Índice
Espirometria
Antes de buscarmos compreender o que é o índice de Tiffeneau, bem como sua interpretação nos diferentes distúrbios respiratórios, precisamos conhecer quais são as principais medidas envolvidas na avaliação da capacidade respiratória de um indivíduo. Isso se faz importante porque esse índice é justamente obtido a partir de outros dois valores colhidos na espirometria.
Mas então, o que é a espirometria? Espirometria, também chamada de prova de função respiratória, é um exame que busca avaliar a capacidade pulmonar de um indivíduo, o que é feito a partir de alguns valores que são obtidos por meio de sua execução. Ela é particularmente útil no diagnóstico de condições como asma e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), por exemplo.
Para a sua realização, é preciso de um equipamento denominado espirômetro, no qual o indivíduo coloca a boca, faz uma inspiração profunda máxima com posterior expiração forçada de todo o ar possível, como demonstra a imagem 1.

A partir disso, esse aparelho medirá os fluxos e os volumes de ar envolvidos no processo, gerando valores a serem comparados com outros pré-determinados para idade, sexo, peso e altura. Esses volumes obtidos podem ser de dois tipos, os estáticos e os dinâmicos.
Volumes Estáticos
Esse conjunto é compreendido pela capacidade pulmonar total (CPT), capacidade residual funcional (CRF) e volume residual (VR). A CPT é definida como o volume de ar que ocupa inteiramente os pulmões da pessoa após a inspiração profunda. O CRF é o volume de ar residual, ou seja, que “fica” nos pulmões após uma expiração normal, mas que em partes pode ser mobilizado na expiração forçada. Já o VR é justamente o ar que sobra nos pulmões mesmo após expiração forçada máxima sendo, portanto, um volume “não recrutável” na ventilação.
Volumes Dinâmicos
Aqui inclui-se a capacidade vital (CV), a capacidade vital forçada (CVF), o volume expiratório forçado de primeiro segundo (VEF1), o fluxo expiratório médio entre 25 e 75% (FEF 25-75%), o pico de fluxo expiratório (peak flow) e o índice de Tiffeneau, que traduz a relação VEF1/CVF.
A CV é o maior volume de ar possível que pode ser mobilizado nos pulmões no intercurso respiratório. A CVF é o volume total forçado de ar exalado após uma inspiração profunda e máxima, enquanto o VEF1 é o volume de ar expirado no primeiro segundo da expiração forçada.
O FEF 25-75% mede o fluxo de ar expelido entre 25 e 75% da expiração forçada. Já o peak flow mede o fluxo expiratório máximo em uma expiração forçada. Por fim, o VEF1/CVF ou, melhor dizendo, o índice de Tiffeneau, corresponde ao percentual de ar exalado no primeiro segundo da expiração forçada, em relação ao volume total de ar exalado durante a mesma.
Logo, nota-se que conceitualmente o índice de Tiffeneau não apresenta grande complexidade, já que simplesmente representa a relação de duas grandezas, o VEF1 e a CVF, que são tomadas a partir de um exame denominado espirometria, utilizado na busca da avaliação da função respiratória de um indivíduo. Mas o fato de ser simples significa que ele não tem importância? Nada disso! A utilização desses valores é fundamental para a avaliação e diagnóstico dos distúrbios respiratórios, condições bem prevalentes na população, e é com eles que a discussão seguirá.
Tipos de distúrbios
Pudemos perceber que ao realizar a espirometria, os valores de alguns volumes pulmonares são obtidos e comparados com o que seria esperado para idade, sexo, peso e altura. Como assim? Bom, imaginemos que um homem de 42 anos, 1,75 m de altura pesando 82 kg, fez o exame e obteve um valor X para sua CVF. Esse valor será comparado com o que seria esperado para uma pessoa nessa mesma condição, e, caso a medida obtida seja próxima ao esperado, teríamos um exame normal, enquanto, se fosse muito discrepante, poderia indicar uma anormalidade. É a partir dessa comparação que teremos um padrão de valores para os volumes obtidos que vão caracterizar determinados tipos de distúrbios, a se dizer, obstrutivos, restritivos e mistos.
Distúrbios Obstrutivos
Ocorre em situações de obstrução das vias aéreas, como no caso da asma e da DPOC. Em termos de espirometria, eles são caracterizados por uma redução dos volumes expiratórios e dinâmicos, porém com um aumento dos volumes estáticos, o que ocorre como consequência da hiperinsuflação pulmonar que normalmente ocorre nessas condições. Logo, temos uma redução de VEF1, CV, CVF, FEF 25-75% e peak flow, em contraste com o aumento de VR, CRF e CPT.
Caso o leitor esteja atento, deve ter se perguntado… “Tudo bem, mas então o índice de Tiffeneau se mantém normal, já que tanto VEF1 quanto CVF apresentam redução?”. É aqui que temos uma informação importante. O VEF1 tem uma redução bem mais pronunciada que a CVF, e por isso o Tiffeneau apresenta queda. Em termos numerários, essa redução faz com que VEF1/CVF fique menor que 70% do que seria esperado, sendo este um valor importantíssimo para ser gravado para sua prática médica.
Distúrbios Restritivos
Nesse caso ocorre uma restrição à expansão pulmonar, o que normalmente ocorre em doenças do interstício pulmonar que acarretam fibrose do parênquima. Assim, a ventilação fica “restrita”. Em termos de espirometria, vamos observar uma redução de todos os volumes pulmonares, tanto estáticos quanto dinâmicos. Como detalhe, nota-se ainda uma redução de VEF1 proporcional ou até mesmo menor que CVF, fazendo com que o índice de Tiffeneau se mantenha normal ou elevado, ou seja, acima de 70% do previsto.
Distúrbios Mistos
Essa condição pode ser desencadeada por uma séria de doenças, sejam elas únicas ou associadas. As principais envolvidas são sarcoidose, tuberculose, bronquiectasias, bem como um obeso asmático ou DPOCítico com tuberculose. Na espirometria é comum encontrarmos um Tiffeneau inferior a 70%, porém com CVF bastante reduzida.
Considerações finais
Portanto, podemos notar que o índice de Tiffeneau é um valor obtido a partir de dois volumes dinâmicos, o VEF1 e o CVF, em que um valor abaixo de 70% indica a presença de distúrbios obstrutivos ou mistos, enquanto sua normalidade associada a diminuições nos outros valores pode indicar um distúrbio restritivo. Dessa forma, esse índice corresponde a um parâmetro de grande importância na avaliação do paciente pneumopata, sendo de grande utilidade para o diagnóstico dessas condições, quando associado aos demais dados da espirometria e história clínica dos pacientes.
Autor: Lucas Diniz Peixoto de Melo
Instagram: @dinizpmelo
O texto acima é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Referências
KASPER, Dennis L.. Medicina interna de Harrison. 19 ed. Porto Alegre: AMGH Editora, 2017. 1
GOLDMAN, Lee; AUSIELLO, Dennis. Cecil Medicina Interna. 24. ed. Saunders Elsevier, 2012.