Carreira em Medicina

Caso Clínico: Síndrome Coronariana Aguda em jovem usuário de cocaína| Ligas

Caso Clínico: Síndrome Coronariana Aguda em jovem usuário de cocaína| Ligas

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Área: Cardiologia

Autores: Bivar Olynto Nóbrega de Mello e Silva, Maria Eduarda de Arruda Carvalho

Revisor(a):Byanka Eduarda Silva de Arruda

Orientador(a): Ivson Cartaxo Braga

Liga: Liga Acadêmica de Cardiologia da Paraíba (CARDIOLIGA – PB)

Apresentação do caso clínico

E.A.B., 27 anos, natural e procedente da Paraíba, foi admitido na Urgência do Hospital Universitário Nova Esperança com queixa de precordialgia há mais de 20 horas, com início após utilização de cocaína, da qual faz uso há aproximadamente 5 anos.  Nega comorbidades e história familiar de doença coronariana. Afirma ter buscado pronto socorro há duas semanas por queixa semelhante, mas recusou-se a realizar os exames e deixou o serviço. Exame físico mostrou-se sem alterações importantes, com freqüência cardíaca de 78bpm e pressão arterial sistêmica de 120x70mmhg. O ECG admissional revelou um supradesnivelamento de ST de V2 a V5 e onda T invertida, profunda e simétrica de V2 a V5 (Figura 1). A radiografia de tórax revelou aumento discreto da área cardíaca. O ecocardiograma, realizado três dias depois, revelou acinesia do septo interventricular posterior e região apical; hipocinesia da parede inferior e apical lateral do ventrículo esquerdo; hipocinesia médio-apical anterior e acinesia na porção posterior do septo. A fração de ejeção do VE foi de 45% e suas dimensões foram de 65cm x 50cm. O cateterismo cardíaco evidenciou artérias coronárias normais, com imagem sugestiva de trombo na porção inicial da artéria descendente anterior. O paciente apresentou boa evolução clínica e recebeu alta com caverdilol, espironolactona e enalapril.

Figura 01 – ECG do paciente feito em urgência do Hospital Universitário Nova Esperança

FONTE:http://www.medicinanet.com.br/conteudos/casos/1559/eletrocardiograma_21.htm

Questões para orientar a discussão           

1. Qual a complicação mais temida em decorrência do uso da cocaína?  É necessário uso crônico para tal?

2. Quais sintomas podem estar associados a precordialgia e o que pode exacerbar a dor?

3. Como se dá o diagnóstico de IAM por cocaína?

4. Qual o tratamento para SCA por uso de cocaína?

5. Apesar das contraindicações qual betabloqueador poderia ser utilizado nesse caso?

Respostas

1. Consistem nos distúrbios do ritmo cardíaco e IAM, mesmo na ausência de doença coronariana prévia. O IAM, transmural ou não, ocorre tanto em decorrência do uso crônico como do uso agudo. A ativação dos receptores β-adrenérgicos, leva ao aumento da demanda metabólica do miocárdio ao mesmo tempo em que, juntamente com a ação agonista da 5-hidroxitriptamina, ocorre vasoconstrição coronariana. Esse desequilíbrio entre oferta e demanda pode levar à isquemia.

2.  Geralmente alguns minutos após uso da droga, a dor vai se fazer presente, podendo vir acompanhada de vômitos, sudorese profusa e sensação de morte iminente. Se, além da cocaina, o paciente fizer uso concomitante de bebidas alcoólicas e cigarro, haverá chance da dor mostra-se em maior intensidade.

3.  Para o diagnóstico de IAM por cocaína, a enzima mais importante a ser pesquisada é a troponina sérica. A droga provoca rabdomiólise em 50% dos pacientes e, portanto, níveis séricos de creatinofosfoquinase (CPK) podem não ser fidedignos. O ECG em repouso apresenta alterações em mais de 50% dos pacientes, inclusive com supradesnivelamento do segmento ST.

4. O tratamento de paciente com síndrome coronariana aguda devido ao uso de cocaína baseia-se em oxigênio, aspirina, ticlopidina, nitroglicerina, benzodiazepínicos, verapamil e fentolamina. A administração de heparina, aspirina, ticlopidina não se assenta em estudos clínicos, mas sim no risco de a cocaína promover um estado pró-coagulante devido à ativação plaquetária. O uso de nitroglicerina visa a reverter os espasmos das artérias coronárias. Os benzodiazepínicos reduzem a freqüência cardíaca e a pressão arterial. Os bloqueadores dos canais de cálcio apresentam efeito duplo: reduzem a pós-carga e promovem vasodilatação coronariana. Por sua vez, os bloqueadores α-adrenérgicos podem reverter a vasoconstrição, porém devem ser usados em conjunto com oxigênio, benzodiazepínicos e nitroglicerina. Vale ressaltar que a fentolamina pode causar hipotensão importante com taquicardia. O uso de fenotiazínicos e butirofenonas (haloperidol) pode trazer riscos e, portanto, estes devem ser evitados. Estão contraindicados os betabloqueadores na fase aguda. Essas drogas bloqueiam os receptores β-adrenérgicos, que mediam a vasodilatação. Ocorre, então, em decorrência da cocaína, apenas a ativação dos receptores α-adrenérgicos que são vasoconstritores. Sem oposição da vasodilatação, pode ocorrer uma crise hipertensiva.

5. O labetolol e, ainda assim, com muita cautela, pois, apesar de possuir ação mista, ainda predomina a sua ação bloqueadora dos receptores β-adrenérgicos, lembrando que ações betabloqueadoras em fase aguda são prejudiciais ao paciente.  Dessa forma, os fármacos mais indicados são os bloqueadores dos canais de cálcio (BCC).

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