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Icterícia Neonatal: Fisiopatologia e Diagnóstico das Grandes Síndromes Ictéricas Neonatais | Colunistas

Icterícia Neonatal: Fisiopatologia e Diagnóstico das Grandes Síndromes Ictéricas Neonatais | Colunistas

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As doenças do período neonatal, que se estende do nascimento da criança até o 28º dia de vida, são relacionadas a situações ocorridas tanto na gestação quanto no período perinatal. Uma das apresentações mais frequentes nesse período é a icterícia, que apesar da apresentação comum de amarelamento da pele, escleras e mucosas pode se originar de distúrbios diferentes.

Crianças que se apresentam com icterícia devem ser investigadas a fim de se determinar a causa e assim evitar consequências deletérias como é o caso do kernicterus, uma doença caracterizada por impregnação cerebral de bilirrubinas pelo aumento exacerbado da bilirrubina não-conjugada sérica. 

Fisiopatologia da Icterícia Neonatal

A ocorrência da cor amarelada em pele, esclera e mucosas do neonato tem origem da mesma forma do adulto: pelo acúmulo de bilirrubinas nos tecidos. Esse acúmulo é proveniente de uma bilirrubinemia alterada que faz com que esse composto se deposite nos tecidos da criança. A icterícia infantil tem a característica de ocorrer do centro para a periferia e pode ser avaliada em zonas, as chamadas zonas de Kramer (FIGURA 1) que se correlacionam com a concentração sérica de bilirrubinas.

A bilirrubina é proveniente da quebra da hemoglobina, que ocorre principalmente pela destruição de hemácias pelo sistema reticuloendotelial. Essa quebra é parte normal do metabolismo dessas células, mas quando ocorre de forma exacerbada indica alguma alteração metabólica.

A bilirrubina que se acumula é a circulante, que ainda não foi conjugada, ou seja, a bilirrubina indireta. Para relembrar o metabolismo da bilirrubina você pode acessar o texto Metabolismo da Bilirrubina e Icterícia aqui mesmo dos colunistas da Sanar.

Icterícia Precoce do Neonato

Icterícia que se apresenta precocemente, ou seja, nas primeiras 24 horas de vida, em sua maioria é patológica, uma vez que essa criança ainda se apresenta no período de adaptação à vida extra útero e não é esperada que haja a destruição significativa de hemácias nesse período. Na ocorrência de hemólise é essencial que se identifique a causa, uma vez que pode causar uma queda significativa de hemoglobina e hematócrito em pouco tempo.

A grande maioria desses neonatos ictéricos precoces tem como causa base da destruição de suas hemácias a isoimunização. A incompatibilidade ABO pode causar uma icterícia de menor porte enquanto que a incompatibilidade Rh é a causa principal de quadros mais graves.

O status ABO, Rh deve ser testado em todas as gestantes para que se evite essa condição. Ao nascer o status do recém nascido também deve ser testado em mães Rh negativo, a fim de possibilitar a tomada de medidas necessárias no caso de incongruência, como aplicação da imunoglobulina RhoGAM dentro de 72 horas. 

No caso de ausência de incompatibilidade sanguínea casos mais raros devem ser avaliados, deficiência de G6PD (que se apresenta geralmente após 48 horas de vida, mas deve ser aventada) e a síndrome de Crigler-Najjar que causa icterícia não-hemolítica do recém nascido.

Icterícia Fisiológica do Neonato

Muitos recém nascidos apresentam uma icterícia de início entre o terceiro e quarto dia de vida, com pico na primeira semana e que pode se estender até a segunda semana de vida. Essa icterícia fisiológica também é conhecida como icterícia do leite materno, apesar de a relação dessa condição com o leite materno ter sido afastada.

Essa situação se dá pela presença do composto conhecido como beta glucuronidase, também presente no leite materno que causa um aumento da bilirrubina indireta que é reabsorvida pelo intestino e atinge a circulação via sistema porta. Com isso a bilirrubinemia aumenta a níveis que causam deposição do composto em tecidos. 

Diagnóstico da Icterícia Neonatal

O recém nascido deve ser avaliado nas primeiras 24 horas após o parto a fim de avaliá-lo para uma série de possíveis alterações que são concatenadas no exame físico do recém-nascido, resumido nesse texto aqui mesmo da Sanar. Entre elas deve-se avaliar a cor da pele e a bilirrubina transcutânea.

A avaliação transcutânea é uma forma não invasiva que de avaliar a presença de depósitos de bilirrubina.  Outro teste possível de ser realizado é a digitopressão da pele do recém-nascido, mas esse teste identifica icterícias com bilirrubinemia maior que 4 mg/dl e como depende da aparência da pele pode não se correlacionar de fora adequada aos níveis séricos de bilirrubinas.

No caso de qualquer um dos testes ser positivos para icterícia a dosagem de bilirrubinas deve ser realizada. Níveis a partir de 1,5 mg/dl já constituem hiperbilirrubinemia e deve-se no mesmo exame solicitar a diferenciação entre bilirrubina direta e indireta para facilitar a identificação da causa. 

Resumo: Icterícia Neonatal

A icterícia neonatal nas primeiras 24 horas de vida é sempre patológica. A aparência amarelada ou a positividade dos testes transcutâneos de bilirrubinas indicam exames laboratoriais complementares para que se identifique a causa da icterícia e que se possa instituir terapêutica adequada para a condição!

Autora: Annelise Oliveira

@anniemnese

Referências

Definições – http://www2.datasus.gov.br/cid10/V2008/WebHelp/definicoes.htm

Metabolismo da Bilirrubina e Icterícia – https://www.sanarmed.com/metabolismo-da-bilirrubina-e-ictericia-colunistas

Síndrome de Crigler-Najjar – https://liverfoundation.org/pt/for-patients/about-the-liver/diseases-of-the-liver/crigler-najjar-syndrome/

Neonatal Jaudice: aetiology, diagnosis and treatment – https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29240507/

Resumo: icterícia neonatal – Ligas – https://www.sanarmed.com/resumos-ictericia-neonatal

What are Jaundice and Kernicterus? – https://www.cdc.gov/ncbddd/jaundice/facts.html#:~:text=Kernicterus%20is%20a%20type%20of,sometimes%20can%20cause%20intellectual%20disabilities.


O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

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