Alergologia e imunologia

Alopecia Areata: uma visão atual | Colunistas

Alopecia Areata: uma visão atual | Colunistas

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Imagem de perfil de Gabriela Sartori

Definição e história

A alopecia areata ganhou atenção da mídia nos últimos dias, devido ao participante do Reality show Big Brother Brasil 21, Lucas Penteado, possivelmente ser portador da doença. As falhas em seu couro cabeludo chamaram a atenção e renderam várias matérias e entrevistas com dermatologistas.

Alopecia vem do grego[Pacheco1]  e significa “ausência de pelos”. Areata vem do latim e significa “localizada”, “em uma só área”. É uma doença conhecida e documentada há séculos, inclusive foram propostas muitas teorias sobre sua causa. Porém, somente com o avanço da medicina foi possível entender sua origem e fisiopatologia. Apesar de ter ganhado foco na mídia recentemente, a alopecia areata é uma doença mais comum do que se imagina. Alguns trabalhos científicos apontam que aproximadamente 1,7% da população mundial terá pelo menos um episódio de alopecia areata durante a vida.

Epidemiologia

Aparentemente, a alopecia areata é uma doença de epidemiologia ampla, acometendo desde crianças até idosos, ambos os gêneros e variadas etnias. Contudo, alguns estudos apontam para uma incidência importante entre crianças de poucos meses de idade e também outro pico de incidência entre indivíduos de 20 a 50 anos. Quanto ao gênero, os estudos variam muito (depende do país onde o estudo foi realizado e do público que aquele centro atendia com mais frequência), mas vários trabalhos apontam para uma discreta prevalência feminina. Porém, na pesquisa feita pela USP, no Brasil, 63% dos acometidos eram homens.

Causas e fisiopatologia

Como já citado anteriormente, foram apontadas diversas causas para explicar a doença. Entretanto, hoje, com auxílio da Histopatologia e da imunologia, a alopecia areata foi entendida como uma doença autoimune com componentes genéticos. Prova disso é que, na análise histológica dos locais acometidos, podem ser observadas células imunologicamente ativas e, em alguns casos, um processo inflamatório.

Além[Pacheco2]  disso, o substrato genético da doença é muito interessante: entre indivíduos cuja manifestação da alopecia areata aconteceu cedo (entre 10 e 25 anos) 37% tinham história familiar da doença. Ademais, as pesquisas apontam para 55% de concordância nos gêmeos idênticos e uma incidência maior entre portadores de síndrome de Down, comparado à população geral, o que indica que a alopecia areata pode ser uma doença poligênica.

As doenças autoimunes ainda possuem vários aspectos não compreendidos pela medicina, mas um fenômeno já observado é que pessoas com uma doença autoimune diagnosticada, provavelmente desenvolverá outra ou outras durante a vida. Isso vale também para a alopecia areata, já que uma significativa parte dos pacientes acometidos têm história de outras doenças autoimunes, como Hashimoto, lúpus, psoríase, artrite reumatoide, colite ulcerativa e até mesmo vitiligo. Também foi apontada nos estudos uma relação importante entre atopias e alopecia areata, sendo que nos indivíduos atópicos a doença tende a se manifestar mais cedo do que a média.

O estigma social da doença

Outro aspecto relevante a ser comentado sobre as causas dessa afecção é a ligação entre estresse e traumas psíquicos como precedente das manifestações. É muito difícil confirmar essa relação cientificamente, já que não há exames laboratoriais ou de imagem capazes de comprovar a hipótese. Todavia, a grande maioria dos pacientes relatam perdas de entes queridos, início de depressão ou alguma mudança significativa na vida que antecedeu o aparecimento das falhas.

Além disso[Pacheco3] , do ponto de vista estético, a alopecia areata gera afastamento social, comentários preconceituosos e baixa autoestima, sobretudo nas mulheres, o que acaba incrementando ainda mais o fator psicológico relacionado à doença.

Quadro clínico e apresentações

A alopecia areata pode se manifestar de diversas formas, que se diferenciam pelo perfil de acometimento. Portanto, o diagnóstico é feito clinicamente: com história e exame físico. As mais comuns, às quais chamamos de clássicas, são a unifocal (única placa redonda ou em formato oval), a multifocal (várias placas), a ofiásica (uma faixa completa na região temporo-occipital do couro cabeludo) e a total (perda total dos fios do couro cabeludo)

Apesar de apresentar-se mais frequente em couro cabeludo, ela pode acometer qualquer região do corpo que contém pelos, incluindo supercílios, cílios, barba, região genital e axilas.

Em geral, as placas alopecicas não são acompanhadas de qualquer sintoma. O paciente somente percebe a falha capilar ao olhar no espelho ou ao passar a mão pelo local. Porém, alguns pacientes referem dor, ardência ou parestesia no local poucos dias antes de notarem a queda dos fios.

Importante salientar que a alopecia areata, ao contrário das alopecias de origem fúngica, deixa placas completamente lisas, sem “tocos” de fio espalhados pelo local. Na fase aguda da doença, quando o processo inflamatório está ocorrendo, é possível retirar os fios da periferia da placa com muita facilidade e esses fios podem apresentar deformações, como os pelos “em ponto de exclamação”, por exemplo. A cor da pele no local acometido é igual ao restante do couro cabeludo, mas pode se apresentar hiperemiada em alguns casos. Ao exame físico é importante o uso do dermatoscópio para diferenciação das causas.

Associada à perda de pelos, a alopecia areata também pode se manifestar em unhas, causando diversos tipos de alterações como ondas, sulcos e depressões.  

Um aspecto também estudado é a associação entre hemangioma plano e alopecia areata. Dos pacientes que apresentam alopecia areata universal, 95% tinham hemangioma plano na região da nuca, enquanto nos casos de alopecia areata ofiásica, 55% deles tinham o hemangioma.

Alopecia areata unifocal em couro cabeludo (Foto da própria autora).
Alopecia areata ofiásica em couro cabeludo com presença de hemangioma plano à esquerda (Foto da própria autora).

Tratamento

Os tratamentos para alopecia areata consistem em modular o processo inflamatório, controlar a resposta imune, estimular a síntese de DNA folicular e melhorar o fluxo sanguíneo local. É necessária avaliação detalhada das áreas acometidas para escolha do melhor tratamento.

Os fármacos mais comumente utilizados são:

  1. Minoxidil

O Minoxidil é um vasodilatador, antigamente utilizado via oral para outras finalidades. Na alopecia areata é utilizado na sua forma tópica, geralmente em associação com outros fármacos, na concentração de 5%, duas vezes ao dia nas áreas acometidas. Apesar de seu mecanismo de ação ser ainda obscuro, ele parece estimular a síntese de DNA folicular e melhorar o fluxo sanguíneo local, o que aumentaria a velocidade de crescimento dos novos fios.

  • Corticosteroides tópicos

O mais utilizado é o dipropionato de Betametasona, aplicado no local das lesões em casos mais brandos, com placas pequenas. Alguns estudos questionam sua eficácia.

  • Corticosteroides em suspensão injetável

Atualmente, tem sido o tratamento mais efetivo da doença. Pode ser utilizada em adultos também para áreas que não sejam tão amplas (até 50% do couro cabeludo). É um procedimento realizado em consultório dermatológico, e a injeção é intralesional. O fármaco mais comum é a triancinolona acetonida, aplicado com intervalos de três ou quatro semanas, tudo a depender da evolução do paciente.  A aplicação pode gerar atrofias na área, mas em geral, reversíveis.

As imunoterapias tópicas são tratamentos recentes, ainda não muito utilizadas. Elas se baseiam em gerar um processo inflamatório local (que pode ser bastante severo) para modular a cascata inflamatória da própria doença.

Existem também tratamentos feitos com imunossupressores orais, como a azatioprina, para casos graves (de alopecia total), e que têm dado resultado. Porém, esse tipo de tratamento possui diversos efeitos colaterais e deve ser muito bem acompanhado pelo médico.

Conclusão

A alopecia areata é uma doença autoimune com importantes componentes genéticos e que parece ter influência psíquica. Sua manifestação pode ocorrer em qualquer fase da vida, porém manifesta-se com mais frequência entre 20 e 50 anos de idade. Tem potencial para acometer qualquer parte do corpo que contenha pelos, porém é muito mais frequente em couro cabeludo, variando as formas de apresentação.

É importante sempre que notada uma placa alopecica, iniciar o tratamento o mais precoce possível para que o retorno dos fios seja rápido. O conhecimento sobre a alopecia areata é de grande importância, tanto para portadores quanto para a população em geral, para que o estigma social da doença seja eliminado e os portadores não se sintam desconfortáveis.

O texto acima é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

https://www.sap.org.ar/docs/publicaciones/archivosarg/2017/v115n6a21e.pdf

https://www.scielo.br/pdf/abd/v80n1/v80n01a09.pdf