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Com o avanço dos casos de infecção por COVID-19, muitos pesquisadores, ao redor do mundo, começaram a pesquisar possíveis medicamentos já existentes para utilizar contra a COVID-19, entre eles, observou-se o potencial efeito benéfico das estatinas. Estas são uma classe de fármacos muito usufruída por pacientes cardiopatas, visto que possui um efeito benéfico em reduzir o colesterol sanguíneo e, consequentemente, reduzir riscos de complicações, como ateroscleroses. Desde 2020, estudos começaram a mostrar que, devido à vasta aplicabilidade das estatinas em controlar inflamações, seu uso poderia ser eficaz em pacientes infectados por Sars-CoV-2. Sendo assim, este texto tem por objetivo observar a literatura presente sobre tais efeitos potenciais, sem inferir qualquer utilização errônea ou descontrolada sem devido acompanhamento médico.
Introdução: como surgiram as estatinas?
Por volta da década de 70, um microbiologista japonês estudava cultura de fungos, enquanto buscava propriedades antibióticas. Durante seu estudo, observou que esses fungos eram capazes de sintetizar um inibidor da biossíntese de colesterol. Essa substância possuía delta-lactona-beta-hidroxilada, semelhante a um dos intermediários da síntese de colesterol, que promoveria redução da HMGGo-A. A partir desses fungos, surgiram as estatinas naturais, chamadas de metavastina, pravastatina, sinvastatina e lovastatina.
Com o passar do tempo, os estudos se tornaram mais eficazes, promovendo mudanças nos fármacos para que seu uso realmente pudesse ser seguro. Sendo assim, em 2003, introduziram a rosuvastatina no mercado de fármacos, alegando que ela pudesse ser capaz de reduzir placas de ateromas.
Um pouco sobre o colesterol
O colesterol é uma molécula lipídica que é produzida pelo fígado, cuja síntese depende da ingestão de alimentos ricos em gordura. Ele possui grande importância para a sobrevivência dos animais, visto que sua síntese é necessária para que ocorra estoque de reserva energética, proteção contra choques mecânicos, além de ser necessário para síntese de diversos hormônios corporais e até de neurotransmissores.
Entretanto, essa ingestão deve ser extremamente balanceada, uma vez que o organismo não necessita de uma elevada quantidade de colesterol para funcionar corretamente. Quando essa ingestão ultrapassa o necessário, o colesterol começa a ser prejudicial ao corpo, visto que pode se acumular em vasos, como as artérias, e elevar o risco de doenças, como aterosclerose.
É de suma importância compreender que existem alguns tipos de colesterol. O conjunto de todos é denominado de colesterol total. Para que possa circular no sangue, ele necessita se ligar a proteínas, visto que é hidrofóbico. Sendo assim, ele se liga a algumas proteínas, formando alguns tipos específicos de colesterol circulante, como o HDL (high density lipoprotein), que é a lipoproteína de densidade elevada, e sua concentração proteica é maior do que a de gordura. O LDL (low density lipoprotein), por outro lado, é o contrário, possui uma maior quantidade de colesterol, do que de proteínas. Ambos são necessários e benéficos ao corpo, no entanto, como supracitado, sua quantidade não pode se encontrar desregulada, visto que diversas patologias podem acometer o indivíduo quando isso ocorre. Quando sua quantidade se encontra muito desregulada, pode ser que o médico recomende a utilização de alguns fármacos para auxiliar em sua redução, um dos mais utilizados são as estatinas.
Estatinas

Fonte: https://www.ocirurgiaovascular.com.br/6-perguntas-frequentes-sobre-estatinas-medicacoes-para-controlar-o-colesterol/
As estatinas são um grupo de fármacos inibidores de uma enzima chamada de hidroximetil-glutaril-coenzima A (HMG-CoA). Ela é importante para o processo de regulação da síntese de colesterol, muito utilizada em casos de cardiopatias. Diversos medicamentos pertencem à classe das estatinas, como as pravastinas, lovastatinas e atorvastatinas.
Apesar de semelhantes, os medicamentos diferem nas suas propriedades farmacocinéticas, metabolização hepática e eficácia. Vale ressaltar que o seu uso é focalizado para tratamento de pacientes cardiopatas, contribuindo significativamente para a redução da morbidade e mortalidade por diversas doenças associadas ao aparelho cardiovascular, como doenças coronarianas.
O grupo farmacológico em questão age como hipolipemiantes primariamente. A ação de inibição da HMG-CoA redutase permite a inibição da síntese de colesterol, convergindo para diminuição do colesterol dos tecidos, assim como aumento de receptores para LDL. O processo de ação do medicamento ocorre por meio da afinidade que ele possui com os sítios ativos da HMG-CoA, processo este que ocorre inicialmente no fígado, via transporte influenciado por OATPS – organic anion transporting polypeptides –, transportadores presentes nas membranas de hepatócitos e vários outros órgãos. Esse transportador tem capacidade de permitir a passagem de hormônios tireoidianos, ácidos biliares e estatinas, como as pravastinas e rosuvastinas.
Assim como qualquer medicamento, quando utilizado sem recomendação médica e de maneira incorreta, as estatinas podem gerar complicações. Como exemplo, pode-se citar rabdomiólise, que acarreta necroses no tecido muscular, assim como elevação de creatimofosfoquinase (CPK). Dentre os sintomas, os pacientes podem sentir mialgia (dor muscular) e mioglobinúria.
Covid-19 e as estatinas: o que se sabe até então
Em 2020, estudos chineses realizados por Xiuqi Wei e Wenjuan Zeng et al, constataram que a gravidade da COVID-19 estava constantemente associada aos baixos níveis de algumas lipoproteínas responsáveis por carregar os lipídeos na corrente sanguínea. O estudo permitiu analisar que um paciente infectado tende a possuir níveis mais baixos de colesterol de lipoproteína de baixa densidade (LDL-C) assim como colesterol total reduzido. Ademais, observaram que o LDL-C e colesterol tendem a reduzir de acordo com a gravidade da infecção. Foi observado também que ocorria a queda de colesterol de lipoproteína de alta densidade, chamada de HDL-C. Em alguns casos, começaram a observar que a estatina poderia corroborar com o aumento do risco de infecção, uma vez que ela tende a aumentar as enzimas conversoras de angiotensina 2 (ECA2), que são receptores para entrada do vírus na célula.
Alguns outros estudos, demonstram que as estatinas possuem efeitos extremamente benéficos, como auxiliar na melhora da função endotelial, assim como suas propriedades anti-inflamatórias, e no combate à formação de trombos. Vale ressaltar que essas situações inflamatórias e formação de trombos são comuns em pacientes que foram infectados pelo Sars-CoV-2. Outro estudo, realizado por Sophia L. Song et al, demonstrou que as estatinas possuem possível contribuição para pacientes admitidos por COVID-19 pelo fato da aparente redução dos riscos de desenvolvimento de pneumonia. Isso ocorre devido às suas propriedades antioxidantes, assim como imunomodeladoras e anti-inflamatórias.
Aparentemente, como demonstrando na literatura até então, os efeitos citados como adversos não parecem contribuir significativamente para o agravamento dos casos de COVID-19. Por outro lado, é confirmado que o fármaco realmente pode reduzir níveis inflamatórios, assim como reduzir formação de trombos, auxiliando na melhora dos quadros de pacientes com a infecção. Sendo assim, de acordo com cada paciente, os médicos podem avaliar se o uso de estatina poderia ser utilizado, visto que, em alguns casos, como pacientes que desenvolvem rabdomiólise, a estatina não é indicada.

Fonte: https://www.scielo.br/pdf/abc/v116n1/0066-782X-abc-116-01-0147.pdf
Conclusão
Como apresentado, as estatinas parecem ser uma boa alternativa para utilizar em pacientes infectados por Sars-CoV-2, visto que apresentam propriedades anti-inflamatórias capazes de controlar a inflamação exacerbada acometida durante a infecção. Ademais, dentre suas funções, são capazes de prevenir a formação de trombos, uma das complicações frequentes em pacientes com COVID-19. Entretanto, vale a pena frisar que o uso deve ser indicado pelo médico que esteja acompanhando o paciente, uma vez que, assim como qualquer fármaco, quando utilizado sem consulta ou erroneamente, pode se tornar mais prejudicial do que benéfico.
Autora: Maria Eduarda de Azeredo Amaral
Instagram: duda_azeredo
O texto acima é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Referências:
Colesterol – http://www.unimedfesp.coop.br/SiteAssets/viver-bem1/Colesterol.pdf
Estatinas e COVID-19: Suspender ou não suspender? Eis a Questão! – https://www.scielo.br/pdf/abc/v116n1/0066-782X-abc-116-01-0147.pdf
Estatinas – efeitos citotóxicos e novas aplicações – https://bdigital.ufp.pt/bitstream/10284/2278/3/TM_15292.pdf
Estatinas: uso racional na cardiopatia isquêmica – http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/HSE_URM_EST_0904.pdf
Farmacocinética das estatinas – https://www.scielo.br/pdf/abc/v85s5/v85s5a03.pdf
Hypolipidemia is associated with the severity of COVID-19 – https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7192140/pdf/main.pdf Statin Use Is Associated with Decreased Risk of Invasive Mechanical Ventilation in COVID-19 Patients: A Preliminary Study – https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7559887/