Carreira em Medicina

Identificação e manejo de queimaduras no contexto da emergência

Identificação e manejo de queimaduras no contexto da emergência

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As queimaduras são uma causa relevante de morbidade e mortalidade no âmbito da emergência.

Esses dois fatores podem ser minimizados quando a equipe atendente realizam uma identificação e, assim, um manejo adequado do paciente grande queimado.

Diante disso, é de suma importância que o médico saiba conduzir esse tipo de atendimento, promovendo mais chances de bom prognóstico ao paciente vítima de queimaduras.

Complemente seu raciocínio entendendo melhor a fisiopatologia das lesões por queimaduras!

Antes de tudo: medidas imediatas para salvar a vida da vítima de queimaduras

Em primeiro lugar, é importante ter em mente três condutas imediatas e urgentes no paciente queimado:

  • Controle de vias aéreas;
  • Interrupção do processo de queimadura;
  • Obtenção de acessos venosos.

Vias aéreas na vítima de queimaduras

A preocupação com a perviedade das vias aéreas do paciente queimado se deve a possível formação de edema devido às queimaduras, colocando em risco a via aérea superior.

Por esse motivo, você deve avaliar os sinais iniciais de obstrução e se, a partir deles, é necessária a intubação endotraqueal.

Com isso em mente, fatores como uma lesão térmica profunda, e extensa, na cabeça, na face ou na boca, além de lesões inalatórias são alertas para que seja feito um controle da via aérea do paciente vítima de queimadura.

Identificando lesões inalatórias no doente queimado

A exposição ao calor coloca a via aérea superior em grande risco de obstrução.

Diante disso, alguns indicadores clínicos alertam para uma possível lesão por inalação, sendo eles a rouquidão, chamuscamento de cílios ou de vibrissas nasais. Outro alerta é o histórico de confinamento no local do incêndio.

Sendo assim, se o seu paciente apresentar qualquer um desses achados considere a intubação traqueal necessária. Além disso, tendo lesão por inalação, o paciente deve ser encaminhado para um centro de referência em queimaduras.

Interrompendo o processo de queimadura

Interromper o processo da lesão térmica não envolve apenas retirar o paciente da cena onde se encontra o foco da lesão térmica. Logo, outras condutas são importantes para que esse processo seja descontinuado.

Um exemplo disso é a remoção completa das roupas do paciente, que pode estar ainda queimando seu material e, assim, ainda queimando o paciente.

No entanto, uma exceção para essa conduta é caso as roupas estejam aderidas à pele, o que poderia agravar a lesão. Sendo esse o caso, é preferível que o paciente permaneça vestido.

Por outro lado, o único caso em que, mesmo havendo aderência, é necessário a sua retirada imediata, se dá na presença de pós químicos. Nesse caso, além de retirada as roupas, deve-se retirar cuidadosamente o pó da ferida através de uma escova e posteriormente lavar a ferida com água corrente.

Obtendo o acesso venoso no paciente queimado

Obter acesso venoso é uma conduta destinada aos pacientes com mais de 20% da superfície corporal queimada.

Para tanto, serão utilizados cateteres de grosso calibre (no mínimo 16G), sendo introduzido na veia periférica.

Muitas vezes, a extensão da queimadura pode gerar dificuldades na inserção do cateter. No entanto, isso não deve representar empecilho para acessar a veia do seu paciente através da pele queimada.

Ademais, é importante frisar que as flebites sépticas nas veias safenas são comuns em pacientes queimados. Esse fato torna as vias de acesso dos membros superiores preferíveis às dos membros inferiores.

Avaliação do doente vítima de queimaduras

História

A história que explica como circunstâncias que levaram a lesão ocorreram é muito importante para o devido tratamento do paciente queimado.

Pensando nisso, é importante alertar para as lesões associadas.

Isso por que é muito comum que, diante do paciente grande queimado, a equipe se distraia de outros possíveis focos traumáticos. Com isso, podem destinar os esforços da equipe atendente, direcionando as suspeitas de outras possíveis injúrias no momento do atendimento, como trauma.

Além disso, a história clínica colhida com o doente ou sua família, precisa conter informações sobre doenças preexistentes, como diabetes, hipertensão ou doença renal, por exemplo.

Outro ponto importante são possíveis intercorrências possíveis na história. No queimado, atente-se para o caso de haver incoerência entre a história clínica relatada e a extensão da queimadura.

Nesses casos, o médico e a equipe podem suspeitar de um possível abuso.

Área de superfície corporal queimada

Para o cálculo estimado da área corporal queimada do paciente, é utilizada a “Regra dos Nove”.

A partir dela, o corpo humano adulto é divido em regiões anatômicas, sendo cada uma representada por 9% ou seus múltiplos. Ademais, as palmas das mãos com os dedos representam 1% de sua superfície corporal.

Caso se trate de uma criança, a cabeça corresponde ao dobro do que no adulto.

Figura 1: Regra dos 9. Fonte: ATLS, 9ªed.

Quanto à profundidade das queimaduras, podem ser divididas em primeiro, segundo ou terceiro graus.

Assim sendo, as queimaduras de primeiro grau não oferecem risco à vida, podendo ser representadas por um queimadura solar típica. Suas características são o eritema e o ardor, porém, com a ausência de bolhas.

Já as queimaduras de segundo grau, contam com a presença de bolhas, bem como a aparência também avermelhada. Ela apresenta-se úmida e mais dolorosa que a de primeiro grau.

Figura 2: Exemplo de queimadura de terceiro grau. Disponível em: https://bit.ly/3J8qDMG.

Avaliação primária e manejo da vítima de queimaduras

Via aérea e ventilação

Como citado anteriormente, as vias aéreas do paciente queimado são uma das prioridades do seu atendimento.

Isso se deve pelas pioras sutis que o queimado ou mesmo o paciente com lesão inalatória após as primeiras 24h. Não havendo o cuidado necessário, o paciente pode evoluir a um edema suficiente para impedir uma intubação, restando uma via aérea cirúrgica.

Com isso em mente, a hipóxia pode ser uma evolução comum. Isso se deve às lesões inalatórias, mas especialmente às lesões no tórax que dificultam muito uma expansão torácica adequada. Por isso, deve-se administrar oxigênio suplementar com ou sem a intubação.

Circulação

Avaliar o volume de sangue circulante, bem como a pressão arterial, do paciente queimado é um grande desafio e pouco confiável.

Pensando nisso, uma medida mais segura de fazer isso é a monitorização horária do débito urinário. Assim, a sondagem vesical é obrigatória para esses pacientes.

Quanto à reposição volêmica do paciente queimado, as regras são: 2 a 4 mL/kg/porcentagem de superfície corporal queimada nas primeiras 24h. Em seguida, durante as primeiras 8h devem ser administrados a metade desse resultado matemático, sendo o restante administrado nas 16h seguintes.

Como exemplo, para facilitar o seu entendimento, temos:

Figura 3: Exemplo de administração de Ringer lactato no paciente vítima de queimadura.

Medidas auxiliares no manejo do paciente vitima de queimaduras

A transferência do paciente queimado é algo previsto no departamento de emergência. Por isso, é necessário preencher um documento descrevendo o que for administrado no paciente.

Outro ponto importante é que não são indicados o uso de antibióticos logo após as queimaduras, reservado para os tratamentos de infecção.

Outra medida que merece atenção é a checagem do estado de imunização do paciente, especialmente contra o tétano.

Perguntas frequentes

  1. O que é contraindicado no cuidado imediato das queimaduras?
    O mais comum e perigoso de ser feito no momento de uma queimadura é o uso do gelo. A ideia de que o gelo ameniza a queimadura é falsa e chega a piorar a extensão da área queimada.
  2. Qual é a maior preocupação com o paciente vítima de queimadura?
    A prioridade imediata do paciente com queimadura é a manutenção da via aérea.
  3. Quais outros cuidados o médico deve ter ao analisar a história clínica do paciente?
    O médico deve estar atento a lesões associadas, que podem ser subestimadas pela aparência, muitas vezes, chamativa e alarmante das queimaduras.

Referências

  1. Phillip L Rice, Jr, MDDennis P Orgill, MD, PhD. Emergency care of moderate and severe thermal burns in adults. UpToDate
  2. Lesões térmicas. Capítulo 9, ATLS, 9ªed.