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Técnica de Sistrunk: método de escolha para remoção do cisto tireoglosso | Colunistas

Técnica de Sistrunk: método de escolha para remoção do cisto tireoglosso | Colunistas

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Imagem de perfil de Comunidade Sanar

O cisto do ducto tireoglosso (ou cisto tireoglosso) é a massa em linha média cervical anterior mais comum nos pacientes pediátricos na idade pré-escolar (sendo a maioria dos casos verificados aos 5 anos de idade), embora possa aparecer em adultos (principalmente após uma infecção de vias aéreas superiores). O cisto pode ser formado em qualquer lugar ao longo do trajeto do ducto tireoglosso remanescente. Seu tratamento é cirúrgico, principalmente para evitar o surgimento de complicações. A operação preconizada permanece a mesma desde que foi descrita por Sistrunk, em 1928. A técnica de Sistrunk consiste na retirada do cisto e de seu trato epitelial até a base da língua, e também na ressecção da porção mediana anterior do osso hioide.

O que é o ducto tireoglosso?

A primeira glândula endócrina a se desenvolver no embrião é a tireoide. Conforme essa glândula em desenvolvimento cresce, ela desce pelo pescoço, cruzando ventralmente o osso hioide e as cartilagens laríngeas em formação. Nesse período, a tireoide encontra-se conectada ao forame cego da língua por um tubo, o ducto tireoglosso. Geralmente, o ducto se atrofia e desaparece no momento em que a glândula já está localizada em seu espaço definitivo no pescoço. Porém, há casos em que ele persiste, podendo ser preenchido por secreção salivar (visto que apresenta conexão com o forame cego), tornando-se assim um cisto, revestido por epitélio.

O cisto comumente se forma na língua ou na parte anterior do pescoço (imediatamente inferior ao osso hioide), se apresentando como massa indolor (salvo se for infectada) na região mediana do pescoço. Pode ocorrer o aumento gradativo da lesão com o tempo ou após quadros de infecções virais do trato respiratório superior. No exame físico, a sua visualização é facilitada com hiperextensão do pescoço do paciente e é facilmente palpável abaixo do osso hioide. Um fator importante que auxilia no diagnóstico de cisto tireoglosso (e afasta outros possíveis diagnósticos diferenciais), é a mobilidade do cisto com a protrusão da língua e com a deglutição. Também podem ser utilizados para o diagnóstico, exames complementares de imagem, tais como a tomografia computadorizada do pescoço com contraste e o USG.

Complicações do cisto tireoglosso

 O cisto do ducto tireoglosso tem prevalência de 7% de toda a população, e é a alteração congênita mais frequente do desenvolvimento da tireoide. Apesar de se tratar de uma lesão benigna, uma de suas principais complicações ocorre quando o cisto se torna infeccioso (sendo invadido principalmente por bactérias provenientes da cavidade oral), fistulizando e drenando seu conteúdo para a pele.

Outra importante complicação é o potencial de malignidade, que pode ocorrer caso o cisto contenha tecido tireoidiano anômalo em seu interior. Embora essa alteração ocorra em apenas 1% dos casos, a diferenciação de um cisto benigno para um maligno é muito difícil de ser feita apenas com a realização do exame físico, já que o cisto maligno pode ter uma apresentação semelhante ao benigno, sem se manifestar como lesão dura, aderida a planos profundos, irregular, associada à linfadenopatia ou com alteração de aparência recente.  Por esse motivo, a melhor conduta após a suspeita diagnóstica de cisto do ducto tireoglosso é a exérese cirúrgica, pela técnica de Sistrunk, e a realização do exame anatomopatológico da peça no pós-operatório.

Figura 1. Trajeto do ducto tireoglosso.
Fonte: MOORE Embriologia Clínica – 10a edição.

Como é feita a cirurgia de Sistrunk?

É realizada uma incisão na transversal, de aproximadamente 5 centímetros de comprimento, no campo da lesão, na altura do osso hioide. A pele e o músculo platisma são afastados para expor o cisto. É feita uma excisão completa do cisto, juntamente com o trajeto fistuloso proximal do ducto (estendendo-se até a altura do forame cego, na base da língua). Os músculos inseridos medialmente no osso hioide são ressecados e separados, e então, é retirada a porção medial anterior do osso (de aproximadamente 2 centímetros). Por fim, é inserido um dreno próximo ao hioide (evitando assim a formação de coleções subcutâneas, como hematomas) e é realizada a síntese dos tecidos seccionados.

A remoção do trajeto do ducto tireoglosso é feita com margem de segurança, diminuindo o risco da recorrência de cistos. Por esse motivo a introdução da técnica de Sistrunk (a qual tem uma taxa de recidiva de 3 a 5%) substituiu a antiga técnica de ressecção simples do cisto tireoglosso (com uma taxa de 50% de recidiva). 

Complicações da Técnica de Sistrunk

Como toda a cirurgia de cabeça e pescoço, existem riscos e complicações associadas à manipulação de uma região onde se encontram diversas estruturas importantes, tais como nervos, vasos e a via aérea. Complicações graves que potencialmente podem ocorrer seriam a lesão de via aérea, de nervos, o hipotireoidismo, a recorrência do cisto tireoglosso (complicação relacionada à retirada incompleta do ducto e do osso hioide), abscessos e hematomas. O que poderá exigir novas intervenções cirúrgicas subsequentes. Entretanto, é rara a ocorrência de complicações graves após o procedimento de Sistrunk.

Conclusão

O cisto do tireoglosso ocorre principalmente em pacientes pediátricos, e é formado em decorrência da persistência anômala do ducto tireoglosso, podendo surgir em qualquer trecho do antigo trajeto da descida da tireoide. Como em maior parte dos casos a apresentação de um cisto maligno é semelhante à de um benigno, a melhor conduta após estabelecer o diagnóstico é o tratamento cirúrgico da lesão, sendo a técnica de escolha a de Sistrunk, tanto para evitar complicações e risco de malignização, quanto para proporcionar qualidade de vida para o paciente.


O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

Novidade: temos colunas sendo produzidas por Experts da Sanar, médicos conceituados em suas áreas de atuação e coordenadores da Sanar Pós.


Referências:

CISTO TIREOGLOSSO E OPERAÇÃO DE SISTRUNK – http://revista.faciplac.edu.br/index.php/RSF/article/view/336

CISTOS E FÍSTULAS DO DUCTO TIREOGLOSSO – http://oldfiles.bjorl.org/conteudo/acervo/acervo.asp?id=1397

TUMORES DE CABEÇA E PESCOÇO NA CRIANÇA – https://cdn.gn1.link/iapo/manuals/vii_manual_br_15.pdf

SABISTON 19a EDIÇÃO, cap. 35 e 38

GOLDMAN-CECIL 25a edição, capítulo 226

MOORE embriologia clínica 10a edição, cap.9

Sistrunk Procedure for Thyroglossal Duct Cyst – https://www.thyroid.com.au/sistrunk-procedure-for-thyroglossal-duct-cyst/

CARCINOMA FOLICULAR METASTÁTICO PARA DUCTO TIREOGLOSSO – https://www.scielo.br/pdf/rcbc/v26n6/14.pdf

Carcinoma de células escamosas em cisto do ducto – tireoglosso https://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:BF00sozntqoJ:https://acervomais.com.br/index.php/saude/article/download/4840/2554/+&cd=3&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br