Carreira em Medicina

Conduta de emergência em sangramentos por uso de anticoagulantes | Colunistas

Conduta de emergência em sangramentos por uso de anticoagulantes | Colunistas

Compartilhar
Imagem de perfil de Carreira Médica

A morte por hemorragia é um problema tão importante que, na última edição do PHTLS (Pre-Hospital Trauma Life Support), houve alteração da sequência clássica ABCDE para XABCDE, dando prioridade à interrupção de sangramentos exsanguinantes antes mesmo da abordagem da via aérea do paciente. E isso é uma mudança fantástica, visto que as mortes evitáveis por hemorragia ainda matam muito mais do que podemos aceitar.

Nos pacientes vítimas de trauma, esse conceito está estabelecido. Mas não são apenas as vítimas de trauma que são atendidas por hemorragias importantes.

Nesse texto, abordaremos uma causa não tão frequente, mas muito importante na emergência: sangramento causado por anticoagulantes.

A anticoagulação é a estratégia terapêutica que visa inibir a formação de trombos pelo processo de coagulação sanguínea anormal.

Abaixo, abordaremos as condutas de forma simplificada em situações de sangramento por cada uma das classes.

Heparina de Baixo Peso Molecular (HBPM):

A reversão do efeito das HBPMs pode ser feita pela protamina, sendo que todo o efeito anti-IIa (antitrombina) é neutralizado, mas apenas 60% do efeito antiXa.

Isso se deve à cadeia mais curta da HBPM. A dose de protamina depende do tempo decorrido da última aplicação da HBPM. Confira a relação tempo/dose da última aplicação:

  • Tempo da última aplicação < 8 h: 1 mg de protamina/1 mg de enoxaparina.
  • Tempo da última aplicação 8-12 h: 0,5 mg de protamina/1 mg de enoxaparina.
  • Tempo da última aplicação > 12 h: o uso de protamina não está indicado.

Heparina Não Fracionada (HNF):

Em pacientes com TEV recente e sangramento importante induzido por heparina, deve-se considerar interrupção da anticoagulação e inserção de um filtro de veia cava inferior.

Em sangramentos vultuosos, a pronta reversão do efeito da heparina pode ser necessária pelo sulfato de protamina.

Para estimar a dose de heparina (e assim podermos determinar quanto de protamina utilizaremos), devemos lembrar que a meia vida da heparina administrada por via intravascular é de 30-60 min. Após esse período, considerar o número de unidades de heparina como metade da administrada inicialmente.

Na infusão contínua de HNF, a dose de protamina recomendada deve ser calculada baseada na dose anterior de HNF realizada há 2-3 horas. Nos casos de sangramento grave associado à HNF administrada por via subcutânea e insensível à dose de 1 mg de protramina para 100 U de HNF, recomenda-se a infusão contínua de protamina, sendo a dose orientada pelo PTTa.

*Ponto importante sobre a protamina: Deve-se observar com cuidado sua velocidade de infusão, que deve ser lenta (máximo 20 mg/min e 20 mg/10min).

Fondaparinux

As moléculas muito pequenas de fondaparinux não se ligam à protamina, sendo esta contraindicada para reversão da anticoagulação. Atualmente, não há antídoto eficaz para o fondaparinux e, apesar de ter sido proposto o uso de fator VIIa (90 mcg/kg) para controle de hemorragias graves, não há evidências que suportem seu uso.

Antagonistas da Vitamina K

Para pacientes com quadro de sangramento, a vitamina K1 é o tratamento de escolha, sendo indicado o uso de 5-10 mg IV. O uso de plasma fresco congelado (PFC) também pode ser usado na dose de 10-20 mL/kg.

No entanto, atualmente recomenda-se a reversão a partir do complexo protrombínico (CPP), pela correção do INR mais rápida (não há necessidade de tipagem sanguínea, aquecimento e transporte de sangue, além do CPP apresentar um volume menor de infusão).

A dose do CPP pode ser guiada de acordo com o INR:

  • INR: 1,5-3,9: 25 UI/kg;
  • INR: 4,0-6,0: 35 UI/kg;
  • INR > 6,0: 50 UI/kg.

Novos Anticoagulantes Orais (NOACs)

Inibidores diretos do fator Xa (rivaroxaban e apixaban):

Foi aprovado pelo FDA o uso da Andexetina alfa como reversor em casos de sangramento por inibidores diretos do fator Xa. Até o momento, a droga não está disponível no Brasil. Em casos de suspeita de intoxicação pela droga, o uso de carvão ativado até 1-2 horas após a ingestão da mesma pode ser útil.

Por apresentar alta ligação proteica, rivaroxaban não pode ser removido de modo efetivo por meio de hemodiálise. Para reversão de urgência do rivaroxaban, é usado o CPP na dose de 50 U/kg (dose máxima de 5.000 U). Em caso de sangramento muito importante, avaliar o uso de fator VIIa recombinante 90 mcg/kg.

Inibidor direto da trombina (dabigatran)

Ao contrário dos NACOs, que possuem alta ligação proteica, o dabigratan tem baixa ligação, permitindo sua eliminação através de hemodiálise.

Possui como antídoto o Idaracizumabe (já disponível no Brasil). A dose recomendada é de 5 g. A dose completa deve ser administrada por via intravenosa, com duas infusões consecutivas durante 5 a 10 minutos cada ou como uma injeção em bolus.

Gostou desse texto e quer ter todas condutas e prescrições para pacientes em emergência na sua mão? Conheça o Yellowbook – Fluxos e Condutas: Emergência 

Ele vem em duas versões, o livro físico e o aplicativo que você pode acessar a qualquer hora e em qualquer lugar, trazendo acesso rápido às informações necessárias na rotina médica, oferecendo a você segurança na tomada de decisão diante das emergências médicas.


O Yellowbook é um guia de conduta médica para casos de emergência, abordando os principais temas, procedimentos e prescrições do dia-a-dia numa emergência.
Ao contrário de outros guias superficiais, ele se destaca pela abordagem mais aprofundada e objetiva, dando mais eficácia e praticidade à atuação médica emergencial

Conclusão

A conduta de pacientes que apresentam sangramento causado por medicações anticoagulantes pode ser bastante desafiadora, principalmente pela ainda pouca disponibilidade de drogas de custo mais elevado no país.

Não hesite em procurar colegas e especialistas para tirar dúvidas e buscar junto aos representantes das suas instituições de trabalho a aquisição de medicamentos importantes na conduta de pacientes graves.

Autor: Eugênio Franco | Médico Emergencista

Preceptor das Residências em Medicina de Emergência da Escola de Saúde Pública do Ceará e do Instituto Dr. José Frota

Autor do perfil no instagram @dosesdeemergencia e canal no youtube doses de emergência

Email para contato: eugeniofranco@emergencistas.med.br


Gostou do artigo? Quer ter o seu artigo no Sanarmed também? Conheça o programa de Colunistas da Sanar!