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Diretriz: Transtorno Obsessivo Compulsivo –Diagnóstico – AMB | Ligas

Diretriz: Transtorno Obsessivo Compulsivo –Diagnóstico – AMB | Ligas

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O transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) tem um quadro clínico muito marcante, cuja descrição é praticamente universal em estudos trans-históricos e transculturais. Entretanto, diferentemente do que possa parecer à primeira vista, o diagnóstico pode ser bastante difícil, em função de algumas das características clínicas deste transtorno.

É importante destacar que muitas vezes o TOC é um quadro secreto, pois os portadores costumam ter noção do exagero ou da irracionalidade de seus sintomas e procuram ocultá-los das outras pessoas, por vergonha ou medo de serem discriminados. É também um transtorno extremamente heterogêneo em suas manifestações clínicas, com um grande número de possibilidades de apresentações fenomenológicas.

Possíveis subtipos mais homogêneos de pacientes com TOC vêm sendo propostos (por exemplo, início precoce versus início tardio, com ou sem transtorno de tiques associado, com ou sem prejuízo da crítica, etc). Dessa forma, as Diretrizes contribuem para uma terapêutica e análise mais coesas, para o desenvolvimento de estratégias mais eficazes. O que implica positivamente no prognostico do transtorno.

Epidemiologia/Etiologia

Segundo a Organização Mundial da Saúde, o TOC é o quarto transtorno psiquiátrico mais comum, precedido apenas pela depressão, fobia social e abuso de substâncias. Sob o prisma da epidemiologia é possível identificar através de estudos uma taxa de prevalência do Transtorno Obsessivo Compulsivo na população geral brasileira em torno de 1% no ano e 2% ao longo da vida.

Em relação à distribuição por gênero é possível observar uma variação conforme as distintas faixas etárias, apresentando um perfil bimodal. Existe um predomínio do sexo masculino durante a infância, devido a um padrão sintomatológico mais precoce. Durante a fase da adolescência, essa prevalência é observada no sexo feminino em meninas, até chegar a uma equivalência através de uma proporção de 1:1 durante a fase adulta.

É necessário salientar que o transtorno obsessivo compulsivo, na maioria das vezes, apresenta uma manifestação sintomatológica precoce, principalmente no sexo masculino,

de forma que com 85% dos casos de TOC começam antes dos 35 anos de idade. Dessa maneira, foi possível observar um pico na taxa de incidência durante o período que compreende ao início da adolescência, assim como na fase entre 20 e 22 anos de idade.

Analisando através ótica etiológica do transtorno, é observado uma frequência entre os indivíduos desempregados ou inativos profissionalmente e também entre indivíduos separados, divorciados ou viúvo, o TOC se apresenta etiologicamente com uma forte característica familial, vários estudos têm demostrado que as chances de apresentar o transtorno são aproximadamente quatro vezes maiores em familiares de pacientes com TOC do que em familiares de controles.

É preciso salientar que alguns fatores ambientais que têm sido apresentados como possivelmente relevantes na etiologia do transtorno, tais como: gravidez, puerpério e após abortamento; uso de substâncias psicoativas infecção estreptocócica/febre reumática e por fim eventos de vida indesejáveis ou traumáticos.

Fisiopatologia

Apresentação sintomalógica do Transtorno obsessivo compulsivo https://www.psicologia.pt/artigos/textos/A0606.pdf

No que tange a fisiopatologia do Transtorno obsessivo compulsivo podemos destacar a relação da mesma com os gânglios da base, além de estruturas de localização subcortical profunda, como por exemplo: corpo estriado (núcleo caudado e putâmen), globo pálido, substância negra e núcleo subtalâmico. Logo, foi possível observar através de estudos de neuroimagem alterações morfológicas e funcionais nos núcleos caudados, o que sugere uma forte ligação entre a manifestação do transtorno e funcionalidade dos mesmos.

É possível que a fisiopatologia do TOC tenha uma forte correlação com o mau funcionamento do núcleo caudado, o que o levaria a filtrar as preocupações, dando origem então as obsessões, originadas no córtex órbito-frontal. Com isso, a dificuldade na inibição destes pensamentos pelo caudado teria um papel importante para ressaltar a preocupação indevida, provocando assim uma necessidade do córtex órbito-frontal desencadear uma ação adaptativa, que seriam as compulsões. Além disso, existem evidências concisas que apontam para anormalidades na neuroquímica cerebral, como mecanismo fisiopatológico do TOC, mais precisamente a função serotonérgica.

Abordagem inicial

A fim de obter uma abordagem mais consistente, é interessante que o clínico abra mão da abordagem categorial dos sintomas obsessivo-compulsivos (SOC), em função de uma abordagem dimensional do TOC, pois a última propicia uma melhor compreensão da heterogeneidade do transtorno, desta forma, facilitando a visualização de um diagnostico mais coeso, uma vez que alguns sintomas tendem a co-ocorrer, tanto em adultos quanto em crianças.

Dentre as “dimensões” de sintomas, podemos destacar: obsessões agressivas/sexuais/ religiosas e compulsões relacionadas; obsessões de simetria/ordenação e compulsões relacionadas; obsessões de contaminação e compulsões relacionadas, como de limpeza ou lavagem, e obsessões e compulsões de colecionamento.

Diferentes fatores podem estar envolvidos em cada uma dessas condições, o que facilita a individualização de suas etiologias, sintomas, provocando diversas implicações prognósticas e terapêuticas. Exemplificando essas situações, alguns estudos revelaram que familiares de primeiro grau de pacientes com altos escores na dimensão “simetria/ordenação” apresentavam taxas significativamente aumentadas de TOC clínico ou subclínico, quando comparados aos familiares de pacientes de referência em estudos genético/familiares com baixos escores nessa dimensão.

Tendo em vista a grande variedade de apresentações clínicas do TOC, é importante que o clínico reconheça os subgrupos mais homogêneos de pacientes não apenas para critérios etiológicos, mas também para desenvolver estratégias terapêuticas mais eficazes, além de distinguir populações com melhor e pior resposta ao tratamento baseado em seu subgrupo. Dentre os subgrupos podemos ressaltar: TOC com início precoce ou tardio dos sintomas, TOC associado ou não a transtornos de tiques e fenômenos sensoriais, com ou sem antecedentes de infecção estreptocócica, com determinadas comorbidades psiquiátricas.

Diagnóstico do Transtorno obsessivo compulsivo

Segundo o DSM-V, para que seja diagnosticado como um quadro de Transtorno obsessivo compulsivo é necessário que o paciente apresente obsessões e compulsões que tomem tempo significativo (p. ex., mais de uma hora por dia) ou causem sofrimento ou prejuízo clinicamente importante para vida do portador. Ademais, é preciso que o conteúdo dos sintomas não se limite a determinados temas específicos de outros transtornos psiquiátricos, como: preocupação com doença da hipocondria, peso corporal da anorexia nervosa, ou preocupação excessiva com um defeito físico mínimo ou imaginado do transtorno dismórfico.

Classificação quanto à gravidade

Ante a heterogeneidade do Transtorno obsessivo compulsivo é importante classificar o mesmo em categorias, como o TOC de início precoce e TOC de início tardio. Em relação à gravidade e sintomatologia, é possível observar algumas características diferenciam o TOC de início mais precoce, entre elas: o fato de apresentar maior frequência do sexo masculino, maior frequência de fenômenos sensoriais, maior proporção de obsessões somáticas, com simetria e medos supersticiosos, maior proporção de compulsões de limpeza, contagem, tocar /esfregar e maior chance de co-ocorrência dos seguintes transtornos: ansiedade de separação, fobia social, transtorno dismórfico corporal e transtorno de tiques.

É possível fazer outro recorte frente a diversidade do transtorno, desta forma, podemos separar o TOC associado a tiques crônicos do TOC sem tiques, é importante considerar que o TOC associado a transtornos de tiques, em geral, tem diferenças clínicas significativas, como: um início mais precoce dos sintomas e uma maior frequência no sexo masculinos, além de apresentar sintomas com um perfil diferenciado, incluindo uma maior presença de “fenômenos sensoriais”, que se tratam de sensações e/ou percepções físicas e/ou mentais que causam incômodo, desconforto ou mal-estar ao paciente, além disso o TOC associado a tiques crônicos apresenta uma maior co-ocorrência de determinados transtornos mentais, o que traz um caráter de maior gravidade ao mesmo.

Tratamento do Transtorno obsessivo compulsivo

Segundo a diretriz de tratamento, é recomendado a utilização de abordagens psicoeducativas, visando tanto os pacientes com TOC quanto seus familiares, uma vez que as principais manifestações clínicas e formas de tratamento do TOC são exponencialmente desconhecidas na população em geral e isso pode ajudar na resposta terapêutica.

É recomendada a exposição sistemática e repetida aos estímulos temidos, associado à prevenção dos rituais compulsivos, terapia comportamental de EPR, de preferência à abordagem cognitiva, no tratamento psicoterápico da sintomatologia do TOC, de preferência à abordagem cognitiva, que consiste na modificação das crenças errôneas subjacentes aos sintomas manifestos.

Para os tratamentos farmacológicos do TOC a primeira escolha são os inibidores de recaptação de serotonina (IRS), classe de medicamentos antidepressivos que inclui os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), como fluoxetina, sertralina, fluvoxamina, paroxetina, citalopram ou escitalopram e os não seletivos, como clomipramina (tricíclico).

A escolha deve se pautar no perfil de efeitos colaterais de cada medicamento, e as doses médias necessárias, em geral, são mais altas do que as recomendadas para os transtornos depressivos; a venlafaxina (NASA) é uma alternativa de associação nos casos de refratariedade.

Apesar de possuir uma eficácia conhecida, a droga de referência no tratamento do TOC, a clomipramina, apresenta mais efeitos colaterais, como: ganho de peso (via aumento do apetite por carboidratos), boca seca, constipação intestinal, sonolência, hipotensão postural, tremores de extremidades, retenção urinária, redução da libido e atraso ejaculatório/anorgasmia, com isso é considerada menos segura do que os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), e passando a ser indicada atualmente como segunda escolha. É importante ressaltar que, o uso da clomipramina associado com os ISRS ou por via endovenosa vem sendo estudado em casos refratários.

Autores, revisores e orientadores:

Autor(a): Janaína Dominguez Dourado @janaddourado

Revisor(a): Sofia Mattos @ouisofi

Orientador(a): Fátima Vasconcellos

Referências:

Associação Brasileira de Psiquiatria. Transtorno Obsessivo Compulsivo: Diagnóstico. Projeto Diretrizes (Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina). Elaboração Final: 30 de julho de 2009

Associação Brasileira de Psiquiatria. Transtorno Obsessivo Compulsivo: Tratamento. Projeto Diretrizes (Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina). Elaboração Final: 31 de janeiro de 2011

DEMINCO, M. Novos aspectos fisiopatológicos envolvidos no transtorno obsessivo-compulsivo. Psicologia. PT: o portal dos psicólogos. s/l, Fev, Brasília/DF, 2011, p. 1-19.

DSM – V, Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais (5ª edição, American Psychiatric Association, 2013).

ROSARIO-CAMPOS, Maria Conceição do, and Marcos T. Mercadante. “Transtorno obsessivo-compulsivo.” Revista Brasileira de Psiquiatria 22 (2000).