Farmacologia

Tudo o que você tem que saber sobre antidepressivos | Colunistas

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O surgimento dos medicamentos antidepressivos ocorreu após a Segunda Guerra Mundial, pela ampliação de testes com fármacos industrializados. Durante o teste com drogas para o tratamento da tuberculose, notaram a melhora do humor de pacientes com sintomas depressivos. Assim surge a primeira classe de antidepressivos a ser descoberta, a dos Inibidores da MAO. Atualmente existem cinco classes de fármacos antidepressivos disponíveis no mercado: os inibidores da monoaminoxidase, os tricíclicos, os inibidores seletivos da recaptação de serotonina, os inibidores seletivos da recaptação de serotonina e da noradrenalina e os atípicos. 

Características gerais dos antidepressivos

Grande parte dos fármacos antidepressivos tem como função potencializar as ações da norepinefrina e/ou da serotonina no cérebro. Este fator, associado com demais evidências, levou à criação da teoria das aminas biogênicas (a hipótese monoaminérgica), que propõe que a depressão é gerada pela deficiência da função ou da quantidade de monoaminas, em certos locais do cérebro. 

Entretanto, no decorrer dessa última década houve uma acentuada mudança na aceitação dessa teoria, já que não explica o motivo pelo qual o efeito farmacológico dos antidepressivo na neurotransmissão é imediato enquanto que a sua resposta terapêutica necessita de várias semanas (em geral, 2 semanas para produzir melhora significativa e sua eficácia máxima pode levar até 12 semanas).

Isso sugere que a diminuição da recaptação dos neurotransmissores é apenas um dos efeitos iniciais do fármaco, que pode não ser totalmente responsável pelos efeitos antidepressivos. Há evidências de que outros fatores tanto neurotróficos quanto endócrinos também desempenhem uma importante função antidepressiva (a hipótese neurotrófica). 

Inibidores da monoaminoxidase 

A monoaminoxidase (MAO) é uma enzima mitocondrial presente em diversos tecidos, tais como nervos, neurônios, fígado e intestino. No neurônio, a MAO tem como função degradar qualquer excesso de neurotransmissor (norepinefrina, dopamina e serotonina) que sair das vesículas sinápticas quando o neurônio está em repouso. O IMAO inativa a enzima monoaminoxidase, evitando a destruição do neurotransmissor e, assim, se acumulem dentro do neurônio pré-sináptico e vazem para o espaço sináptico. Os principais IMAOs disponíveis atualmente seriam a fenelzina, tranilcipromina, isocarboxazida e selegilina. O uso de IMAOs é restrito (sendo utilizados principalmente na depressão atípica), e são considerados os fármacos de última escolha devido às suas restrições dietéticas e interações farmacológicas. 

Durante a utilização desses fármacos, a inibição da MAO ocorre não só nos neurônios, mas também no fígado e no intestino, onde a MAO tem como função a desaminação oxidativa de fármacos e substâncias potencialmente tóxicas, como a tiramina (presente em alimentos como queijos envelhecidos e carnes, fígado de aves, peixes em conserva ou defumados e vinhos tintos). Quando o excesso de tiramina não é degradado, ocorre uma enorme liberação de catecolaminas armazenadas nos terminais nervosos, resultando em uma “crise hipertensiva”, gerando cefaleia occipital, rigidez no pescoço, taquicardia, náuseas, hipertensão, arritmias cardíacas e convulsões. Os pacientes precisam, portanto, ser orientados para evitar alimentos contendo tiramina. Outros efeitos adversos observados com o tratamento incluem sonolência, hipotensão ortostática, visão turva, xerostomia e constipação. O uso de IMAO associado com outros antidepressivos é contraindicado, já que há o risco de síndrome de serotonina. 

Antidepressivos tricíclicos 

Os fármacos antidepressivos tricíclicos têm como mecanismo de ação a inibição da captação de norepinefrina e serotonina no neurônio pré-sináptico. Além disso, também causam o bloqueio dos receptores serotoninérgicos, α-adrenérgicos, histamínicos e muscarínicos. Ainda não é claro se o bloqueio desses receptores têm algum benefício terapêutico, mas a ação nesses receptores provavelmente é responsável por muitos dos efeitos adversos. Nesse grupo, incluem as aminas terciárias imipramina, amitriptilina, clomipramina, doxepina e trimipramina, e as aminas secundárias desipramina e nortriptilina e protriptilina. Pacientes que não respondem a um ADT podem se beneficiar de outro fármaco do grupo.

Os ADTs são empregados principalmente no tratamento de depressão moderada e grave, alguns ADTs, tais como a amitriptilina, também tem sido utilizada para prevenção da enxaqueca e tratar síndromes de dor crônica de causa desconhecida. Os principais efeitos colaterais dessas medicações seriam arritmias cardíacas (por afetarem a condução cardíaca), xerostomia, retenção urinária, taquicardia sinusal, constipação, agravamento do glaucoma de ângulo fechado (pelo bloqueio dos receptores muscarínicos). Podem levar a grande sedação durante as primeiras semanas do tratamento, devido ao seu bloqueio dos receptores H1 histamínicos. 

Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina 

Os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), como o próprio nome indica, são um grupo de fármacos antidepressivos que inibem especificamente a captação da serotonina, aumentando a sua  concentração na fenda sináptica. Além disso, pouca atividade bloqueadora em receptores muscarínicos, α-adrenérgicos e H1-histamínicos, portanto, os efeitos adversos associados aos ADTs não são comumente observados com os ISRS. Pelo menor número de efeitos adversos e por serem relativamente seguros mesmo em dosagens excessivas, esse grupo substituiu os ADTs e os IMAOs, sendo fármacos de primeira escolha no tratamento da depressão. Nesse grupo estão incluídos: fluoxetina, citalopram, escitalopram, fluvoxamina, paroxetina e sertralina. 

Diversos outros transtornos psiquiátricos também podem se beneficiar com o uso dos ISRS, como transtorno obsessivo-compulsivo, de pânico, de ansiedade generalizada, de estresse pós-traumático, de ansiedade social, além de transtorno disfórico pré-menstrual e bulimia nervosa (neste caso, apenas a fluoxetina).

Embora tenham efeitos adversos mais brandos, também podem levar a cefaléia, sudorese, ansiedade e agitação, efeitos gastrintestinais, disfunções sexuais, alterações de massa corporal, distúrbios do sono. Além disso, os ISRS podem causar a síndrome da interrupção, caso o tratamento seja suspenso de modo súbito.

Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina e Noradrenalina 

Os principais representantes desse grupo seriam a venlafaxina, desvenlafaxina, levomilnaciprana e duloxetina. Estes fármacos inibem a recaptação da serotonina e da norepinefrina e podem ser utilizados no tratamento de depressão em pacientes nos quais os ISRS foram ineficazes. Além disso, são eficazes algumas vezes para aliviar a dor associada com a neuropatia diabética periférica, a fibromialgia e a dor lombar, já que essas dores são, em parte, moduladas por vias de serotonina e norepinefrina no sistema nervoso central. Os ISRSN também têm pouca atividade em receptores adrenérgicos α, muscarínicos ou histamínicos e, portanto, têm menos efeitos adversos. Entretanto, também podem causar síndrome de interrupção.

A venlafaxina e a desvenlafaxina são potentes inibidores da recaptação de serotonina e, em dosagens mais altas inibem a recaptação de norepinefrina. Seus efeitos adversos mais comuns são náuseas, cefaléia, disfunções sexuais, tonturas, insônia, sedação e constipação. Em doses elevadas, pode ocorrer aumento da pressão arterial e da frequência cardíaca. Já a duloxetina inibe a captação de serotonina e norepinefrina em todas as dosagens. Ela é biotransformada no fígado em metabólitos inativos e por isso, deve ser evitada em pacientes com disfunção hepática. Tem como efeitos adversos, insônia, tonturas, sonolência, disfunção sexual e aumento da pressão arterial e da frequência cardíaca. Por ser um inibidor da isoenzima CYP2D6 e pode aumentar a concentração de fármacos biotransformados por essa via, tais como os antipsicóticos.

Antidepressivos atípicos 

Os antidepressivos atípicos são um grupo heterogêneo de fármacos com ações diversas. O grupo inclui os fármacos: bupropiona, mirtazapina, nefazodona, trazodona, vilazodona e vortioxetina. A bupropiona é um inibidor fraco da recaptação de dopamina e norepinefina, diminuindo os sintomas de depressão. Também é muito utilizada para diminuir a fissura por substâncias e os sintomas de abstinência da nicotina em pacientes que estão tentando cessar o tabagismo. Seus efeitos adversos podem incluir boca seca, sudorese, tremores e um aumento dose-dependente do risco de convulsões. O seu uso deve ser evitado em pacientes com risco de convulsões ou que sofrem de transtornos de alimentação (como bulimia).

A mirtazapina por sua vez aumenta a neurotransmissão de serotonina e norepinefrina e também tem potente atividade anti-histamínica, por isso é extremamente sedativa. Por este motivo, pode ser utilizada como uma opção para pacientes deprimidos com dificuldade para dormir. Como principais efeitos colaterais, pode levar ao aumento do apetite e da massa corporal.

Conclusão 

Os antidepressivos têm um amplo espectro de aplicações na prática clínica, sendo seu uso cada vez mais empregado em outras condições além da depressão maior. No entanto, a farmacoterapia tem limitações no tratamento dos distúrbios psicológicos. Apesar de serem um ótimo recurso terapêutico para lidar com os sintomas, as medicações não modificam influências hereditárias, estruturas familiares ou situações socioeconômicas do paciente. Os fármacos apenas alteram a reação do paciente ao seu meio, mas a maior parte do seu humor continuará sendo influenciado pelos estímulos externos que permanecem em sua vida. Portanto, para uma abordagem terapêutica adequada, o contexto no qual o paciente está inserido deverá sempre ser valorizado.

Autora: Giovanna di Cola

Instagram: @giodicola

Referências:

DEBATTISTA, Charles. Agentes antidepressivos. In: KATZUNG, B. G.; TREVOR, A. J. Farmacologia básica e clínica. 13. ed. [S. l.: s. n.], 2017. cap. 30.

MEDICAMENTOS ANTIDEPRESSIVOS: INSERÇÃO NA PRÁTICA BIOMÉDICA (1941 A 2006) A PARTIR DA DIVULGAÇÃO EM UM LIVRO-TEXTO DE FARMACOLOGIA – https://www.scielo.br/j/mana/a/jhSdsKBF4YgKhLXMWsbtHSF/?lang=pt&format=pdf  

REY , J. A. Antidepressivos. In: WHALEN, Karen et al. Farmacologia Ilustrada. 6. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2016. cap. 10.

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