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Manual de Clínica Médica

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4.6

LEPTOSPIROSE

A leptospirose é uma doença infecciosa febril aguda caracterizada por amplo espectro clínico, podendo apresentar quadros assintomáticos e oligossintomáticos, além de formas graves e fulminantes. É também conhecida como Doença de Weil, síndrome de Weil, febre dos pântanos, febre dos arrozais, febre outonal. Trata-se de uma zoonose de importância universal. No Brasil tem distribuição endêmica. Pode ocorrer durante todo o ano, com maior incidência nos períodos chuvosos, principalmente em grandes centros urbanos, devido às enchentes associadas à aglomeração populacional de baixa renda, condições inadequadas de saneamento e alta infestação de roedores infectados. As epidemias urbanas anuais estão relacionadas às condições precárias de moradia e trabalho. Os surtos, em geral, são decorrentes de desastres naturais de grande magnitude, pós enchentes e inundações.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA DA LEPTOSPIROSE

O agente etiológico é uma bactéria helicoidal (espiroqueta) aeróbica obrigatória, altamente móvel, com elevada capacidade de sobrevivência no meio ambiente. Pertence ao gênero Leptospira, sendo a espécie mais importante a L. interrogans. Existem mais de 200 sorotipos da L. interrogans, estando a virulência da doença correlacionada ao sorotipo

MODO DE TRANSMISSÃO DA LEPTOSPIROSE

A Leptospira é transmitida ao homem por meio do contato direto ou indireto com a urina de animais infectados (reservatórios).

QUADRO CLÍNICO DA LEPTOSPIROSE

Varia desde formas assintomáticas e subclínicas até quadros clínicos graves, com alta letalidade.

Fase precoce ou leptospirêmica

Essa fase corresponde a cerca de 85% das formas clínicas. Resultante da disseminação da leptospira pelo organismo, caracteriza-se pelo início súbito de febre, acompanhada de cefaleia, mialgia, anorexia, náuseas e vômitos, diarreia, artralgia, hiperemia ou hemorragia conjuntival, fotofobia, dor ocular e tosse. Podem ocorrer exantema, hepatomegalia, esplenomegalia e linfadenopatia (em menos de 20% dos casos).

Fase tardia ou fase imune da Lepstopirose

Essa fase ocorre após a primeira semana da doença. Caracterizada pelo início da produção de anticorpos específicos.

Síndrome de Weil

É uma manifestação clássica da forma grave, caracterizada pela tríade de icterícia, insuficiência renal e hemorragia, principalmente pulmonar. A icterícia rubínica (tonalidade alaranjada muito intensa), característica da síndrome, aparece entre o 3o e 7o dia de sintomas, sendo marcador de pior prognóstico.

Síndrome de hemorragia pulmonar

É uma complicação importante na fase tardia, decorrente de lesão pulmonar aguda e sangramento pulmonar maciço, caracterizada por tosse seca, dispneia, expectoração hemoptoica e, ocasionalmente, dor torácica e cianose. A hemoptise franca indica extrema gravidade e pode ocorrer de forma súbita, levando à insuficiência respiratória (síndrome da hemorragia pulmonar aguda e síndrome da angústia respiratória aguda – SARA) e a óbito, em poucas horas.

Insuficiência renal aguda

Essa situação pode ocorrer em até 40% dos pacientes, caracterizada por ser não oligúrica e hipocalêmica.

Outras complicações da forma grave da LEPTOSPIROSE

Outras complicações da forma grave são miocardite, arritmias, pancreatite, distúrbios neurológicos como confusão, delírio, alucinações e meningite asséptica. Mais raramente, pode-se observar encefalite, paralisias focais, espasticidade, nistagmo, convulsões, distúrbios visuais de origem central, neurite periférica, paralisia de nervos cranianos, radiculite

DIAGNÓSTICO DA LEPTOSPIROSE

O diagnóstico é clínico-epidemiológico – caso suspeito: indivíduo que apresenta febre de início súbito, mialgias e cefaleia, associados a um e mais dos seguintes sinais e sintomas: sufusão conjuntival ou conjuntivite, alterações do volume urinário (IRA), icterícia e fenômenos hemorrágicos.

Exames inespecíficos PARA IDENTIFICAR A LEPTOSPIROSE

Em fase precoce, ocorre o isolamento da bactéria através de exame direto, cultura para Leptospira em sangue e detecção do DNA pela técnica da reação em cadeia da polimerase.

Exames específicos PARA IDENTIFICAR A LEPTOSPIROSE

Como exames inespecíficos temos hemograma (anemia, plaquetopenia, leucocitose com desvio à esquerda), ureia e creatinina (elevados), bilirrubina total (elevada com predomínio da fração direta), potássio (normal ou dimunuído), CPK (elevada – lesão muscular grave), AST, ALT (normais ou com aumento de três a cinco vezes o valor da referência), Gama-GT e fosfatase alcalina (normais ou elevadas), radiografia de tórax (infiltrado alveolar ou lobar, bilateral ou unilateral, congestão e SARA), ECG (fibrilação atrial, bloqueio atrioventricular e alteração da repolarização ventricular) e gasometria arterial (acidose metabólica, hipoxemia).

DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS DA LEPTOSPIROSE

Em fase precoce: dengue, síndrome gripal, malária, febre maculosa, doença de Chagas aguda, toxoplasmose aguda, febre tifoide, entre outras. Em fase tardia: hepatites virais agudas, hantavirose, febre amarela, malária grave, dengue grave, endocardite, febre maculosa, doença de Chagas aguda, pneumonias, pielonefrite, sepse, meningites, abdome agudo.

TRATAMENTO DA LEPTOSPIROSE

O tratamento deve contemplar: • Hospitalização imediata dos casos com sinais de alerta, visando evitar complicações e diminuir a letalidade. • Coleta de amostras para realização de exames diagnósticos. • Terapia de suporte precoce: sintomáticos, reposição volêmica adequada e cautelosa. • Antibioticoterapia precoce: indicada em qualquer fase da doença, porém, é mais eficaz na primeira semana do início dos sintomas. • Monitorização de complicações (IRA, hemorragia pulmonar)

CONCLUSÕES SOBRE A LEPTOSPIROSE

A Leptospirose é um importante problema de saúde pública no Brasil, apresentando caráter endêmico, com aumento da incidência no verão. Trata-se de uma doença com alto potencial de gravidade, sendo a letalidade em torno de 10%. Já nas formas graves da doença, a letalidade chega a 50%

CASO CLÍNICO DE LEPTOSPIROSE

Paciente, 45 anos, sexo masculino, gari, previamente hígido, refere que há cerca de 8 dias teve início súbito de febre, cefaleia, astenia, prostração, náuseas e mialgia mais acentuada em panturrilhas, evoluindo com vômitos frequentes e icterícia. Refere ainda tosse, dispneia e hemoptise, além de anúria há dois dias. Relata contato físico com área alagada há cerca de 20 dias. Nega doenças pré-existentes, uso de medicamentos, alergias. Tabagista há 25 anos. Etilista social.

Prescrição

Dieta zero até segunda ordem. • Soro fisiológico 0,9% 500 mL IV em bolus. • Ceftriaxone 2 g IV ao dia. • Se persiste PAM < 60 ou PA < 90x60 mmHg: Noradrenalina 4 ampolas em 234 mL de soro glicosado 5% IV em infusão contínua.

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