Emergências psiquiátricas constituem um conjunto de situações que conferem risco ao paciente e a terceiros, e são desencadeadas pela agudização de um transtorno psiquiátrico preexistente ou por reações agudas ao estresse. Seguem as principais emergências psiquiátricas atendidas nos serviços de pronto-atendimento médico.
A abstinência alcoólica é uma das mais prevalentes entidades dentre as emergências psiquiátricas, e deve ser entendida dentro do contexto do abuso e dependência de etanol. Caracteriza-se por uma série de sinais e sintomas desencadeados a partir da cessação ou redução do uso crônico daquela substância.
O uso crônico do etanol leva a alterações no número e na função de certos neurotransmissores no sistema nervoso central (SNC) em resposta aos efeitos depressores da substância. Há uma diminuição nos receptores gabaérgicos e um aumento nos glutamatérgicos. Devido a esse processo adaptativo, a suspensão do uso crônico leva um estado de hiperexcitabilidade do SNC por hipoatividade gabaérgica e hiperatividade glutamatérgica
A síndrome cursa com sintomas que surgem em média de 5 a 10 horas após a última ingesta, tem seu pico entre 48 e 72 horas, e desaparecem por volta de 5 a 14 dias. São sintomas da abstinência: sudorese; taquicardia; hipertensão sistólica;
O diagnóstico é clínico. Mas devemos lembrar que, na maioria das vezes, a interrupção do uso do etanol deu-se por alguma outra complicação médica que impediu o usuário de ingerir ou de ter acesso à substância, como vômitos, dor abdominal, sepse, trauma cranioencefálico ou um acidente vascular cerebral (AVC). Portanto, alguns exames complementares podem ser solicitados à suspeita na coleta da história e ao exame físico, tais como: hemograma; glicemia; função renal; eletrólitos; enzimas e função hepática; amilase; lipase; sumário de urina; eletrocardiograma (ECG); radiografia de tórax e tomografia computadorizada (TC) de crânio
Hipoglicemia; intoxicações agudas; infecções do SNC; transtornos psiquiátricos primários; síndrome neuroléptica maligna e síndromes hipertérmicas
1. Suporte clínico: diz respeito à hidratação, à correção de possíveis distúrbios eletrolíticos, e a outras possíveis complicações associadas, como hipóxia, infecções; 2. Prevenção da síndrome de Wernicke-Korsakoff: tiamina, via oral (VO) (300 a 600 mg/dia), ou parenteral (intramuscular (IM) ou intravenosa (IV), 100 a 200 mg/dia); 3. Controle dos sintomas de abstinência, e redução de convulsões e delirium tremens: os benzodiazepínicos são as drogas de escolha, de preferência diazepam ou lorazepam
INTRODUÇÃO A intoxicação aguda por cocaína (e análogos, como o crack) é uma das principais emergências em psiquiatria dos dias atuais. Ao lado de outras substâncias, como as anfetaminas e a efedrina, têm a capacidade de serem análogos das principais catecolaminas do SNC e do sistema nervoso simpático, o que leva à toda sintomatologia do quadro.
Independente da via de intoxicação, tais substâncias estimulam a liberação e inibem a recaptação, tanto no SNC, como nas terminações sinápticas, de neurotransmissores, como noradrenalina e dopamina.
Náuseas, vômitos; cefaleia; palpitações; ansiedade; sudorese; midríase; dor torácica; agitação psicomotora; delirium; fasciculações; hiperventilação; tremores; convulsões e coma. O uso crônico leva a uma deterioração neuropsicocomportamental, que pode ocasionar quadros psicóticos.
O diagnóstico deve ser baseado em uma boa história clínica e exame físico. Exames complementares que podem ser pedidos: ECG – que pode mostrar taquiarritmias, alterações da repolarização e do segmento ST, e distúrbios de condução; radiografia de tórax – pode mostrar aumento da área cardíaca, congestão, e edema pulmonar cardiogênico; screening qualitativo na urina; e, TC de crânio – para pacientes com alterações neurológicas persistentes.
Hipertermia maligna; feocromocitoma; hipertireoidismo; síndromes de abstinência; síndrome serotoninérgica e transtornos psiquiátricos primários
1. Suporte clínico: hidratação e correção de possíveis distúrbios eletrolíticos; 2. Benzodiazepínicos são agentes de escolha para a ansiedade, agitação e convulsões, bem como para a instabilidade hemodinâmica; 3. Podem ser associados com:
INTRODUÇÃO É o estado de agitação psíquica e física, hiper-reatividade e agressividade física ou verbal, podendo ser causada por inúmeras razões, desde quadros de hipóxia, álgicos, intoxicações agudas, até transtornos neurológicos ou psiquiátricos primários. Demanda pronta identificação do potencial de agressividade, e restrição física, se necessária.
Inquietação, movimentação excessiva, hiper-reatividade a estímulos externos, e, por vezes, agressividade verbal e física.
Uma boa história clínica deve ser colhida, de preferência com o acompanhante, investigando antecedentes pessoais e familiares de transtornos psiquiátricos. Após isso, um exame físico e neurológico deverão ser feitos, e alguns exames complementares podem ser solicitados, como gasometria arterial, TC de crânio, EEG e screening urinário de substâncias psicoativas, para afastarem causas orgânicas
Surto psicótico em paciente portador de transtorno psicótico – por exemplo esquizofrenia; episódio de mania ou misto (transtorno bipolar); transtorno de ansiedade/síndrome do pânico; transtornos conversivos-dissociativos; transtornos de personalidade (borderline, antissocial); reação aguda ao estresse; oligofrenia; abstinência alcoólica ou de outras substâncias psicoativas; intoxicação aguda por substâncias psicoativas; demência; delirium; hipoglicemia; hiperglicemia; hipertireoidismo; encefalopatia hepática; encefalopatia urêmica; epilepsia; traumatismo cranioencefálico (TCE); quadros álgicos ou que cursem com hipóxia.
Surtos psicóticos, episódios de mania ou mistos: tratamento de escolha são neurolépticos, VO, quando possível, e parenteral se necessária restrição física – haloperidol, 5 mg, 1 a 4x/dia (máximo 40 mg/dia); clorpromazina, 100 mg, 1 a 4x/dia (máximo 600 mg/dia); risperidona, 2 mg, 1 a 3x/dia (máximo 6 mg/dia), olanzapina, 10 mg, 1 a 3x/dia (máximo 30 mg/dia)
INTRODUÇÃO Trata-se de um complexo quadro motor e comportamental presente em diversas entidades clínicas, caracterizado principalmente por extrema hipoatividade/ lentificação motora
Diversas entidades clínicas não psiquiátricas podem causar um quadro catatônico: neoplasias cerebrais; epilepsias não convulsivas; traumatismo craniano; AVC; encefalites; hipercalcemia; encefalopatia hepática; homocistinúria; cetoacidose diabética; doenças autoimunes e intoxicações agudas. Dentre os transtornos psiquiátricos primários, temos, principalmente, transtornos psicóticos – como a esquizofrenia catatônica, e transtornos do humor – como quadros depressivos maiores, mas também transtornos conversivos-dissociativos e transtorno obsessivo-compulsivo.
Hipoatividade/lentificação motora – ou até imobilidade, mutismo, negativismo, ecolalia, ecopraxia e desenvolvimento de posturas bizarras.
O diagnóstico das catatonias constituintes de transtornos psiquiátricos primários é de exclusão. Pode-se afastar outras causas a partir de uma boa história clínica e exame físico minucioso, além da solicitação de exames como eletroencefalograma (EEG); TC ou ressonância magnética (RNM) de crânio; exame de líquor; glicemia; eletrólitos; função hepática; screening urinário para substâncias psicoativas, dentre outros.
Distonia aguda induzida por neurolépticos, demências, coma, narcolepsia, transtorno factício.
1. Suporte e tratamento das complicações clínicas; 2. Lorazepam, 8 a 24 mg/dia, IV, por 5 a 7 dias; 3. Em casos graves ou refratários, indica-se a eletroconvulsioterapia (ECT).
INTRODUÇÃO A síndrome neuroléptica maligna (SNM) é uma emergência psiquiátrica associada ao uso de fármacos neurolépticos (ou antipsicóticos), principalmente os ditos “típicos”, e caracterizada pela tétrade alteração da consciência, febre alta, rigidez muscular e instabilidade autonômica.
A associação com o uso de antipsicóticos é obrigatória, podendo ocorrer com uma dose, ou após anos de uso da medicação. Comumente relacionada com antipsicóticos típicos, sendo o haloperidol o representante mais comum; mas também pode ocorrer com antipsicóticos atípicos, como a risperidona.
Febre alta, rigidez muscular grave; sialorreia; trismo; distonias; tremores; confusão mental; delirium; hipertensão arterial e taquicardia. A evolução dos sintomas ocorre em 3 a 7 dias
O diagnóstico é clínico, devendo-se avaliar, inicialmente, o nível de consciência; pressão arterial; frequência cardíaca; hidratação; hipertermia e diurese. A principal alteração laboratorial é a elevação da CPK acima de 1.000 UI/L. Leucocitose, elevação das transaminases hepáticas, mioglubinúria, hipocalcemia e hipomagnesemia são frequentes, mas não são específicas
Meningites, encefalites, infecções sistêmicas, AVC, disautonomias causadas por outras medicações, síndrome serotoninérgica.
1. Suspensão do antipsicótico; 2. Hidratação vigorosa;
INTRODUÇÃO A síndrome serotoninérgica (SS) é uma condição clínica potencialmente fatal associada ao aumento da atividade serotoninérgica no SNC, e pode ocorrer a partir da interação entre drogas que aumentem os níveis desse neurotransmissor no encéfalo ou por intoxicação por drogas serotoninérgicas.
Comumente desencadeada pela associação entre inibidores da monoaminoxidase (IMAOS) e inibidores da recaptação da serotonina (seletivos ou não), mas também pode ocorrer com interações entre estes e antidepressivos tricíclicos, antiparkinsonianos e lítio.
Mioclonias; clonias (inclusive oculares); tremores; hiperreflexia; agitação; diaforese; alterações do nível de consciência; febre alta (> 38 °C); hipertensão; taquicardia; vômitos e diarreia.
O diagnóstico é eminentemente clínico, devendo ter havido história pregressa de uso de agentes serotoninérgicos. A evolução dos sintomas se dá de forma abrupta, geralmente dentro de 24 horas.
SNM; síndrome anticolinérgica; infecções do SNC; abstinência alcoólica; abstinência a benzodiazepínicos; intoxicação com simpaticomiméticos; toxicidade do lítio e insolação.
1. Descontinuação dos agentes serotoninérgicos – na maioria dos casos, a síndrome se resolve em até 24 horas da adoção desta medida; 2. Suporte clínico até normalização de sinais vitais; 3. Benzodiazepínico, se agitação motora; 4. Ciproeptadina, 12 mg/dia