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QUAL A DIFICULDADE EM SABER SE O EFEITO ADVERSO É CAUSADO PELA VACINA? | Colunistas

QUAL A DIFICULDADE EM SABER SE O EFEITO ADVERSO É CAUSADO PELA VACINA? | Colunistas

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O uso do imunizante da Johnson & Johnson/Janssen para a prevenção e erradicação da covid-19 está pausado nos Estados Unidos no momento. Nos últimos dias, países europeus anunciaram a suspensão das aplicações da vacina AstraZeneca/Oxford ou a restringiram apenas para a população de idosos. Ambos os casos devido à possível – e difícil de ser confirmada – associação entre o uso das respectivas vacinas e o desenvolvimento de raros coágulos sanguíneos que acometem o seio venoso cerebral e a veia esplâncnica. Mas afinal, qual a dificuldade em saber se um determinado efeito adverso é realmente causado pelo uso da vacina?

O PROCESSO DE PRODUÇÃO DA VACINA

Em pesquisa científica, o ensaio clínico é o tipo de estudo usado para produção de novos medicamentos, bem como de vacinas. Inicialmente, se os testes in vitro ou em animais se mostrarem seguros, partimos para a etapa clínica, composta de 4 fases.

            Fase I: é escolhido um pequeno número de pacientes, geralmente homens adultos e saudáveis, para testar se o fármaco, no caso a vacina, é segura para o uso em humanos. Estuda-se os efeitos colaterais e as reações adversas.

            Fase II: em um pequeno número de pacientes, busca-se definir qual a dose necessária para atingir o efeito que é buscado com aquele novo fármaco.

            Fase III: agora com maior número de pacientes, é o momento de definir a eficácia da vacina. Na prática, aplica-se a vacina em um grupo e no outro, chamado de grupo controle,  aplica-se o placebo. Ao comparar os dois grupos, obtemos a porcentagem de eficácia da vacina e, se ela for eficaz, será comercializada.

Fase IV: aqui a vacina está disponível para a população e é o momento de vermos como ela funciona fora do laboratório, sendo de extrema importância a notificação de efeitos adversos, pois podem surgir complicações e efeitos colaterais não previstos inicialmente. A farmacovigilância gera novas informações sobre a segurança da vacina.

O QUE É UM EVENTO ADVERSO PÓS-VACINAÇÃO (EAPV)?

Um evento adverso pós-vacinação (EAPV) é qualquer ocorrência médica indesejada após a vacinação, podendo ser um sintoma, doença ou um achado laboratorial, que NÃO possui necessariamente, uma relação causal com o uso da vacina. Os EAPV podem ser classificados em esperados, sendo aqueles identificados anteriormente, como febre, dor e edema local, ou inesperados sendo aqueles não identificados com os estudos clínicos, como a formação dos coágulos no caso da vacina de Oxford e J&J, por exemplo. Muitos dos eventos adversos são apenas associações temporais, não se devendo à aplicação das vacinas, por isso, há a necessidade de uma cuidadosa investigação, para estabelecer a sua origem. Assim, os EAPV podem ser devido a aspectos relacionados aos vacinados ou à própria vacinação, como a técnica empregada ou os componentes da vacina.

ASPECTOS RELACIONADOS AOS VACINADOS

A pessoa que recebe a vacina pode ter uma doença infecciosa em incubação e a apresentação dos sintomas pode coincidir com os dias após a aplicação da vacina, por exemplo. Esse fato é apenas uma associação temporal, não guardando relação direta com a vacina.

Pode acontecer também de a pessoa vacinada ter tendência à convulsão quando apresenta febre alta, que pode ser um EAPV esperado. Neste caso, a convulsão se apresentaria com ou sem a vacinação, desde que aconteça febre alta (convulsão febril). Esta situação é comum nas crianças.

Outros fatores relacionados aos vacinados podem ser doenças alérgicas, autoimunidade, comprometimento imunológico, AIDS ou o uso de imunossupressores, por exemplo, que podem levar a apresentação de sintomas muito acentuados se vacinados com bactérias ou vírus atenuados, e a faixa etária ou ainda o sexo.

ASPECTOS RELACIONADOS À VACINAÇÃO

COMPONENTES DA VACINA

O tipo (vírus vivo atenuado ou partícula viral) está relacionado a uma vacina que pode provocar mais ou menos reações.

O meio de cultivo, como, por exemplo, o ovo da galinha que é usado para o cultivo viral em algumas vacinas, pode provocar alergias em pessoas suscetíveis.

Os antibióticos usados para impedir a contaminação da vacina por outros microrganismos podem provocar alergias em pessoas suscetíveis.

Substâncias agregadas como estabilizantes e adjuvantes, como o hidróxido de alumínio que é agressivo ao tecido epitelial, podendo causar irritação local.

E, por fim, a contaminação ou qualidade inadequada de componentes no processo de produção podem causar abscessos como efeito adverso.

TÉCNICA DE VACINAÇÃO

No que se refere à técnica de vacinação devem ser considerados a preparação, a manipulação e a aplicação da vacina. Englobando fatores como a conservação adequada em refrigeradores, a contaminação no momento da aplicação, sendo empregados a lavagem das mãos e a assepsia da pele com algodão embebido em álcool, por exemplo, para evitar a introdução de agentes patogênicos no organismo no momento da aplicação. Deve-se considerar também o local e a via de inoculação corretos (vacinação intradérmica, subcutânea ou intramuscular) para reduzir os possíveis eventos adversos.

CONCLUSÃO

            Podemos perceber que a dificuldade em saber se o efeito adverso é causado pela vacina decorre de inúmeros efeitos confundidores, como fatores relacionados ao indivíduo vacinado ou a própria técnica de vacinação, não estando necessariamente relacionado à vacina em si e aos seus componentes. Assim, para avaliar tais efeitos


O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

Novidade: temos colunas sendo produzidas por Experts da Sanar, médicos conceituados em suas áreas de atuação e coordenadores da Sanar Pós.


REFERÊNCIAS

Manual de vigilância epidemiológica – https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_vigilancia_epidemiologica_eventos_adversos_pos_vacinacao.pdf

Vigilância dos Eventos Adversos Pós-Vacinação – https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cartilha_eadv_nivel_medio1.pdf

Saúde monitora eventos adversos pós-vacinação da Covid-19 – https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/saude-monitora-eventos-adversos-pos-vacinacao-da-covid-19

Trombose é efeito colateral raro da vacina de Oxford, diz agência europeia – https://www.dw.com/pt-br/trombose-%C3%A9-efeito-colateral-raro-da-vacina-de-oxford-diz-ag%C3%AAncia-europeia/a-57124538

Recommendation to Pause Use of Johnson & Johnson’s Janssen COVID-19 Vaccine – https://www.cdc.gov/coronavirus/2019-ncov/vaccines/safety/JJUpdate.html