Alergologia e imunologia

O que todo médico deve saber sobre a vacina da influenza?

O que todo médico deve saber sobre a vacina da influenza?

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A Dr. e colunista Maitê Dahdal reuniu tudo que você precisa saber sobre a vacina da influenza. Aproveite a leitura!

Independente da nossa especialidade, é importante estar preparado(a) para responder questionamentos sobre a vacina da influenza. As dúvidas mais comuns na prática médica são: quem pode tomar a vacina, se pode ou não tomar junto com a da covid-19 e qual a eficácia da vacina.

Por isso, reuni nesse texto tudo que os profissionais de medicina precisam saber sobre a vacina da gripe com base nas evidências científicas atuais, nos materiais da ANVISA, Ministério da Saúde e Sociedade Brasileira de Imunização.

Cenário atual 

A organização mundial de saúde (OMS) estima que todos os anos 5-10% da população mundial seja infectada pelo vírus da influenza. Sabemos que pessoas de todas as idades estão suscetíveis a se contaminar pelo vírus, porém alguns grupos em especial são mais propensos a desenvolver as formas graves da doença.

Além do prejuízo à saúde individual e coletiva, a gripe causa prejuízos bilionários na economia, devidos aos custos com hospitalização, perda de qualidade de vida e absenteísmo no trabalho. Pela magnitude e transcendência da doença, anualmente acontece uma campanha nacional de vacinação contra a influenza.

A primeira campanha teve início em 1999 com o objetivo de reduzir internações, complicações e óbitos na população alvo. De 1999 para cá, o Brasil tem aplicado de forma crescente milhões de doses da vacina. Até que em 2021, infelizmente, tivemos pela primeira vez um decréscimo importante na taxa de vacinados O  que contribuiu para a epidemia extra temporal da doença no final do ano de 2021.

Em 2022, apenas 68% do público alvo foi imunizado contra a gripe. Para reverter esse cenário, a meta é vacinar 90% do grupo prioritário em 2023.

Quem é a população alvo da vacina da influenza?

Os grupos populacionais com maiores riscos de desenvolverem formas graves da doença são a população alvo da vacina. Com base na recomendação da OMS, são eles: 

  • Profissionais de saúde
  • Idosos
  • Crianças de 6 meses a 5 anos de idade
  • Gestantes
  • Portadores de doenças crônicas

No brasil temos uma ampliação dessa população alvo recomendada pela OMS, que contempla também:

  • Crianças de 6 meses a menores de 5 anos
  • Gestantes e puérperas
  • Povos indígenas
  • Trabalhadores da saúde
  • Idosos com 60 anos ou mais
  • Professores de escolas públicas ou privadas
  • Pessoas portadoras de doenças crônicas não transmissíveis e outras condições clínicas especiais
  • Pessoas com deficiência permanente
  • Profissionais das forças de segurança e forças armadas
  • Caminhoneiros
  • Trabalhadores do transporte coletivo rodoviário
  • Trabalhadores portuários
  • Funcionários do sistema prisional
  • Adolescentes e jovens de 12 a 21 anos sob medidas socioeducativas
  • População privada de liberdade

O público alvo representa cerca de 37% da população brasileira. Com as campanhas de vacinação, a meta é atingir pelo menos 90% dos grupos elegíveis. Para obter o êxito nessa estratégia, contaremos com cerca de 50 mil postos de vacinação ao longo do país. 

A vacinação da influenza é trivalente, contempla 2 cepas da influenza A (sendo selecionadas de acordo com as cepas circulantes nas epidemias) e influenza B.

É indicado tomar a vacina da influenza anualmente porque o imunizante tem tempo de ação de 6 a 12 meses. 

Como funciona a vigilância epidemiológica da influenza?

A vigilância da doença é composta pela vigilância sentinela de síndrome gripal e síndrome respiratória aguda grave em pacientes hospitalizados ou que evoluíram para óbito. 

O Brasil possui 135 municípios e 239 unidades sentinelas que coletam 5 amostras clínicas semanais de casos de síndrome gripal e encaminham para as pesquisas dos vírus respiratórios.

Essa vigilância tem como objetivo a determinação do início da sazonalidade, das epidemias e surtos e detectam os vírus e subgrupos circulantes. 

Em 2022, foram processadas 53.016 amostras de SG registrados em
unidades de saúde sentinelas. Desse total, 41,8% (22.187/53.016) tiveram resultado detectável para vírus respiratórios.

Entre os vírus respiratórios identificados:

  • 51% foram detectáveis para o vírus da covid-19,
  • 12,5% foram positivos para influenza,
  • 36,4% das amostras correspondem a outros vírus respiratórios (entre estes, vírus Sincicial Respiratório, Parainfluenza, Adenovírus e Rinovírus).

Das amostras de influenza, 12,5%, 67,6% foram decorrentes de influenza A(H3N2), 22,2% de influenza A não subtipado, 4,1% de influenza B e 6,0% de influenza A(H1N1)pdm09.

A faixa etária mais frequente foi de 60 anos ou mais, representando 44,2% dos casos. 

E por que estou te contando isso? Pois é através dessa informação que determinamos quais os próximos passos da vacinação.

Como é aplicada a vacina da gripe? 

Para crianças de 6 meses a menores de 5 anos, que estão sendo vacinadas pela primeira vez, são recomendadas 2 doses com intervalo de 30 dias entre elas. Os demais grupos em apenas 1 dose.

Quais doenças crônicas estão contempladas na população alvo?

Para pessoas com doenças crônicas não transmissíveis é necessário a comprovação da situação. Pode ser uma receita médica, declaração, exames, prontuário e outros documentos.

É comum os médicos receberem pacientes em busca de uma declaração que comprove que estão aptos a receber a vacina. Por isso, veja quais doenças são contempladas: 

Como funciona a vacina da influenza?

Por conta da alta mutação do vírus influenza, a definição da cepa é feita com base na minuciosa análise das cepas circulantes e definição de casos anuais.

A OMS realiza reuniões duas vezes ao ano com a finalidade de analisar os dados da vigilância, a caracterização genética do vírus assim como a sua resistência as medicações antivirais existentes, os resultados das vacinas atuais e anteriores.

Após essas reuniões, a OMS emite a recomendação das cepas que devem compor o próximo imunizante.

A vacina da influenza, popularmente conhecida como vacina da gripe, é composta por diferentes cepas dos vírus inativados, fragmentados e purificados. Ou seja, não tem capacidade de causar a doença. 

Devem ser aplicadas de forma intramuscular e em casos excepcionais, como pacientes com discrasia sanguínea, podem ser administradas via subcutânea. Vale acrescentar que ela pode ser usada em imunodeprimidos. 

Qual o tipo de vacina da gripe ofertada na campanha de 2023?

Conforme Instrução Normativa (IN) n.º 189, de 26 de outubro de 2022 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), as vacinas influenza trivalentes utilizadas no Brasil a partir de fevereiro de 2023 deverão apresentar 3 tipos de cepas de vírus em combinação:

  • A/Sydney/5/2021 (H1N1)pdm09
  • A/Darwin/9/2021 (H3N2)
  • B/Áustria/02/1359417/2021 (linhagem B/Victoria)

A vacina ofertada pela campanha de vacinação será a trivalente produzida pelo Instituto Butantan.

Podemos administrar a vacina simultaneamente com outras vacinas?

Sabe aquele “já que” estou aqui vou atualizar o calendário vacinal, será possível? Sim! A vacina pode ser administrada concomitantemente a qualquer outra vacina do calendário nacional de vacinação e com outros medicamentos, devendo apenas ter a precaução de usar outra seringa, agulha e outro sítio anatômico.

Em maiores de 12 anos, a vacina de covid-19 pode ser administrada simultaneamente a vacina de influenza. Em menores de 12 anos, deve-se respeitar o intervalo de 15 dias entre as vacinas devendo a vacina de covid-19 ser priorizada e a influenza agendada.

Tenho alergia ao ovo, posso tomar a vacina da gripe?

Os pacientes que apresentam apenas urticária após a ingestão do ovo podem receber a vacina normalmente, sem necessidades especiais.

Pacientes que têm reações alérgicas graves, como anafilaxia, devem receber a vacina em local adequado para identificação e tratamento de manifestações alérgicas graves (serviço de urgência e emergência) e sob supervisão médica preferencialmente.

Hesitação vacinal

A vacinação é apontada como o segundo maior avanço da humanidade em termos de saúde pública, perdendo apenas para a ampliação da oferta de água potável. Mesmo com o sucesso de campanhas mundiais de vacinação, estamos registrando o retorno de algumas doenças já controladas devido à redução da cobertura vacinal.

Ainda que muitos países tenham alcançado a erradicação de algumas doenças, nota-se uma crescente negativa da vacinação no mundo e no Brasil. 

A OMS reconhece a hesitação vacinal como uma das 10 maiores ameaças à saúde pública no mundo. Relacionadas a esse fenômeno temos como causas subjacentes a falta de confiança, conveniência e complacência da população a vacinação.

Efeitos adversos esperados da vacina da influenza

Em 14 a 20% dos pacientes podemos esperar manifestações locais como dor no local da injeção, eritema e endurecimento local. 

Em cerca de 10% dos vacinados podemos ter reações sistêmicas, benignas e autolimitadas como febre, mal-estar e mialgia. Reações de hipersensibilidade são muito raras e podem estar associadas a qualquer componente da vacina. 

Manifestações neurológicas, como a tão temida Síndrome de Guillain-Barré,que pode ser precedida tanto pela vacina quanto pela infecção do vírus influenza, são raras. 

Acredito que esse pequeno manual facilite a sua compreensão sobre a campanha atual da vacinação da influenza e te auxilie na instrução dos seus pacientes.

*Conteúdo sobre vacina da influenza todo produzido pela Dr. Maitê Dahdal, médica de família e comunidade e coordenadora do curso de MFC da pós-graduação Sanar.

Andamento da campanha de vacinação contra gripe 2023

Desde 15 de maio de 2023, toda população com mais de 6 meses de vida pode tomar a vacina contra gripe. A decisão é do Ministério da Saúde e tem como objetivo
expandir a cobertura vacinal contra a doença antes do inverno, quando as infecções respiratórias tendem a aumentar.

Em nota, o Ministério orientou que sejam usadas as vacinas em estoque e que sejam adotadas estratégias locais para operacionalizar a imunização.

“Mais de 80 milhões de doses da vacina trivalente, produzidas pelo Instituto Butantan, foram distribuídas para todo o país. A meta é vacinar 90% da população”, destacou o ministério”, diz a nota.

A vacinação é de extrema importância para reduzir a carga da doença. O imunizante atua na prevenção de hospitalizações e mortes.

Vale ressaltar que o estado do Amapá chegou a decretar emergência de saúde pública após registrar um aumento de mais de 108% de casos de síndromes gripais, entre janeiro e maio de 2023. Além disso, já houve registro de superlotação em um hospital da capital.

Sugestão de conteúdo complementar

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Veja também:

Referências:

  • Informe Técnico Operacional Vacinação Contra a Influenza. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Imunização e Vigilância de Doenças Transmissíveis. Brasília , março de 2023. [S.d.].
  • HOLANDA, W. T. G., OLIVEIRA, S. B. de, SANCHEZ, M. N. “Aspectos diferenciais do acesso e qualidade da atenção primária à saúde no alcance da cobertura vacinal de influenza”, Ciência & Saúde Coletiva, v. 27, n. 4, p. 1679–1694, 2022. DOI: 10.1590/1413-81232022274.03472021. .
  • NOBRE, R., GUERRA, L. D. da S., CARNUT, L. “Hesitação e recusa vacinal em países com sistemas universais de saúde: uma revisão integrativa sobre seus efeitos”, Saúde em Debate, v. 46, n. spe1, p. 303–321, 2022. DOI: 10.1590/0103-11042022e121. .
  • PALMIERI, M., DOURADO, S. “Nota Técnica SBIm 08/04/2021 – Vacinas influenza no Brasil em 2021”, n. 11, 2021. .
  • SOUZA, F. D. O., WERNECK, G. L., PINHO, P. D. S., et al. “Influenza vaccine hesitancy among health workers, Bahia State, Brazil”, Cadernos de Saúde Pública, v. 38, n. 1, p. 1–16, 2022. DOI: 10.1590/0102-311X00098521.