Carreira em Medicina

O futuro da medicina como a conhecemos | Colunistas

O futuro da medicina como a conhecemos | Colunistas

Compartilhar
Imagem de perfil de Comunidade Sanar

A medicina envolve o campo da prevenção, intervenção e cura. Inclui uma ampla equipe multiprofissional composta de enfermeiros, médicos e vários especialistas, abrangendo diagnóstico, tratamento e prevenção de doenças, pesquisas médicas e muitos outros aspectos da saúde. Como qualquer outra área do conhecimento, a medicina também está sujeita a mudanças. Desde seu surgimento, na Grécia antiga, até os dias atuais, passando por centenas de gerações de profissionais, inúmeras foram as vezes em que foi preciso rediscutir alguns paradigmas que, antes inquestionáveis, não estavam mais adequados ao contexto em que se encontravam.

Por meio deste artigo, iremos te levar a uma reflexão sobre os rumos que a medicina vem tomando. Discutiremos sobre como a arte da cura sofreu e vem sofrendo mudanças que abalam seus alicerces, e, também, como a tecnologia reserva um futuro volátil na área de saúde. Relacionando esse evento ao contexto de pandemia mundial, a tecnologia, por mais que permita levar um atendimento seguro para além das fronteiras físicas, por outro lado, tem gerado um distanciamento na relação médico-paciente, ferindo os princípios históricos da medicina. Nada deveria ofuscar o espaço da figura central do atendimento: o paciente.

A medicina através dos tempos

É na nossa história onde podemos avaliar os processos de progressos da civilização. Olhando para trás, também avaliamos os seres humanos de forma coletiva e individualizada. Aprender sobre o passado significa pensar no futuro, sem deixar de lado todas as mudanças que aconteceram.

Então, quando começou a prática da medicina? E quem foram os primeiros médicos? Embora não haja respostas diretas para essas perguntas, há evidências em sociedades primitivas de que “tratamentos” foram tentados para doenças comuns, embora muitas vezes superstições e crenças religiosas se misturassem a elas. Sabemos que desde os tempos egípcios antigos (por volta de 3.000 a.C.), havia “médicos” e, neste contexto, o médico Imhotep (por volta de 2.600 a.C.) produziu uma obra escrita narrando mais de 200 condições médicas diferentes.

Hipócrates (nascido em 460 a.C.) é amplamente considerado o pai da medicina moderna. Uma de suas grandes contribuições para o avanço do campo foi a compreensão do fato de que as doenças podem ter causas naturais (em vez de sobrenaturais). Também de enorme significado, foi seu juramento de conduta para médicos, que ainda é usado em todo o mundo hoje. Médicos famosos do mundo romano incluem Galeno, que dissecou macacos e foi capaz de extrapolar as descobertas para o corpo humano, embora com sucesso limitado. Os avanços na saúde pública também foram importantes durante este período, incluindo alguns dos primeiros sistemas de esgoto.

No entanto, o próprio termo ‘médico’ não surgiu até o século XIV na Grã-Bretanha e era normalmente usado para se referir a teólogos e aqueles que podiam ‘ensinar’. Leonardo da Vinci, trabalhando no século XV, contribuiu muito para a nossa compreensão da anatomia humana, com esboços detalhados produzidos após dissecação cuidadosa de cadáveres humanos. Uma descoberta importante, no século XVII, foi feita pelo conhecido médico William Harvey, que o coração bombeia o sangue pelo corpo. A ideia dos quatro humores no corpo, sangue, catarro, bile amarela e bile negra, ainda predominava, no entanto, com muitas doenças atribuídas a um desequilíbrio nestes.

Seguindo em frente, o século XIX viu muitos avanços, embora até os dias atuais muitas práticas comuns da época pareçam bárbaras. Esta foi a época dos primeiros usos dos anestésicos, da “teoria dos germes das doenças”, das primeiras vacinas e, também, da primeira mulher a receber um diploma de medicina. Logo na virada do século passado, grupos sanguíneos foram identificados, abrindo a onda para melhorias na transfusão. A introdução de vacinas para doenças como difteria, tuberculose e, de maneira vital, o desenvolvimento de antibióticos, revolucionaram a medicina. Com a diminuição das condições que antes dizimavam as populações, veio o aumento de doenças mais enraizadas no estilo de vida, como a diabetes, problemas cardíacos e câncer.

O desenvolvimento da telemedicina

Em 11 de março de 2020, a COVID-19 foi declarada pandemia pela Organização Mundial da Saúde, mudando radicalmente a forma como a medicina é praticada. No espaço de algumas semanas, quando a quarentena e o distanciamento social se tornaram a norma, as visitas médicas pessoais despencaram, de repente empurrando a telemedicina das asas da assistência médica para o centro do palco.

A pandemia expôs um enorme problema de saúde pública, mas o maior problema não era que os pacientes com COVID-19 não pudessem receber atendimento, era que as pessoas sem a doença não podiam acessar seus cuidados normais.

Telemedicina é um termo geral que se refere à prestação de assistência médica a distância por meio da tecnologia de telecomunicações. A telemedicina síncrona é realizada em tempo real, como uma chamada de vídeo entre um paciente e um provedor. Essa ferramenta oferece muitas vantagens em relação à visita tradicional ao médico, cara a cara. Na era do COVID-19, a telemedicina melhora a segurança de pacientes e fornecedores. Pode, também, oferecer melhor confidencialidade para pacientes que podem não querer ser atendidos em uma clínica e oferece aos familiares espalhados pelo mundo a oportunidade de participar dos cuidados de seus entes queridos.

Aplicativos, sites e celulares

Com o crescimento da internet, o paciente tem cada vez mais acesso à informação. O conhecimento, que até bem pouco tempo atrás era restrito às salas de universidade e à necessidade de um diploma, vem se tornando cada vez mais democrático e acessível. Se, por um lado, isso traz inúmeros benefícios ao paciente, que não precisa mais estar atado às ordens dadas pelo médico, por outro, traz diversos riscos à sua saúde. Um exemplo disso é a automedicação, com riscos potenciais que incluem: auto diagnóstico incorreto, demora na busca de aconselhamento médico, quando necessário, reações adversas infrequentes, porém graves, e interações medicamentosas perigosas. Muitas vezes o paciente passa a ter uma falsa sensação de conhecimento, algo que deve ser amplamente discutido e inserido à realidade da relação médico-paciente.

Entretanto, a tecnologia também pode trazer inúmeros benefícios tanto à vida do profissional que atende, como do paciente que é atendido. No futuro, a relação médico-paciente poderia ser sintetizada na frase final de um médico ao encerrar uma consulta: “Abra este site que ele vai te ajudar a entender melhor o seu problema e instale este app no celular para te ajudar no tratamento”.

Ademais, aplicativos e sites inovadores, como o caso do “Sanar Residência Médica”, produzidos pela editora SANAR, possibilitam que o médico em formação tenha um amplo acesso a vastas áreas do conhecimento médico. Esse fato, além de facilitar o processo de formação acadêmica, possibilita que ele aprenda por meios diferentes que a faculdade, promove a formação de profissionais muito mais preparados, capacitados e com empatia para guiar a medicina por um futuro que ainda está sendo descoberto.

Cirurgias cada vez menos invasivas

Na cirurgia minimamente invasiva, os médicos evitam fazer uma grande incisão e abrir o corpo do paciente. Em vez disso, eles fazem uma série de pequenas incisões e, em seguida, inserem uma série de tubos finos contendo vários dispositivos, incluindo instrumentos cirúrgicos superfinos e câmeras em miniaturas, que permitem visualizar o que estão fazendo. Em algumas operações, o cirurgião manipula os tubos com braços robóticos ao invés de suas próprias mãos, o que permite maior precisão e elimina o risco de um tremor, que poderia causar um erro.

Embora a ideia de operar de maneira delicada pareça alta tecnologia, é uma ideia que remonta à década de 1850, quando os médicos começaram a fazer experiências com a endoscopia, ou seja, instrumentos que permitem olhar para dentro do corpo durante a cirurgia. Mas foi só no início dos anos 1980 que os avanços na eletrônica tornaram possíveis o uso de pequenas câmeras de vídeo que podiam ser inseridas em um paciente para orientar a cirurgia, trazendo assim uma luz mais brilhante para as cavernas do corpo.

A cirurgia minimamente invasiva tem vantagens sobre a cirurgia aberta convencional. Os pacientes sentem menos dor pós-operatória e se recuperam mais rápido, uma vez que não têm tantos danos nos tecidos para curar. Também é provável que produza melhores resultados, uma vez que os cirurgiões podem ampliar e iluminar a área que estão cortando de forma mais eficaz do que com métodos antigos.

Em um futuro próximo, com a popularização e democratização das técnicas de videolaparoscopia, a cirurgia, como conhecemos hoje, sofrerá uma drástica mudança. Enquanto isso, novas técnicas, como a laparoscopia de incisão única e a cirurgia endoscópica transluminal com orifício natural (NOTES), em que um tubo é passado por um orifício natural para evitar qualquer incisão, prometem tornar os procedimentos ainda mais suaves. À medida que os aparelhos se tornam cada vez menores, alguns até ousam imaginar um tempo em que a cirurgia aberta ficará completamente obsoleta.

Conclusão

Prestigiado, cultural e socialmente, o médico traz em si grande responsabilidade sob seu jaleco. Cabe a ele usar de seu conhecimento para favorecer o melhor tratamento ao seu paciente. Nesse contexto, a tecnologia deve sempre ser utilizada como um complemento de suas técnicas. Aplicativos, cirurgias cada vez menos invasivas e o advento da telemedicina são avanços singulares propiciados por uma democratização do conhecimento em moldes que nunca foram antes vistos.

Assim como em todas as áreas da ciência, a medicina também está sujeita a sofrer mudanças drásticas ao longo dos anos. Aprender sobre o passado é também olhar para o futuro. Considerando que a empatia pode enriquecer a prática médica, é fundamental que nos mantenhamos sempre atualizados e estudando, para que um dia não nos tornemos obsoletos em face do futuro que, a cada dia, vem se tornando mais presente. Afinal de contas, como disse Augusto Cury em seu livro O futuro da Humanidade, “Somos garotos brincando de ciência no teatro da existência”.



O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

Novidade: temos colunas sendo produzidas por Experts da Sanar, médicos conceituados em suas áreas de atuação e coordenadores da Sanar Pós.


Referências:

Minimally Invasive Surgery FAQ – http://www.ucihealth.org/medical-services/surgery/minimally-invasive-surgery/faq

History of Medicine – https://ghsm.hms.harvard.edu/research/history-medicine

Prevalence of self-medication in Brazil and associated factors – https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/27982373/

How new technologies and ancient remedies are transforming health care – https://www.nationalgeographic.com/magazine/2019/01/