Carreira em Medicina

Resumo: Preditores de intubação traqueal difícil | Ligas

Resumo: Preditores de intubação traqueal difícil | Ligas

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Imagem de perfil de Comunidade Sanar

Ao nos depararmos com um paciente que será submetido à intubação traqueal, é possível prever, por meio de parâmetros clínicos, o quão difícil poderá ser a intubação daquele paciente. Os chamados preditores de intubação traqueal difícil são parâmetros clínicos baseados em comorbidades e em características anatômicas do paciente que poderão dificultar a visualização da glote durante a laringoscopia. Dessa forma, o médico que realizará o procedimento poderá planejar a melhor forma de obter a via aérea definitiva para cada caso. 

O “ASA Task Force on Difficult Airway Management – Practice Guideline for Management of the Difficult Airway” classificou os desafios para a intubação em:  

  • Laringoscopia difícil – cordas vocais não são visualizadas após várias tentativas de laringoscopia
  • Intubação difícil – diversas tentativas realizadas para o sucesso, com ou sem doença traqueal 
  • Intubação impossível – múltiplas tentativas sem sucesso 
  • Ventilação difícil – um único profissional capacitado não consegue ventilar adequadamente o paciente. Este desenvolve cianose, distensão gástrica, ausência de CO2 exalado e expansibilidade torácica 
  • Via aérea difícil: presença de ventilação difícil e intubação difícil ou impossível

Todas essas condições estão relacionadas a aumento da morbimortalidade do paciente, podendo ser evitadas com a identificação e  preparação prévia à intubação orotraqueal difícil.

Preditores na anamnese

De forma geral, algumas informações coletadas por meio da anamnese podem ser preditoras de uma intubação traqueal difícil, como: 

  • Intubação traqueal prévia difícil;
  • Antecedentes patológicos sugestivos de intubação difícil (síndrome da apneia obstrutiva do sono, tumores/trauma de face e pescoço);
  • Comorbidades que prejudiquem a abertura da boca ou extensão cervical (artrite reumatoide, espondilite anquilosante, queimaduras prévias em face/pescoço, esclerodermia);
  • Malformações de cabeça e pescoço ou da via aérea;
  • Pacientes de urgência e emergência (o jejum é desconhecido, aumentando o risco de regurgitação gástrica e aspiração pulmonar).

Preditores no exame físico

Além da anamnese, outros preditores podem ser avaliados por meio do exame físico do paciente. O mnemônico LEMON é amplamente utilizado como um conjunto de preditores de intubação difícil, representados por cada letra, em inglês:

  • LLook (olhar): muitas vezes, ao olharmos para o paciente, poderemos identificar características que possam dificultar a intubação, como a obesidade, deformidades aparentes na região cervical, retrognatismo, abscesso cervical, pescoço curto. Ou seja, a ectoscopia por si só poderá nos mostrar alguns preditores.

Essas alterações podem ser visualizadas no site com dicas de intubação da USP https://www.anestesiologiausp.com.br/wp-content/uploads/graduacao/informacoes-gerais/avaliacaodasviasaereaseintubacaoorotraqueal-graduacao-2010.pdf.

  • EEvaluate (avaliar o paciente): o objetivo dessa avaliação é prever se a visualização da glote poderá ser difícil no momento da laringoscopia. Por exemplo: a abertura limitada da boca, o tamanho pequeno da mandíbula e a posição da laringe mais anterior no pescoço são fatores que podem limitar muito a visualização da glote. Dessa forma, a avaliação é feita pela medida da:
    • Distância entre os incisivos, a qual deve ser maior ou igual a três dedos. Essa distância representa o grau de abertura da boca.
    • Distância hiomentoniana, a qual deve ser maior ou igual a três dedos. Ela representa o tamanho da mandíbula.
    • Distância tireo-hióidea, a qual deve igual a 2 dedos. Se a distância for menor que três dedos, isso significa que a laringe está muito próxima do osso hióide e da base da língua, ou seja, a entrada da laringe poderá estar “escondida” e mais anteriorizada no pescoço. 
Fonte: Manual de Walls para o manejo da via aérea na emergência. 5ª edição.
  • M –  Mallampati: a escala de Mallampati é realizada por meio da observação da cavidade oral do paciente. Este deve estar em posição sentada, com o máximo de abertura da boca e  maior protrusão possível da língua, sem realizar fonação. De acordo com a visualização das estruturas da orofaringe, a escala de Mallampati é definida:
    • Classe I: Pilares amigdalianos, úvula e palato mole são visualizados.
    • Classe II: Base da úvula e palato mole são visualizados.
    • Classe III: Só o palato mole é visualizado.
    • Classe IV: Só o palato duro é visualizado.
Fonte: Miller, Anestesia. 8ª ed.
  • OObstruction (obstrução): uma possível obstrução de via aérea pode ser suspeitada caso o paciente apresente, por exemplo, voz abafada, estridor, dificuldade de deglutição, dispneia. A obstrução pode ser um fator dificultador da intubação traqueal. 
  • NNeck (pescoço): é avaliada a mobilidade do pescoço. Caso o paciente apresente imobilidade do pescoço (devido, por exemplo, a artrite reumatoide, espondilite anquilosante) ou dificuldade de realizar a extensão do pescoço, esses fatores poderão dificultar a laringoscopia. 

Existe a forma simplificada do método LEMON: esta não utiliza a classificação de Mallampati.

Outros preditores:

  • Circunferência cervical > 43 cm.
  • Gestação
  • Teste de mordida do lábio superior:
    • O paciente deve morder o lábio superior com os incisivos da mandíbula inferior, podendo ser classificado em:
      1. Quando os incisivos inferiores ultrapassam a borda vermelha do lábio superior 
      2. Incisivos inferiores não passam da borda vermelha 
      3. Incisivos não são capazes de morder o lábio superior.
  • Complacência do espaço retromandibular: é preditivo de via aérea difícil quando a depressão digital no espaço retromandibular é reduzida, indicando endurecimento e aumento da possibilidade de luxação da língua. 
  • Conformação do palato: pode indicar dificuldade na laringoscopia quando este estiver ogival e estreito, diminuindo o volume da orofaringe.

Conclusão

Embora existam vários preditores de intubação traqueal difícil, é recomendável que eles sejam analisados de maneira conjunta, pois quanto mais parâmetros sugiram uma intubação difícil, maior será a especificidade dos preditores.

Autores, revisores e orientadores:

Autor(a):  Beatriz Almeida Fernandes – @biaalmeida_

Revisor(a): Gabriela de Oliveira Silva  – @gabiii_olivs

Orientador(a): Rodolfo Ragnolli Perez.

Liga: Liga Acadêmica de Anestesiologia e Dor do Distrito Federal.

Instagram: @laad.df

O texto acima é de total responsabilidade do(s) autor(es) e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

Novidade: temos colunas sendo produzidas por Experts da Sanar, médicos conceituados em suas áreas de atuação e coordenadores da Sanar Pós.


Referências:

BONASSA, A. J. et al. Guia de Anestesiologia e Terapia Intensiva. UNIFESP. 1 ed. São Paulo: Manole, 2011. p.534-538

BROWN III, Calvin A.; SAKLES, John C.; MICK, Nathan W. Manual de Walls para o manejo da via aérea na emergência. 5ª edição. Porto Alegre: editora Artmed, 2019: 10 – 16

JÚNIOR, J. O el al. Avaliação e manejo da via aérea. Departamento de medicina da USP, 2010. Acesso em: 27 de fev. 2020. https://www.anestesiologiausp.com.br/wp-content/uploads/graduacao/informacoes-gerais/avaliacaodasviasaereaseintubacaoorotraqueal-graduacao-2010.pdf

MANICA, James. Anestesiologia. 4ª edição. Porto Alegre: editora Artmed, 2018: 578 – 583

MILLER, Ronald D. Miller Anestesia. 8ª edição. Rio de Janeiro: editora Elsevier, 2019: capítulo 55.