Animais peçonhentos são animais que possuem estruturas especializadas (dentes, ferrões) capazes de inocular seus venenos, como cobras, escorpiões, aranhas, abelhas, lagartas, entre outros. Os acidentes ofídicos, escorpionismo, araneísmo e os acidentes com lagartas, são os acidentes mais comuns na prática médica, capazes de desencadear quadros moderados a graves. Têm importância médica significativa devido à sua grande frequência e gravidade.
Acidente ofídico é o envenenamento causado por toxinas presentes no veneno de serpentes peçonhentas, que exercem ação local e sistêmica, sendo responsáveis pelas manifestações clínicas. Como as serpentes ocupam quase todos os tipos de ambiente, tanto aquático como terrestre, os acidentes ofídicos apresentam elevada incidência, principalmente na zona rural.
3.1 Ações do veneno Proteolítica, coagulante e hemorrágica, as quais determinam o quadro clínico. São exuberantes e precoces, caracterizadas por dor e edema intensos, além de equimose no local da mordedura (pode ocorrer extensão ao longo do membro acometido). Os dois orifícios de inoculação das presas nem sempre são visíveis. Podem surgir lesões bolhosas com conteúdo sero-hemorrágico, podendo evoluir para áreas de necrose, infecção secundária, abscesso, gangrena e em casos mais graves, síndrome compartimental. Essas constituem as principais complicações locais, com indicação de intervenção cirúrgica (fasciotomia, desbridamento de tecidos desvitalizados, amputação) e consequente déficit funcional do membro.
Caracterizam-se por sangramentos devido à coagulopatia (gengivorragia, equimoses, hematúria, hematêmese, petéquias, entre outros), hipotensão por hipovolemia consequente a sangramento, sudorese, choque hipovolêmico, insuficiência renal aguda por ação direta do veneno, desidratação e hipovolemia.
Acidente leve: forma mais comum, caracterizada por dor e edema local discretos, manifestações hemorrágicas discretas ou ausentes, com ou sem alteração do tempo de coagulação (TC). • Acidente moderado: caracterizado por dor e edema evidentes que ultrapassam o segmento anatômico afetado, alterações hemorrágicas locais ou sistêmicas ausentes ou discretas, tempo de coagulação normal ou alterado.
É recomendado analisar o Tempo de Coagulação (TC) – importante para avaliar eficácia da soroterapia – hemograma, exame sumário de urina, eletrólitos, ureia e creatinina.
Observa-se ações neurotóxicas, miotóxicas e coagulantes. Essas são discretas e restritas ao local da mordedura.
São precoces e potencialmente graves. Incluem manifestações neuroparalíticas com progressão crânio-caudal, caracterizadas por ptose palpebral, fácies miastênica, turvação visual e oftalmoplegia, além de distúrbios de olfato e paladar, ptose mandibular, sialorreia e insuficiência respiratória aguda, pela ação neurotóxica do veneno, as quais são reversíveis.
• Leve: sinais e sintomas neurotóxicos ausentes ou tardios, sem mialgia ou alteração da cor da urina, ausência de oligúria. • Moderado: sinais e sintomas neurotóxicos discretos, de instalação precoce, mialgia discreta, alteração da cor da urina ausente ou discreta, sem oligúria.
Hemograma, ureia, creatinina, eletrólitos, creatinoquinase (CK), desidrogenase lática (LDH), aspartase-amino-transferase (AST), aspartase-alanino-transferase (ALT), TC, sedimento urinário.
Apresenta ações proteolíticas, coagulantes e hemorrágicas. As manifestações locais e sistêmicas são semelhantes às do Acidente Botrópico. Em casos graves de envenenamento podem ocorrer manifestações vagais (náuseas, vômitos, cólicas abdominais, diarreia, hipotensão e choque).
Apresenta ação neurotóxica e miotóxica. As manifestações locais são discretas. Os sinais e sintomas sistêmicos são decorrentes da ação neurotóxica do veneno: fraqueza muscular progressiva, ptose palpebral, fácies miastênica, mialgia difusa e dificuldade para deglutir.
A maioria causa apenas manifestações locais discretas (edema, dor e equimose).
• Manter elevado e estendido o membro afetado. • Analgesia e antibioticoterapia se evidência de infecção secundária. • Hidratação vigorosa: manter diurese entre 30 a 40 mL/hora no adulto, e 1 a 2 mL/kg/hora na criança. • Fasciotomia: se presença de síndrome compartimental, debridamento de áreas necrosadas e drenagem de abscessos.
Tem caráter predominantemente urbano. As manifestações locais e sistêmicas são decorrentes da ação de toxinas presentes no veneno, que atuam nas terminações nervosas pós-ganglionares. Esses acidentes atingem predominantemente os membros superiores. Sua importância está relacionada à grande frequência e à potencial gravidade, principalmente em crianças menores de 10 anos. Os acidentes predominam nos meses quentes e chuvosos e a maioria tem curso benigno.
Decorrente da liberação de catecolaminas e acetilcolina nas terminações nervosas, determinando manifestações orgânicas simpáticas ou parassimpáticas. A gravidade do quadro depende do volume de veneno inoculado, faixa etária e espécie envolvida. Crianças são mais suscetíveis a quadro sistêmico grave.
Dor intensa de instalação imediata, com extensão para o membro, associada à parestesia, eritema, edema e sudorese local.
São indicados em casos graves (repercussão sistêmica): • Exames laboratoriais: hemograma, eletrólitos, CPK, CK-MB, glicemia. • Eletrocardiograma: avaliar arritmias (taqui ou bradiarritmias). • Radiografia de tórax: avaliar sinais de congestão pulmonar
Sintomático , formas moderadas e graves;
Envenenamento causado por toxinas presentes no veneno de aranhas peçonhentas, desencadeando alterações locais e sistêmicas. Atinge principalmente adultos, de ambos os sexos, predominando em áreas urbanas. Ocorre preferencialmente em mãos e pés.
Corresponde à forma mais grave de araneísmo no Brasil. O veneno loxoscélico atua sobre membranas das células, principalmente do endotélio vascular e hemácias, resultando em intensa vasculite no local da picada, obstrução capilar, hemorragia e hemólise intravascular.
Quadro clínico indistinguível do escorpionismo.
A toxina do veneno atua sobre o sistema nervoso autônomo, levando à liberação de neurotransmissores adrenérgicos e colinérgicos, responsáveis pelo quadro clínico.
Hemograma, eletrólitos, função renal, coagulograma, sedimento urinário, bilirrubina total e frações, glicemia e ECG.
Para o tratamento sintomático realizar antissepsia local, compressa morna no local da picada, anestesia local ou troncular sem vasoconstritor (com lidocaína 2%), analgesia sistêmica e, nos casos de dor refratária, meperidina 50-100 mg por via intramuscular.
• Diazepan 5 a 10 mg para adultos, intravenoso, de 4 em 4 horas; Gluconato de cálcio 10% de 10 a 20 mL para adultos, intravenoso lentamente, de 4 em 4 horas; ou Clorpromazina: 25 a 50 mg para adultos, intravenoso, de 8 em 8 horas, se necessário. Observação por pelo menos 24 horas. • Soro antilatrodectus (SALatr): em casos graves, administrar 1 a 2 ampolas por via intramuscular.
Devido à potencial gravidade dos acidentes por animais peçonhentos, recomenda-se a observação mínima de 6 a 12 horas em todos os casos. A indicação de antiveneno deve ser criteriosa, para se evitar a administração desnecessária de soro nos casos de acidente sem envenenamento. Evidências clínicas e laboratoriais de envenenamento, indicam soroterapia intravenosa específica imediata, por se tratar de emergência médica. Diagnóstico e tratamento precoces influenciam favoravelmente a evolução e o prognóstico do acidente.
Paciente, 45 anos, masculino, trabalhador rural, previamente hígido, procura pronto atendimento referindo acidente ofídico causado por jararaca, em membro inferior direito, há cerca de seis horas. Refere dor intensa no local da mordedura, associada a eritema, edema intenso e calor local. Relata progressão do edema e surgimento de equimose local. Refere ainda gengivorragia discreta. Nega demais queixas. Diurese preservada. Nega doenças de base, uso de medicamentos e alergias. Refere tabagismo e etilismo.