Índice
- 1 Caso clínico 1 – “Doutor, minha filha teve uma convulsão”
- 2 Qual a conduta imediata?
- 3 O que é síncope?
- 4 O que o polígono de Willis tem a ver?
- 5 Causas de síncope na emergência
- 6 Consulta inicial do paciente com síncope na emergência
- 7 Métodos diagnósticos da síncope
- 8 Reavaliação da paciente
- 9 Qual a conduta agora?
- 10 Síncope vasovagal
- 11 Tratamento da ortostática
- 12 Tratamento para causas cardíacas
- 13 Conclusão do caso clínico
- 14 Resumo
- 15 Referências
- 16 Post relacionado
A síncope é definida como perda transitória de consciência devido à hipoperfusão cerebral, caracterizada por um início rápido, curta duração e recuperação completa espontânea.
Acompanhe o caso clínico abaixo, que serve para ilustrar a condução de um paciente com síncope.
Caso clínico 1 – “Doutor, minha filha teve uma convulsão”
HDA: Marina, 16 anos, estudante, vem trazida pela mãe por ter tido crise convulsiva durante a madrugada. Agora está totalmente consciente, sem déficits focais.
HPP: Nada
História familiar: Mãe tinha o mesmo quadro na adolescência, mas melhorou após uso de anti-convulsivantes
Exame físico sem alterações
ECG

Qual a conduta imediata?
A)Internação hospitalar
B)Alta
C)Realização de um ultrassom de carótidas. Se normal, alta
D)Realização de uma TC de crânio sem contraste
Resposta: letra A)

O que é síncope?

Perda transitória da consciência por hipoperfusão cerebral com resolução completa, sem déficits neurológicos.
Corresponde a 6 a 8 segundos sem perfusão no Sistema Reticular Ativador Ascendente (SRAA).
- Se não for transitória: coma
- Se for parcial: estupor/torpor
- Acometimento transitório, global e autolimitado da consciência: síncope
OBS.: Se a síncope for sucedida de esturpor ou sinais focais, algo AINDA está danificando o sistema. Nesses casos, encefalopatia, neoplasias, sangramento, acidentes vasculares são hipóteses.
• Síncopou e acordou: provavelmente alteração cardíaca.
•Síncopou e está com esturpor ou sinais focais: provavelmente alteração neurológica.
O que o polígono de Willis tem a ver?

O que poderia danificar transitoriamente o córtex bilateral ou a SRAA? Precisamos pensar em algo relacionado ao fluxo sanguíneo: Algo reduziu ou interrompeu o fluxo sanguíneo para o córtex ou para o SRAA!
O SRAA recebe sangue do polígono de Willis, da artéria basilar, da ASA, da PSA, PICA, PCA e AICA.
As duas maneiras de levar menos sangue a uma artéria são oclusão e baixo débito:
- Pela rica irrigação das estruturas, oclusão raramente é hipótese (exceção: artéria basilar).
- Baixo débito sim é capaz de fazer essas estruturas pararem de funcionar transitoriamente.
Causas de síncope na emergência

Consulta inicial do paciente com síncope na emergência
1) Foi síncope mesmo?
- A perda de consciência foi completa?
- A perda de consciência teve início rápido e curta duração?
- A recuperação foi espontânea, completa e sem sequelas?
- O tônus postural foi perdido?


2)Tem doença cardíaca?
3)Usa medicações?
4)Já houve recorrências?
5)Existem gatilhos?
6)Precedido por pródromos?
- Desmaios e tonturas – 70% dos pacientes com síncope verdadeira
- Náuseas e diaforese – falam a favor da etiologia vasovagal
- Duração: 2 a 3 minutos na vasovagal, 3 segundos na síncope cardíaca
Normalmente pacientes com síncope verdadeira não se lembram do momento que caíram ao chão.
- Confusão mental após acordar:
- Até 30 segundos na síncope verdadeira
- Mais longa que isso no período pós-ictal de uma convulsão
Síncope pode gerar episódios tônico-clônicos!
Métodos diagnósticos da síncope
Anamnese e exame físico
- Descrição do evento pelo paciente: tontura, escurecimento da visão, sensação de desmaio iminente, luzes na cabeça
- Posição em que ocorreu: a supina tem pior prognóstico
- Pródromos por segundos ou minutos (sensação de calor ou frio, palpitações, diaforese).
ECG
- 5% de chance de diagnóstico
- Se normal: sugere baixa probabilidade de síncope cardíaca
- ECG-alta resolução: sem papel na síncope
Holter
- Importante se já há história pessoal de cardiopatia e os episódios são frequentes;
- Episódios de síncope em ritmo sinusal: exclui causa arrítmica.
Ecocardiograma
•Síncope em que se suspeita de causa estrutural (ex.:estenose aórtica, cardiomiopatia hipertrófica).
Reavaliação da paciente
HDA: Marina fez um ecocardiograma que foi normal. O Tilt test foi positivo do tipo vasodepressor.
Qual a conduta agora?
A)Avaliação da neurologia
B)Realização de estudo genético
C)Iniciar midodrina
D)Estudo eletrofisiológico
Resposta: letra D)
Tilt testing
- Busca de causa neuro-mediada ou disautonômica;
- Inúmeros fatores confundidores;
- Deve ser realizada apenas quando não houver diagnóstico firmado (quando se suspeita de síncope reflexa);
- Baixa sensibilidade e especificidade;
- Examinador dependente.

Estudo eletrofisiológico
- Examinador dependente;
- Útil para o diagnóstico nas seguintes situações clínicas: bradicardia sinusal assintomática (suspeita de parada sinusal causando síncope), síncope em bloqueio de ramo bifascicular (bloqueio AV de alto grau iminente) e suspeita de taquicardia;
- História familiar de morte súbita (?);
- Ocupações de alto risco (ex: piloto de avião), avaliar prognóstico.
TC de crânio e Doppler de carótidas
- Utilizados de maneira errônea;
- Não devem ser feitos em pacientes com síncope não-complicada (sem déficits focais).
Teste de Esforço
- Isquemia miocárdica: causa rara
- Durante exercício: CPVT, QTL
- Pós-exercício: sempre neuro-mediada
CATE
- Deve ser solicitado apenas se houver indicação para tal.
- Síncope por si só não é indicação!
Monitor de eventos implantável

- Dispositivo que pode ficar até 36 meses ou mais monitorando o ritmo cardíaco;
- Indicado para síncopes não explicadas e de baixo risco (pacientes que foram internados, fizeram outros exames, mas ainda não tiveram diagnóstico);
- Até 88% de acurácia diagnóstica.
Síncope vasovagal
É quando se tem pródromos (sudorese fria, sensação de mal estar, vômito, náuseas).
O que fazer?
- Ingerir mais sal e água, se possível
- Midodrina
- Fludrocortisona
- Beta-bloqueador: sem benefício
- Disopiramida
- Inibidores da receptação de serotonina
- Tilt-training (fisioterapia)
- Marca-passo dupla câmara (Diretriz europeia recomendou como classe IIa se assistolia documentada)
Tilt-training
As intervenções fisioterapêuticas na síncope reflexa se baseiam na realização do Tilt Training, na qual o paciente permanece em posições específicas. O treino será realizado diariamente sob supervisão, com objetivo de aumentar o tempo de tolerância na postura.



Tratamento da ortostática
- Manobras de contra-pressão
- Reduzir antihipertensivos para PA alvo< 140 x 90mmHg
- Fludrocortisona e midodrina também podem ser usadas
Tratamento para causas cardíacas
- Bradi-arrítmico: marca passo
- Taqui-arrítmico: implante do CDI
Conclusão do caso clínico
Estudo genético confirmou Síndrome do QT longo tipo 1.
Marina está hoje em uso de betabloqueadores em dose alta.
Resumo
- Síncopes são causa frequente de consulta no pronto atendimento;
- São definidas como perda transitória e completa da consciência, com retorno sem déficits;
- Se não transitória = coma
- Se incompleta = torpor
- e se apresenta déficits neurológicos = AVC
- Possuem uma longa lista de diagnósticos diferenciais;
- As causas cardíacas são acompanhadas de alta morbimortalidade;
- A anamnese e o exame físico são muito mais importantes do que os exames complementares e os escores;
- Os principais exames são ECG, Ecocardiograma e Holter, mas nem sempre conseguem dar o diagnóstico
- Tratamento do tipo vaso vagal é com manobras de contrapressão. E cada causa cardíaca tem seu tratamento específico.
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Referências
Brignole M, Moya A, Lange F et al. 2018 ESC Guidelines for the diagnosis and management of syncope. European Heart Journal, Volume 39, Issue 21, 01 June 2018, Pages 1883–1948, https://doi.org/10.1093/eurheartj/ehy037
HAIN, TC. Tilt Training for Orthostatic Hypotension and Syncope. Dizziness-and-balance, 2020. Disponível em: https://www.dizziness-and-balance.com/treatment/rehab/tilt%20training.html. Acesso em: 19 de fevereiro de 2020.