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O avanço da infecção por HIV/AIDS em idosos | Colunistas

O avanço da infecção por HIV/AIDS em idosos | Colunistas

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Imagem de perfil de Comunidade Sanar

O padrão epidemiológico da infecção por HIV passou por mudanças ao longo das décadas. Nos últimos anos observou-se o aumento na população idosa devido a fatores como estigma social, falta de políticas públicas direcionadas e esclarecimento sobre a doença. Notou-se que os idosos apresentam comportamento de risco para a infecção e carecem de cuidados e não devem ser negligenciados.

Epidemiologia ao longo das décadas

Depois do contágio do primeiro ser humano pelo HIV (até então um retrovírus desconhecido) em meados da década de 1920 na África, a infecção pelo vírus foi pouco estudada, o que propiciou a sua disseminação inicialmente pelo continente africano e posteriormente por todo o globo.

No final da década de 1970 e início da década de 1980, homossexuais no continente americano começam a desenvolver a uma doença ainda de causa desconhecida que viria a ser chamada de AIDS (Síndrome de Imunodeficiência Adquirida – SIDA em português), criando um grande estigma e preconceito com essa população. Durante esse período a doença ficou conhecida como GRID (Gay-Related Immunodeficiency Disease) e chegou a ser chamada no Brasil como “Peste Gay”.

Já a partir da década de 1990, a doença começou a avançar nas demais populações. Observou-se um aumento do diagnóstico em heterossexuais e jovens, mas também em idosos e foram notificadas as transmissões verticais. 

Durante muitos anos a transmissão por transfusão sanguínea foi muito relevante, contudo, atualmente, a transmissão ocorre basicamente por via sexual ou por acidentes de trabalho que envolvam materiais cortantes e exsanguinação, com exceção da transmissão vertical (principal forma de contágio em menores de 13 anos de vida).

Vida sexual dos idosos

A vida sexual ativa da população tem se estendido ao longo dos anos. O aumento da expectativa e qualidade de vida têm se mostrado relevantes, mas é de suma importância a  acessibilidade a medicamentos que potencializam e viabilizam a prática sexual nessa população. 

Entretanto, foi observado que os idosos são menos adeptos à hábitos de proteção à transmissão de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), seja por desconhecimento dos riscos ou por negligência.

A adesão ao uso de preservativos por idosos é baixa, visto que muitos deles acreditam que os preservativos servem unicamente como método anticoncepcional, além de que muitos já estão num relacionamento de vários anos e confiam inteiramente no parceiro, configurando também um comportamento de risco.

Preconceito e políticas públicas

Apesar do Brasil manter um dos maiores programas de prevenção e tratamento da AIDS no mundo, a abordagem dos idosos sobre o assunto sempre foi muito escassa. A sexualidade na terceira idade ainda é um tabu, de modo que muitos atribuem os idosos a um grau de assexualidade.

Sendo assim, essa parcela da população se mantém mal-assistida e mal-informada.

Somado a isso, tem-se que o diagnóstico de HIV implica num sofrimento psicológico e num peso social muito grande que pode ser ainda mais difícil de conviver durante a terceira idade devido ao preconceito já enraizado sobre a doença.

O aumento em números

Diversas pesquisas têm buscado demonstrar a importância da abordagem da doença nessa população através do crescimento do número de diagnósticos.

Em uma pesquisa, observou-se um padrão de aumento considerável de idosos com HIV no estado do Pará no período de 2007 a 2018. Fenômeno semelhante ao observado num outro estudo entre 2008 a 2018 no estado do Piauí.

A mortalidade por AIDS em pacientes acima de 60 anos no Brasil saltou de 461 para cada 100.000 habitantes em 2008 para 979:100.000 habitantes em homens em 2018 e de 250:100.000 habitantes para 465:100.000 em 2018 em mulheres.

Conclusão

A população idosa carece de cuidados e políticas públicas direcionadas à Infecções Sexualmente Ativas, sobretudo a infecção pelo HIV. Como resultado dessa carência e também do estigma social envolvido à sexualidade dos idosos, o que tem se observado é o aumento da doença nessa população.

Autor: Víctor Miranda Lucas

Instagram: @victormirandalucas


O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

Novidade: temos colunas sendo produzidas por Experts da Sanar, médicos conceituados em suas áreas de atuação e coordenadores da Sanar Pós.


Referências:

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