Cirurgia geral

Retalhos cutâneos | Colunistas

Retalhos cutâneos | Colunistas

Compartilhar
Imagem de perfil de Comunidade Sanar

Definição

Os retalhos cutâneos são unidades constituídas por pele e tela subcutânea transferida de uma área (doadora) para outra (receptora), tendo o seu próprio pedículo vascular, responsável pela sua nutrição. São utilizados na cobertura de feridas, proporcionando um melhor aspecto estético e funcional. É importante lembrarmos que o retalho se diferencia do enxerto exatamente porque o enxerto é totalmente desconectado do seu pedículo vascular, nutrindo-se inicialmente por embebição plasmática da área receptora.

Indicações

Reparação de feridas na face (aspecto estético);

Cobertura de estruturas nobres (nervos e vasos – cobertura mais robusta);

Cobertura de saliências ósseas (tratamentos de úlceras de pressão – escaras de decúbito);

Regiões com déficit de irrigação (quando colocado nessa região, o retalho melhora a vascularização do leito receptor).

Contraindicação

Insuficiência da área doadora.

Classificação

Os retalhos se classificam de acordo com diversos critérios quanto a:

  1. Forma
  2. Planos: retalhos que mantêm a forma original, possuindo uma única superfície de revestimento cutâneo, constituindo a maioria dos retalhos;
  3. Tubulares: retalhos cujas bordas são saturadas uma à outra, formando um tubo.
  4. Número de pedículos
  5. Monopediculados;
  6. Bipediculados;
  7. Multipediculados.
  8. Constituição
  9. Simples – formado apenas por pele e tela subcutânea;
  10. Duplo revestimento – retalho simples que têm a sua parte de subcutâneo enxertada com pele, ou seja, têm pele na parte externa e na interna, sendo bom para reconstruir cavidades como bochecha;
  11. Composto – pele e subcutâneo + outro tecido: se músculo, retalho miocutâneo; se cartilagem, retalho condrocutâneo; se osso, osteocutâneo; se osso e músculo e pele, osteomiocutâneo.
  12. Vascularização
  13. Randomizados ou ao acaso – são retalhos cuja irrigação vem de artérias perfurantes musculocutâneas;
  14. Axiais – retalho cuja irrigação é pela artéria cutânea direta.
  15. Mobilização
  16. A distância – são retalhos obtidos de uma região distante do local a ser reparado;
  17. Vizinhança – são subdivididos de acordo com a sua forma de migração:
    1. Deslizamento/avanço: são aqueles retalhos traçados a partir de uma das bordas da área cruenta, que lhe é contígua, alcançando-a em movimento retilíneo. São usados em retirada de lesões de pele, para diminuir tensão da ferida. Se formar redundância de pele na base, a chamada orelha de cachorro, deve-se fazer a retirada desse triângulo de compensação/de Burow (Figura 1);
    1. Rotação: são aqueles retalhos traçados a partir de uma das bordas da área cruenta, que lhe é contígua, alcançando-a em movimento rotatório. O seguimento de pele é retirado em triangulo e progride em semicírculo (2-4x a extensão de um dos lados do triângulo), fazendo descolamento do plano subcutâneo e rotação do retalho para o fechamento da ferida. Se formar redundância de pele na base, retira-se o triângulo de compensação;
Figura 1: retalho de avanço (Kalaska,2016)
Figura 2: A) Retalho cutâneo em rotação. B) Incisão de compensação. C) Triângulo de Burow (Mélega, 2011)

Transposição:

são retalhos de forma variável que, para alcançar a área cruenta, realizam um movimento giratório, transpondo a área de pele normal. Como exemplos, temos: retalho bilobado, retalho de Limberg e zetaplastia;

Interpolação:

são retalhos de forma variável que, para alcançar a área cruenta, realizam um movimento giratório, passando em ponte sobre a área de pele normal.

Figura 3: retalho de interpolação (Kalaska, 2016)
  • Complicações
  • Infecção;
  • Hematoma;
  • Necrose de ponta;
  • Insuficiência vascular;
  • Sutura sob tensão ou torção do pedículo;
  • Utilização de um retalho menor que a área coberta;
  • Cuidados pós-operatórios inadequados.

Limberg

Retalho que utiliza paralelogramo com ângulo de 60° e 120° para transpor tecido para um defeito em forma de diamante. É bastante versátil, sendo indicado em cistos pilonidais, cirurgias em mãos e nas áreas de otorrinolaringologia e oftalmologia.

Procedimento: realizar incisão da lesão em forma de losango (romboide), onde, no maior ângulo interno, faz-se o prolongamento do mesmo tamanho de um dos lados do losango e, em seguida, uma linha paralela a um outro lado do losango. Depois, seguimos realizando o descolamento da pele e do subcutâneo e depois transpomos o retalho para fechar a ferida.

Figura 4: Limberg* (Chasmar, 2007)
*Transposição do retalho D’-B, E´-A, F-D (sutura mais importante, faz com que o retalho caia sobre toda ferida sem tensão, fazer ponto de Gillies nesse local primeiro)

Zetaplastia

É uma técnica na qual dois triângulos são transpostos. Ela é indicada no alongamento de cicatrizes retráteis, na mudança da posição da cicatriz em relação às linhas de força e na correção de defeitos congênitos como fissuras labiopalatinas e bridas amnióticas.

  • Procedimento – nessa técnica, fazemos uma incisão na região central e dois prolongamentos: um para direita e outro para esquerda do mesmo tamanho, formando um “Z”. Descolamos o subcutâneo e no seu fechamento fazemos a transposição do triângulo, o B vai para o lugar do A e o triângulo A vai para o lugar do B (ver imagem). O Z muda de posição, sendo que ele pode ser único ou múltiplo.

Pós retalho

Avaliação: os retalhos podem ser avaliados quanto a cor (normal, se bem perfundido; cianótico, insuficiência venosa; se pálido, insuficiência arterial), sangramento (se o parâmetro da cor não for o bastante, podemos fazer pequenas perfurações na superfície do retalho com uma agulha e avaliar a coloração do sangramento; se sangue vermelho rutilante, bem perfundido; se sangramento escurecido ou cianótico, insuficiência venosa; se não tiver sangramento, insuficiência arterial) e podemos usar também teste de viabilidade (angiografia, fluorescência e temperatura).

Resultados tardios:

cor e textura normais, diminuição da espessura do retalho; glândulas sebáceas, pelos normais e as glândulas sudoríparas (inervação simpática) demoram mais tempo para entrar em atividade, porque a regeneração nervosa ocorre mais tardiamente – daí a necessidade de uma boa hidratação da área do retalho até que as glândulas sudoríparas voltem ao seu funcionamento normal.

O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: esse material foi produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido.


REFERÊNCIAS:

Goffi Fábio Schimit. Técnica Cirúrgica: Bases Anatômicas, Fisiopatológicas e Técnicas de Cirurgia. 4a edição – São Paulo: Atheneu, 1996.

Morris, D. Overview of flaps for soft tissue reconstruction. UpToDate, 2018.

Mélega, José Marcos. Cirurgia Plástica Fundamentos e Arte, Princípios Gerais. 1ª edição, Editora MEDSI – 2002.

Mélega, José Marcos. Cirurgia Plástica- Os Princípios e a atualidade. Editora Guanabara – 2011.

UpToDate. Overview of flaps for soft tissue reconstruction. Jul 2020.

Chasmar, Leslie. The versatile rhomboid (Limberg) flap. The Canadian Journal of Plastic Surgery – 2007.

Sabiston. Tratado de cirurgia: A base biológica da prática cirúrgica moderna. 19.ed, Editora Elsevier – 2014.

Kalaska, Deepak K, Peter E. Butler, and Shadi Ghali. Textbook of Plastic and Reconstructive Surgery. UCL Press2016.