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Distúrbios do equilíbrio ácido-básico: Acidose Metabólica | Colunista

Distúrbios do equilíbrio ácido-básico: Acidose Metabólica | Colunista

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Existem diversos distúrbios do equilíbrio ácido-básico e um dos mais relevantes e prevalentes é a acidose metabólica.

A acidemia é definida pelo aumento de acidez sanguínea (pH < 7,36) e, a alcalose, a diminuição desta (pH > 7,44).

Esses distúrbios podem ocasionar consequências graves e, por isso, devem ser prontamente identificados.

Antes de nos atentarmos a como diagnosticar esse distúrbio, precisamos compreender as possíveis etiologias.

Acidose Metabólica:

Pode ser causada por:

–      Choque: pelo estado anaeróbico dos tecidos, havendo aumento da produção de ácido lático

–      Cetoacidose diabética (aumento da produção de ácidos endógenos que ocorre comumente nos pacientes com diabetes mellitus tipo 1 ou nos alcoólatras)

–      Ingestão de toxinas.

–      Diarréia ou outras perdas de bicarbonato

–      Insuficiência renal: incapacidade de eliminar os ácidos e diminuição da capacidade de reabsorção renal do HCO3.

Quadro clínico: o sinal mais comumente observado pela tentativa de compensação de um dos grandes sistemas tampões é a hiperpneia (padrão kussmaul – inspiração com períodos de apneia), mas pode estar associado a outros sinais inespecíficos ou ser assintomática. 

Gravidade

A acidose pode diminuir a contratilidade do miocárdio, ocasionando o aparecimento de possíveis arritmias e consequentemente possíveis alterações na perfusão dos tecidos.

Valores de referência:

pH: 7,35 – 7,45

PCO2: 35 – 45 mmHg

HCO3: 24

BE: -3 a +4

Descobrir que tipo de distúrbio estamos avaliando:

Figura 1. Imagem comparativa das alterações esperadas em cada distúrbio metabólico.
Fonte: https://ppgbqa.ufsc.br/files/2011/07/material-para-estudo-de-Equilibrio-acido-base.pdf

Acidose: queda do pH sanguíneo

–      Metabólica: queda do bicarbonato

–      Respiratória: aumento do PCO2

Alcalose: aumento do pH sanguíneo

–      Metabólica: aumento do bicarbonato

–      Respiratória: queda do PCO2

Uma vez compreendido que se trata de uma acidose metabólica – ou seja, percebemos que há uma redução do pH concomitante a uma queda de bicarbonato, qual passo devemos tomar?

·      Primeiramente deve ser feito o cálculo de compensação

·      Posteriormente, o cálculo do anion gap

o   Se alterado – iremos calcular o delta do anion gap

Limite de compensação:

Essa conta serve para analisarmos se os sistemas tampões estão sendo eficazes e, de fato, compensando essas alterações, ou se há um distúrbio misto por falha nesses mecanismos.

Dessa forma, devemos primeiramente calcular a PCO2 esperada com a seguinte conta:

pCO2 esperada = 1,5 x [HCO3] + 8 (+/-) 2

–      Se a pCO2 esperada for equivalente a PCO2 apresentada pelo paciente, se trata de um distúrbio compensado.

–      Caso o paciente apresente menor quantidade de PCO2 do que a PCO2 esperada, trata-se de uma acidose metabólica associada a uma alcalose respiratória

–      E, por fim, se o paciente apresentar maior quantidade de PCO2 do que a esperada, trata-se de uma acidose metabólica associada a uma acidose respiratória.

Anion Gap:

O cálculo do anion gap se dá para analisarmos quais íons estão ocasionando esse desequilíbrio. Por exemplo, quando o anion gap é igual ao valor esperado (10 mEq/L), podemos perceber que o único íon alterado, que mantém o distúrbio, é o cloreto (denominado acidose hiperclorêmica). Caso de um valor maior que o esperado, estima-se que outros íons possam estar colaborando para o desequilíbrio e, assim, outras possíveis etiologias.

O cálculo é feito pela seguinte fórmula:

Na+ – (Cl + HCO3) = 10 mEq/L

–      Quando aumentado: é devido a aumento de algum outro ácido, que não o cloreto acidose normocalcemia

–      Quando normal: decorrente de perda de bicarbonato  acidose hiperclorêmica

Ânions possivelmente associados à acidose metabólica:

Figura 2. Tabela de causas de aumento de anion gap.
Fonte: http://www.rbti.org.br/rbti/download/artigo_2010623145045.pdf

·      Para lembrar: GOLD MARRK

o   G: glicol (etileno e propileno)

o   O: 5-Oxoprolina (uso de paracetamol:

o   L: lactate

o   D: D-lactato

o   M: methanol

o   A: aspirina (intoxicação por salicilato)

o   R: renal (insuficiência renal)

o   R: rabdomiólise

o   K: ketoacidose

Delta anion gap:

Calcular apenas quando o anion gap estiver aumentado.

Ø  Delta AG = AG medido – 10 (AG esperado)

Ø  Delta HCO3 = 24 (HCO4 esperado) – HCO3 medido

Ø  Delta AG / Delta HCO3: entre 1 – 1,6

o   Se maior: AG aumentado com alcalose metabólica , podendo resultar num paciente com distúrbio ácido-básico triplo.

o   Se menor: AG aumentado + AG normal – algo está causando perda maior que de bicarbonato (DRC, cetoacidose…) 

o   No esperado: apenas AG aumentado

Cálculo da osmolaridade:

Nos casos de acidose metabólica com anion gap aumentado, deve ser calculado a osmolaridade com base na seguinte fórmula:

Osmolaridade calculada: [2 x(Na+) + (glicose)/18 + ureia/6]

Osmolaridade calculada – osmolaridade medida: 10 ou 15

Caso essa diferença seja maior que 10, é sugestivo de alteração de íons que são osmoticamente ativos, podendo auxiliar a guiar a busca pela etiologia (como, por exemplo, metanol e etilenoglicol).

Tratamento de reposição:

Inicialmente deve ser tratada a causa base, avaliando as possíveis etiologias desse desequilíbrio.

Posteriormente, pode ser calculado o déficit de bicarbonato, equivalente ao quanto deverá ser reposto para reverter o quadro. Essa opção deve ser utilizada principalmente nas acidemias graves (pH < 7,2; bicarbonato < 8)

Calcular déficit de bicarbonato:

Bic necessário = (Bic desejado – bic atual) x 50% do peso corporal

Repor com solução isotônica 0,1 mEq/Kg/min 

Caso o paciente apresente anion gap aumentado, ou seja, presença de outros íons responsáveis pelo desequilíbrio, não é indicado a reposição de bicarbonato. Nesses casos pode-se optar por, principalmente, tratar a causa base.

Conclusão

Neste artigo pudemos abordar a interpretação de uma acidose metabólica, assim como classificá-la em: mista ou compensada ou se de anion gap normal ou aumentado, para compreender sua etiologia.

Além disso, pudemos entender quando e porque utilizar as inúmeras fórmulas desse distúrbio, a fim de conseguir interpretá-las e, consequentemente, tratá-las.

Autora: Mariana Gonçalves Fernandes

@marigf__

Referências:

Acidose metabólica – Por James L. Lewis III – https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/dist%C3%BArbios-end%C3%B3crinos-e-metab%C3%B3licos/regula%C3%A7%C3%A3o-e-dist%C3%BArbios-%C3%A1cido-base/acidose-metab%C3%B3lica

Diagnóstico dos Distúrbios do Metabolismo Ácido-base, Rocco, J. R – http://www.rbti.org.br/rbti/download/artigo_2010623145045.pdf

Gold Mark: an anion gap mnemonic for the 21st century – https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140673608613987/fulltext

Alterações do Equilíbrio ácido-base- https://ppgbqa.ufsc.br/files/2011/07/material-para-estudo-de-Equilibrio-acido-base.pdf


O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

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