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Covid-19 e complicações na gravidez | Colunistas

Covid-19 e complicações na gravidez | Colunistas

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Os primeiros casos da doença COVID-19 foram documentados na China em 2019, desde então informações sobre a doença e como o vírus se comporta no corpo humano mudam constantemente. Devido a todas as incertezas sobre o curso da doença, se tornou uma pauta ainda mais visível quando se trata na infecção de gestantes pelo vírus.

Gestação e covid-19

Segundo um artigo publicado em janeiro de 2022 no UpToDate, ainda há muito o que investigar em relação aos verdadeiros riscos que as gestantes e seus bebês correm com a presença do vírus. Porém, por hora, o que se sabe é que essa população não corre maior risco de ser infectada em relação às demais pessoas.

Em relação a gravidade da infecção, ao fazer uma comparação entre mulheres da mesma idade, porém não gestantes, as gestantes apresentaram mais chances de desenvolver uma infecção mais agravada do que as não gestantes.

O quadro clínico é o mesmo nas mulheres gestantes e não gestantes, podendo ser assintomáticas ou sintomáticas, com chances de desenvolver quadros muito graves e potencialmente fatais. É de suma importância a detecção precoce dos sintomas, quando presentes, pois possibilita o início de medidas adequadas, como por exemplo, tratamento de suporte adequado, encaminhamento e admissão rápidos em hospitais, e monitorização da saúde materno-fetal. Na tabela publicada no “Manual de Recomendações para a Assistência à Gestante e Puérpera frente à Pandemia de Covid-19 ́ ́ é possível identificar critérios de gravidade nessa população.

Tabela

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Além da determinação da gravidade do estado da gestante, é extremamente importante a utilização do Escore de Alerta Precoce pelos profissionais da saúde apresentado no Quadro 2, a fim de ter mais um instrumento para apoiar as decisões que serão feitas em cada caso. Nesse escore, as gestantes que apresentarem dois ou mais sinais de alerta amarelo, ou mesmo um ou mais sinais de alerta velho, e as gestantes com síndrome respiratória aguda grave, correm um risco aumentado de ter uma evolução desfavorável, logo necessitam de um cuidado diferenciado.

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Fonte: Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Primária à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Manual de recomendações para a assistência à gestante e puérpera frente à pandemia de Covid-19 [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção Primária à Saúde, Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2021.

A literatura tem demonstrado desfecho materno e neonatal desfavorável na presença da covid-19 moderada e grave. As gestantes infectadas por SARS-CoV-2 têm maior chance de hospitalização, admissão em unidade de terapia intensiva e ventilação mecânica (ELLINGTON et al., 2020). Apesar de a maior parte das pessoas se recuperarem sem necessitar de hospitalização, a deterioração clínica rápida pode acontecer, e gestantes sintomáticas parecem ter mais risco de doença severa e morte quando comparadas a não gestantes. Os principais fatores de risco na gestação são idade maior que 35 anos, obesidade e doenças pré-existentes, particularmente a hipertensão e o diabetes (KARIMI et al., 2021).

Publicação recente mostrou que a infecção por covid-19 está associada ao desfecho materno adverso, principalmente hipertensão gestacional, eclâmpsia ou pré-eclâmpsia, uso de antibioticoterapia e admissão em UTI neonatal, o que aumenta consideravelmente o risco de óbito nessas mulheres (HEALY, 2021). É maior a probabilidade de anestesia geral com intubação orotraqueal, seja pelo comprometimento respiratório materno, seja pela indicação de parto de emergência (KNIGHT et al., 2020).

Há poucos dados sobre a infecção por SARS-CoV-2 no primeiro trimestre gestacional. A hipertermia, que é frequente, pode alterar a organogênese e aumentar o risco de anomalias congênitas, porém, até o momento, não se observou aumento na frequência dessas alterações ou de abortamento espontâneo (JUAN et al., 2020; YAN et al., 2020).

Quanto às repercussões da covid-19 para o feto, o aumento da prematuridade é o principal desfecho (KNIGHT et al., 2020; PIERCE-WILLIAMS et al., 2020). De modo geral, 83% dos partos prematuros são por indicação médica (HEALY, 2021), seja por piora do estado materno ou por outras indicações, como pré-eclâmpsia, sofrimento fetal e restrição de crescimento, uma vez que a hipoxemia pode levar ao comprometimento da oxigenação e do bem-estar fetal. A ocorrência de restrição de crescimento fetal é reportada entre 7% e 10% (DASHRAATH et al., 2020; ELSHAFEEY et al., 2020). Há relatos de óbito fetal nas séries descritas na literatura, porém sem comprovação precisa de associação do óbito com a infecção (ELSHAFEEY et al., 2020). O risco de morbimortalidade perinatal é cerca de duas vezes maior nos recém-nascidos de mães infectadas (HEALY, 2021). Ainda assim, a maioria dos recém-nascidos de mães infectadas é assintomática (ZENG et al., 2020).

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Fonte: Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Primária à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Manual de recomendações para a assistência à gestante e puérpera frente à pandemia de Covid-19 [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção Primária à Saúde, Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2021.

Em relação à transmissibilidade do vírus, a transmissão vertical pode ocorrer por via transplacentária, durante o parto e durante a amamentação. A capacidade de transmissão do SARS-CoV-2 pelo sangue ainda não foi muito bem definida pelos especialistas. “Já foi demonstrada a presença de receptor ACE-2 no trofoblasto e já foi divulgada foto por microscopia eletrônica´´ (WIERSINGA et al., 2020).

Estudo recente demonstrou 13% de positividade em neonatos de gestantes positivas no momento do parto (VILLAR et al., 2021), enquanto a amamentação não se associou a aumento de risco de positividade na testagem neonatal (VILLAR et al., 2021). As evidências disponíveis mostram que a transmissão vertical existe, mas é pouco frequente, e não é afetada pela via de parto, clampeamento tardio do cordão umbilical ou contato pele a pele, amamentação ou alojamento conjunto – desde que as medidas de precaução sejam mantidas (ROYAL COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNAECOLOGISTS, 2021). 

Fragmentos de RNA viral foram encontradas em amostras de leite materno de mulheres com a COVID-19, esse fato fez com que o aleitamento materno fosse muito discutido. Entretanto, na etapa de isolamento do vírus no leite na pesquisa, não foi possível encontrar vírus possíveis para replicação e causar infecção. Sendo assim, a organização mundial de saúde declara que os benefícios do aleitamento são superiores ao baixo risco de transmissão vertical do vírus.

Referências

ELLINGTON, S. et al. Characteristics of Women of Reproductive Age with Laboratory-Confirmed SARS-CoV-2 Infection by Pregnancy Status – United States, January 22-June 7, 2020. MMWR Morbidity and Mortality Weekly Report, Atlanta, v. 69, n. 25, p. 769-775, June 2020.

KARIMI, L. et al. Effect of Covid-19 on Mortality of Pregnant and Postpartum Women: A Systematic Review and Meta-Analysis. Journal of Pregnancy, Cairo, v. 2021, p. 8870129, Mar. 2021.

HEALY, C. M. Covid-19 in Pregnant Women and Their Newborn Infants. JAMA Pediatrics, Chicago, v. 175, n. 8, p. 781-783, Apr. 2021

KNIGHT, M. et al. Characteristics and outcomes of pregnant women admitted to hospital with confirmed SARS-CoV-2 infection in UK: National population based cohort study. BMJ, [s. l.], v. 369, p. m2017, 2020.

JUAN, J. et al. Effect of coronavirus disease 2019 (covid-19) on maternal, perinatal and neonatal outcome: systematic review. Ultrasound in Obstetrics & Gynecology, England, v. 56, n. 1, p. 15-27, July 2020.

PIERCE-WILLIAMS, R. A. M. et al. Clinical course of severe and critical coronavirus disease 2019 in hospitalized pregnancies: a United States cohort study. American Journal of Obstetrics & Ggynecology MFM, United States, v. 2, n. 3, p. 100134, Aug. 2020.

DASHRAATH, P. et al. Coronavirus disease 2019 (covid-19) pandemic and pregnancy. American Journal of Obstetrics and Gynecology, New York, v. 222, n. 6, p. 521-531, June 2020.

ELSHAFEEY, F. et al. A systematic scoping review of covid-19 during pregnancy and childbirth. International Journal of Gynaecology and Obstetrics, Malden, MA, v. 150, n. 1, p. 47-52, July 2020. EUROPEAN MEDICINES AGENCIES. Covid-19 Vaccine AstraZ

ZENG, L. et al. Neonatal Early-Onset Infection with SARS-CoV-2 in 33 Neonates Born to Mothers with covid-19 in Wuhan, China. JAMA Pediatrics, Chicago, v. 174, n. 7, p. 722-725, 2020.

WIERSINGA, W. J. et al. Pathophysiology, Transmission, Diagnosis, and Treatment of Coronavirus Disease 2019 (covid-19): A Review. JAMA, Chicago, v. 324, n. 8, p. 782-793, Aug. 2020.

VILLAR, J. et al. Maternal and Neonatal Morbidity and Mortality among Pregnant Women with and without covid-19 Infection: The INTERcovid Multinational Cohort Study. JAMA Pediatrics, Chicago, v. 175, n. 8, p. 817-826, Apr. 2021.

ROYAL COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNAECOLOGISTS. Coronavirus (covid19) Infection in Pregnancy: Information for healthcare professionals. London: Royal College of Obstetricians and Gynaecologists, 2021.

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Primária à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Manual de recomendações para a assistência à gestante e puérpera frente à pandemia de Covid-19 [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção Primária à Saúde, Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. 2. ed. Brasília : Ministério da Saúde, 2021.


Educação ao paciente: a COVID-19 e a gravidez (O essencial). UpToDate. https://www.uptodate.com/contents/a-covid-19-e-a-gravidez-o-essencial#:~:text=Pessoas%20gr%C3%A1vidas%20que%20pegam%20a,muito%20doentes%20e%20t%C3%AAm%20pneumonia.

Autora: Camila Figueira

Instagram: @camiifigueira

O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: esse material foi produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido.