versão On-line ISSN 2317-1782
CoDAS vol.28 no.3 São Paulo mai./un. 2016 Epub 10-Jun-2016
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20162015152
Amamentar prematuros é um desafio em virtude da imaturidade, e, em muitos casos, há a necessidade de utilização da sonda gástrica por tempo prolongado, o que limita a experiência de sucção e a maturação dos reflexos orais(1-3).
Além disso, há situações que requerem uma forma de alimentação complementar ou alternativa, segura e eficaz, como na ausência da mãe ou quando o recém-nascido prematuro (RNPT) não está fisiologicamente apto para a amamentação. Nesse sentido, existem métodos que são utilizados na transição da sonda gástrica para a via oral(2-5) e no oferecimento da dieta ao neonato na falta da mãe(6). Dentre essas alternativas, encontram-se o copo(1,7-11), a xícara(6), a colher(6) e a mamadeira(7,9,12), sendo esta última evitada pelos impactos negativos para o aleitamento materno(4,5,13).
Preconizado pela Organização Mundial da Saúde, o copo vem sendo utilizado com a justificativa de ser uma alternativa prática, simples e que garante a amamentação(6). Contudo, há discussões sobre sua efetividade, já que os movimentos orais realizados pelo recém-nascido (RN) para a extração do conteúdo do copo não são de sucção efetiva(10,14,15). Além disso, há referências de derramamento do volume oferecido e repercussão negativa no ganho de peso(2,15-18).
Há outras estratégias de oferta de dieta frequentemente utilizadas na rotina das unidades neonatais; porém, não existem pesquisas que fundamentem o seu uso. Tais estratégias são referidas pela equipe de cuidados como facilitadoras do momento de transição alimentar, em especial no caso de RNs que apresentam dificuldades nesse processo(19). Duas dessas formas de oferta são a seringa(5,19,20) e o finger feeding ou técnica sonda-dedo (TSD)(1,19,21-23).
Não há estudos científicos disponíveis a respeito do uso da seringa, apenas informações sobre os procedimentos de como utilizá-la. A orientação é de que o leite seja dirigido à face interna da bochecha da criança e o seu embolo pressionado apenas quando o RNPT estiver sugando e não nos momentos de deglutição ou respiração(20).
A TSD tem sido sugerida como uma alternativa na transição alimentar(1,20-23). Essa técnica consiste em acoplar uma sonda ao dedo do cuidador, que é sugado pelo RN.
Diante da utilização rotineira desses dois utensílios como estratégias de oferta de dieta ao RNPT, considerou-se importante a busca por dados objetivos de uso para ambos. A hipótese inicial do presente estudo é de que, durante a alimentação, a estabilidade clínica do RNPT e a perda do leite por derramamento sejam influenciadas pelas estratégias de oferta.
É imprescindível que a forma como a alimentação é oferecida estimule os reflexos orais em situações de treino para o estabelecimento da via oral ou na ausência da mãe. Além disso, o RNPT já é exposto a situações de estresse e, por vezes, períodos prolongados de internação. Portanto, a sucção pode ser uma estratégia importante de estímulo para o seu desenvolvimento.
Assim, o objetivo deste estudo foi comparar duas formas distintas de oferta de dieta ao RNPT (seringa e TSD) especificamente em relação às quantidades de dieta oferecida e derramada e à variação dos parâmetros de saturação de oxigênio periférico e frequência cardíaca.
Trata-se de um estudo quasi-experimental, realizado em uma unidade neonatal pública, situada na cidade de Porto Velho, Estado de Rondônia. O hospital é a única unidade de saúde pública do Estado de Rondônia a oferecer assistência a gestantes de alto risco e neonatos de baixo peso e prematuros.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética, sob o número 40.928/2012. As genitoras foram orientadas sobre os procedimentos. Aquelas que concordaram com a participação de seu filho assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.
A referida unidade neonatal compreende quatro enfermarias, totalizando 40 leitos. As enfermarias são separadas pela gravidade do estado geral do neonato e pelo tipo de cuidado necessário. A equipe multidisciplinar responsável pelo atendimento dos pacientes é composta por médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos, nutricionistas e assistentes sociais.
A coleta de dados ocorreu na enfermaria denominada “intermediário I”, com 14 leitos. Essa enfermaria atende os RNs estáveis e que permanecem em contato com a mãe por 24 horas. Nesse contexto, todos os RNs são avaliados e acompanhados pelos fonoaudiólogos do serviço, que auxiliam no processo de transição alimentar da sonda gástrica para a via oral, além de incentivar e apoiar o aleitamento materno.
De acordo com os dados do setor de estatística, nos seis primeiros meses de 2012, a média de nascimentos prematuros foi de 52 ao mês. A amostra de 30 indivíduos foi definida a partir do valor médio de nascimentos por mês, considerando erro amostral de 12% e nível de confiança de 95%. Portanto, ao longo de um mês, os neonatos que se enquadravam nos critérios de inclusão foram selecionados para o estudo.
Os critérios de inclusão estabelecidos, de acordo com a Figura 1, foram: ser RNPT com idade corrigida igual ou maior que 34 semanas no momento da avaliação, estar sendo alimentado por via oral há no mínimo dois dias, estar em estado de alerta na avaliação, clinicamente estável, ou seja, sem necessidade de monitoramento cardiorrespiratório ou hemodinâmico, assim como, não apresentar alterações neurológicas, alteração pulmonar crônica, cardiopatia congênita, malformação craniofacial e não ser soro positivo para o vírus da imunodeficiência humana.
Legenda: RNPTs = recém-nascido pré-termo; TCLE = Termo de consentimento livre e esclarecido; TSD = Técnica sonda-dedo
Figura 1 Fluxograma amostral
Todos os RNPTs da unidade são acompanhados pelos fonoaudiólogos do serviço, portanto os indivíduos da amostra receberam intervenção específica para a transição alimentar de acordo com a sua rotina. Essa intervenção inclui avaliação e estímulos específicos das habilidades orais e da prontidão para alimentação dos RNs, assim como orientação e apoio ao aleitamento materno. Assim, os RNPTs do estudo estavam aptos para receber dieta via oral de forma segura há pelo menos dois dias.
Para que não houvesse interferência das características individuais dos sujeitos, optou-se por avaliar um momento de alimentação com a seringa e outro momento com a sonda-dedo para a mesma criança, sendo ela controle de si mesma.
Dos neonatos selecionados, 13 eram do gênero feminino e 17 do masculino.
As idades gestacionais ao nascimento e no momento da avaliação (idade corrigida), expressas em semanas, foram de 33 4/7±4/7 e 36±4/7, respectivamente. Os pesos médios ao nascimento e na ocasião da avaliação foram de 1.800±140 e 1.972±88 gramas.
Houve homogeneidade da amostra (Tabela 1), com exceção dos dias de uso de sonda gástrica e dias de alimentação oferecida por via oral, cujos coeficientes de variação foram de 70% e 82%, respectivamente. Das 30 crianças que compuseram a amostra, 18 foram classificadas como adequadas para idade gestacional (AIG) e 12 como pequenas para a idade gestacional (PIG). Para caracterizar a distribuição da frequência relativa entre elas, foi aplicado o Teste de Igualdade de Duas Proporções, sem observação de diferença (p=0,121).
Tabela 1 Distribuição dos 30 (trinta) sujeitos em relação a idade gestacional, peso e dias de alimentação por sonda gástrica e via oral
RNPT | PESOIG | IG | IGC | PN | PDA | DSOG | DORAL |
---|---|---|---|---|---|---|---|
1 | PIG | 36 2/7 | 38 2/7 | 1.870 | 1.945 | 12 | 2 |
2 | PIG | 34 | 36 3/7 | 1.605 | 1.855 | 11 | 10 |
3 | AIG | 30 | 37 5/7 | 1.225 | 1.865 | 52 | 2 |
4 | PIG | 34 2/7 | 40 5/7 | 1.430 | 1.986 | 26 | 18 |
5 | PIG | 35 2/7 | 37 2/7 | 2.020 | 1.950 | 5 | 8 |
6 | AIG | 31 | 37 2/7 | 1.125 | 1.920 | 42 | 2 |
7 | PIG | 34 | 39 5/7 | 1.175 | 1.810 | 38 | 2 |
8 | AIG | 32 3/7 | 37 2/7 | 1.615 | 2.160 | 31 | 3 |
9 | AIG | 30 | 34 | 1.300 | 1.615 | 21 | 4 |
10 | AIG | 32 6/7 | 37 2/7 | 1.670 | 2.270 | 26 | 2 |
11 | AIG | 33 | 35 3/7 | 1.655 | 1.815 | 15 | 2 |
12 | AIG | 33 | 35 1/7 | 2.100 | 1.960 | 6 | 10 |
13 | AIG | 33 | 34 4/7 | 2.065 | 1.920 | 6 | 6 |
14 | AIG | 34 2/7 | 35 2/7 | 2.085 | 1.920 | 3 | 5 |
15 | AIG | 33 | 36 2/7 | 1.690 | 1.735 | 37 | 5 |
16 | AIG | 35 | 36 3/7 | 2.905 | 2.825 | 6 | 5 |
17 | AIG | 31 4/7 | 35 | 2.030 | 2.320 | 22 | 2 |
18 | AIG | 31 | 35 | 1.510 | 2.040 | 26 | 2 |
19 | AIG | 33 | 35 | 1.940 | 1.945 | 12 | 2 |
20 | PIG | 36 1/7 | 37 1/7 | 1.885 | 1.725 | 6 | 2 |
21 | AIG | 33 | 34 5/7 | 2.320 | 2.400 | 7 | 5 |
22 | PIG | 36 6/7 | 41 | 2.130 | 2.010 | 24 | 3 |
23 | AIG | 32 | 36 6/7 | 1.420 | 1.860 | 32 | 3 |
24 | PIG | 35 | 37 6/7 | 1.530 | 1.605 | 16 | 3 |
25 | AIG | 35 | 35 4/7 | 2.200 | 2.000 | 2 | 3 |
26 | PIG | 35 | 38 6/7 | 1.980 | 2.100 | 14 | 2 |
27 | AIG | 34 2/7 | 36 | 2.185 | 2.100 | 9 | 3 |
28 | PIG | 34 | 38 3/7 | 1.530 | 1.875 | 22 | 10 |
29 | PIG | 35 | 36 3/7 | 1.995 | 1.890 | 8 | 2 |
30 | PIG | 32 | 34 3/7 | 1.817 | 1.735 | 14 | 4 |
33 4/7*±4/7† (1 5/7‡) | 36*±5/7† (1 6/7‡) | 1.800*±140† (390‡) | 1.972*±88† (245‡) | 18,4*±4,6† (12,9‡) | 4,4*±1,3† (3,6‡) |
*média;
†intervalo de confiança;
‡desvio padrão
Legenda: DORAL = dias da alimentação oferecida por via oral até o dia da avaliação; DSOG = dias de uso de sonda gástrica; IG = idade gestacional ao nascimento (semanas); IGC = idade gestacional corrigida na ocasião da avaliação (semanas); PDA = peso na ocasião da avaliação (gramas); PESOIG = relação peso e idade gestacional; PN = peso ao nascimento (gramas); RNPT = identificação do recém-nascido prematuro
Inicialmente, foi realizado o levantamento dos dados de prontuários, para selecionar os RNPTs que atendiam aos critérios de inclusão.
Os materiais utilizados foram: gaze não estéril, luvas de procedimento, esparadrapo, seringa descartável de 20 mililitros, sonda gástrica número seis, balança digital calibrada (Balmak, Easy 5, São Paulo, Brasil), oxímetro de pulso portátil (Moriya, MD300C1, Beijing, China, com registro ANVISA nº 10349590060), cronômetro digital (Q&Q, HS45, Tóquio, Japão) e equipamentos de proteção individual.
Na ausência ou impossibilidade da genitora de realizar o aleitamento materno, o mesmo RN foi submetido às duas formas de oferta de dieta: seringa e TSD, respectivamente, no mesmo dia em sessões de alimentação subsequentes. As avaliações foram realizadas em dois momentos únicos de alimentação do período matutino e por duas pesquisadoras igualmente treinadas e calibradas.
Em ambas as técnicas, foram realizados os seguintes procedimentos: (1) 50 cm de gaze, utilizada para conter qualquer derramamento de dieta, foi pesada em uma balança de precisão; (2) houve o cuidado em despertar o bebê, pois era imprescindível que estivesse em estado de alerta; (3) um oxímetro portátil foi colocado no pé do bebê para a verificação e anotação da saturação do oxigênio e da frequência cardíaca no início, um minuto após iniciado o procedimento e ao final da oferta; (4) o toque da seringa ou dedo nos lábios do RN foi considerado o início, já o término foi estabelecido como o aceite total da dieta ou a recusa às investidas de oferta, sendo esse período cronometrado; (5) durante a sessão de alimentação, o RNPT foi posicionado em seu leito, em posição elevada, com inclinação de 45 graus, sendo as regiões occipital e cervical sustentadas com a mão oposta à utilizada na oferta; (6) a dieta esteve de acordo com a prescrição diária do pediatra e foi disponibilizada pelo lactário da unidade; (7) imediatamente ao final da oferta, a gaze era novamente pesada para verificar a quantidade do derramamento.
A seringa de 20 mililitros foi escolhida por ser usualmente oferecida pelo serviço (Figura 2). O conteúdo da seringa era dirigido à face interna da bochecha e não à língua ou à faringe(20).
Figura 2 Oferta da dieta por meio da seringa. Fonte: Recém-nascido assistido na unidade hospitalar onde foi realizada a pesquisa. Registro fotográfico autorizado pela genitora
Para a TSD (Figura 3), uma das pontas da sonda gástrica foi fixada no dedo mínimo do avaliador e introduzida na cavidade oral do bebê(20-23). A outra ponta da sonda foi acoplada a uma seringa de 20 mililitros. O embolo da seringa só era pressionado nos momentos em que ocorria a sucção.
Figura 3 Oferta da dieta por meio da técnica sonda-dedo. Fonte: Recém-nascido assistido na unidade hospitalar onde foi realizada a pesquisa. Registro fotográfico autorizado pela genitora
Independente da forma de oferta, o tempo do oferecimento e os volumes totais oferecidos e derramados foram registrados. A partir desses valores foram calculadas as proporções dos volumes, além de sua relação com o tempo.
Para assegurar a segurança das crianças, foram considerados dois parâmetros de competência da alimentação: o monitoramento do volume oferecido durante os primeiros cinco minutos dividido pelo volume total prescrito para cada sessão de alimentação (que deveria ser de, no mínimo, 30% da dieta total daquela sessão) e o volume de ingesta do leite durante uma sessão de alimentação completa, ou seja, a relação entre a quantidade oferecida (mL) e o tempo (min), cujo valor mínimo esperado foi de 1,5 mL/min(24,25).
Esses são dois parâmetros utilizados no serviço para a liberação de via oral. Como os RNPTs avaliados na presente pesquisa já se encontravam em alimentação oral plena há pelo menos dois dias, esperava-se que todos alcançassem os valores mínimos de 30% e 1,5 mL/min, o que de fato ocorreu. Mediante isso, esses valores foram utilizados para comparar uma possível variação entre os dois métodos.
Foram realizadas as seguintes análises: (1) comparações das proporções de dieta oferecida e derramada, assim como o tempo total do momento da alimentação entre as duas formas de oferta por meio do teste t de Student pareado; (2) correlação entre os volumes de oferta e o tempo e as características do RNPT, tais como idade gestacional ao nascimento e idade corrigida, peso ao nascer e peso na ocasião da avaliação, dias de uso de sonda gástrica e dias de via oral, utilizando-se o teste de Correlação de Pearson; (3) comparação da variação da saturação de oxigênio e frequência cardíaca em três momentos, antes, durante e após a alimentação para cada forma de oferta pelos testes estatísticos ANOVA e Comparação Múltipla de Tukey.
Os dados coletados foram organizados em planilha do Excel Office 2010 e analisados pelo software SPSS V17. Os resultados apresentaram uma distribuição normal, sendo o nível de significância estatística de 5%.
Na Tabela 2, consta a interferência da relação entre peso e idade gestacional nas proporções de dieta oferecida, dieta derramada e tempo. Pode-se observar que os RNPTs PIG apresentaram volume oferecido maior que os RNPTs AIG quando a TSD foi usada. Nos demais aspectos avaliados, os resultados mostraram-se iguais.
Tabela 2 Dados referentes às proporções de dieta oferecida, derramada e tempo para cada forma de oferta, considerando a relação idade gestacional/peso para os 30 (trinta) indivíduos avaliados
Variáveis | Técnica sonda-dedo | Valor de p | Resultado | Seringa | Valor de p | Resultado | ||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
AIG (n=18) | PIG (n=12) | AIG (n=18) | PIG (n=12) | |||||
Volume oferecido (%) | 69,6*±10,2† (22,0‡) | 92,8*±7,3† (13,0‡) | 0,003 | AIG≠PIG | 87,0*±6,7† (14,4‡) | 91,5*±6,5† (11,5‡) | 0,383 | AIG=PIG |
Volume oferecido em 5 min (%) | 35*±4,9† (10,5‡) | 41,5*±6,5† (11,4‡) | 0,122 | AIG=PIG | 38,6*±4,0† (8,6‡) | 40,3*±5,4† (9,5‡) | 0,608 | AIG=PIG |
Volume derramado (%) | 2,3*±1,9† (4,1‡) | 2,4*±3,3† (5,8‡) | 0,965 | AIG=PIG | 16,6*±3,5† (7,6‡) | 17,9*±4,0† (7,1‡) | 0,634 | AIG=PIG |
Relação volume/tempo (mL/min) | 3,04*±0,45† (0,97‡) | 3,42*±0,57† (1,01‡) | 0,316 | AIG=PIG | 3,34*±0,31† (0,68‡) | 3,27*±0,51† (0,90‡) | 0,827 | AIG=PIG |
Tempo (min) | 9,90*±1,45† (3,14‡) | 11,38*±1,77† (3,13‡) | 0,218 | AIG=PIG | 11,27*±1,34† (2,91‡) | 11,56*±1,41† (2,49‡) | 0,781 | AIG=PIG |
*média;
†intervalo de confiança;
‡desvio padrão
Legenda: AIG = adequado para idade gestacional; PIG = pequeno para idade gestacional. Teste estatístico: ANOVA (p<0,05)
A Tabela 3 mostra a comparação das proporções de dieta oferecida, dieta derramada e tempo entre as duas formas de oferta, que demostrou diferença para o volume oferecido e derramado.
Tabela 3 Comparação entre as duas formas de oferta, técnica sonda-dedo e seringa, referentes às proporções de dieta oferecida, derramada e tempo para os indivíduos avaliados
Variáveis | Oferta (n=30) | Valor de p | Resultado | |
---|---|---|---|---|
Técnica sonda-dedo | Seringa | |||
Volume oferecido (%) | 78,9*±7,8† (21,9‡) | 88,8*±4,8† (13,3‡) | 0,029 | TSD≠seringa |
Volume oferecido em 5 min (%) | 37,6*±4† (11,2‡) | 39,3*±3,2† (8,8‡) | 0,400 | TSD=seringa |
Volume derramado (%) | 2,3*±1,7† (4,8‡) | 17,2*±2,6† (7,3‡) | <0,001 | TSD≠seringa |
Relação volume/tempo (mL/min) | 3,20*±0,35† (0,99‡) | 3,31*±0,27† (0,76‡) | 0,515 | TSD=seringa |
Tempo (min) | 10,49*±1,13† (3,17‡) | 11,38*±0,97† (2,71‡) | 0,135 | TSD=seringa |
*média;
†intervalo de confiança;
‡desvio padrão
Legenda: Teste estatístico: t de Student pareado (p<0,05)
Para medir o grau de relação entre as características dos RNPTs que poderiam interferir nas formas de oferta, foi aplicada a Correlação de Pearson, apresentada na Tabela 4. Os resultados indicaram correlação presente apenas para a TSD e a idade corrigida.
Tabela 4 Correlação das características dos indivíduos avaliados com os volumes e proporções de dieta oferecida, dieta derramada e tempo para cada forma de oferta (técnica sonda-dedo e seringa)
Variáveis | IG | IGC | PN | PDA | DSOG | DORAL | ||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Técnica sonda-dedo | Volume oferecido | r* | 20,4% | 38,0% | 11,1% | 26,1% | 7,9% | 13,4% |
p-valor | 0,279 | 0,038† | 0,559 | 0,163 | 0,677 | 0,480 | ||
Volume oferecido em 5 min | r* | 5,1% | 36,9% | 0,1% | 23,6% | 23,9% | 8,6% | |
p-valor | 0,787 | 0,044† | 0,995 | 0,209 | 0,204 | 0,653 | ||
Volume derramado | r* | 10,2% | 8,4% | 29,2% | 31,7% | 24,5% | 21,3% | |
p-valor | 0,592 | 0,660 | 0,117 | 0,088 | 0,193 | 0,259 | ||
Relação volume/tempo | r* | 9,2% | 40,4% | 1,7% | 22,4% | 24,3% | 8,5% | |
p-valor | 0,630 | 0,027‡ | 0,927 | 0,235 | 0,195 | 0,656 | ||
Seringa | Volume oferecido | r* | -3,5% | 32,4% | -4,4% | 33,0% | 17,7% | 15,4% |
p-valor | 0,856 | 0,081 | 0,819 | 0,075 | 0,349 | 0,415 | ||
Volume oferecido em 5 min | r* | 1,0% | 19,9% | -6,2% | 4,1% | 5,8% | 13,3% | |
p-valor | 0,958 | 0,292 | 0,743 | 0,830 | 0,761 | 0,483 | ||
Volume derramado | r* | 21,0% | 24,5% | 15,8% | 9,4% | -4,8% | 19,1% | |
p-valor | 0,266 | 0,193 | 0,406 | 0,620 | 0,800 | 0,311 | ||
Relação volume/tempo | r* | 4,1% | 27,1% | -5,6% | 13,5% | 12,9% | 8,9% | |
p-valor | 0,830 | 0,147 | 0,768 | 0,478 | 0,498 | 0,641 |
Teste estatístico: * Correlação de Pearson (p<0,05);
†Correlação presente, classificada na escala do teste como ruim;
‡Correlação presente, classificada na escala do teste como regular
Legenda: DORAL = dias da alimentação oferecida por via oral até o dia da avaliação; DSOG = dias de uso de sonda gástrica; IG = idade gestacional ao nascimento (semanas); IGC = idade gestacional corrigida na ocasião da avaliação (semanas); PDA = peso na ocasião da avaliação (gramas); PN = peso ao nascimento (gramas)
Os valores da saturação de oxigênio, que foram anotados em três momentos (antes, durante e depois) para as duas formas de oferta da dieta, são mostrados na Figura 4. Utilizou-se o teste ANOVA para comparar esses momentos em cada técnica. Para a TSD, a comparação não indicou mudança nesse parâmetro. Para a seringa, houve diferença (p=0,047). Para verificar em qual momento estaria a diferença, foi aplicada a Comparação Múltipla de Tukey, que apontou aumento da saturação de oxigênio entre os momentos antes e depois da oferta (p=0,05).
Legenda: *média; †intervalo de confiança; ‡desvio-padrão
Figura 4 Dados referentes à saturação de oxigênio que foram mensurados antes, durante e depois da oferta da dieta, dos indivíduos avaliados para as duas formas de oferta, técnica sonda-dedo e seringa
Na Figura 5, são demonstrados os valores da frequência cardíaca obtidos em três momentos (antes, durante e depois) para as duas formas de oferta da dieta. Foi utilizado teste ANOVA para comparar esses momentos, indicando diferença para ambas as técnicas (p<0,001). A Comparação Múltipla de Tukey demonstrou essa diferença em dois momentos específicos: antes/durante e antes/depois (p<0,001).
Percebeu-se que as duas únicas variáveis que não se mostraram homogêneas foram os dias de uso de sonda gástrica e os dias de alimentação oferecida por via oral até o dia da avaliação (Tabela 1). Contudo, esses dois aspectos não influenciaram os resultados, como se pode perceber na Tabela 4. Esse achado justifica-se pelo fato de todos os RNPTs da unidade receberem intervenção multiprofissional (por exemplo: estímulos orais), o que pode beneficiar as habilidades necessárias para a alimentação(1,3,25,26).
Houve a preocupação de verificar se o desenvolvimento intrauterino poderia ter influenciado os resultados obtidos. É interessante notar que a proporção maior do volume de dieta oferecido (92,8±7,3) foi apresentado pelos RNPTs PIG e durante o uso da técnica que privilegia a sucção, ou seja, a TSD (Tabela 2). Como já referido anteriormente, a amostra era homogênea; portanto, essa diferença não foi decorrente de características díspares entre os indivíduos, tais como peso ou idade gestacional (Tabela 1).
É importante afirmar que não houve episódio de recusa da dieta por qualquer RN, o que poderia interferir nesse resultado. Contudo, pode-se inferir por esse valor que provavelmente os RNPTs PIG tenham recebido, durante a hospitalização, mais intervenções fonoaudiológicas e/ou multidisciplinares em virtude da própria condição de prematuridade e baixo peso. Lau e Smith(3) afirma que o exercício e a prática permitem que o RNPT se adapte ao seu ambiente e sugere que a estimulação oral e global podem acelerar o desenvolvimento normal de funções fisiológicas variadas. Assim, ao receberem a dieta por meio de um método que favoreceu a sucção, como é a TSD, apresentaram melhor desempenho para o volume de dieta oferecido. Entretanto, não foram coletados dados referentes à quantidade ou ao tipo de estímulo que comprovem essa hipótese, o que pode ser um objetivo para pesquisas posteriores.
As diferenças apresentadas entre as formas de oferta estão relacionadas ao volume que os RNPTs foram capazes de receber e ao derramamento (Tabela 3). Percebe-se que, ao ser utilizada a seringa, o volume injetado na cavidade oral é significantemente maior quando comparado à TSD; contudo, também há um derramamento maior quando a seringa é utilizada, resultando em ingesta real menor. O derramamento maior com o uso da seringa (17,2%) pode ter ocorrido porque o leite flui constantemente nesse método e, portanto, o neonato não tem controle do volume inserido na cavidade oral. Apesar de a seringa ser comumente utilizada nas unidades neonatais, esse método oferece um estímulo antifisiológico que independe da vontade do bebê de sugar ou sorver(19).
Estudo recente indica a utilização de seringa de 1 mL para treino de deglutição(3), enquanto as demais referências não especificam o tamanho de seu embolo, mas referem apenas que podem ser utilizadas para oferta da dieta(1,5,19). Como já mencionado, a seringa de 20 mL foi escolhida por ser a usualmente oferecida aos RNs do serviço onde foi realizada a presente pesquisa. Contudo, o seu fluxo de leite é provavelmente maior do que o de seringas de menor êmbolo. Além disso, mesmo que para a sonda-dedo seja utilizada uma seringa de 20 mL a sonda minimiza o fluxo de oferta. Portanto, não se pode considerar que os resultados apresentados representem o que poderia ser obtido por qualquer seringa, em especial a de êmbolos menores.
As respostas obtidas pela TSD indicam uma perda mínima da dieta por derramamento (Tabela 3). Pode-se inferir que essa técnica beneficia a organização do processo de alimentação oral do neonato, pois são realizados movimentos de sucção e deglutição, que podem ser ritmados por quem a oferece(22,23).
Diante desse resultado, percebe-se que a técnica utilizada para a oferta da alimentação ao RN pode influenciar o volume real ingerido. Há fatores, como a inabilidade oral do prematuro em administrar o fluxo de leite de acordo com o utensílio utilizado, que podem ocasionar derramamento, repercutindo na defasagem do valor energético e nutricional que deveria consumir(11,12,17,27).
Não foram encontrados estudos referentes a outro tipo de utensílio ou método, como a seringa e a TSD, ficando, os estudos existentes, restritos à mamadeira e ao copo(10,15,16,28). Há apenas relatos do uso da TSD como estratégia para a transição da sonda gástrica para via oral(20,22,23). Alguns autores consideram que a TSD permite que o ritmo e a coordenação da sucção sejam aperfeiçoados(23); contudo, a indicação deve ser considerada para treino da sucção na ausência da mãe ou como complemento desde que o RNPT já tenha sido aleitado(22).
Comparando-se os derramamentos encontrados nesta pesquisa, 17,2% para a seringa e 2,3% para a TSD (Tabela 3), àqueles obtidos para médias de estudos com o copo, de 12%(18), 38,5%(15) e 22,8%(17), percebe-se o quanto a TSD oferece menor derramamento. Infere-se, diante dessa análise, que há uma inabilidade do prematuro em administrar o fluxo de leite, e a TSD permite a coordenação das funções reflexas do neonato, que são a sucção e a deglutição em coordenação com a respiração(21).
A porcentagem do volume oferecido no intervalo de cinco minutos foi de 37,6±4 para a TSD e 39,3±3,2 para a seringa, sem diferença entre as duas técnicas (Tabela 3). Esses valores estão de acordo com estudos que utilizam o monitoramento dos primeiros cinco minutos como um índice de capacidade de alimentação dos bebês, quando a fadiga é mínima, e o volume oferecido deve ser de, no mínimo, 30% do volume total prescrito por sessão de alimentação(24,25).
A relação entre o volume total oferecido por sessão de alimentação e o tempo, que foi de 3,2±0,35 mL/min para a TSD e 3,31±0,27 mL/min para a seringa, não demonstrou diferença entre as duas técnicas (Tabela 3). Estudos referem que o monitoramento de uma sessão completa de alimentação indica o índice de resistência do RNPT, pois a fadiga é considerada máxima(24,25). Essa relação deve ser de no mínimo 1,5 mL/min(24,25), e os dados desta pesquisa são coincidentes com esse parâmetro.
Ao analisar a influência das características dos RNPTs nas duas formas de oferta, verificou-se correlação positiva classificada na escala do teste como ruim e regular apenas para a TSD e a idade corrigida (Tabela 4). Assim, para a TSD, há uma tendência de que quanto maior a idade corrigida, maiores serão o volume total oferecido por sessão de alimentação, o volume oferecido em cinco minutos e a relação volume/tempo. Os estudos apresentam opiniões distintas no que se refere à influência da idade corrigida, pois há os que sugerem que a idade corrigida não influencia os volumes oferecidos ou derramados(17), enquanto outros apontam associação(24).
No que se refere à saturação de oxigênio para cada forma de oferta (Figura 4), houve diferença apenas para a seringa, que apontou um aumento entre os momentos antes e depois (93,23±2,04; 95,90±0,76; p=0,05). Essas variações não inferem prejuízo aos RNPTs, visto que se encontram dentro da normalidade, ou seja, acima de 93%(29).
Não foi possível localizar pesquisas que relacionam a saturação de oxigênio ao uso da seringa ou da TSD. Os estudos já realizados referem-se aos valores desse parâmetro fisiológico para o copo e a mamadeira. Um trabalho semelhante realizado na mesma unidade desta pesquisa, porém com o copo, demonstrou variação da saturação (de 95,55% a 96,50%) durante e ao término da oferta; contudo, também dentro da normalidade para o RNPT(30). Outros estudos referem estabilidade de saturação de oxigênio, frequência respiratória e frequência cardíaca para o copo quando comparado com a mamadeira(10,15,16). Outro estudo obteve saturação inferior a 85% para prematuros alimentados com copo e considera que essa queda esteja relacionada ao maior esforço na tentativa de sorver o alimento do copo(27).
É imprescindível recordar que o subsistema autônomo se refere às funções vitais e deve receber atenção. Dentre os diversos parâmetros, como respiração, ritmo cardíaco, cor da pele, entre outros, há a saturação de oxigênio, que reflete a estabilidade do bebê(6).
Por fim, no que se refere à frequência cardíaca, houve diferença para as duas técnicas entre dois momentos específicos: antes/durante e antes/depois (Figura 5). Ou seja, houve aumento da frequência cardíaca quando comparado ao valor de repouso anterior à oferta do alimento. Em estudo anterior, realizado com 56 RNPTs de 34 semanas de idade gestacional, houve aumento das frequências cardíaca e respiratória para o copo e a mamadeira quando comparados aos valores desses parâmetros antes da mamada(10). Isso pode ser justificado pelo fato de a regulação do sistema circulatório ainda não estar bem desenvolvida e porque a frequência cardíaca maior ajuda a fornecer mais oxigênio ao organismo(29). Não se pode negar que há um esforço físico do bebê no momento da alimentação e que tal esforço pode levar a essa variação(27).
A hipótese inicial do presente estudo foi parcialmente confirmada diante dos resultados obtidos, pois se constatou que o uso da seringa causa derramamento da dieta. Portanto, trata-se de uma estratégia ineficiente para a alimentação do RNPT. Contudo, em virtude de a avaliação ter ocorrido uma única vez em um dia, não se pode afirmar que os resultados seriam diferentes caso fossem realizadas avaliações contínuas. Além disso, os RNPTs já estavam sendo alimentados por via oral, e foram realizadas intervenções fonoaudiológicas com todos eles.
Uma limitação importante para o presente estudo foi a utilização da seringa de 20 mL, que provavelmente repercute em maior fluxo de leite e pode ter influenciado os valores obtidos, em especial o de derramamento. Logo, os resultados deste estudo valem apenas para a seringa desse calibre, não sendo possível a generalização para qualquer outro tamanho de seringa.
Além disso, mesmo que a proposta desta pesquisa tenha sido analisar duas formas específicas de ofertar a dieta ao RNPT, seriam interessantes comparações com outros utensílios, como copo e mamadeira, que são usualmente utilizados em unidades neonatais.
Sugere-se, ainda, pesquisas que envolvam a TSD e seu impacto para o aleitamento materno, haja vista ser um método utilizado por fonoaudiólogos nos serviços neonatais, que mesmo estimulando a sucção não envolve a mãe no processo de transição alimentar. Além disso, não se pode afirmar se a introdução do dedo acoplado à sonda na cavidade oral do RN pode interferir nos movimentos ideais para a amamentação.
Dessa forma, é imprescindível a realização de pesquisas com utensílios, instrumentos ou técnicas que podem ser estratégias facilitadoras para a alimentação dessas crianças e, como consequência, repercutir em menor ocorrência de estresse, maior ganho de peso e estímulo ao aleitamento materno.
De acordo com a metodologia empregada, verificou-se que a TSD proporciona menor derramamento da dieta quando comparada à seringa de 20 mL. As variações da saturação de oxigênio e da frequência cardíaca observadas nos momentos antes, durante e depois se mantiveram dentro dos limites de normalidade para ambos os métodos de oferta.