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Hepatopatia: o que é, tipos, quadro clínico, diagnóstico e mais

Hepatopatia: o que é, tipos, quadro clínico, diagnóstico e mais

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Entenda o que é hepatopatia, quais são as patologias mais comuns relacionadas ao fígado e como abordar seus pacientes. Bons estudos!

A hepatopatia é a alteração funcional ou anatômica hepática, secundária à alguma condição danosa ao fígado. Devido à relevância do fígado para toda homeostase sistêmica, compreender as principais condições relacionadas à ele são fundamentais para o médico.

Anatomia hepática: princípio para a compreensão da hepatopatia

O fígado é um órgão nobre, localizado no hipocôndrio direito, sendo a maior glândula do corpo humano.

Dentre suas muitas funções, a metabolização de substâncias, produção de albumina e outras proteínas e a viabilização do sistema porta o caracterizam.

O fígado é recoberto pela cápsula de Glisson, fibrosa, e adota um formato de cunha na cavidade abdominal. Ainda, sua face visceral é parcialmente recoberta por peritônio, exceto na fossa da vesícula biliar e na porta do fígado.

É no fígado que encontramos a tríade portal, que se agrupa no ligamento hepatoduodenal e é composta por:

  • Ducto colédoco, advindo da vesícula biliar;
  • Veia porta;
  • Artéria hepática.

Uma imagem contendo animal, invertebrado, molusco

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Fatores de risco e epidemiologia das hepatopatia

De todas as principais causas de hepatopatias, as hepatites virais são uma das principais causas. Os vírus hepatotrópicos mais comuns são a hepatite B (HBV) e C (HCV).

A prevalência das hepatites varia dentre as regiões do globo a depender das condições socioeconômicas. Em relação à HBV, são mais comuns na Ásia e África, enquanto a HCV é mais comum em países desenvolvidos.

As hepatopatias podem ter um impacto significativo na saúde pública devido à sua associação com morbidade e mortalidade.

A esteatose hepática não alcoólica (EHNA) é também uma condição associada ao acúmulo de gordura no fígado. Ainda, fortemente relacionada à Diabetes tipo II, dislipidemia e síndrome metabólica.

Assim sendo, os fatores de risco para o desenvolvimento de hepatopatias são muitos, dado a gama de doenças possíveis. No geral, temos:

  • Obesidade;
  • Dislipidemia;
  • Abuso de álcool e outras substâncias, incluindo medicamentos.

História clínica do paciente com hepatopatia: como colher?

Colher uma boa história clínica do paciente faz toda diferença para a formulação de suspeitas diagnósticas. Conhecer o perfil do paciente e entender a sintomatologia da condição é fundamental para que o raciocínio clínico do médico seja formulado.

Por isso, algumas informações são importantes de ser colhidas, como:

  • Histórico de consumo de álcool;
  • Doenças prévias, pesquisando histórico de icterícia, cirurgias;
  • Transfusão sanguínea;
  • Exames médicos anteriores, especialmente laboratoriais;
  • Sintomas hepáticos:
    • Dores abdominais;
    • Perda de apetite ou de peso;
    • Prurido;
    • Náuseas.

Exame físico do paciente com hepatopatia: como realizar?

No exame físico do paciente com suspeita de hepatopatia, o seguimento abdominal será especialmente importante. Assim, ser cuidadoso e criterioso com a avaliação pode fazer toda diferença nessa avaliação.

Inicialmente, a inspeção visual deve procurar por cicatrizes, equimoses e distensão ou retrações, principalmente. É importante que o paciente esvazie a bexiga antes do exame, e que o dorso também seja inspecionado.

A ausculta deve ser seguida, antes da palpação e percussão. Todo o abdomen deve ser auscultado, por quadrantes. É interessante que essa etapa seja iniciada pelo quadrante inferior direito. Esteja atento aos ruídos hidroaéreos, aumentados ou diminuídos. Ainda, à pulsação arterial da artéria abdominal, se possível.

A percussão é uma parte fundamental, já que é por meio dela que será possível realizar a hepatimetria. Use a técnica de dedo em dedo, pressionando suavemente um dedo sobre o abdômen e batendo no dedo com o dedo médio da mão oposta. Essa técnica permite delinear bordas hepáticas e esplênicas.

A descrição normal do exame físico abdominal pode ser feita da seguinte forma:

  • À percussão: maciço (baço e fígado), timpânico (vísceras ocas).
    • É esperado que a percussão hepática seja maciça, o espaço de Traube timpânico (livre, sem esplenomegalia);
    • Massas abdominais sólidas ou líquidas (ascite) são maciços;
    • Timpanismo generalizado pode indicar obstrução.

Em pacientes com ascite, devemos fazer manobras importantes para avaliar o paciente, sendo elas:

  • Macicez móvel: ascites de médio volume. O líquido se localiza bem em apenas um lado do abdome, quando em decúbito dorsal.
  • Semi-círculo de Skoda: alteração do timpanismo, quando realizada percussão em círculo no abdome.
  • Sinal de Piparote: uma onda líquida pode ser vista no abdome de pacientes com grandes ascites. Peça ao paciente que localize a mão medial ao abdome, realizando um leve batimento.
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Alterações no exame físico abdome secundário à ascite.

Exames de imagem: quais solicitar para o seu paciente?

É importante individualizar a escolha dos exames de imagem para a condição de cada paciente. No entanto, seriar esses pedidos é especialmente valioso quando pensamos na sobrecarga do sistema de saúde.

Assim, de maneira geral, a primeira escolha será a solicitação de uma ultrassonografia abdominal. Essa escolha se deve ao fato de a USG não ser um exame invasivo, barato e capaz de informar sobre tamanho, lesões, cistos e tumores. Ainda, por meio dela é possível avaliar a vesícula biliar e as vias biliares.

A tomografia computadorizada (TC) vem em seguida, com imagens mais detalhadas para além do fígado, mas estruturas próximas. Através da TC, os tumores hepáticos podem ser melhor visualizados e descritos. Assim, pensando em planejamento cirúrgico, por exemplo, é fundamental que essas informações sejam muito bem descritas.

Pensando nisso, ainda sobre tumores, avaliar a sua vascularização pode ser útil. Para isso, a angiografia hepática é capaz de avaliar esse suprimento sanguíneo da massa e a fisiológica hepática. No entanto, por se tratar de um exame mais invasivo, com injeção de contraste, não é um exame rotineiro.

Hepatites: uma das principais hepatopatias

A hepatite é a inflamação hepática, que pode ser causada por vírus, mas também por substâncias tóxicas como álcool ou doenças autoimunes.

A hepatite A (HAV) é transmitida pela ingestão de alimentos ou água contaminados com fezes de uma pessoa infectada. Assim, a prevenção pode ser feita pelas boas práticas de higiene, vacinação e saneamento básico. Por ser autolimitada, a HAV não se cronifica, como a HCV ou HBV. Os sintomas incluem:

  • Fadiga;
  • Icterícia;
  • Febre;
  • Dor abdominal;
  • Anorexia.

Em seguida, tem-se a hepatite B (HBV), que é transmitida pelo contato com fluídos corporais infectados, como sangue. Assim, relações sexuais desprotegidas é um hábito que favorece essa transmissão. Diferente da HAV, a HBV pode se cronificar, podendo levar a sérias complicações.

Embora seja, muitas vezes, assintomática, pode evoluir com cirrose hepática e até mesmo carcinoma hepático. Pensando nisso, a vacinação continua sendo fundamental para o cuidado com esse vírus.

Quanto à hepatite C (HCV), a sua transmissão ocorre da mesma maneira que a HBV: sangue. No entanto, ela é especialmente comum entre populações que fazem uso de drogas injetáveis, com compartilhamento de seringas.

Além disso, até antes de 1992, as transfusões sanguíneas não contavam com a pesquisa de HCV. Ou seja, é válido questionar o seu paciente se a possível realização da transfusão se deu antes ou após essa data. Ao se cronificar, a HCV pode levar a sérias complicações, como cirrose.

Cirrose hepática: porque essa hepatopatia ocorre?

A cirrose hepática é uma condição crônica e progressiva que ocorre como resultado de danos prolongados ao fígado.

Nela ocorre a formação de tecido cicatricial fibrótico no fígado, substituindo o tecido funcional e saudável. Com isso, a longo prazo, a função hepática fica prejudicada, chegando à sua insuficiência.

hepatopatia
Figura 2: Fígado saudável comparado a um cirrótico.

Em geral, a cirrose vem acompanhada de um histórico de longo prazo de alguma condição persistente danosa ao fígado.

Mais frequentemente, ela está relacionada ao consumo excessivo de álcool. No entanto, a hepatite crônica, doenças autoimunes e distúrbios genéticos podem resultar em cirrose hepática.

O diagnóstico de cirrose hepática envolve uma combinação de:

  • Histórico médico;
  • Exame físico, revelando hepatomegalia e, em alguns casos, ascite;
  • Laboratoriais, com hemograma e perfil hepático e lipídico, para avaliar a função hepática;
  • Exames de imagem, como ultrassonografia, tomografia computadorizada;
  • Biópsia hepática, em alguns casos.

Doença hepática alcoólica (DHA): mecanismos patogênicos e abordagem

A doença hepática alcoólica ocorre devido ao abuso crônico de álcool, especialmente comum em países ocidentais.

A DHA é uma combinação de múltiplos processos, envolvendo a toxicidade direta do álcool e metabólitos, bem como a resposta inflamatória e imunológica resultante.

Durante a anamnese, é comum que o paciente relate que iniciou a ingestão de álcool cedo, e que ao longo da vida alterou o perfil de bebidas, ingerindo destilados e bebidas quentes no momento.

Essa é uma condição que pode evoluir para a cirrose, devido às fibroses progressivas. Pensando nisso, a abordagem a esse paciente deve incluir:

  • Abstinência alcóolica, com interrupção do consumo. Caso esse hábito não seja interrompido, a doença progredirá.
  • Suporte nutricional: a DHA pode estar associada à desnutrição. Assim, pode ser necessário um acompanhamento e dieta de suplementação.
  • Tratamento de complicações, como ascite, encefalopatia hepática e sangramento gastrointestinal.

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Perguntas frequentes

  1. O que é cirrose hepática?
    A cirrose hepática é uma condição crônica em que o fígado desenvolve cicatrizes irreversíveis, resultando em perda de função.
  2. O que é hepatite?
    A hepatite é uma inflamação do fígado, geralmente causada por infecção viral, consumo excessivo de álcool, toxinas ou doenças autoimunes.
  3. O que é doença hepática alcoólica?
    A doença hepática alcoólica é um termo usado para descrever danos no fígado causados pelo consumo crônico e excessivo de álcool.

Referências

  1. Ascite: state of the art based on evidences. Dahir Ramos de Andrade Júnior.
  2. Figura 2.
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