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Conceito
A shigelose é uma doença diarreica causada por algumas bactérias gram-negativas da família Enterobacteriaceae, como: S sonnei, S flexneri, S boydii e S dysenteriae. A S. sonnei e S. boydii geralmente estão relacionadas às enfermidades mais brandas, e a S dysenteriae às enfermidades mais graves.
Transmissão
É transmitida por via fecal-oral, principalmente quando o ser humano faz ingestão de alimentos contaminados (especialmente os com baixo teor de água em sua composição). A shigella é muito sensível ao calor, e sobrevive sob a temperatura de 10 a 45º C e ph de 5 a 8, e não sobrevivem à pasteurização.
Por ter sua transmissão por via fecal-oral, lugares sem saneamento básico são fatores de risco para a transmissão da shigelose, e as moscas são facilitadores, já que elas vão fazer o trânsito do conteúdo fecal até os alimentos em que pousam.
Quadro Clínico
Após a entrada das bactérias no organismo humano, os sintomas costumam surgir cerca de 1 a 4 dias. É normalmente uma patologia autolimitada, estendendo-se de 5 a 7 dias na maior parte dos casos.
Os sintomas costumam ser os mesmo de outra gastroenterite bacteriana, como: diarreia leve a uma disenteria grave, vômitos, dor abdominal, febre, enterorragia, etc. Nas crianças até a fase pré-escolar, a shigelose tem início súbito, e vem acompanhada de febre, irritabilidade e sonolência. A criança normalmente cursa com piora rapidamente, e começa um quadro de hematoquezia, podendo ter uma frequência de evacuação maior que vinte por dia.
Normalmente a shigelose não causa complicações graves, sendo a desidratação a mais comum, contudo, o paciente também pode cursar com hipoglicemia grave, convulsões, tenesmo retal, cefaleia e letargia, síndrome hemolítico-urêmica (SHU), microangiopatia trombótica. Idosos, crianças, e imunodeprimidos ou imunossuprimidos são fatores de risco para o agravo da doença.
Síndrome hemolítico-urêmica (SHU)
A síndrome hemolítico-urêmica é causada principalmente pelo tipo 1 da Shigella dysenteriae, pois ela produz uma enterotoxina chamada Shiga. É caracterizada pela típica tríade: lesão renal aguda, anemia hemolítica microangiopática e trombocitopenia. Deve-se solicitar hemograma (investigação de anemia e trombocitopenia), esfregaço sanguíneo (presença de esquistócitos), função renal (pois a SHU causa muito insuficiência renal), eletrólitos (SHU causa hipercalemia, hiponatremia, hipernatremia, acidose, hiperfosfatemia), lactato desidrogenase (tende a estar aumentado), etc. A reação em cadeia da polimerase para detectar toxina Shiga 1/ toxina Shiga 2 nas amostras fecais deve ser solicitada, e é mais específico para um melhor manejo clínico.
Fisiopatologia
A shigella depois de entrar em contato com a porta de entrada do organismo humano, descendem para o intestino delgado, multiplicam-se, e vão para o cólon. Depois disso, as bactérias penetram na mucosa do cólon através das micropregas, usando a actina do ser humano para realizar sua movimentação pelo citoplasma. Nesse tempo, o sistema humano é ativado e começa a liberar macrófagos para fagocitar as bactérias, entretanto, quando ocorre a fagocitose, as bactérias induzem a apoptose dos macrófagos, aumentando, assim, a resposta inflamatória pelo aumento de citocinas pró-inflamatórias liberadas.
Mas porque a shigelose causa disenteria?
A shigelose, como as outras gastroenterites, ao colonizar o trânsito intestinal e causar a chuva de citocinas pró-inflamatórias, gera uma resposta bastante agressiva do corpo humano. Devido a ela, as células natural killer (NK), e neutrófilos polimorfonucleares (PMN) são atraídos para atuar no local da infecção, e causam a destruição da mucosa intestinal do hospedeiro. Quanto maior a lesão tecidual que as células NK e os PMN causam, maior tende a ser infecção, pois permite a entrada de maneira mais fácil e rápida da shigella, gerando o quadro clínico típico da doença.

Fonte: Schroeder e Hilbi, 2008.
Tratamento
O tratamento da shigelose não é tão rotineiro, isso se dá por ela ser normalmente uma doença autolimitada, devido a isso, o tratamento, para casos não-graves, é normalmente de suporte. Assim, devido à diarreia, os pacientes devem fazer ingesta de água em abundância, e em alguns casos fazer hidratação venosa. Pode-se iniciar antibiótico empiricamente para evitar um quadro mais grave, principalmente nos grupos de risco: crianças e adultos com doença grave, idosos, pacientes desnutridos ou doentes crônicos e para controle da disseminação da doença.
Os antibióticos normalmente usados são fluoroquinolona (como ciprofloxacino 500 mg via oral, tomar a cada 12 horas por 3 dias), azitromicina (tomar no 1º dia 500 mg, e nos outros seguintes, tomar 250 mg por quatro dias) ou cefalosporina de 3ª geração.
Autor : Arthur de Morais e Silva
Instagram: @arthurdemorais_
O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.
Observação: esse material foi produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido.
Referências
https://tede.ufam.edu.br/bitstream/tede/2232/1/Maria%20Scheffer.pdf
https://bestpractice.bmj.com/topics/pt-br/1174/pdf/1174/Infec%C3%A7%C3%A3o%20por%20Shigella.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_bolso_4ed.pdf