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Ivermectina na COVID-19: ensaios clínicos no Brasil e no mundo!

Ivermectina na COVID-19: ensaios clínicos no Brasil e no mundo!

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Desde nossa primeira publicação sobre a Ivermectina, elucidamos de onde surgiu a ideia de utilizar esse medicamento no combate ao novo coronavírus. Desde então, o crescimento pela procura e os relatos de utilização da droga na prática clínica cresceram muito. Sabemos que tudo começou com o estudo australiano in vitro. Mas agora, há alguma evidência atual que possa confirmar a eficácia da Ivermectina na prática clínica? Quais são os estudos em curso utilizando a droga? Tentaremos responder à algumas destas questões neste post.

O estudo ICON: Ivermectina e COVID-19

O estudo ICON (Ivermectin in COvid Nineteen) é um preprint postado no dia 10 de Junho na plataforma medrxiv. Portanto, ressaltamos de antemão que seus resultados ainda passarão pelo processo de revisão por pares.

No entanto, devido aos resultados apresentados, achamos válido expô-los aqui.

Metodologia do estudo ICON

A pesquisa consistiu num estudo do tipo caso-controle, onde foram analisados dados de pacientes distribuídos em 4 hospitais da Flórida. Participaram do estudo 280 pacientes com infecção pelo SARS-CoV-2 confirmada.

Dentre esses, 173 haviam recebido tratamento com Ivermectina, e 107 haviam sido tratados de acordo com o protocolo padrão. Os pacientes foram então divididos em dois grupos, levando em conta o fato de terem recebido pelo menos uma dose de Ivermectina durante todo tempo de hospitalização.

Resultados

A análise univariada mostrou redução de mortalidade no grupo Ivermectina (15.0 % versus 25.2%, OR 0.52, IC 95% 0.29-0.96, p=.03).

A mortalidade também foi menor em 75 pacientes com doença pulmonar grave, tratados com Ivermectina (38.8% vs 80.7%, OR 0.15, IC 0.05-0.47, p=.001), no entanto não houve diferença estatística significativa nas taxas de extubação bem sucedidas (36.1% vs 15.4%, OR 3.11 (0.88-11.00), p=.07).

Após ajuste das diferenças entre os grupos e do risco de mortalidade, a diferença de mortalidade permaneceu significante para todo o grupo (OR 0.27, CI 0.09-0.85, p=.03; HR 0.37, CI 0.19-0.71, p=.03).

Muita calma nesta hora

Os resultados apresentados mostraram que uso da Ivermectina esteve associado à menor mortalidade durante tratamento da COVID-19. Todavia, reforçamos a natureza preliminar do artigo.

Além disso, trata-se de estudo de caso-controle, tipo de pesquisa que não está no topo das evidências, cuja natureza retrospectiva não permite excluir a possibilidade de fatores confundidores não mensurados.

Outra limitação importante foi o fato da maioria dos pacientes do grupo de casos terem recebido doses de hidroxicloroquina (HCQ) com ou sem azitromicina (AZT), o que não permite distinguir se os resultados foram melhores por conta do uso destes agentes.

Um outro pequeno estudo preprint em Bagdá mostrou resultados melhores no tempo de hospitalização entre pacientes recebendo Ivermectina além da HCQ + AZT, quando comparados com o grupo HCQ + AZT apenas.

A curta duração do estudo e o pequeno n amostral também se mostram como limitações. Sendo assim, é necessário ensaios clínicos randomizados para confirmação dos achados.

Estudo preprint apoiando ivermectina na Covid-19 é retirado do ar

Um estudo que teve bons resultados ao avaliar a eficácia e segurança da ivermectina¹ em pacientes com Covid-19 foi retirado do ar ontem, dia 15. O ensaio clínico estava publicado em preprint desde novembro, no site Research Square, que alegou “questões éticas” para remover o artigo.

Segundo os resultados do estudo, liderado pelo Dr. Ahmed Elgazzar da Benha University no Egito, os pacientes com Covid-19 tratados no hospital que tinham recebido ivermectina precocemente relataram recuperação substancial. Além disso, o artigo aponta que houve redução na taxa de mortalidade nos grupos com ivermectina em 90%.

O jornal The Guardian apurou as possibilidades para que o artigo fosse retirado do ar e encontrou informações de possível plágio no texto, dados inconsistentes e até registros de pacientes clonados. Os autores não se manifestaram sobre o tema.

O que a maior revista de ciência do mundo diz sobre?

No artigo da Nature Medicine, cientistas do Reino Unido, Austrália, Suécia e Estados Unidos destacaram, entre aqueles que foram publicados, dois estudos suspeitos, mas que chamaram bastante atenção sobre os possíveis efeitos da ivermectina contra a covid-19. Foram eles: um ensaio clínico feito no Egito, retirado da plataforma de preprints — estudos que ainda não foram avaliados por outros cientistas — em que foi disponibilizado; e o outro foi feito no Irã. Inclusive, os autores iranianos teriam se recusado a disponibilizar os dados dos pacientes incluídos na investigação.

Por mais evidente que seja o problema destes dois estudos sobre o uso de ivermectina contra a covid-19, os autores do novo artigo explicam que essa é apenas a ponta do iceberg. Segundo eles, existem inúmeros estudos em que, apenas um olhar mais atento nos dados, revela dados inconsistentes e que podem ser falsos.

Ensaios clínicos com Ivermectina no Brasil e no Mundo

Existem atualmente 32 estudos de testes em humanos com a Ivermectina registrados no site do governo americano clinicaltrial.gov. Todavia, nenhum deles possui ainda resultados disponíveis.

O país que lidera as pesquisas com a Ivermectina é o Egito, somando 9 estudos registrados. No Brasil, há três ensaios clínicos em andamento. São eles:

  • Universidade de São Carlos, participação de 64 pacientes.
  • Corpometria Institute, em Brasília, com 254 pacientes.
  • Instituto do Câncer no Estado de São Paulo, com 176 pacientes.

A Universidade Federal de Pernambuco, juntamente com a Santa Casa de Porto Alegre e a Universidade Federal do Rio de Janeiro, também lançaram projeto de pesquisa para investigação da ação da Ivermectina no tratamento da COVID-19.

Os estudos devem em breve fornecer resultados preliminares. Acompanhe o nosso site para ficar por dentro destes resultados.

Meta-análises e revisões sistemáticas

Algumas revisões sistemáticas indicam possível redução do tempo à resolução das manifestações clínicas da doença, redução dos níveis de marcadores inflamatórios, aceleração do clearance viral e menor taxa de mortalidade entre os pacientes que receberam ivermectina, quando comparado com outras drogas ou placebo. Porém, a maioria desses estudos apresentou informação incompleta dos estudos e dados dos pacientes, e limitações metodológicas significativas, o que dificultou a eliminação de causas comuns de bias. Essas limitações incluíram:

  • Tamanho amostral pequeno;
  • Várias doses e esquemas de uso de ivermectina;
  • Estudos randomizados sem uso de duplo cego;
  • Uso concomitantes de diversos medicamentos (ex. hidroxicloroquina, doxiciclina, azitromicina, zinco, corticoides e outros);
  • A gravidade do quadro de Covid-19 nos participantes dos estudos não foi devidamente descrita em vários dos estudos;
  • O desfecho clínico não foi detalhado. 

Algumas meta-análises sobre o uso anti-Covid-19 da ivermectina têm sido publicadas. Uma delas publicada em maio de 2021, reuniu 55 estudos, sendo que 100% dos 36 ensaios com uso profilático ou tratamento precoce, indicaram efeitos positivos da intervenção com ivermectina sustentados por significância estatística (Bryant et al., 2021; Roman et al., 2021; Wehbe et al., 2021). Bryant et al. (2021) conduziram uma revisão sistemática, meta-análise e análise sequencial de ensaios e incluíram 15 estudos clínicos. Observou-se a redução de risco de morte com ratio de 0,38 (Intervalo de confiança 0,19-0,73, n = 2.438, evidência moderada) em pacientes com Covid-19 em tratamento constituído de ivermectina, e redução de infecção por Covid-19 em cerca de 86% quando em uso de profilático da droga (evidência baixa). 

Cautela e uma nota da ANVISA

Assim como diversos outros medicamentos que surgiram durante esta pandemia, a Ivermectina vem sendo foco de muito debate e divide opiniões, até mesmo entre médicos.

Resta-nos aguardar os resultados dos estudos que estão sendo conduzidos ao redor do mundo. Por enquanto, nada se pode afirmar categoricamente a respeito de sua eficácia.

O uso disseminado, inclusive, levou a ANVISA a emitir nota oficial sobre o tema, afirmando:

“Nesse sentido, as indicações aprovadas para a ivermectina são aquelas constantes da bula do medicamento. Cabe ressaltar que o uso do medicamento para indicações não previstas na bula é de escolha e responsabilidade do médico prescritor.”

Um adendo: provável mecanismo de ação

Apesar do pensamento mecanicista nem sempre corresponder ao sucesso na prática clínica, acrescentamos aqui o provável mecanismo de ação da Ivermectina, proposto no artigo dos pesquisadores australianos.

De acordo com o artigo, a Ivermectina desestabilizaria a ligação das proteínas importinas (alfa/beta1) às proteínas do novo coronavírus, impedindo sua passagem através do complexo de poro nuclear da célula (NPC).

Como resultado, o vírus não mais conseguiria reduzir a resposta viral da célula hospedeira, o que permitiria adequada resposta celular antiviral contra o SARS-CoV-2. Veja o mecanismo esquematizado na figura abaixo:

Fonte: The FDA-approved drug ivermectin inhibits the replication of SARS-CoV-2 in vitro.

Confira o vídeo:

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Perguntas frequentes

  1. Ivermectina funciona para COVID-19?

Segundo as melhores evidências científicas atuais, não.

2. O que a maior revista de ciência do mundo diz sobre?

Deve-se ter cautela ao interpretar o resultado desses estudos.

3. Por que um grande estudo sobre o uso de ivermectina foi tirado do ar?

Inconsistências éticas no banco de dados.