Ciclo Clínico

Telarca precoce: mecanismo fisiopatológico e diagnóstico | Colunistas

Telarca precoce: mecanismo fisiopatológico e diagnóstico | Colunistas

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A telarca precoce (TP) é processo benigno do aparecimento do broto mamário antes dos 8 anos de idade.  Essa condição é comum na prática clínica diária; é mais frequente em meninas entre 6 meses e 2 anos de idade e, depois dos 4 anos de idade, essa condição é menos comum. Então, é necessário realizar o diagnóstico diferencial, principalmente para os casos de telarca com doenças que requerem uma intervenção terapêutica.

Mecanismos fisiopatológicos

Os mecanismos fisiopatológicos que causam a TP são desconhecidos, porém acredita-se que eles resultam dos aspectos listados abaixo, os quais podem agir sozinhos ou em conjunto.

  1. Aumento da sensibilidade da mama ao estrogênio;
  2. níveis elevados de estrogênio;
  3. secreção de estrogênio por cistos ovarianos foliculares;
  4.  aumento da produção de estrogênio dos precursores adrenais;
  5. aumento do estrogênio na dieta; 
  6. ativação parcial transitória do eixo HCG com secreção predominante de folículo-estimulante (FSH) e hormônios luteinizante (LH);

Ao nascer, a criança possui o seu eixo hipotálamo-hipófise-gonadal (HHG) ativo e, ao longo dos meses, ocorre a inibição dele, tornando-se latente até a puberdade, quando é ativado novamente. O eixo HHG faz com que o LH e FSH secretem esteroides sexuais; como essa inibição não ocorre em meninas com telarca precoce isolada, há um aumento da sensibilidade discreta a estrógenos e pequenas quantidades desse hormônio são suficientes para estimular o aumento do tecido mamário.

Importante destacar, ainda, que o aparecimento de cistos ovarianos também pode estimular a produção de estrogênio. Na maioria nos casos, há uma regressão espontânea dessa produção hormonal e do próprio broto mamário até os 2 anos de idade, o que leva a uma conduta expectante, ou seja, apenas acompanhamento e observação, até porque não há uma aceleração da velocidade de crescimento, nem aumento da Idade Óssea (IO) e as dosagens hormonais são todas pré-puberais, sem a necessidade de tratamento.

Entretanto, quando a telarca aparece após os 2 anos, pode não haver regressão e é importante que se investigue a hipótese de puberdade precoce. Esse avanço na secreção prematura dos hormônios sexuais pode levar à aceleração do crescimento e à fusão precoce das epífises ósseas, o que pode antecipar o final do crescimento e até mesmo comprometer a estatura final da criança. Em algumas meninas, mesmo com início prematuro da secreção de hormônios sexuais, a puberdade tem lenta evolução e não compromete a altura final. Assim, avaliar a progressão por 3 ou 6 meses pode ajudar a definir a necessidade ou não de tratamento de crianças nos estágios iniciais de puberdade, especialmente em meninas entre 6 e 8 anos de idade.

Diagnóstico clínico e laboratorial

O desenvolvimento mamário na telarca precoce é gradual e pode se apresentar como uni ou bilateral assimétrico, sem desenvolvimento mamilar, sendo raro que as mamas ultrapassem o estágio 3 de Tanner (figura 1). Não existem outros sinais de estrogenização, nem odor de corpo e pubarca. A estatura é compatível com a idade cronológica e idade óssea, sem ocorrer aumento na velocidade de crescimento. Dessa maneira, a evolução clínica é útil para a realização do diagnóstico precoce. As mamas regridem ou permanecem inalteradas na maioria das crianças e apenas uma pequena porcentagem (5%) pode evoluir para puberdade precoce.

É importante avaliar o peso e estatura fazendo o cálculo da velocidade de crescimento e do Índice de Massa Corporal (IMC). Pode-se também usar gráficos de crescimento em percentil e z score.  Geralmente na TP a velocidade de crescimento não está aumentada. Em crianças com TP isolada, a IO é compatível com a idade cronológica e é indicado que a paciente seja acompanhada e reavaliada periodicamente para verificar se há ou não aparecimento de sinais progressivos de puberdade precoce, como por exemplo a não regressão do broto mamário. Se houver esses sinais é importante fazer a radiografia de mão e punho para determinar a IO. Isso é relevante, pois possibilita avaliar a progressão dos efeitos hormonais, já que os esteroides aceleram a matu­ração óssea. A determinação da  IO pode ser realizada através de alguns métodos, sendo que o mais conhecido  é o método de Greulich-Pyle, que consiste em um Atlas com fotos de radiografias da mão e punho, o qual pode-se comparar com a radiografia do paciente, consi­derando a imagem que mais se aproxima com a investigada. Considera-se uma IO de 2 anos acima ou abaixo da idade cronológica do paciente.

Ademais, na TP também pode-se usar a ressonância magnética, principalmente para meninas com menos de 6 anos, a fim de descartar a puberdade precoce. Em relação aos exames, faz-se necessário a utilização de exames para avaliação indireta de atividade estrogênica, como ultrassonografia (USG) pélvica/abdomi­nal ou citologia hormonal vaginal (CHV), onde, na maioria dos casos, mostram baixa atividade estrogênica. A USG também permite avaliar as gônadas, descartando ou não a presença de tumores, pois a presença deles pode aumentar os níveis de estrogênio e consequentemente o aparecimento precoce da mama. As concentrações de FSH podem estar pouco elevadas. Alguns cistos foliculares podem aparecer na USG pélvica. Veja o resumo dessas características a seguir.

Figura 1. Escala de Tanner

https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Tanner_scale-female.svg

Características clínicas e laboratoriais da telarca precoce:

Mamas antes dos 8 anos de idade;

Ausência de outros sinais puberais;

Regressão ou não progressão;

Aparecimento dos 4 a 24 meses;

IO = IE = IC (IO: idade óssea; IC: idade cronológica; IE: idade estatural);

Ativação “parcial” do eixo HHG (FSH > LH);

Secreção estrogênica pelo ovário;

Cistos foliculares.

Autora: Suzana Vasconcelos, estudante de medicina Instagram: @Suzanavasconcelossv
E-mail: Suzanasantos847@gmail.com