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Classificação de Bosniak | Colunistas

Classificação de Bosniak | Colunistas

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Criada por Bosniak, a classificação permitiu a padronização da descrição e conduta de lesões císticas renais. No entanto, se torna imprescindível a exclusão de outras etiologias possivelmente associadas, de origem infecciosa, inflamatória e/ou vascular.

Bosniak, quem?

Dr. Morton A. Bosniak (1929 – 2016), radiologista responsável pela criação da classificação, nasceu em 13 de novembro de 1929. Graduou-se pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts e recebeu seu diploma médico pela Universidade de Nova York – Downstate Centro Médico.

Bosniak foi responsável pela criação da primeira sociedade de imagem abdominal nos Estados Unidos. Atuou como presidente da Sociedade de Uroradiologia e recebeu diversos prêmios. Publicou (apenas, rs) 140 artigos originais e diversos capítulos de livros; servindo como mentor e modelo para diversos médicos.

Então, já deu pra entender a importância dele, não é mesmo?

Classificação de Bosniak

Histórico

Dentre os diversos artigos escritos por Bosniak, um deles foi escrito no final da década de 1980 e propusera a classificação das lesões renais de aspecto cístico, que seria baseada nas imagens adquiridas via tomografia computadorizada.

Inicialmente, a classificação foi associada à tomografia computadorizada, mas foi estabelecida a possibilidade de uso da ressonância magnética para avaliação e classificação das massas císticas ao longo dos anos.

A partir de 1990, Bosniak e colaboradores alteraram a classificação e introduziram uma quinta categoria (IIF – ‘F’ de follow up) justamente para contemplar aquelas lesões complexas em que se apresentava uma dificuldade de classificar como II ou III. 

Por que?

Alguns fatores que influenciaram a proposta de classificação foram a falta de padronização da caracterização das imagens e, consequentemente, das condutas. Nessa época, o uso de métodos de imagem estava avançando, principalmente na investigação de comorbidades de localização abdominal.

Concomitantemente, existiam as lesões mais complexas em sua conformação e, em consequência disso, na classificação. Nesse momento, se tornou crucial uma padronização na abordagem às massas renais císticas

Classificação

Ao longo dos tempos, foram realizados aprimoramentos na classificação de Bosniak, sendo a versão mais utilizada dividida em:

CATEGORIA I: lesão cística com margens finas com nítida separação do parênquima renal; parede lisa e fina; homogênea; ausência de septos, vegetações ou calcificações, e sem realce após administração de meio de contraste intravenoso;

CATEGORIA II: alguns septos finos; calcificações pequenas e finas ou ligeiramente espessadas na parede ou septo;

– Cistos hiperdensos até 3,0 cm com margens bem definidas e sem realce.

CATEGORIA IIF: lesões mais complexas que não se enquadram na categoria II ou III.

Presença de múltiplos septos; parede ou septo contendo calcificações; aspecto nodular ou irregular;

– Cistos hiperdensos: acima de 3,0 cm ou somente com 25% das paredes visíveis (exofítico);

– O realce pode estar ausente, duvidoso ou de aspecto capilar.

CATEGORIA III: parede espessada, irregularidade de septo e parede e/ou conteúdo não homogêneo; calcificações grosseiras, e realce nítido após contraste.

CATEGORIA IV: lesões com todos os achados da classe III apresentando componente sólido definido ou partes moles.

A partir da classificação, foi possível dar uma “cara” para as lesões e, desde então, as lesões císticas foram especificadas da seguinte forma:

  • BOSNIAK I e II: claramente benigna/I: simples; II: minimamente complicada;
  • BOSNIAK IIF: provavelmente benigna/minimamente complicada que requer seguimento;
  • BOSNIAK III: indeterminada;
  • BOSNIAK IV: claramente maligna.

Consequentemente, a partir da especificação das lesões, foi dada a possibilidade de uma padronização a respeito da conduta médica.

  • Bosniak I e II, por serem consideradas claramente benignas, está indicado acompanhamento com seguimento clínico. Bem como as lesões classificadas como IIF.

Porém, é importante ratificar que há relatos na literatura de achados de malignidade no anatomopatológico de lesões classificadas como II, situação associada a uma descrição inadequada de achados no exame de imagem.

  • Nas classificações Bosniak IIF, por serem mais complexas que I e II, há a necessidade de seguimento clínico mais específico. Por não haver uma recomendação oficial, é indicado controle anual por no mínimo 5 anos após seguimento de 6 meses do exame inicial. Porém, em algumas literaturas, é indicado seguimento de 3, 6 e 12 meses após exame inicial associado a rotina anual.

A partir do momento em que foi adicionada a categoria IIF, boa parte das lesões císticas que eram classificadas como III (indeterminadas), passaram a ser categoria II (claramente benignas); dessa forma, houve a possibilidade de seguimento clínico da lesão sem ter, necessariamente, intervenção cirúrgica.

Apesar de reduzir a abordagem cirúrgica de lesões benignas, foi observado que existe uma gama de possíveis características das lesões císticas englobadas nesta categoria. Ou seja, podem ter várias “faces”. Dessa forma, existe uma dificuldade em estabelecer uma classificação e seguimento precisos; portanto, abre-se brechas para condutas não padronizadas.

  • Para Bosniak III está indicada intervenção cirúrgica devido à prevalência de malignidade de 31-100%, a menos que alguma comorbidade a contraindique. Porém existe a possibilidade de seguimento clínico, de acordo com a preferência e experiência do médico, comorbidades associadas, bem como uma expectativa de vida limitada e características da lesão.
  • Para Bosniak IV está indicada intervenção cirúrgica devido à prevalência de 95 – 100% de malignidade.

Bônus: Update 2019

Em 2019, um grupo de radiologistas dos Estados Unidos propôs uma atualização da classificação cujo objetivo é melhorar a predição da classificação em relação à probabilidade de malignidade de uma lesão renal cística.

Os principais objetivos são: 

  • Redução da variabilidade do operador; 
  • Melhoria na precisão das taxas de malignidade reportadas, de acordo com as categorias da classificação de Bosniak;
  • Demonstração de dados indicativos de sobrediagnóstico e tratamento desnecessário;
  • Redução do número de lesões que passam por intervenções desnecessárias com aumento de especificidade; 
  • Limitação da morbidade associada à redução da função renal e à intervenção médica, bem como custo médico.

Além dos motivos supracitados, o update 2019 cita um suposto manejo “agressivo” acerca das lesões císticas, que contribuem para a ressecção de lesões benignas, as quais, em sua maioria, não evoluem para malignidade, e de massas indolentes, que apresentam um bom prognóstico.

Apesar de necessitar de uma validação, a versão 2019 da Classificação de Bosniak incorpora a ressonância magnética, inclui definições específicas com uma maior proporção de massas renais e proporciona um reposicionamento mais adequado de lesões císticas dentre as categorias.

Conclusão

A classificação de Bosniak é amplamente utilizada pelos radiologistas e urologistas. E esse avanço se deu por mérito de Dr. Bosniak, que mudou a prática médica e se tornou o pioneiro na avaliação de massas renais.

Importante salientar a necessidade de incorporar de forma oficial o uso da classificação na ultrassonografia. Apesar de ser uma ferramenta importante para a detecção de lesões renais iniciais e que fornece a possibilidade de diferenciação entre nódulo e cisto, há, ainda, dificuldade na precisão diagnóstica devido à necessidade de utilização de contraste intravenoso.

É evidente o quão imprescindível se tornou a classificação, tanto na prática médica quanto na qualidade de vida dos pacientes, ao possibilitar a categorização, contribuindo para estudos das massas renais e correlacionar prevalência de malignidade.

Dessa forma, dá-se a oportunidade de tornar as condutas mais direcionadas e específicas de acordo com cada paciente. E uma das formas de aprimorar a precisão diagnóstica é atualizar parâmetros, constantemente, de forma que possam contribuir para uma melhor assistência médica. E, principalmente, evidenciar a prevenção quaternária, visando evitar danos ao paciente com intervenções médicas desnecessárias.

O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: esse material foi produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido.


Referências:

Christiana Maia Nobre Rocha de Miranda; Carol Pontes de Miranda Maranhão; Carla Jotta Justo dos Santos. Classificação de Bosniak das lesões císticas renais segundo achados na tomografia computadorizada multidetectores. Radiol Bras. 2014 Mar/Abr;47(2):115–121. Disponível em (rb.org.br).

Valdair F. Muglia1, Antonio Carlos Westphalen2. Classificação de Bosniak para cistos renais complexos: histórico e análise crítica. Radiol Bras. 2014 Nov/Dez;47(6):368–373. Disponivel em rb2014v47n6p368-373.p65 (scielo.br).

Stuart G. Silverman, MD, Ivan Pedrosa, MD, PhD, James H. Ellis, MD. Bosniak Classification of Cystic Renal Masses, Version 2019: An Update Proposal and Needs Assessment. Radiology: Volume 292: Number 2—August 2019. Disponivel em https://doi.org/10.1148/radiol.2019182646.

Comunication – In memoriam. Radiology: Volume 282: Number 2—February 2017. Disponível em radiol.2016164037 (rsna.org).