Área: Geriatria
Autores: Rafaella Oliveira Dias, Laryssa Ramos Pino de Souza
Revisor(a): Caísa Costa Pereira
Orientador(a): Jule Rouse de Oliveira Gonçalves Santos
Liga: Liga de Emergências Médicas do DF (LEM-DF)
Apresentação do caso clínico
Paciente do sexo feminino, 81 anos, branca, aposentada, natural de Goiânia-GO, procedente e residente em Brasília-DF. A filha procurou geriatra com relato de esquecimento frequente da mãe, nos últimos meses. Informou também que ela tem apresentado menos apetite, insônia e falta de interesse nas atividades das quais sempre gostou de participar. Relata que percebeu início desses sinais pouco depois do falecimento do seu marido, há 7 meses. Nega dificuldades nas atividades diárias e de cuidado pessoal. Afirma utilizar Levotiroxina Sódica de 75mg, 1x ao dia, para tratamento de Hipotireoidismo de Hashimoto, diagnosticado aos 12 anos de idade. Nega diagnóstico prévio de outras doenças crônicas ou quadros agudos recentes, bem como o uso de outros medicamentos. Informa que a paciente mora sozinha e que os filhos intercalam as visitas desde que o marido faleceu.
Ao exame físico, a paciente encontrava-se em bom estado geral, lúcida e orientada no tempo e no espaço, afebril, acianótica, anictérica e hidratada. Sem alterações nos exames dos aparelhos cardiovascular, respiratório e neurológico. Abdome normal, sem abaulamentos ou retrações, ruídos hidroaéreos audíveis e normais.
Foram realizados, então, os testes direcionados para a Avaliação Geriátrica Ampla. A paciente mostrou resultados de normalidade nos testes de equilíbrio, mobilidade e risco de quedas, bem como na avaliação de sarcopenia. No teste de fluência verbal, falou 14 animais, sequencialmente, em 1 min. No Miniexame do Estado Mental, a pontuação obtida foi de 22 pontos. Na Escala de Depressão Geriátrica, a paciente fez 7/15 pontos. No teste do desenho do relógio, todos os aspectos avaliados foram bem atendidos. Não foram identificadas quaisquer deficiências sensoriais ou prejuízo para as atividades básicas da vida, mostrando-se com alto grau de funcionalidade.
Após conversa com a filha que a acompanhava e com a paciente, a principal suspeita diagnóstica foi de depressão. Foi explicado para a filha a importância do cuidado e da atenção da família para o idoso nessa fase e, também, foi recomendado que os filhos se reorganizassem para evitar deixá-la sozinha. Foi prescrito tratamento com Citalopram, 20mg/dia 1 comprimido pela manhã, e a paciente foi encaminhada para acompanhamento com psicólogo, após alta.
Questões para orientar a discussão
1. Qual a fisiopatologia da depressão no idoso?
2. Qual o diagnóstico diferencial para esse caso clínico?
3. Quais as causas da depressão no idoso?
4. Quais os exames utilizados para o diagnóstico do caso clínico?
5. Qual a conduta terapêutica para a depressão no idoso?
Respostas
1. A depressão no idoso é uma enfermidade mental frequente, com uma prevalência de 15%, aproximadamente, nessa faixa etária, e que pode causar um sofrimento psíquico. Ela pode ser desencadeada por fatores estressores do idoso, bem como por medicamentos. A sua fisiopatologia, a partir dos mais recentes estudos, está relacionada aos neurotransmissores, tanto em relação à redução em seu número – notadamente serotonina, adrenalina e dopamina – tanto em relação à diminuição na sensibilidade dos neuroreceptores envolvidos na sinapse, não havendo, necessariamente, alteração na quantidade do neurotransmissor. Os dados mais atuais direcionam-se às mudanças nos neuroreceptores, os quais possuem uma neuroplasticidade, não sendo, portanto, estruturas inflexíveis e, desse modo, se adaptaram com a redução fisiológica da liberação de neurotransmissores.
2. A partir das manifestações atípicas da depressão no idoso, pode ocorrer uma dificuldade elevada para realizar o diagnóstico correto entre a depressão e a demência, uma vez que a depressão possui associação com alguns déficits cognitivos e a demência pode estar relacionada com alterações de humor condizentes com a depressão. Outros diagnósticos diferenciais que devem ser levados em consideração são o delirium e a as causas potencialmente reversíveis de quadros cognitivos, frequentemente presentes nos idosos.
3. A depressão nos idosos pode estar relacionada a fatores múltiplos e associativos, normalmente englobando aspectos biológicos, psicológicos e sociais. O primeiro está relacionado à fisiopatologia propriamente dita da doença, a qual os idosos estão mais predispostos pelas alterações morfológicas e bioquímicas naturais do envelhecimento. Os fatores psicológicos e sociais, por sua vez, tornam-se um único fator, na análise das causas depressivas, uma vez que, geralmente, as situações sociais – como rompimento com a família, perda de contatos afetivos, eventos estressantes da vida e viuvez – desencadeiam os aspectos psicológicos de solidão e tristeza, por exemplo. Assim, as causas de depressão nos idosos se somam e, muitas vezes, não podem ser associadas a um fator isolado.
4. O diagnóstico da depressão é fundamentalmente clínico, em que se deve ter um enfoque na história clínica do paciente. Há instrumentos que se fazem eficazes para a avaliação sintomatológica, destacando-se a Escala de Depressão Geriátrica (Geriatric Depression Scale – GDS), a qual é uma ferramenta de rastreio para a identificação dos sintomas ou de vulnerabilidade à depressão no idoso. A sua versão curta (GDS 15) é composta por 15 questões com pequena variação de respostas (sim/não), possuindo uma nota de corte de, no mínimo, 5 pontos para a sensibilidade aos sintomas depressivos. A fim da exclusão de outras condições clínicas, também é utilizado testes de rastreio cognitivos, tais como, o MEEM (Mini Exame do Estado Mental), o Teste de Fluência Verbal e o Teste do Desenho do Relógio, cujos resultados negativos afastam o diagnóstico de demências.
5. O tratamento dessa condição no idoso tem por fim a diminuição do sofrimento e uma melhora na qualidade de vida do paciente. Primeiramente, há a necessidade de reconhecer os fatores que poderiam estar desencadeando esse processo, entre eles, o uso de medicamentos e aspectos sociais do idoso. A intervenção não farmacológica, com a ajuda de um profissional especializado, guiará este idoso na realização de atividades ocupacionais – parte integrante da psicoterapia. Quando os sintomas apresentam risco à condição clínica do paciente faz-se necessário uma intervenção farmacológica, na qual é recomendada os antidepressivos de segunda geração, pois são os mais seguros para essa faixa etária. Os medicamentos mais indicados são os ISRS (Inibidores seletivos da recaptação de serotonina), destacando-se o Citalopram e Sertralina. Além disso, a escolha do fármaco deve ser fundamentada no perfil do paciente e de seus efeitos colaterais.