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O que é convulsão febril?
Convulsão febril é toda convulsão que ocorre em vigência de doença infecciosa febril com temperatura ≥ 38ºC. Excluindo-se as infecções do SNC, como meningites e encefalites e os desequilíbrios hidroeletrolíticos.
É a desordem convulsiva mais comum da infância, com uma incidência aproximada de 2 a 5% dos lactentes e pré-escolares. Está fortemente relacionado à história familiar com um padrão autossômico dominante já demonstrado. O risco de recorrência da crise febril (CF) em processos infecciosos posteriores é da ordem de 30%.
Se não houver fator de risco, a chance de recorrência é de 12%; na presença de um fator de risco, 25-50%; dois fatores de risco, 50- 59%; e três ou mais fatores de risco, a recorrência é de 73-100%. Crise febril complexa (focal) está associada a 29% de risco de epilepsia no futuro;
Fatores de risco da convulsão febril
Maiores:
- Primeira crise febril com menos de 12 meses de idade;
- Duração da febre < 24 horas antes da crise;
- Febre 38-39ºc.
Menores:
- História familiar positiva de crises febris;
- História familiar de epilepsia;
- Crise febril complexa;
- Sexo masculino;
- Sódio sérico baixo no início da crise.
O pico de incidência varia de 9 a 18 meses, independentemente de localização geográfica, raça, sexo ou condições socioeconômicas. Cabe lembrar que convulsão febril raramente pode ocorrer antes dos 3 meses e após os 5 anos de idade.
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Por que ocorre a convulsão febril?
A origem da CF não é ainda inteiramente compreendida, sabe-se, no entanto, que a febre, a idade e a predisposição genética são os fatores importantes.
Temperatura corpórea > 39°C ocorrendo nas primeiras horas de infecções virais constituem o quadro clínico padrão da CF. Infecções bacterianas e outras doenças febris ou imunizações também pode levar a uma CF. Podendo ocorrer em temperaturas menores que 39°C.
A persistência de CF após os 6 anos, associada ou não a crise afebril, com remissão espontânea em torno dos 12 anos, configura uma situação de forte componente familiar denominada “convulsão febril plus”.
A verificação de que algumas famílias são mais suscetíveis a apresentarem CF é notória e já foram descritos os loci cromossômicos de algumas delas. No entanto, ainda não foi identificado um modelo de transmissão que atenda a todos os casos de CF. A maioria dos estudos sugere herança autossômica dominante, com baixa penetrância e expressão variável, ou herança poligênica.
A Clínica
A crise usualmente é generalizada tônico-clônica com duração de alguns segundos até 15 minutos. O período pós-ictal é marcado por sonolência passageira.
O exame neurológico da criança é inteiramente normal após a crise. A investigação clínica deve visar a localização da infecção, seja ela uma amigdalite, otite ou doença exantemática. Atualmente, prefere-se a denominação “crises febris”, porque elas podem ser convulsivas e não-convulsivas.
De modo geral, as CF são tônico-clônicas generalizadas, de curta duração, únicas e precoces em uma mesma doença febril, e não se acompanham por fenômenos neurológicos pós-críticos. Essas características definem as CF típicas, simples, ou também chamadas crises não-complicadas.
Crises com duração > 10 min, parciais, que se repetem durante o mesmo episódio febril, e acompanhadas por sinais neurológicos transitórios (paralisia de Todd) são denominadas atípicas, complexas ou complicadas.
A distinção entre ambas tem importância clínica, uma vez que define prognósticos diferentes: a forma atípica está associada a um maior número de recorrências, tanto febris, quanto afebris.
Diagnóstico da convulsão febril
O diagnóstico da CF é clínico, porém não é fácil de definir na primeira apresentação. A hipótese é reforçada quando a crise é típica, o exame neurológico é normal, o paciente já apresentou uma ou mais CF e há relato de casos semelhantes em parentes de 1º grau. A investigação da doença de base e a exclusão da meningite são essenciais. Lactentes que apresentem a primeira CF, mesmo na ausência de sinais de irritação meníngea, devem realizar exame do líquor.
Criança com < 6 meses com convulsão + febre, a punção lombar deve ser SEMPRE realizada. Mesmo que uma otite média seja identificada no exame físico, não é possível excluir a possibilidade de meningite sem a punção lombar.
A punção lombar é obrigatória nas seguintes situações:
- Na primeira crise febril complexa;
- Letargia persistente;
- Crise febril em crianças > 5 anos, pela possibilidade de meningite/encefalite.
De acordo com a história clínica também é necessário pedir hemograma, dosagem de eletrólitos e glicemia. Na definição de uma infecção viral ou bacteriana bem estabelecida (otite, laringite, doença exantemática), não existe a indicação de Eletroencefalograma (EEG) ou exame de imagem do sistema nervoso central.
As crises convulsivas provocadas por meningites, encefalites, distúrbios eletrolíticos, hipoglicemia ou intoxicação exógena não são consideradas crises febris. Sua ocorrência é provocada por alguma destas condições e, por isso, são denominadas crises sintomáticas.
O EEG pode mostrar anormalidades, principalmente nas crianças com CF prolongadas ou repetidas, mas não tem valor prático, pois não define a probabilidade de recorrências, tanto febris quanto afebris. Exames de neuroimagem também não auxiliam no diagnóstico das CF, mas na criança com crises atípicas recorrentes, ou naquelas que apresentam sinais prévios de comprometimento do sistema nervoso, a ressonância magnética cerebral deve ser solicitada.
O Tratamento da convulsão febril
Assim como em qualquer síndrome convulsiva a orientação sobre o quadro é fundamental. O tratamento da CF, na maioria das vezes, é limitado à fase aguda, quando estão indicados antitérmicos e medicação específica para a doença febril.
Nos casos de crise prolongada, a criança deverá ser levada a um serviço de emergência.
O tratamento anticonvulsivante com benzodiazepínicos (diazepam venoso ou retal, na dose de 0,3-0,5 mg/kg, midazolan ou lorazepan) é considerado na emergência para as crianças que apresentam crise convulsiva com duração superior a cinco minutos.
Nos casos caracterizados por crises febris recorrentes, principalmente quando associadas aos fatores de risco, pode-se utilizar a profilaxia intermitente, embora não haja consenso em relação a sua eficácia.
Por sua ação rápida, os benzodiazepínicos são as drogas prescritas, especialmente o diazepam, por via retal, nas formas de supositório ou de solução, na dose de 0,5 mg/kg de peso, a cada 12 horas e por 2 dias consecutivos; o tratamento deve ser iniciado assim que a família perceber os sinais da doença febril.
A profilaxia contínua com anticonvulsivantes não é indicada, pois a crise febril é uma condição benigna e com resolução espontânea, e, por isso, não se justifica o emprego de medicações com tantos efeitos adversos como a redução da capacidade cognitiva e distúrbios comportamentais (agitação, sonolência, agressividade), além de hepatotoxicidade, principalmente em menores de dois anos.
É importante deixar claro que o uso de antitérmicos reduz o mal-estar associado à febre, mas não impede a ocorrência da crise febril, até porque suspeita-se que a mesma seja desencadeada durante a fase de ascensão ou queda da temperatura.
Referências bibliográficas
- Tratado de Pediatria da Sociedade Brasileira de Pediatria, 3ª edição. Fábio Ancona Lopez e Dioclécio Campos Júnior.
- Bases da Pediatria – Carlos Eduardo Schettino, 2013.
- NITRINI, R.; BACHESCHI, L. A. A neurologia que todo médico deve saber. 2º edição. São Paulo: Atheneu, 2003.