Carreira em Medicina

Caso Clínico: Hérnia hiatal | Ligas

Caso Clínico: Hérnia hiatal | Ligas

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Apresentação do caso clínico

Paciente SLSS, do sexo masculino, 51 anos, negro, procedente e residente em Salvador – BA. Comparece à emergência com epigastralgia há 01 dia, relatando piora com alimentação e dor em queimação sempre relacionada também com o ato de se alimentar. Nega uso de medicamentos para melhora da dor. Nega comorbidades, doenças prévias ou alergias.  Relacionado aos antecedentes familiares, revela pai hipertenso e mãe diabética. Refere alcoolismo prévio e nega tabagismo.

Ao exame físico, paciente se encontra em bom estado geral, lúcido e orientado no tempo e no espaço, eupneico – 18 ipm –, normocárdico – 89 bpm –, normotenso – 120x70mmHg –, afebril, anictérico, hidratado e corado. Em aparelho respiratório, murmúrio vesicular presente e bem distribuído, ausência de ruídos adventícios. Em aparelho cardiovascular, bulhas rítmicas e normofonéticas em 2 tempos e sem sopros. Em aparelho digestório, ruídos hidroaéreos presentes, abdômen flácido, indolor à palpação, ausência de irritação peritoneal, ausência de visceromegalias e/ou massas palpáveis. Extremidades sem edemas e bem perfundidas. Ao exame neurológico, ausência de sinais de irritação meníngea.

Paciente recebeu alta após melhora devido ao uso de Peridona, 10 mg, 3 doses, com orientações de retornar à unidade caso os sintomas retornem. Como suspeita diagnóstica, questionou-se a possibilidade de gastrite.

Cerca de 1 semana depois, paciente retorna à emergência relatando vômitos a cerca de 05 dias, associados à intensa epigastralgia. Nega febre, diarréia e sangramentos. Refere epigastralgia com pirose associada a episódio de vômitos. Endoscopia prévia demonstrou volumosa hérnia parahiatal. Refere alcoolismo prévio e nega tabagismo. Nega colecistite. Paciente apresenta saturação de 95%, frequência cardíaca de 110 bpm, significando leve taquicardia, com temperatura axilar de 36.5°C. Paciente se encontra em bom estado geral, lúcido e orientado no tempo e no espaço, eupneico – 19 ipm –, normotenso – 120x80mmHg –, anictérico, hidratado e corado. Em aparelho respiratório, murmúrio vesicular presente e bem distribuído, ausência de ruídos adventícios. Em aparelho cardiovascular, bulhas rítmicas e normofonéticas em 2 tempos e sem sopros. Em aparelho digestório, ruídos hidroaéreos presentes, abdômen plano, timpânico, doloroso à palpação em região epigástrica, embora sem sinais de irritação peritoneal, de visceromegalias e/ou massas palpáveis. Extremidades sem edemas e bem perfundidas. Pulsos radiais e pediosos palpáveis bilateralmente, cheios e simétricos. Ao exame neurológico, pupilas isocóricas e fotorreagentes, força muscular preservada globalmente, GS (Glasgow Scale) de 15, não apresentando déficits cognitivos ou sinais de irritação meníngea. Paciente foi submetido ao internamento.

Como suspeita diagnóstica, foi levantada a possibilidade de uma epigastralgia secundária à hérnia hiatal ou uma pancreatite aguda. Durante o internamento hospitalar, solicitou-se tomografia computadorizada e ressonância nuclear magnética de abdômen total, exames laboratoriais, analgesia e soro fisiológico. Os exames laboratoriais revelaram: Hemácias 4,30 milhões/uL, hemoglobina 13.2 g/dL, hematócrito 38.3%, volume corpuscular médio 89.1 fL, leucócitos 8270/uL, Hb corpuscular média de 30.7 pg, concentração de Hb corpuscular média 34.5 g/dL, R.D.W 14,1%, neutrófilos 67, promielócitos, mielócitos, metamielócitos e bastões não foram encontrados, segmentados 67, eosinófilos e basófilos 1, linfócitos 24 e monócitos 7. Tendo como diagnóstico hemácias normocrômicas e normocíticas, linfócitos sem atipias e plaquetas morfologicamente normais. O laudo da tomografia revelou aparente descontinuidade do diafragma em situação parietal à esquerda, com herniação do corpo gástrico para cavidade torácica, apresentando rotação sobre o seu próprio eixo, apresentando material de estase com formação de nível hidroaéreo devido à área de redução do seu calibre no seu terço médio pela impressão diafragmática.

Após o resultado dos exames, paciente foi encaminhado ao centro cirúrgico para correção da hérnia diafragmática. Durante o procedimento, identificou-se hérnia diafragmática com fundo de estômago em seu interior, foi reduzido todo o conteúdo gástrico, sem sinais de necrose, realizou-se correção da hérnia diafragmática e fixação do estomago ao diafragma. Ao sair do centro cirúrgico, paciente é encaminhado à UTI e permanece hemodinamicamente estável, normocárdico, normotenso, eupneico, afebril e com saturação satisfatória (95%).

Questões para orientar a discussão    

1. Pensando na história natural da doença em questão, como poderíamos classificar os 2 momentos do paciente?

2. Quais as estruturas mais comuns de serem herniadas neste tipo de caso?

3. Qual outro exame poderia ter sido solicitado previamente à internação para investigar o quadro do paciente? E algum que poderia ter sido deixado de fazer?

4. Em relação ao tratamento do paciente, existe algum tratamento clínico? Todo caso de hérnia diafragmática é cirúrgico?

5. As hérnias diafragmáticas costumam aparecer em algum ponto específico?

Respostas

  1. Lembrando que a história natural da hérnia diafragmática é dividida em 3 fases (aguda, latente e crônica)², podemos inferir que no primeiro momento em que SLSS vai para atendimento se encontra na fase latente, uma vez que apresenta uma sintomatologia difusa e inespecífica como dor epigástrica e náusea4. A partir do segundo momento em que o paciente volta para atendimento podemos classificar na fase crônica uma vez que se apresenta num quadro de complicação devido a obstrução e vômitos.

2.A hérnia diafragmática é definida como a evisceração transdiafragmática de conteúdo abdominal para o tórax, normalmente os órgãos, mas frequentemente herniados através do defeito são o estomago, omento, cólons e fígado³.

3. Além da endoscopia como método diagnostico, poderia também ser solicitado uma raio-x de tórax e abdome, visto que ele torna obvio o diagnostico ao se visualizar vísceras abdominais no tórax. E no caso em questão, a RM poderia ter sido deixada de lado visto que já havia sido pedida uma TC, já que esta se apresenta como um exame mais detalhado para o quadro em questão¹.

4. Todo caso de hérnia diafragmática é cirúrgico, visto que por ser uma zona de pressão é de difícil cicatrização espontânea independentemente do tamanho do defeito e deve ser reparado após seu diagnostico visto que irá criar complicações graves e evoluir ao óbito do paciente. Logo não existe tratamento clínico definitivo para hérnias diafragmáticas apenas tratamento paliativo dos sintomas nas fases aguda e latente².

5. Sim, hérnias diafragmáticas costumam aparecer mais em 2 pontos do diafragma, na região póstero-lateral do diafragma esquerdo que é tida como um ponto de fraqueza embriológico e o centro tendíneo que por ser inextensível, também acaba sendo ponto de incidência de hérnias diafragmáticas4.