Endocrinologia

Síndrome metabólica: overview | Colunistas

Síndrome metabólica: overview | Colunistas

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Vivemos em um mundo em pleno desenvolvimento e expansão e, dentro deste cenário, lutamos para garantir nosso espaço, para nos tornar protagonistas e não meros telespectadores. Porém, infelizmente, não existe lugar para todos nesse contexto, e a desigualdade social aumenta na mesma medida em que os cuidados com a própria saúde são negligenciados, hábitos saudáveis de alimentação e atividades físicas são deixadas de lado, e a praticidade do fast food incentivada. Não à toa, inúmeros profissionais de saúde e revistas especializadas alertam a respeito dos riscos cardiovasculares, associados à síndrome metabólica (SM).

Abordaremos neste artigo uma visão geral a respeito desta síndrome, caracterizada como um conjunto de alterações metabólicas, como deposição central de gordura e resistência à insulina, que aumentam, e muito, os riscos da doença aterosclerótica. É recomendado, porém, a busca por periódicos e artigos para aprofundamento sobre o assunto.

Segundo a I Diretriz Brasileira de Diagnóstico e Tratamento da Síndrome Metabólica [1], a presença da SM e sua concomitância com alterações cardiovasculares aumenta a mortalidade geral por volta de 1,5 vezes e a cardiovascular em aproximadamente 2,5 vezes. Alguns fatores de risco, como maus hábitos alimentares, sedentarismo, estresse, obesidade e predisposição genética podem colaborar para o desenvolvimento deste quadro.

Percebe-se ainda uma prevalência da ocorrência da SM na população feminina, em especial dentre aquelas com idade superior a 59 anos, atribuída às modificações hormonais ocasionadas na menopausa e à tendência de acumulo de gordura abdominal nessa fase, assim como o aumento das partículas de LDL circulantes, tornando-as mais aterogênicas, fator associado ao maior risco de doença cardiovasculares. [2]

Alguns outros fatores, como socioeconômicos e comportamentais, estão diretamente relacionados e também se configuram como fatores de risco para SM, devendo ser considerados em uma análise mais ampla. Em um estudo publicado em 2020 pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva, ficou clara a importância da atividade física como um tratamento não farmacológico de primeira linha para controle da SM e, também, que políticas de prevenção são necessárias, tendo em vista que o fatores socioeconômicos figuraram como uma variável importante. [6]

Segundo critérios utilizados pela Sociedade Brasileira de Cardiologia [1], que considera a classificação proposta pela National Cholesterol Education Program’s AdultTreatment Panel III (NCEP-ATP III), a SM ocorre quando estão presentes ao menos três dos cinco itens descritos no quadro abaixo:

Fonte: Quadro extraído da I DIRETRIZ BRASILEIRA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DA SÍNDROME METABÓLICA, https://www.scielo.br/pdf/abc/v84s1/a01v84s1.pdf

Um estudo realizado em 2013 pela Universidade Federal de Alagoas, com o objetivo de avaliar a prevalência da SM e os fatores associados à população brasileira, identificou que aproximadamente 9% da população apresentou a condição de SM, de acordo com a definição de harmonização dos consensos internacionais de cardiologia com carga ≥ 3 dos seguintes componentes: diabetes e hipercolesterolemia autorreferidas, pressão arterial elevada e circunferência da cintura elevada. Este mesmo estudo demonstrou que somente 23,8% da população não apresenta nenhum dos componentes da SM e que 67,3% apresentam entre um e dois componentes. [2]

Fisiopatologia

A deposição central de gordura representa um dos aspectos principais da SM e pode ser estimada a partir da circunferência abdominal, conforme descrito no Quadro 1. Diversos problemas metabólicos estão associados ao acúmulo de gordura abdominal, entres eles merecem destaque a hipersensibilidade à glicocorticoides do tecido adiposo, associado à maior capacidade de vasoconstrição e aumento da pressão arterial. O excesso de glicocorticoides também estimula a glicose-6-fosfatase que promove o aumento dos níveis plasmáticos de glicose; em longo prazo, o nível aumentado de glicose induz a liberação de excesso de insulina pelo pâncreas. A hipersecreção de glicocorticoides, em conjunto com a hiperinsulinemia do tecido adiposo visceral, age fornecendo um retorno negativo ao pâncreas, que inibe a secreção de insulina, culminando com a resistência à insulina e a diabetes do tipo II.  [4] [5] [7].

O acúmulo de gordura visceral aumenta também o risco de degeneração gordurosa não alcoólica do fígado, devido ao aumento da lipólise e da síntese de triglicerídeos a partir da glicose. Além disso, também ocorre o aumento da secreção hepática de triglicerídeos para o sangue, elevando seus níveis séricos. O excesso de triglicerídeos no sangue diminui a secreção hepática de HDL e aumenta a de VLDL e LDL. Estas alterações, respectivamente, alteram a viscosidade do sangue, o que favorece o processo de agregação de plaquetas e o risco de trombose e progressivamente dão origem a lesões e formação de placas de gordura nas paredes arteriais. [7]

Estes, dentre outros fatores associados à SM, aumentam substancialmente o risco de doenças cardiovasculares.

Outros fatores associados

Alguns outros achados clínicos, levando em consideração que a hiperinsulinemia ocasionada pela SM pode estimular alguns tecidos não resistentes, levam a doenças como:

Acantose nigricans: comumente associada à SM, é uma doença caracterizada por manchas hiperpigmentadas na pele, com textura grossa e aveludada, que podem aparecer nas axilas, dorso cervical, virilha, juntos e dobras da pele;

Esteatose hepática: caracterizada pelo acúmulo excessivo de gotículas lipídicas nos hepatócitos. A doença hepática não alcoólica está associada à diabetes mellitus tipo 2 e à obesidade;

Síndrome dos ovários policísticos: esta síndrome é bastante comum em mulheres pré-menopausa, e a prevalência de resistência à insulina/hiperinsulinemia é significativamente maior nessas pacientes; [3]

Alterações cognitivas: o artigo “Doenças associadas à resistência à insulina/hiperinsulinemia não incluídas na síndrome metabólica”, um estudo que avaliou a população de idosos americanos, demonstrou que a presença da SM aumentava os riscos de alterações cognitivas, independentemente das questões demográficas, de hábitos de vida e comorbidades, e esses riscos eram ainda mais evidentes em idosos com alterações inflamatórias mais acentuadas. [3]

Tratamento

O tratamento inclui um plano de terapia não medicamentosa, como ajuste dos hábitos alimentares (a simples ingestão de farelo de aveia, que se liga aos ácidos biliares e é constituinte de muitos cereais matinais, aumenta a proporção de colesterol hepático que forma novos ácidos biliares, em vez de formar novas LDLs e placas aterogênicas), atividades físicas para redução de peso, controle na ingestão de bebida alcoólica e de situações de estresse e um plano de terapias medicamentosas, quando a terapia não medicamentosa não é suficiente e a depender de cada comorbidade associada. [4]

Pessoas com diabetes ou hipertensão arterial são exemplos em que o tratamento medicamentoso pode ser necessário em complemento à terapia não medicamentosa.

A maior parte dos sintomas pode ser revertido com um bom acompanhamento médico e mudanças nos hábitos de vida, porém um dos grandes desafios a serem considerados, uma vez diagnosticada a SM, é a adesão do paciente ao tratamento. Isso se deve à necessidade de alterações de velhos hábitos, já há muito tempo presentes em seu cotidiano, a exemplo o hábito de fumar, beber e ingerir alimentos ricos em carboidratos e gorduras. Além disso, algumas alterações forçadas na rotina de todos, como a reclusão social, trazem consigo um aumento significativo no estresse do dia a dia e restringem algumas possibilidades de atividades físicas, fatores que aumentam o risco associados à SM.

O texto acima é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.