Genética

Atrofia muscular espinhal e o medicamento mais caro do mundo, o Zolgensma | Colunistas

Atrofia muscular espinhal e o medicamento mais caro do mundo, o Zolgensma | Colunistas

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A atrofia muscular espinhal (AME) atinge cerca de 1 ou 2 casos em cada 100.000 pessoas e necessita como tratamento o medicamento mais caro do mundo, o Zolgensma. 

Vem entender toda essa história!

O que é a atrofia muscular espinhal (AME)?

A doença é caracterizada como a perda do funcionamento dos neurônios motores e, consequentemente, diminuição dos tecidos celulares dos músculos, especialmente daqueles localizados no corno anterior da medula espinhal.

Isso é explicado por meio da genética; a AME tem origem genética autossômica recessiva ligada aos genes SNM 1 (survival motor neuron 1) e SNM 2 (survival motor neuron 2), que são genes da sobrevida do neurônio motor, que são localizados no cromossomo 5q.

Tais genes produzem a proteína SMN, que tem uma função muito importante na estrutura dos neurônios motores inferiores da medula espinhal.

Em pessoas saudáveis, a proteína SMN é produzida a partir do gene SMN1, já em pessoas com AME, uma mutação no gene SMN1 faz com que uma parte dele, o Exon 7, esteja ausente, perdendo, então, sua função integral de produção da proteína SMN. Quando menos do que 50% da proteína SNM é produzida pelo corpo, a pessoa terá atrofia muscular espinhal.

A proteína SMN também pode ser produzida pelo gene SMN2. No entanto, somente uma pequena parte da proteína SMN produzida pelo gene SMN2 é funcional, de forma que não é suficiente para “suprir” toda a necessidade da proteína e manter os neurônios motores saudáveis.

O pai e a mãe possuem uma cópia do alelo mutado e a outra cópia normal (que garante o funcionamento normal da produção da proteína SNM), ou seja, os pais são portadores da doença – cerca de 1 em 50 pessoas são portadoras de um alelo mutado. Os indivíduos que apresentam a doença possuem dois alelos SMN1 com mutação, um herdado do pai e outro da mãe. 

Fonte: Instituto da Atrofia Muscular Espinhal (https://iname.org.br/genetica-e-diagnostico-ame/)

Classificações

A classificação é clínica, conforme os marcos motores que o paciente alcançou e a idade de início dos sintomas. O resultado do exame genético e o número de cópias de SMN2 não são fatores que vão dizer qual o tipo de AME do paciente.

Fonte: Instituto Nacional Da Atrofia Muscular Espinhal
(https://iname.org.br/tipos-de-ame/)

Tipo 0/ forma pré-natal/ tipo 1A:

  • Os sintomas surgem durante a gestação, durante a qual pode ocorrer baixa movimentação fetal, até os 3 meses de vida;
  • Os recém-nascidos apresentam hipotonia severa, principalmente nas musculaturas proximal e intercostal e insuficiência respiratória grave, além de defeitos cardíacos;
  • O tórax é estreito e geralmente há pectum excavatum
  • Costumam não resistir além do primeiro mês; 
  • Em geral, esses bebês possuem apenas uma cópia do gene SMN2.

Tipo 1/ forma infantil grave:

  • Os sintomas surgem até o sexto mês de vida;
  •  O bebê apresenta hipotonia e pode necessitar de auxílio para respirar (suporte de ventilação);
  • Normalmente não atingem o marco de sustentar o pescoço e o marco de sentar sem apoio (em inglês são chamados de “non-sitters”). Além disso, pode haver diminuição ou ausência dos reflexos tendinosos;
  • Também apresentam dificuldade de deglutição (o que resulta em engasgos frequentes e não apresenta ganho de peso adequado) e dificuldades respiratórias, assim, o bebê tem uma respiração taquipneia e pode suar mais do que o normal;
  • A criança apresenta fasciculação (tremor) na língua e normalmente tem choro e tosse fracos, e, devido à hipotonia, é comum que fique na postura de “perna de sapinho”.

Tipo 2/ forma intermediária:

  • O aparecimento dos sintomas e da fraqueza muscular ocorre entre os 6 e os 18 meses;
  • A criança pode conseguir atingir o marco de se sentar sem apoio, porém não chega a andar. Também pode apresentar dificuldade respiratória em graus variados e problemas de deglutição, (mas em menor grau do que no tipo I), sintomas de dor muscular e rigidez articular, tremores finos nas mãos com dedos estendidos;
  • As infecções respiratórias se repetem, sendo a causa do óbito na maioria dos casos;
  • Ao longo de seu desenvolvimento, podem surgir anomalias esqueléticas, como escoliose, deslocamento de quadril e deformidades articulares.

Tipo 3/ forma juvenil moderada:

  • O aparecimento dos sintomas acontece após os 18 meses de idade;
  • Os pacientes apresentam capacidade de ficar em pé e andar (em inglês, o termo é “walkers”), mas, devido à progressão da doença, podem perder essa habilidade ao longo da vida e normalmente as pernas são mais afetadas do que os braços;
  •  Pode haver dor muscular e escoliose.

Tipo 4/ forma adulta:

  • Tem início na vida adulta e o paciente apresenta fraqueza, que predomina em membros inferiores, demonstrada visivelmente na dificuldade para se levantar.

Observações sobre as classificações

Os casos mais graves são os tipos 0 e I, nos quais problemas motores e respiratórios se desenvolvem já nos primeiros meses de vida, e no tipo 1 ocorre perda rápida e irreversível dos neurônios motores.

Os tipos de AME mais comuns de atrofia muscular espinhal são os tipos I (cerca de 60%), II e III. 

Como é feito o diagnóstico?

  • Quadro clínico;
  • Suspeita familiar;
  • Triagem neonatal;
  • Exames genéticos de análise quantitativa do gene SMN 1 (coleta de sangue, de saliva ou raspagem de bochecha);
  • Eletromiografia;
  • Biópsia muscular.

Observações: atualmente, a eletroneuromiografia e a biópsia muscular não são solicitados, porque, além de serem extremamente dolorosos para a criança, eles não são capazes de fechar o diagnóstico de AME e só atrasam o fechamento do diagnóstico do paciente. Por isso, a recomendação do Consenso 2018 é que, se há suspeita de AME, deve-se partir para o exame genético de imediato.

Para a confirmação do diagnóstico genético, a quantificação das cópias do gene SMN2 não é necessária. Mas o conhecimento da quantidade de cópias do gene SMN2 também é importante, pois pode auxiliar na predição da severidade da doença e abordagem terapêutica.

Como é feito o tratamento?

Não medicamentoso

Se dá pelo tratamento multidisciplinar com o acompanhamento de: neuropediatra, fisioterapeuta, enfermeiro, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional e nutricionista.

Medicamentoso

Spinraza (nusinersena):

É um tratamento que induz o RNA do paciente a produzir a proteína SNM, assim, atua desacelerando o avanço da doença. Contudo, essa medicação se dá por meio de uma punção lombar em centro cirúrgico a cada 4 meses;

Zolgensma (onasemnogene abeparvovec-xioi):

O medicamento mais caro do mundo e o único que impede o avanço da AME e teve a aprovação da ANVISA no dia 17/08/2020. É uma terapia genética recombinante baseada no AAV9 (adeno associated virus), um vírus que não causa doenças em humanos.

No laboratório, se retira o DNA do AAV9 e se substitui por uma cópia funcionante do SMN humano. Em seguida, o vírus é inserido no corpo e entrega o gene SMN aos neurônios motores, sem se tornar parte do DNA do paciente. Desse modo, os novos genes induzem à produção de novas proteínas repetidas vezes e, assim, a função das células motoras é mantida.

Assim que o vírus entrega o gene, ele é degradado e excretado do corpo.

Fonte:  https://www.zolgensma.com/how-zolgensma-works

O Zolgensma é aplicado em dose única por via intravenosa. Custa cerca de 2,125 milhões de dólares (cerca de 12 milhões de reais). A indústria afirma que o custo é tão elevado porque se trata de uma terapia única e transformadora para a cura de uma doença rara.

O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: esse material foi produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido.


Referências:

– Instituto Nacional da Atrofia Muscular Espinhal; 

– BAIONI, Mariana T. C.; AMBIEL, Celia R.. Atrofia muscular espinhal: diagnóstico, tratamento e perspectivas futuras. J. Pediatr. (Rio J.), Porto Alegre, v. 86, n. 4, p. 261-270, Aug. 2010.

– Keeler AM, Flotte TR. Recombinant Adeno-Associated Virus Gene Therapy in Light of Luxturna (and Zolgensma and Glybera): Where Are We, and How Did We Get Here?. Annu Rev Virol. 2019.

– https://www.novartis.com/news/media-releases/avexis-announces-innovative-zolgensma-gene-therapy-access-programs-us-payers-and-families;

– www.zolgensma.com;

– www.justospelaame.com.br;

– www.cureakyara.com.br