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A infância é um período delicado da vida de um ser humano. É um período de muitas transformações no corpo, fragilidade e que necessita de muitos cuidados. Nesse viés, a emergência pediátrica exige dos médicos uma postura que minimize agravamentos dos casos em pacientes acometidos por patologias, assim como evitar a mortalidade dessas crianças. Sendo assim, observa-se que existe um cuidado redobrado com relação aos diagnósticos, visto que os médicos, em sua maioria, solicitam mais exames complementares, como os de imagens, para tentar evitar erros médicos. No entanto, é preciso analisar com cuidado a necessidade dos pedidos de exame, além de observar o impacto que isso poderá trazer ao corpo de uma criança e, também, prejuízos financeiros ao sistema de saúde. Ademais, em 2020, com a declaração da pandemia de COVID-19, esse cenário foi intensificado. Sendo assim, a compreensão e avaliação desse cenário é de suma importância para trabalhadores e acadêmicos na área da saúde.
Exames de imagem
Os exames de imagem podem ser considerados como uma grande inovação no que tange à possibilidade de ampliar o diagnóstico médico. Isso ocorre por possibilitarem uma visão do interior do corpo. Por meio de sistemas energéticos, como radiação, campos magnéticos e ondas do som. Essas energias atravessam o organismo e, de acordo com sua passagem, resultam em imagens do interior do corpo do indivíduo. A análise e estudo de indivíduos normais permitem que possam diagnosticar possíveis alterações que não são visíveis externamente no indivíduo. Existe uma diversidade de exames de imagem, assim como uma diversidade de custos e disponibilidade em cada local.
Dentre os mais conhecidos, encontra-se a ultrassonografia. Seu uso é amplamente conhecido por ser um dos exames mais utilizados durante a gravidez. A escolha da ultrassonografia ocorre amplamente nesses casos por possibilitar um exame sem radiação, que funciona apenas por meio de ondas sonoras de uma frequência mais elevada. No entanto, existem diversas situações em que se pode utilizá-lo. Como exemplo, pode-se citar avaliação das vísceras abdomino-pélvicas e também para análise da tireoide. Vale ressaltar que ele permite a passagem dos ultrassons pela estrutura corporal em tempo real, dessa forma é possível movimentar o equipamento na região observada e visualizar aquele órgão ou região naquele momento. Ademais, o método de examinar costuma ser bem simples, em que é necessário um transdutor, seguido da passagem de gel na região previamente despida em que se deseja avaliar.
Outros métodos são o Raio-x e a tomografia computadorizada. Ambos são exames que utilizam partículas raios-x, de modo que atinjam o corpo e gerem imagens da região que se deseja analisar. O primeiro costuma ser um exame mais barato e acessível, enquanto o segundo é um método mais complexo e possui um custo maior. No entanto, os exames são bem rápidos, durando cerca de alguns minutos. Para realizá-los, o paciente deve deitar-se na máquina e ser posicionado de modo que o equipamento atinja o corpo na região em que se deseja visualizar, tentando, desse modo, evitar exposição do corpo à radiação.
Possíveis consequências dos exames
As radiações são energias geradas por meio de diversas fontes que geram partículas atômicas ou subatômicas que carregam energia em si, como os prótons, elétrons e partículas beta, por exemplo. Outro tipo de energia radioativa é aquela produzida em forma de onda eletromagnética, formada por campos elétricos. Sua classificação é de acordo com sua frequência, ou então por meio de seu comprimento de onda, podendo se apresentar como radiação infravermelha, raios x e raios gama.
Dentre os vários tipos de radiação, destacam-se aquelas capazes de ionizar átomos, formando a radiação ionizante. Os raios x e gama possuem essa capacidade, e, de certa forma, podem causar alguns danos. Para compreensão desse fator, é de grande valia entender que o organismo humano é formado por partículas minúsculas, chamadas de átomos, que se unem por meio de forças elétricas. Quando o corpo é atingido por partículas capazes de desestabilizar essas eletricidades, pode ser que o corpo sofra algum dano. Em alguns casos, as moléculas podem se desestabilizar e se ligar a outras, gerando mutações. Na maioria dos casos, o organismo consegue reverter esses processos, visto que possui mecanismos de defesa para eliminar estruturas modificadas. Entretanto, isso nem sempre é possível, permitindo que o corpo conviva com aquela mutação, que pode ser indiferente ou maléfica ao corpo.
Dentre os exames, sabe-se que o Raio-X e a tomografia computadorizada são métodos que utilizam partículas de raios x para conseguir obter as imagens do corpo. Ambas são propostas que auxiliam muito no diagnóstico de patologias, uma vez que possuem qualidade e eficiência superior a muitos outros exames. No entanto, apesar de serem métodos válidos para diagnóstico, não se pode desconsiderar possíveis riscos ao sujeitar um paciente, principalmente pediátrico, a eles.
É de suma importância entender que o corpo de uma criança possui células em constante divisão celular, sendo, portanto, mais suscetível a erros durante esse processo. Ademais, os riscos de desenvolver neoplasias se encontram aumentados quando o corpo é atingido por radiações. Esses processos em excesso, ainda mais em situações desnecessárias, geram um risco para o desenvolvimento saudável dos pacientes pediátricos.
Com base em estudos realizados nos Estados Unidos, observou-se que a tomografia computadorizada pode gerar cerca de 1,5% das neoplasias malignas.
A fim de evitar problemáticas relacionadas aos exames de imagem, é de grande valia informar que existem regulamentações, como a da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e a United Nations Scientific Committee on the Effects of Atomic Radiation (Unscear). Ambas, uma em território nacional e a outra em internacional, estabelecem parâmetros de segurança, como equipamentos a serem utilizados para evitar excesso de exposição à radiação, limite de radiação anual aconselhado e também recomendações quanto aos usos de exames que usufruem de material radioativo.
COVID-19 e os exames de imagem
Com o advento da pandemia de Covid-19, muitos médicos se depararam com um cenário em que não sabiam como comprovar a intensidade do acometimento pela doença. Sendo assim, a melhor alternativa percebida, principalmente na emergência pediátrica, seria de realizar o máximo de exames possíveis em prol de diagnosticar e monitorar o avanço da doença. Dentre os variados exames, os de imagem ocuparam local significativo, visto que permitem visualizar os órgãos acometidos, como os pulmões. Outrossim, não se sabia se as crianças poderiam ser mais ou menos afetadas pela COVID-19, gerando um cenário de incertezas e preocupações. Todavia, não se pode negar que existem consequências biológicas e financeiras do uso exacerbado de exames de imagem.
Eyal Cohen e seus colegas realizaram um estudo por meio de avaliação de bancos de informações de saúde na emergência pediátrica do Canadá e Estados unidos e o levantamento a respeito dos pedidos de imagem solicitados. Outros estudos analisaram os dados de Cohen e outros autores, observado os riscos e impactos que essas medidas geraram no sistema de saúde local.
Dentre os resultados, observou-se o impacto dos exames na saúde da criança, uma vez que a maioria dos exames mais usuais utilizam radiações ionizante. Essa radiação, apesar de apresentar risco mínimo, pode contribuir, a longo prazo e uso excessivo, para o surgimento de patologias na vida adulta, como exemplo, acometimento por neoplasias. Isso ocorre devido às condições de modificações em que as células corporais se encontram durante a vida infantil. Nesse período, as células estão constantemente se multiplicando e formando o organismo, desenvolvendo assim, o corpo do futuro jovem. Caso esse organismo seja exposto de maneira recorrente a agentes indutores de mutações, como a radiação ionizante, pode ser que a criança tenda a sofrer algumas mutações em seu DNA, como supracitado anteriormente.
É de suma importância frisar que este texto não tem por objetivo inferir que exames de imagem são prejudiciais em todos os casos e, de forma alguma, induzir ao pensamento de que não se deve realizá-los. No entanto, os riscos existem, assim como diversas situações cotidianas, como exposição à radiação solar ou consumo de alimentos com agrotóxicos. Dessa maneira, o objetivo se baseia em apenas observar o quanto medidas desnecessárias, como pedidos de exames em excesso e recorrentes na emergência pediátrica, podem surtir efeito a longo prazo.
Outro fato relevante é observar os impactos na questão financeira. Os estudos também avaliaram que entre os médicos de alguns locais existe uma grande disparidade no que tange aos pedidos de exames complementares. Nos Estados Unidos, os profissionais tendem a solicitar mais exames em prol de evitar processos por erros médicos, assim sendo, é evidente que esta conduta gera gastos ao sistema de saúde, uma vez que são métodos desnecessários, sem justificativa, aparentemente, na maior parte dos casos. Contrastando com esses dados, os médicos no Canadá solicitam os pedidos apenas quando necessário, uma vez que possuem uma maior visão a respeito da administração hospitalar e também dos gastos gerados no sistema de saúde. Essa visão mais ampla do sistema faz com que eles não solicitem tantos exames de imagem quanto os americanos. Isso contribui para o sistema de saúde.
Outrossim, no cenário de pandemia da COVID-19, a emergência pediátrica passou por um aumento intenso de pedidos para tomografia e raio-X. Além de serem solicitados de maneira desenfreada, não são os exames mais aconselháveis para análise pulmonar em casos de infecção por sars-cov-2. A tomografia, por exemplo, não permite distinção dos outros tipos de pneumonias, não sendo eficaz. Assim como o raio-x, que não é a melhor alternativa para visualizar quadros de pneumonia. Sendo assim, os exames são pedidos em excesso de maneira quase completamente desnecessária, visto que apenas em alguns quadros sintomatológicos devem ser solicitados.
Uma alternativa que tem sido estudada é o uso da ultrassonografia pulmonar. Seu uso tem sido muito confiável para diagnosticar caso de COVID-19, além de proporcionar exame indolor, simples e sem radiação. Pode ser realizado pelo próprio médico que acompanha a criança, evitando o contato com mais profissionais de saúde. Por fim, seu custo também é reduzido em comparação com os ademais. Desse modo, embora ainda em estudo, a ultrassonografia pode ser uma escolha importante para pacientes na emergência pediátrica. Vale ressaltar que é necessária uma base de dados maior para que seja possível melhor análise e comparação das modificações pulmonares por meio desse exame, para que, dessa forma, sua utilização seja mais eficaz.

Fonte: https://jornal.usp.br/atualidades/programa-busca-reduzir-numero-de-exames-desnecessarios-em-criancas/
Conclusão
Em suma, percebe-se que os exames de imagem à base de radiação ionizante podem trazer malefícios ao sistema financeiro na área da saúde, assim como ser prejudicial ao paciente pediátrico. Desse modo, faz-se necessária a melhor gestão hospitalar, a fim de evitar excessos na solicitação de exames, assim como orientar melhor os profissionais de saúde sobre os gastos desnecessários e sobre os prejuízos médicos dessa submissão excessiva a exames de imagem.
Ademais, é de grande relevância investir em propostas alternativas para esses exames, a fim de evitá-los quando possível. Nesse sentido, a ultrassonografia tem ocupado um papel importante, sendo, portanto, necessário explorar mais sua finalidade, principalmente em tempos de COVID-19.
O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.
Observação: esse material foi produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido.
Referências:
Exposição de pacientes da emergência pediátrica a exames de imagem, na atualidade e em tempos de covid-19: uma revisão integrativa – https://www.scielo.br/pdf/rpp/v40/pt_1984-0462-rpp-40-e2020302.pdf
Low-Value Diagnostic Imaging Use in the Pediatric Emergency Department in the United States and Canada – https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31157877/#affiliation-1
Pediatric Emergency Care Applied Research Network head injuryprediction rules: on the basis of cost and effectiveness – https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29306237/
Efeitos biológicos das radiações ionizantes. Acidente radiológico de Goiânia – https://www.scielo.br/pdf/ea/v27n77/v27n77a14.pdf
Métodos de imagem em medicina Diagnostico por imagem- https://cedav.com.br/wp-content/themes/cedav/aulas/arquivos-aulas/diagnostico-por-imagem/resumo_intrucao_2017.pdf
Manual de processos de trabalho em imaginologia –https://intranet.hc.unicamp.br/manuais/imagem.pdf