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Exame radiológico de fratura | Colunistas

Exame radiológico de fratura | Colunistas

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As fraturas e luxações constituem a maioria dos traumatismos que, por sua vez, são os transtornos do sistema musculoesquelético mais comumente examinados pelos radiologistas. Para a análise de fraturas e luxações, a radiografia simples é o exame mais indicado. Nesses quadros, cabe ao radiologista:

  • Realizar o diagnóstico e análise da fratura ou luxação;
  • Avaliar os resultados do tratamento realizado, assim como monitorizar a consolidação e as possíveis complicações.

Assim, esse artigo abordará o conceito de fratura e seus elementos descritivos, as fraturas pediátricas, a redução e fixação de fraturas, além da consolidação de fratura e suas possíveis complicações.

Conceito de fratura

Define-se fratura como a quebra da continuidade do osso ou da cartilagem, seja por trauma direto (quando a força é aplicada diretamente sobre o osso) ou indireto (quando a força é aplicada a certa distância, mas produz reflexo sobre ele).

Devido às propriedades do osso, as fraturas podem ser classificadas em padrões, de acordo com algumas características:

  • Transversal: a lesão ocorre por flexão, o tecido mole na articulação apresenta aspecto de concavidade e a intensidade do trauma é baixa;
  • Espiral: a lesão ocorre por torção, o tecido mole na articulação apresenta aspecto de segmento vertical e a intensidade do trauma é baixa;
  • Oblíqua/transversal ou borboleta: a lesão ocorre por adição de compressão e flexão, o tecido mole na articulação apresenta aspecto de concavidade ou borboleta e a intensidade do trauma é mediana;
  • Oblíqua: a lesão ocorre por adição de compressão e flexão, o tecido mole na articulação apresenta aspecto de concavidade (muitas vezes destruída) e a intensidade do trauma é moderada;
  • Cominutiva: a lesão ocorre por mecanismo variável, o tecido mole na articulação apresenta-se destruído e a intensidade do trauma é alta;
  • Compressão metafisária: a lesão ocorre por compressão, o tecido mole na articulação apresenta-se variável e a intensidade do trauma é variável.

Ademais, a fratura pode ser classificada em fechada/simples (quando os tecidos moles não são rompidos pelo trauma) ou aberta/exposta (quando os tecidos moles são dilacerados e a fratura é exposta).

Para que o diagnóstico correto seja feito, reitera-se que são necessárias pelo menos duas radiografias do osso comprometido, cada qual contendo as articulações adjacentes.

Elementos descritivos da fratura

De acordo com Greenspan, sete elementos devem ser considerados na descrição da fratura:

  • Local anatômico ou extensão da fratura: o local deve ser descrito de forma a identificar o osso, seus pormenores anatômicos (área supracondilar do fêmur, por exemplo), além da porção da diáfise (terço proximal, médio, distal ou nos limites) e das extremidades (proximal ou distal, cada qual contendo uma porção extra-articular e uma porção intra-articular) no caso dos ossos longos;
  • Tipo de fratura (completa ou incompleta): a fratura pode ser completa (quando todos os córtices do osso são rompidos e, assim, o osso é dividido em dois fragmentos) ou incompleta (quando ocorre rompimento de apenas uma porção do córtex);
  • Alinhamento dos fragmentos da fratura: uma fratura é dita desalinhada quando um de seus fragmentos possui angulação (diferente de 90º) em relação ao outro; ademais, pode-se dizer que a fratura está deslocada (há contato ou justaposição entre as faces dos fragmentos);
  • Direção da linha de fratura: tem como referência o eixo longitudinal do osso longo e os córtices dos ossos irregulares; pode ser transversal (quando possui ângulos retos em relação ao eixo longitudinal ou córtices), oblíqua (quando se estende obliquamente em relação à referência), espiral (quando forma uma espiral com relação ao eixo longitudinal) ou longitudinal (quando é paralela à diáfise); por fim, a fratura cominutiva (que possui mais que dois fragmentos) nem sempre possui direção definida;
  • Presença de características especiais: como, por exemplo, a impactação (que ocorre quando um dos fragmentos é firmemente impelido para dentro do outro) e a avulsão (ocorre pela contração ativa de um músculo ou pela resistência de um ligamento e se caracteriza por avulsão dos fragmentos ósseos da posição original);
  • Existência de anormalidades relacionadas: as luxações e subluxações são as mais frequentes;
  • Tipos especiais de fraturas: como, por exemplo, fraturas de esforço (resultam de pequenos e repetitivos traumas) e fraturas patológicas (ocorre por processo patológico em ossos estruturalmente enfraquecidos).

Fraturas pediátricas

As fraturas que acometem ossos em desenvolvimento são um desafio para o diagnóstico e tratamento. Quanto ao diagnóstico, o fator desafiante é a incapacidade da radiografia de reproduzir o modelo cartilaginoso, ou seja, o osso ainda imaturo. Ademais, a presença de linhas epifisárias dificulta a visualização do exame, pois podem ser confundidas com linhas de fratura (para evitar esse problema, costuma-se comparar o exame com a radiografia do membro íntegro). No que se refere ao tratamento, por sua vez, é possível que haja interrupção do crescimento do osso após a fratura.

Geralmente, se descreve a fratura do osso longo pediátrico tendo como referência a região em desenvolvimento, da seguinte forma:

  • Fratura diafisária: compromete a parte central do osso;
  • Fratura metafisária: compromete a extremidade em crescimento;
  • Fratura fisária: compromete a lâmina epifisária;
  • Fratura epifisária: compromete a epífise.

A descrição da fratura, além dos elementos de Greenspan, inclui a descrição dos padrões das fraturas incompletas da diáfise e as características das fraturas da lâmina epifisária e da epífise.

A descrição das fraturas incompletas da diáfise é feita de forma a classificar a fratura conforme explicitado a seguir:

  • Fratura em galho verde: ocorre quando a fratura acomete um lado da diáfise, mas as porções do córtex e periósteo do lado oposto permanecem intactas;
  • Fratura em toro: é a fratura impactada, que acarreta em abaulamento do córtex;
  • Curvatura plástica: é um componente das fraturas pediátricas, se caracterizando pelo abaulamento do osso quando as forças de compressão longitudinal atuantes sobre o osso tubular são maiores que a retração elástica.

As fraturas epifisárias, por sua vez, são mais comumente classificadas de acordo com o diagrama de Salter-Harris (tipos I a V), posteriormente complementado por Rang (tipo VI) e Ogden (tipos VII a IX), conforme visto na imagem 1 e descrito a seguir:

Fonte: GREENSPAN, A., BELTRAN, J. Radiologia Ortopédica: Uma Abordagem Prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 6. ed., 2017.
Imagem 1: Diagrama de Salter-Harris posteriormente complementado por Rang e Ogden
  • Tipo I: ocorre quando a linha de fratura se estende através da lâmina epifisária de crescimento, de forma que a epífise é separada e deslocada da sua posição normal;
  • Tipo II: ocorre quando a linha de fratura atravessa a lâmina epifisária até a metáfise, de forma a causar um fragmento cuneiforme da metáfise que se desloca com a epífise;
  • Tipo III: ocorre quando a linha de fratura se estende da face articular até a lâmina epifisária, atravessando a epífise, de forma que uma porção da epífise seja deslocada;
  • Tipo IV: ocorre quando a linha de fratura produz um único fragmento, ao se estender da face articular e atravessar tanto a epífise quanto a lâmina epifisária e a metáfise;
  • Tipo V: ocorre quando a fratura da lesão por esmagamento danifica a lâmina epifisária pela força de compressão;
  • Tipo VI de Rang: é a lesão que compromete o anel pericondrial ou o periósteo da lâmina epifisária;
  • Tipo VII de Ogden: é a fratura osteocondral na porção articular da epífise;
  • Tipo VIII de Ogden: é a fratura da metáfise;
  • Tipo IX de Ogden: é a fratura por avulsão do periósteo.

Redução e fixação de fraturas

A redução é o procedimento que visa justapor os fragmentos deslocados para a posição anatômica normal, podendo ser realizada de duas maneiras:

  • Redução fechada: procedimento feito por manipulação, tração ou uma combinação de ambas, sem intervenção cirúrgica;
  • Redução aberta: realizada com intervenção cirúrgica, havendo exposição da fratura.

A fixação, por sua vez, é o procedimento que objetiva manter os fragmentos no lugar após a redução, para que possa acontecer a consolidação. A fixação pode ser realizada de duas formas:

  • Fixação externa: realizada com imobilização por gesso ou telas;
  • Fixação interna: realizada com dispositivos ortopédicos, como pinos, fios, hastes, parafusos e placas.

Consolidação de fratura e possíveis complicações

A consolidação da fratura começa logo após o acontecimento da lesão. Apesar desse processo não seguir um padrão, sabe-se que que no osso cortical ocorre por formação de osso novo, enquanto no osso esponjoso ocorre quase sem a formação de osso novo. Os principais termos referentes à consolidação na radiografia são:

  • Formação de calo: se refere às linhas radiodensas periosteais e endosteais;
  • Consolidação óssea primária: se refere à consolidação da fratura sem produção de calo, realizada pelo osso novo trabecular;
  • Consolidação precoce: se refere ao padrão trabecular visto na linha de fratura;
  • Consolidação clínica: se refere à presença de calo, porém com remodelamento ósseo incompleto, de forma que é reproduzida faixa radiolucente;
  • Consolidação radiográfica: se refere ao calo periosteal e endosteal responsável pela consolidação da fratura;
  • Consolidação estabelecida: se refere à estrutura cortical e ao processo inicial do remodelamento;
  • Remodelamento: se refere ao início da reorganização das trabéculas;
  • Consolidação fibrosa: se refere ao local da fratura onde não há sinal de consolidação na linha de fratura, já estável e indolor.

As principais complicações da consolidação são as seguintes:

  • Consolidação tardia: ocorre quando a fratura não se consolida no tempo previsto;
  • Consolidação lenta: ocorre quando a consolidação é lenta, apesar das condições serem ideais;
  • Não-consolidação: não há consolidação, de forma que os fragmentos não se consolidam;
  • Má-consolidação: ocorre quando a fratura consolidada apresenta algum grau de deformidade, podendo ser angular ou rotatória;
  • Pseudartrose: é a presença de anormalidade no local da fratura (também chamada articulação falsa), devido à má-consolidação;
  • Necrose avascular: ocorre quando a irrigação sanguínea do osso ou segmento ósseo está impossibilitada, o que leva à morte do osso.

Por fim, o tempo de consolidação da fratura depende de vários fatores, a saber:

  • Idade do paciente: quanto mais jovem o paciente, mais rápida a consolidação;
  • Grau de trauma local: quanto maior o grau do trauma, mais lenta a consolidação;
  • Grau de perda óssea: quanto mais osso perdido, mais lenta a consolidação;
  • Tipo de osso envolvido: o osso esponjoso se consolida de forma rápida nos pontos de contato direto; o osso cortical, por sua vez, se consolida por dois mecanismos;
  • Grau de imobilização: a imobilização inadequada ou inexistente dificulta ou até impossibilita a consolidação;
  • Infecção: a ocorrência de infecção no local retarda ou impossibilita a consolidação;
  • Presença de doença oncológica local: na existência de doença, a consolidação é prejudicada ou até impossibilitada;
  • Outros quadros patológicos locais: algumas patologias não-oncológicas, como a doença de Paget, podem dificultar ou impossibilitar a consolidação;
  • Necrose por radiação: a consolidação do osso irradiado é mais lenta, podendo em alguns casos nem acontecer;
  • Necrose avascular: geralmente, a consolidação ocorre apenas na porção do osso vascularizada;
  • Hormônios: a consolidação é inibida pelos corticosteróides e estimulada pelos hormônios do crescimento;
  • Exercício e tensão sobre a fratura: técnicas de apoio de peso, desde que não exageradas, são benéficas para a consolidação.

De acordo com Rockwood, o tempo de consolidação pode ser dividido em três fases, que se sobrepõem:

  • Fase de inflamação: corresponde a cerca de 10% do tempo;
  • Fase de reparação: corresponde a cerca de 40% do tempo;
  • Fase de remodelamento: corresponde a cerca de 70% do tempo.

Autor(a) : Aliscia Wendt – @alisciawendt

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Referências:

MCKINNIS, L. N. Fundamentos da radiologia ortopédica. Editora Premier, 2004.

GREENSPAN, A., BELTRAN, J. Radiologia Ortopédica: Uma Abordagem Prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 6. ed., 2017.



O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

Novidade: temos colunas sendo produzidas por Experts da Sanar, médicos conceituados em suas áreas de atuação e coordenadores da Sanar Pós.