Oftalmologia

Estrabismo: tudo sobre o diagnóstico e tratamento

Estrabismo: tudo sobre o diagnóstico e tratamento

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Estrabismo: saiba mais sobre distúrbio na função dos músculos oculares, e as formas disponíveis de tratamento para a doença!

O estrabismo um termo utilizado para descrever uma anomalia do alinhamento ocular adequado. Esse desalinhamento pode ocorrer em qualquer direção, mas é importante estarmos atentos as nomenclaturas utilizadas no contexto de presença dessa anomalia:

  • Se a visão binocular está presente, usaremos os termos heterotropia, tropia ou estrabismo manifesto.
  • Se o desvio ocorre após a interrupção binocular, chamamos de heteroforia, foria ou estrabismo latente.

Quais os tipos de estrabismo

O tipo mais comum de estrabismo é convergente é a esotropia e pode ser parética, quando associada a paralisia ou paresia de um ou ambos os músculos retrolaterais do olho, enquanto chamada de não parética quando é concomitante. A forma parética é mais comum em adultos, enquanto a não parética é mais vista em crianças.

O estrabismo divergente (exotropia), por sua vez, é menos comum que a esotropia ma infância, mas quando presente está fortemente associada às questões genéticas, onde pelo menos um dos pais ou ambos apresentam exotropia.

De forma geral, o estrabismo surge em crianças e estima-se que 4% de indivíduos dessa população possuem essa condição. Nesse público, o tratamento deve ser iniciado quando o diagnóstico for determinado para que seja possível manter a acuidade visual e a preservação da função binocular. Contudo, o estrabismo também pode ser adquirido ao longo da vida, secundário a paralisia de nervos cranianos, fraturas orbitais ou outros distúrbios associados.

Na oftalmologia, de forma geral, o conhecimento da motricidade ocular é essencial para auxiliar na avaliação e posterior diagnóstico de qualquer condição, então recomendamos fortemente que você reconheça os músculos envolvidos nessa movimentação. 

Qual a fisiologia do estrabismo?

Para entender esse distúrbio, é necessário compreender que existem aspectos motores e sensoriais associados a ele.

Nos aspectos motores, é preciso compreender as funções individuais de cada um dos seis músculos extrínsecos e como eles interferem nos três eixos rotacionais do olho.

MúsculoFunção principal
M. Reto medialAdução, com pouco efeito na elevação ou torção
M. Reto lateralAbdução, com pouco efeito na elevação ou torção
Reto inferiorAbaixamento do bulbo ocular
M. Oblíquo inferiorPosicionamento torcional/Elevação diagonal
M. Oblíquo superiorAbaixamento diagonal do olho
Reto superiorElevação do bulbo ocular

Em relação aos aspectos sensoriais, os conceitos que precisamos conhecer são:

  • Visão binocular: formada pela fusão sensorial e esteropsia, consiste na formação da imagem conjugada a partir do que enxergamos em cada olho.
  • Fusão sensorial: formada na área de Panum e diz respeito a junção dos pontos na retina em que é possível fundir estímulos visuais.
  • Esteropsia: processo de percepção do que nos cerca em três dimensões, ou seja, nossa percepção de profundidade.

O estrabismo ocorre quando qualquer uma dessas estruturas ou funções citadas acima não está funcionando no equilíbrio adequado, seja individualmente ou de forma conjugada.

Principais causas do estrabismo

No tocante ao estrabismo, ele pode ser causado por condição congênita ou associadas a disfunção de parte do sistema nervoso que coordena a ação dos músculos oculares ou provocado pela presença de tumores ou outras condições oculares. Em adultos, pode ocorrer secundário a traumas cranioencefálicos ou problemas de ordem vascular.

Os fatores de risco para o estrabismo são:

  • Histórico familiar de estrabismo
  • Nascimento prematuro e/ou registro de baixo peso no nascimento
  • Além de condições oculares que predispõem o estrabismo como ambliopia, anisometropia, fusão binocular desalinhada, hipermetropia e outras como retinopatia do prematura, catarata, cicatrizes na córnea e ptose severa.

Quais os sinais e sintomas do estrabismo?

Por ser basicamente um desvio do alinhamento dos músculos oculares, pela inspeção já é possível avaliar um desvio da direção dos olhos, fazendo com que eles não estejam alinhados em momentos pontuais ou continuamente. Além disso, o paciente pode referir diplopia (visão dupla), perda da percepção de profundidade – o que chamados de perda de esteriopsia, além de não ser capaz de coordenar os movimentos oculares.

Quando o desvio de um dos olhos ocorre para dentro (em direção ao nariz) enquanto o outro se mantém fixo ou de ambos nessa direção, chamamos de estrabismo convergente. Quando desviados para fora, é nomeado como estrabismo divergente. Se o desvio ocorre para cima ou para baixo, existe o estrabismo vertical. 

Além de classificar em relação à direção, o estrabismo também precisa ser avaliado em relação ao ângulo do desvio:

  • Se o desvio ocorre em todas as direções possíveis para os movimentos oculares é chamado de concomitante
  • Se variado conforme a direção, é chamado de paralítico.

Como conduzir o diagnóstico? 

Como grande parte das condições clínicas, a realização de uma anamnese bem detalhada e um exame físico bem direcionado e conduzido são indispensáveis para o estabelecimento do diagnóstico.

Abaixo organizamos informações essenciais a serem obtidas na anamnese:

  • Existe algum antecedente familiar de estrabismo e ambliopia?
  • A partir de qual idade os sintomas e sinais começaram a se manifestar? 
    • Quando mais cedo se iniciam, pior pode ser o prognóstico no contexto da preservação da função binocular adequada.
  • O início dos sintomas foi gradual, súbito ou intermitente?
  • Em que posição está ocorrendo o desalinhamento? Ele ocorre em todas as posições do olhar?
  • O desvio observado é constante de um olho ou ocorre a alternância?

No exame físico, é indispensável:

A inspeção já possibilita obter informações preciosas para o diagnóstico, então é preciso avaliar:

  • O estrabismo é constante ou intermitente?
  • Alternante ou não alternante?
  • É variável ou não?
  • Há ptose e/ou posição anormal da cabeça associado ao estrabismo?
  • A fixação está preservada de forma individualizada em cada olho? E em ambos?
  • Há nistagmo? Se sim, indica fixação instável e possível redução da acuidade visual.

Avaliar a acuidade visual

Sempre examinando um olho de cada vez, lembrando que podemos encontrar diferentes achados ou recorrer a alguns testes de acordo com a idade, sobretudo em crianças:

  • Crianças muito pequenas (primeiros meses de vida até 1 ano): utilizar objeto pequeno em movimento para estabelecer a capacidade do olho em seguir o movimento. Se a fixação estiver centrada (na fóvea) e parecer estável enquanto o olho acompanha o movimento, a consideramos normal. 
  • Crianças na fase pré-verbal: a preferência de fixação em apenas um dos olhos pode indicar ambliopia no outro olho. Nessa etária, quando existe um bom alinhamento motor, pode ser mais complicado a detecção de problemas na acuidade visual. A forma avaliativa aplicável a essa situação é o olhar preferencial de escolha forçada.
  • Crianças a partir dos 2 anos e meio ou 3 anos: as figuras de Allen já podem ser utilizadas nessa faixa etária.
  • 4º ano de vida: já existe a capacidade de utilização do teste do reconhecimento HOTV.
  • Crianças com 5 ou 6 anos: pode ser utilizado o teste de Snellen na maioria dos casos.

Identificar o ângulo de estrabismo

É possível através do teste de cover, que é realizado em quatro partes, onde em todas as etapas o paciente precisa estar olhando especificamente para um objeto localizado perto ou longe e em qualquer direção do olhar:

  • Teste de cover (oclusão)
  • Teste de uncover (desoclusão)
  • Cover alternado
  • Teste de prisma

Verificar os movimentos disjuntivos

A convergência e a divergência.

  • Convergência: consiste na avaliação dos músculos extraoculares. Para testá-la deve-se aproximar um objetivo em direção a ponta do nariz, pedindo que o paciente mantenha a atenção no objeto e que sinalize a partir do momento que a imagem parecer duplicada. A convergência é normal até o ponto do objeto estar próximo da ponta do nariz, chamado de ponto próximo de convergência, padronizado como normal até 5cm de distância entre o objeto e o nariz.
  • Divergência: Esse é um movimento que é testado principalmente no contexto de amplitudes de fusão. No geral, não precisa ser avaliado.

Realizar o exame sensorial

Que inclui o teste para estereopsia, supressão e potencial de fusão. Para todos esses testes, é preciso que dois alvos sejam marcados, sendo um para cada olho. Não é necessário a dilatação pupilar para esses testes.

  • Teste para estereopsia: utilizando óculos específicos para esse teste, o paciente deve ser capaz de observar figuras 3D, identificando as que estão em maior evidência.
  • Teste de supressão: avaliado pelo Teste de Worth, que consiste na exposição a 4 pontos luminosos. O paciente coloca um óculos com uma lente vermelha e uma lente verde e deve olhar para lanterna que contém luzes vermelhas, verdes e brancas. As luzes coloridas marcam a percepção de cada olho e a branca pode indicar a presença de diplopia. Deve-se sempre analisar as áreas foveais para longe e as áreas periféricas para perto. O teste é considerado normal quando todas as cores originais são vistas pelo paciente, significando que a fusão está normal.
  • Potencial de fusão: o paciente é exposto a uma luz vermelha e uma branca que devem podem estar localizadas numa distância curta ou mais distante. Após colocar um prisma em um dos olhos ou até mesmo nos dois, na presença do potencial de fusão, o paciente deve ser capaz de visualizar uma única luz rosa. Se o potencial de fusão não estiver preservado, as luzes serão vistas em suas cores normais.

Quais as opções de tratamento para estrabismo?

O tratamento do estrabismo tem dois objetivos principais: obtenção do alinhamento ocular – seja por intervenção clínica ou cirúrgica, e reversão dos efeitos sensoriais deletérios como a ambliopia, supressão e perda da estereopsia. É válido destacar, porém, que nem sempre é possível obter sucesso em todos os casos, então se trabalha com a noção do que é o melhor possível dentro de cada contexto.

Deve-se iniciar o tratamento tão logo quanto o diagnóstico seja obtido e é conhecido que, quando mais cedo forem realizadas as tentativas de realinhamento, melhor o prognóstico. Depois dos 8 anos de idade, torna-se mais difícil obter sucesso na correção da ambliopia e do estado sensorial.

O tratamento clínico é baseado no pilar de tratamento da ambliopia, agentes farmacológicos e ortópticos associados ou não ao uso de dispositivos ópticos.

Tratamento da ambliopia

Inclui o uso de óculos quando há um erro refracional significativo, mas tem como base a oclusão – que é o uso de um tampão, que permite uma melhora inicial e estimula a melhora da acuidade visual.

Esse tampão é colocado no olho saudável para que o olho amblíope seja “forçado” a melhorar, porém não é recomendado que esse tampão seja utilizado por mais de 4 meses quando não há percepção alguma de melhora.

Quando a oclusão não é tolerada pelo paciente, pode se realizar o tratamento com atropina 1% diariamente ou nos fins de semana, no contexto do olho sem ambliopia ser hipermétrope ou emétrope, mas o mecanismo de ação dessa substância não é muito bem conhecido. 

Ortópticos

Consiste no uso de exercícios localizados a serem feitos no contexto domiciliar com o propósito de suplementar ou reforçar o tratamento cirúrgico.  

Uso da toxina botulínica

É aplicada em um músculo extraocular para provocar paralisia química. Essa paralisia deve estimular o estiramento desse músculo enquanto há o movimento do músculo antagonista, provocando um equilíbrio de forças que permita a redução ou eliminação do desvio.

Geralmente usam-se mais de duas aplicações para obter efeito prolongado, mas depende de cada caso. 

Dispositivos ópticos

Inclui o uso de óculos ou prismas. Já o tratamento cirúrgico busca realizar alterações em um músculo extraocular, no tocante aos efeitos rotacionais desse músculo.

Primeiro é realizado o fortalecimento muscular com a ressecção de um músculo e depois deve ser recuado – ou seja, enfraquecido. Depois dessa etapa, é realizado a alteração do ponto de inserção muscular. Esse procedimento serve para habilitar o movimento rotacional que o olho não possuía antes. Esse processo de realinhamento cirúrgico pode ser realizado mais de uma vez até que o resultado desejado seja obtido.

Papel do médico no sucesso do atendimento e as novidades na área da oftalmologia

Considerando a visão como um dos sentidos mais primordiais, é preciso reforçar a importância de profissionais altamente capacitados para atender às demandas associadas a visão.

Pela ampla abrangência da oftalmologia, tanto no contexto de prática clínica, cirúrgica ou na realização de exames, é importante que mesmo um médico generalista seja capaz de reconhecer as principais patologias dessa especialidade para encaminhamento adequado de seus pacientes para resolução das condições clínicas, visando a preservação não apenas do sentido, mas também da qualidade de vida dos indivíduos.

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Links úteis relacionados à Oftalmologia

Referências

  • SALOMÃO, S. R.. Desenvolvimento da acuidade visual de grades. Psicologia USP, v. 18, n. 2, p. 63–81, jun. 2007.
  • Vaughan & Asbury’s General Ophthalmology, 17th edition