Alergologia e imunologia

Reinfecção pelo SARS-CoV-2 no Brasil | colunistas

Reinfecção pelo SARS-CoV-2 no Brasil | colunistas

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Os casos de reinfecção pelo SARS-Cov-2 já são confirmados no Brasil, em diversas regiões. Este artigo traz o primeiro caso e o mais recente confirmado.

Você poderá perceber que as manifestações clínicas são diferentes de seus primeiros diagnósticos, além do longo intervalo entre as infecções. E que para serem considerados casos de reinfecção foi necessário obedecer a critérios de confirmação do Ministério da Saúde.

Além disso, foi descrita uma análise de pesquisa que observou as reinfecções como sendo causadas por vírus com alteração no genoma viral, ou seja, por linhagens diferentes de SARS-CoV-2. Isso gera uma preocupação, porque os pacientes que já foram infectados uma vez não terão anticorpos contra essas novas variantes, sendo assim, o mecanismo de defesa será ineficiente, aumentando os casos de reinfecção. A situação também é válida para as atuais vacinas, pois elas constam com genoma viral da linhagem primária circulante, não promovendo proteção contra as novas. Portanto, é necessário manter o distanciamento social, uso de máscaras e álcool para higienização das mãos.

Caso clínico   

O primeiro caso de reinfecção, no Brasil, pelo SARS-CoV-2 foi de uma médica de 37 anos, que reside em Natal/RN, e foi confirmado pelo Ministério da Saúde, em dezembro de 2020, sendo que ela teve a doença em junho, e após 116 dias do primeiro diagnóstico obteve novamente os resultados positivos no exame RT-PCR. Os sintomas apresentados foram diferentes. Na primeira infecção apresentou coriza, cefaleia e dor abdominal. Já na segunda, ela reapresentou quadro gripal com distúrbios gustativos e olfativos, além de mialgia, astenia e cefaleia frontal.

Outro caso mais recente confirmado de reinfecção é de uma mulher, 29 anos, que reside em Manaus/AM. Ela foi infectada duas vezes, em um intervalo de 270 dias, e também teve sintomas distintos. Na primeira infecção, em 16 de março, apresentou tosse, febre, náuseas, mialgia de longa duração, dor de garganta e dores nas costas. Na segunda infecção, em 19 de dezembro, apresentou diarreia, cefaleia, coriza, febre, tosse, dor de garganta, anosmia e ageusia.

Critérios de confirmação de reinfecção

Para o caso ser considerado uma reinfecção, de acordo com o protocolo estabelecido pelo Ministério da Saúde, o indivíduo será analisado nos seguintes critérios:

  • Apresentar dois resultados positivos por meio da técnica de RT-PCR, em tempo real, para o vírus SARS-CoV-2.
  • Ter um intervalo entre os dois episódios de infecção viral, igual ou superior a 90 dias.
  • Fazer a análise do sequenciamento genético viral nos dois episódios.

Após serem feitas essas análises foi possível comprovar a presença de dois genomas virais diferentes entre a primeira e a segunda infecção, de ambos os casos citados anteriormente.

Linhagens de SARS-CoV-2

As pesquisas sobre as novas linhagens tomaram conta dos centros de pesquisa, incluindo o Laboratório da Fiocruz, que submeteu várias amostras à técnica de análise de sequenciamento genético, comprovando a existência de linhagens distintas do vírus. Isso reafirma a evidência de que a reinfecção é causada por genomas virais diferentes da primeira infecção pelo SARS-CoV-2.

Figura 1. Variante do SARS-CoV-2

Autor: Adaptado de Fiocruz (Karina Paez,2021).

Os achados mostraram que as variantes denominadas provisoriamente de  B.1.1.28 (K417N/ E484K / N501Y) e B.1.1.28 (E484k) são oriundas da linhagem B.1.1.28 (figura 1),  e que essa mutação aconteceu recentemente entre dezembro de 2020 e janeiro de 2021. Esses novos genomas virais possuem domínio de ligação do receptor da proteína Spike (a mesma que é usada como mecanismo de invasão da célula hospedeira), que em diversos países durante a segunda metade de 2020 sugeriram mudanças seletivas na evolução de SARS-CoV-2.

Essas novas linhagens de SARS-CoV-2 trazem preocupação, pois ainda não se tem certeza se apresentam algum grau de vantagem seletiva para a transmissibilidade viral e reinfecção, devido ao não reconhecimento pelo mecanismo de defesa do organismo. Portanto, é esperado um aumento na frequência de novos aparecimentos de outras linhagens virais, e, como consequência, elevação do número de casos novos e dos casos de reinfecção no Brasil nos próximos meses.

Mecanismo de defesa viral e reinfecção

O mecanismo de defesa imune do nosso organismo atua em um sistema de cooperação com participação de várias moléculas, células e estruturas para combater os agentes da infecção viral, a partir da resposta imune inata celular e/ou humoral.

No início da infecção viral, a defesa é feita por interferons do tipo I (IFN-ⲁ e IFN-β) que tem propriedade de proteger contra as reações da infecção. Para ajudar no combate são ativados os macrófagos, responsáveis pela destruição do vírus, e também as células NK (células Natural Killers – citotóxicas), que liberam granzima e perforina para destruir as células infectadas. Também, conta-se com a participação de IL-12, uma interleucina, produzida por macrófagos e células apresentadoras de antígenos, que irão estimular o aumento do potencial microbicida das células NK. 

A criação de anticorpos para esse tipo de infecção é importante, pois os vírus são agentes intracelulares, ou seja, sua propagação viral e multiplicação ocorrem dentro da célula hospedeira, assim os vírus rompem a célula, ficando livres para entrar em outra. Com os anticorpos, na fase extracelular, eles se ligam ao vírus causando a neutralização, o que inibe a invasão, a partir da proteína Spike, em outra célula hospedeira e permite a ação das células do mecanismo de defesa para fazer a destruição viral.

            Já se sabe que os casos de reinfecção ocorrem quando a imunidade celular e/ou humoral é escassa ou efêmera. Isso significa que ao ter contato com o SARS-CoV-2, ele irá conseguir fazer a multiplicação do seu RNA viral dentro da célula hospedeira, provando, também, que a imunidade protetora dos anticorpos criados na primeira infecção viral é de curta duração. Isso também é válido para a proteção dada pelas vacinas já produzidas, pois atualmente as que estão sendo aplicadas ainda não possuem proteção contra as novas variantes circulantes pelo país.

Conclusão

Com o aumento do número de casos de reinfecção pelo SARS-CoV-2 no Brasil justificado pela escassa imunidade celular e/ou humoral, contra as novas linhagens do vírus, como B.1.1.28 (K417N/ E484K / N501Y) e B.1.1.28 (E484k), além da não criação de anticorpos para essas variantes, as manifestações sintomáticas também são diferentes, com sintomas até mesmo mais graves.

Mostrando que as medidas protetivas adotadas desde o início da pandemia, como o distanciamento social, o uso de máscaras, medidas de higiene incluindo: lavar as mãos com sabão, ou fazer uso de álcool em gel, e também, higienizar os sapatos, compras e pertences, além do isolamento dos pacientes com resultados positivos para SARS-CoV-2, devem ser mantidas para prevenir o contágio e o aumento dos casos. Mesmo com a aplicação das vacinas, que atualmente não promovem proteção contra essas novas linhagens.

O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: esse material foi produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido.


Referências

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