Coronavírus

Que perspectivas a pandemia deixa para a saúde?

Que perspectivas a pandemia deixa para a saúde?

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Imagem de perfil de Sanar

As perspectivas para quando a pandemia do novo coronavírus passar são diversas. Há expectativas para mudanças na nossa relação com o consumo, também é esperado que a tecnologia faça mais parte do trabalho – como as reuniões via videotransmissão. Os mais espiritualistas acreditam até numa mudança de comportamento social estimulada pela nova frequência vibrada na Terra.

Para a saúde, a lição é uma só: precisamos fortalecer o Sistema Único de Saúde. O economista Carlos Gabrois Gadelha, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em entrevista ao Globo, insistiu num fortalecimento tecnológico da rede pública.

“Em outras palavras: nós não poderíamos ter um sistema universal de saúde para 200 milhões de pessoas, o maior do mundo, sem uma base produtiva e tecnológica que envolva a indústria farmacêutica, equipamentos, serviço de saúde”, disse ele, na entrevista.

A médica sanitarista Lígia Bahia, também professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), escreveu no mesmo jornal um artigo sobre a necessidade de o SUS ser potente e qualificado. A pandemia tem mostrado que cortar recursos da saúde pública para investir na rede privada não é a solução, observa a especialista.

Coordenação nacional

O antropólogo e doutorando Jonatan Sacramento reforça a ideia de investimento no SUS. Ele é pesquisador da relação entre ciência e saúde, com foco em formulação de políticas sanitárias para enfrentamento de epidemias.

“Acho que tem de ser fortalecida essa ideia de saúde primária, essa que acontece no cotidiano, na estratégia de Saúde da Família/Comunitária, porque é ali que a maioria das pessoas tem um acesso mais facilitado”, avalia o especialista, em um bate-papo com a equipe da Sanar.

Nesse sentido, fica a lição também para a integração entre os níveis municipais, estaduais e federal. Segundo Jonatan, uma emergência de saúde requer coordenação nacional que seja capaz de se adaptar às realidades locais.

Uma prática assim tem precedentes. A estratégia de erradicação da varíola foi exitosa porque, além de recursos financeiros, técnicos e humanos, houve uma coordenação nacional aliada à autonomia relativa dos estados para adaptá-la à realidade regional.

Atenção à vigilância epidemiológica

A pandemia do novo coronavírus tem chamado a atenção também para a importância da vigilância epidemiológica. Isso implica conhecimento sobre o número de casos de uma determinada doença. Jonatan Sacramento, especialista em políticas sanitárias para enfrentamento de epidemias, lembra que esse sistema foi implementado a partir da erradicação da varíola, nos anos 1970.

Mas, de lá para cá, houve diminuição no investimento para área. Isso levou à incapacidade de saber, por exemplo, o número de casos de doenças no sistema suplementar, como estamos assistindo em relação à Covid-19.

“Acho que nesse ponto é uma questão de investimento. Financeiro, tecnológico e de formação de pessoas. É necessário que as equipes estejam preparadas e saibam notificar as diferentes doenças pelos diferentes meios. Por exemplo, a Zika é uma doença de notificação compulsória, que o posto de saúde faz direto ao Ministério, ao mesmo tempo em que às secretarias municipal e estadual. Outras doenças passam primeiro por esses níveis mais “baixos” antes de chegar ao MS. Para isso a equipe de saúde precisa de formação nessa área e precisa de equipamentos e acesso à internet, por exemplo. Coisa que em alguns municípios ou localidades ainda é falha”, destaca o especialista, se referindo a médicos, enfermeiros, técnicos, administrativos e agentes de saúde.

Saúde é economia e sociedade

A terceira lição que a pandemia do novo coronavírus deixa é a importância do investimento em pesquisa científica para além da fisiologia. Jonatan Sacramento explica que saúde é um tema que diz respeito também à economia, à sociedade, à moral e à história.

O especialista em políticas sanitárias para enfrentamento de pandemias dá um exemplo que ilustra seu ponto. Se boa parte das pessoas deixarem de trabalhar porque estão doente, haveria pelo menos duas consequências econômicas.

“De um lado, você não tem renda, ou seja, você não circula as mercadorias que essa sociedade produz – as pessoas não trabalham, logo, não tem dinheiro, logo, não consomem. Por outro lado, chegaria um tempo em que não haveria mais mercadorias, ou em pouca quantidade, porque as pessoas que as produzem estão doentes e não podem produzi-las. Logo, você teria uma quebra das empresas”, acrescenta.

Essa perspectiva mostra a importância da tomada de consciência sobre saúde ser um investimento, não um gasto, como é o pensamento coletivo. Isso implica investir também nos centros de saúde de bairro, laboratórios, instituições de pesquisa, vigilância epidemiológica. Neste caso, Jonatan reforça a necessidade de população e governantes encararem saúde do ponto de vista de um sistema.

Confira o vídeo:


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