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COVID-19: desafios para a realização de testagem em massa com o uso de testes rápidos | Colunistas

COVID-19: desafios para a realização de testagem em massa com o uso de testes rápidos | Colunistas

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Em dezembro de 2019, uma série de casos de uma pneumonia com causa até então desconhecida foram relatadas na cidade chinesa de Wuhan. Mais tarde, esse quadro clínico seria denominado de COVID-19 (doença do coronavírus, do inglês coronavirus disease). A infecção é causada pelo SARS-CoV-2, vírus pertencente à família Coronaviridae, que é responsável por um amplo espectro de doenças do trato respiratório em animais e no homem.

A partir dos primeiros casos relatados na China, o número de pessoas acometidas aumentou exponencialmente, desencadeando grandes repercussões para o cenário mundial. No Brasil, até o dia 8 de novembro de 2020, já se acumulam 5.653.648 casos da doença e 161.106 óbitos registrados.

Diante do crescente número de casos, juntamente com a inexistência de uma vacina para imunização duradoura, a realização de testagem em massa na população se mostra uma alternativa promissora para conter os índices de contágios e mortes, visto que permite um melhor manejo de pacientes doentes, diminuição das subnotificações e adequação do planejamento sanitário para as realidades locais.

A utilização do teste rápido (imunocromatografia) é o principal método discutido para esse propósito, devido ao seu tempo de duração, praticidade e custo. Todavia, sua expansão para testagem em massa ainda sofre empecilhos, os quais serão discutidos nesse artigo.

1. O método de imunocromatografia – teste rápido

Até o momento, o diagnóstico de COVID-19 pode ser realizado por meio de dois métodos: testes moleculares (RT-PCR), que buscam detectar a presença de material genético vírus no organismo, e testes imunológicos (imunocromatografia, ELISA e quimiluminescência), que avaliam a presença anticorpos IgM (infecção vigente) e IgG (infecção pregressa).

A realização da imunocromatografia inicia com a retirada de uma gota de sangue do paciente e sua colocação em um cassete de plástico. Após isso, a amostra será misturada com o reagente, devendo haver reação para dar o diagnóstico. O teste é indicado a partir do 7º dia após o surgimento dos sintomas da doença e o resultado é obtido em torno de 10 a 30 minutos.

2. Os entraves para a expansão do uso de testes rápidos

O principal aspecto debatido sobre o uso do teste rápido tange sobre sua reduzida sensibilidade – chance de o indivíduo doente ter seu resultado alterado – e especificidade – chance de o indivíduo normal ter seu resultado normal. Para o anticorpo IgM (indicador de doença vigente), estima-se que a sensibilidade e especificidade sejam, respectivamente, 85% e 94%; comparado ao teste RT-PCR, que possui sensibilidade e especificidade diagnósticas superiores à 95%, observa-se uma precisão menor, principalmente com relação à sensibilidade.

Os principais problemas que podem surgir após a realização da testagem em massa sob essas circunstâncias incluem:

  • Grande incidência de falsos-positivos (indivíduos saudáveis com resultados alterados) e de falsos-negativos (indivíduos doentes com resultados normais);
  • Amedrontamento de indivíduos saudáveis falso-positivos;
  • Aumento da curva do número de casos confirmados da doença devido à disseminação do vírus por parte de indivíduos falso-negativos.

Por isso, questiona-se sobre o investimento para a produção e distribuição dos testes rápidos, que, apesar de apresentarem menor custo, podem acarretar em um ônus considerável à saúde pública e aos cofres públicos.

Somado a isso, destaca-se que ainda enfrentamos um cenário muito complexo, no qual desconhecemos ainda alguns aspectos da resposta imunológica destinada ao combate do SARS-CoV-2, o que dificulta a aplicação de testes rápidos mais precisos para a detecção de indivíduos infectados e, consequentemente, o melhor controle epidemiológico da doença. Vale destacar que, até então, recomenda-se a realização do teste rápido a partir do 7º dia após o aparecimento de sintomas característicos de COVID-19, pois esse é o intervalo médio que se deve aguardar para constatar o aparecimento de anticorpos.

Devemos considerar também nessa discussão a necessidade global para obtenção de insumos destinados à produção dos testes diagnósticos. Em meio ao cenário pandêmico instaurado, nem todos os países possuem condições de investir na obtenção desses materiais e muitos acabam dependendo majoritariamente da importação para possibilitar a distribuição desses testes, devido à ausência de fabricantes em território nacional.

Ademais, apesar de a realização dos testes rápidos ser simples, é de suma importância que um profissional de saúde qualificado se encarregue de realizá-los e interpretá-los corretamente para informar o paciente. Logo, para a adoção de uma estratégia de testagem em massa, deve-se levar em consideração também a demanda de profissionais.

3. Conclusão

A realização de testagem em massa com o uso de testes rápidos para COVID-19 ainda é bastante discutida quanto a sua rentabilidade e capacidade para frear a disseminação da doença. Sua validação pode ser reforçada através de estudos que avaliem a dinâmica dos cenários epidemiológicos configurados em localidades que adotaram a testagem em massa.

Concomitante a isso, é imprescindível manter a continuidade dos estudos que buscam desenvolver testes mais precisos e com melhor custo-benefício, objetivando favorecer as estratégias de controle da disseminação da COVID-19.

Até que se decida qual a melhor forma limitar a expansão da doença, deve-se preconizar a adoção de medidas preventivas e o isolamento social de indivíduos doentes.

Autor: Danilo José Silva Moreira

Instagram: @dani_m.96

Referências:

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