Infectologia

Crianças: o tratamento e a prevenção do HIV | Colunistas

Crianças: o tratamento e a prevenção do HIV | Colunistas

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A infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) é causada pelos retrovírus HIV-1 e 2, sendo o 1 o mais comum. A infecção danifica de forma crônica o sistema imune do hospedeiro e, especialmente se não tratada, pode chegar a fase final, conhecida como a AIDS propriamente dita (quando já existe doença ativa e a presença de infecções oportunistas que podem levar a morte)

 Mas crianças, o diagnóstico pode ser realizado pela presença de anticorpos virais acima dos 18 meses e pelo PCR em menores de 18 meses.

Epidemiologia

Cerca de 1,7 milhões de crianças têm infecção pelo HIV no mundo e esse número cresce a cada ano, mesmo com a tecnologia e as possibilidades que temos nos dias de hoje para impedir a transmissão. A terapia antirretroviral (TARV) para gestantes e crianças reduz muito o número anual de novas infecções na infância e de mortes em crianças nos últimos anos, ainda assim, nota-se que muitas crianças infectadas acabam não recebendo a TARV de maneira precoce. No Brasil, é obrigatória a testagem materna na gestação, visando diminuir a infecção perinatal.

Transmissão

O risco de infecção para uma criança nascida de mãe HIV-positiva e que não recebeu terapia antirretroviral durante a gestação é estimado em aproximadamente 25%. Alguns fatores de risco para transmissão vertical durante a gestação são: Soroconversão durante a gestação ou amamentação, concentração plasmática alta de RNA viral, doença materna avançada e baixa contagem materna de células T CD4+ periféricas. A

Ruptura prolongada das membranas não é mais considerada um fator de risco importante, porém ainda é levada em consideração para definição de via de parto.

O parto cesárea antes do início do trabalho de parto ativo reduz esse risco de transmissão da mãe para o filho, ainda assim, não é indicado de forma rotineira para todas as gestantes portadoras do vírus visto que a transmissão pode ser reduzida com a terapia antirretroviral de combinação, geralmente incluindo zidovudina (ZDV) para mãe e recém-nascido, a profilaxia intraparto e outras medidas como a preservação de membranas íntegras e o clampeamento rápido do cordão.

No leite materno humano, a estimativa do risco de transmissão é de 12 a 14%, sendo a amamentação contra indicada. O vírus está presente nas células e nas frações livres de células. A transmissão parece ser maior em mães com altas concentrações plasmáticas de RNA viral (p. ex., mulheres que se infectaram durante a gestação ou durante o período de amamentação, no entanto, como não existe uma forma eficaz de reduzir o risco de infecção através do leite materno, não se realiza a amamentação, mesmo em casos de carga viral indetectável.

Sinais e sintomas

Lactentes infectados no período perinatal costumam são assintomáticos durante os primeiros meses de vida, com ou sem tratamento. A média de idade para o início dos sintomas é de 3 anos de vida. O tratamento precoce e adequado faz com que a expectativa de vida dessas crianças chegue a fase adulta. Antes da existência do tratamento acreditava-se que essas crianças eram infectadas durante a gestação e cerca de 15% apresentava progressão rápida da doença, com sintomas no primeiro ano de vida e morte entre 18 e 36 meses.

As manifestações mais comuns da infecção pelo HIV em crianças que não tratadas incluem linfadenopatia generalizada, hepatoesplenomegalia, má evolução ponderal, candidíase oral, doenças do sistema nervoso central (incluindo retardo de desenvolvimento, que pode ser progressivo), pneumonite intersticial linfoide, bacteremia recorrente, infecções oportunistas, diarreia recorrente, parotidite, miocardiopatia, hepatite, nefropatia e doenças malignas

Complicações

Normalmente são causadas por infecções oportunistas (e raramente câncer). O tratamento diminuiu muito essas ocorrências e tornou essas infecções incomuns, que acontecem principalmente em crianças não diagnosticadas que ainda não estão em tratamento ou não aderentes.

A pneumonia por Pneumocystis jirovecii é a causa mais comum e grave e tem alta taxa de mortalidade. Pode ocorrer em idades precoces como 4 a 6 semanas, sendo mais frequente entre as idades de 3 a 6 meses.

Lactentes e crianças maiores com pneumonia por Pneumocystis desenvolvem caracteristicamente pneumonite subaguda, difusa, com taquipneia e dispneia em repouso, dessaturação do oxigênio, tosse não produtiva e febre. Outras infecções oportunistas em crianças imunocomprometidas incluem esofagite por Candida , infecção por citomegalovírus disseminada, infecção pelo vírus do herpes simples disseminada ou crônica, infecção pelo vírus varicela-zoster e, menos frequentemente, infecções complexas por Mycobacterium tuberculosis e M. avium, enterite crônica causada por Cryptosporidium ou outros organismos e criptococos disseminados ou do sistema nervoso central ou infecção pelo Toxoplasma gondii .

Leiomiossarcomas e certos linfomas, incluindo os do sistema nervoso central e os não Hodgkin de células B (tipo Burkitt), ocorrem muito mais frequentemente do que em crianças imunocompetentes, ainda assim, são raros em comparação aos adultos. O sarcoma de Kaposi é muito raro em crianças infectadas pelo HIV.

O tratamento alterou a progressão da doença na população pediátrica. Embora a pneumonia bacteriana e outras infecções bacterianas ainda ocorram com maior frequência em crianças infectadas pelo HIV as infecções oportunistas e o deficit de crescimento são muito menos frequentes. Alguns achados relacionados ao tratamento são relatados, como dislipidemias, hiperglicemia, má distribuição gordurosa (lipodistrofia, lipoatrofia), nefropatia e osteonecrose; A incidência dessas complicações é menor em crianças do que em adultos infectados pelo HIV em uso de TARV.

Parece haver, também, aumento dos problemas de comportamento e cognitivos nas crianças infectadas pelo HIV tratadas. No entanto, não está claro se esses problemas são causados pelo vírus, pelos fármacos ou por outros fatores biopsicossociais.

Diagnóstico

Pode-se realizar testes rápidos de imunoensaio para a detecção do HIV em secreções orais, sangue total ou soro e os resultados são fornecidos em questão de minutos a horas. Ensaios rápidos normalmente requerem testes de confirmação, como um segundo ensaio de antígenos/anticorpos, ensaio de diferenciação de anticorpos para HIV-1/2 ou um NAT. Esses testes confirmatórios são especialmente importantes porque, em áreas onde a prevalência esperada do HIV é baixa, mesmo um ensaio específico rápido fornece resultados falso-positivos na maioria das vezes.

Antes de realizar os testes para HIV a mãe ou os responsáveis (e a criança, se tiver idade suficiente) devem ser orientados quanto aos possíveis desfechos e benefícios do teste. Deve-se obter consentimento informado oral (ou escrito) e deve-se registrá-lo no prontuário do paciente.

Exposição perinatal

É considerado como baixo risco perinatal: mãe  que recebeu terapia antirretroviral (TARV) durante a gestação, com bom controle virológico e boa adesão ao tratamento.

É recomendado exames para recém-nascidos de baixo risco com 14 a 21 dias e 4 a 6 meses

Risco aumentado de transmissão perinatal do HIV é definido por uma ou mais das situações a seguir em caso de uma mãe soropositiva:

Não receberam cuidados pré-natais, TARV durante a gestação, antirretrovirais pré-parto ou intraparto, iniciada a TARV tardiamente na gestação (durante o final do 2.º ou no 3.º trimestre), diagnóstico agudo na gestação, carga viral desconhecida.

Recomendam-se exames ao nascimento, 14 a 21 dias, 1 a 2 meses, 2 a 3 meses, 4 a 6 meses.

Prognóstico e tratamento

Anteriormente a TARV, 50 a 80% das crianças morriam antes dos 4 anos de idade; no entanto, com esquemas apropriados TARV de combinação, a maioria das crianças infectadas no período perinatal sobrevive bem na adolescência.

Na presença de infecções oportunistas e, se a terapia TARV de combinação não conseguir recuperar o controle virológico e imunológico, o prognóstico é pior.  Atualmente, não se recomenda a interrupção da TARV em nenhuma hipótese após o diagnóstico de HIV, sendo necessário o tratamento para a vida toda.

O início da terapia em crianças é semelhante ao de adultos; essencialmente, todas as crianças com infecção pelo HIV devem receber TARV o mais rápido possível.

Prevenção

O tratamento materno pré-natal é padronizado para todas as gestantes infectadas pelo HIV e deve ser iniciado assim que houver o diagnóstico. Os testes rápidos para o HIV realizados em gestantes em trabalho de parto e durante o pré-natal.

Recomenda-se parto cesárea eletivo antes do início do trabalho de parto se a carga viral materna de HIV for > 1.000 cópias/mL e a administração de ZDV IV na dose de 2 mg/kg IV na primeira hora e então 1 mg/kg/hora IV até o parto a mulheres com: Carga viral plasmática recente do HIV > 1.000 cópias/mL ou carga viral sérica de HIV desconhecida próximo do parto.

Todos os recém-nascidos expostos ao HIV devem receber um esquema ARV pós-parto para reduzir o risco de infecção pelo HIV o mais rápido possível, de preferência 6 a 12 horas após o parto.

Amamentação ou doação para bancos de leite é contraindicada a mulheres infectadas pelo HIV.

Autora: Thays Davanço Pedroso dos Passos

Instagram: @thadavanco

Referências

1 – Imbelloni LE, Carneiro ANG, Cefaléia pós-raquianestesia: Causas, prevenção e tratamento. Revista Brasileira de Anestesiologia, 1997; 47:5: 453-464


O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: esse material foi produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido.