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Caso Clínico do Mal de Pott

Caso Clínico do Mal de Pott

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Identificação do paciente

ASL, masculino, 42 anos.

Queixa principal

Dor lombar e fraqueza muscular há 2 anos.

História da doença Atual (HDA)

Paciente sem queixas anteriores relata que em Agosto de 2015 iniciou quadro de dor lombar, 6/10, tipo queimação, sem irradiações, conjuntamente com tosse seca, febre vespertina e dor torácica inespecífica. Refere perda ponderal significativa de aproximadamente 7 quilos. Em Maio de 2016, diz ter somado a esta conjuntura sintomas de fraqueza, rigidez e dor forte e contínua em membros inferiores, ficando incapaz de deambular.

IS: Relata constipação intestinal. Nega, no momento da entrevista, outros sintomas além dos descritos na HMA.

Exame físico

Geral – paciente restrito ao leito, LOTE, REG, eupneico, afebril ao toque, acianótico e pouco comunicativo.

Dados vitais – 97 bpm, rítmicos e cheios; 18 ipm; 36,8 ºC; 126 x 72 mmHg.

Pele – ausência de lesões.

 Sistema Respiratório – Conformação, expansibilidade, FTV e percussão dentro da normalidade. MVBD em ambos HT; ausência de RA.

Sistema cardiovascular – Ausência de estase de jugulares; TEC < 2s; precórdio calmo; não palpei íctus; BRNF em 2T. Não ausculto sopros ou desdobramentos.

Abdômen – plano; ausência de protusões ou circulação colateral; RHA +; som timpânico a percussão; hepatimetria normal e Traube livre; ausência de dor a palpação profunda; não palpo visceromegalias; sem sinais de irritação peritoneal.

Extremidades – Pulsos pediosos palpados e simétricos. Edema ++/4 em ambos os MMII até metade das pernas.

Sistema Nervoso:

NC: sem alterações.

Motricidade: hipotrofia dos mm. dos MMII. Força grau 1/5 e rigidez espástica em MMII. MMSS sem alterações.

Sensibilidade: sem alterações.

Reflexos: ROT 3/4 patelar e aquileu; 2/4 biccipital e tricipital. Cutâneo-plantar em extensão em ambos os pés (Sinal de Babinski).

Marcha: Não testada por limitação do paciente.

Coordenação: íntegra em MMSS. Não testada em MMII por limitação do paciente.

Exames complementares

Cultura do lavado brônquico: crescimento de Micobacterium tuberculosis.

RMN de coluna torácica: Formação expansiva entre os corpos vertebrais de T6 e T7, com fusão parcial destes e consequente redução da altura desses corpos vertebrais, assim como projeção do muro posterior para o canal vertebral, reduzindo amplitude do espaço subaracnoideano anterior e determinando compressão sobre o contorno anterior da medula. Realce heterogêneo de contraste entre esses níveis, com áreas de cistificação/necrose por baixo sinal em T1, assim como intenso comprometimento de partes moles paravertebrais e disco.

Formação expansiva comprometendo os corpos vertebrais de L2 e L3 com características similares aos descritos para T6 e T7. Área focal de alteração de sinal na medula em um plano que passa entre T5 e T6, caracterizado por hipersinal em T2, inferindo edema.

Legenda: 1) RMN de coluna torácica na ponderação T1 com contraste. 2) RMN do mesmo nível em ponderação T2.

Discussão do caso de Mal de Pott:

  1. Qual o diagnóstico provável para o caso?

Tuberculose vertebral (Doença de Pott ou Mal de Pott) é uma doença infecciosa causada pelo Mycobacterium tuberculosi, que acomete a coluna vertebral causando osteomielite e artrite. É a forma mais comum de tuberculose óssea. Evolui com progressiva destruição óssea, causando colapso vertebral e cifose acentuada, que se manifesta com dor e instabilidade. A invasão do canal medular causada pela destruição óssea e/ou formação de abcesso frio gera compressão mielorradicular, responsável pelos déficits neurológicos.

O quadro clínico varia de acordo com o local, estágio da doença e a presença de complicações, como abcessos. O sintoma mais comum e precoce é a dor, que tem evolução crônica. Sintomas neurológicos, como paraparesia progressiva e parestesias, indicam compressão mielorradicular. A deformidade cifótica ocorre pelo colapso das estruturas anteriores da coluna vertebral. Sintomas inespecíficos, como febre e perda de peso podem estar presentes.

O hemograma é usualmente normal, com velocidade de hemossedimentação (VSH) elevada, indicando inflamação tecidual importante. O teste tuberculínico (PPD) costuma ser positivo em pacientes infectados e não-imunossuprimidos. Exames radiológicos mostram deformidade óssea, diminuição do espaço intervertebral, deformidade cifótica e, frequentemente, abcessos frios nas adjacências. A Tomografia Computadorizada (TC) e a Ressonância Magnética (RNM) são exames de escolha, a RNM é particularmente útil por demostrar a extensão e invasão de tecidos moles em estruturas próximas, como a medula espinhal.

Pacientes com suspeita clínica, laboratorial e imaginológica de tuberculose vertebral devem ser submetidos a biópsia, sendo o material encaminhado para cultura, teste de reação em cadeia da polimerase (PCR) e baciloscopia (com coloração pelo método de Ziehl-Neelsen). A cultura e baciloscopia são frequentemente negativas, tornando o diagnóstico difícil.

  1. Quais importantes diagnósticos diferenciais?

O principal diagnóstico diferencial é o abcesso piogênico, que cursa de forma mais aguda, e é frequentemente acompanhado de sinais e sintomas de bacteremia. Deve-se considerar ainda: actinomicose, nocardiose, sífilis terciária, micoses sistêmicas, brucelose e neoplasias metastáticas.

  1. Qual o tratamento mais adequado para o paciente?

O tratamento se dá pela quimioterapia com drogas antituberculínicas (Isoniazida, Rifampicina, Pirazinamida e Etambutol), da mesma forma que a tuberculose pulmonar. A intervenção cirúrgica deve ser considerada, visando descompressão e artrodese (fusão de vértebras).

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