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Leucemias: o que são, origem e tipos de cânceres do sangue

Leucemias: o que são, origem e tipos de cânceres do sangue

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Leucemias: tudo o que você precisa saber para sua prática clínica!

Câncer no sangue é uma forma genérica de se referir a um grupo de doenças malignas que afetam os componentes do sangue e da medula óssea. Essas doenças são conhecidas como “cânceres hematológicos” ou “neoplasias hematológicas” e incluem leucemias, linfomas e mielomas múltiplos.

No Brasil, atualmente a leucemia é o 9º câncer mais comum entre os homens e o 11º entre as mulheres. Segundo o Atlas de Mortalidade por Câncer de 2015, houve 6.837 mortes por leucemias, sendo 3.692 de homens e 3.145 de mulheres. Em 2020, o Instituto Nacional de Câncer (INCA) estima o surgimento de 10.810 novos casos, sendo dentre eles de 5.920 do sexo masculino e 4.980 do sexo feminino.

O que é leucemia?

A leucemia é um câncer que afeta os glóbulos brancos, que são as células responsáveis pela defesa do corpo contra infecções.

Na leucemia, a medula óssea produz glóbulos brancos anormais e imaturos em grande quantidade, que acabam se acumulando no sangue e atrapalhando a função normal do sistema imunológico.

O que é hematopoiese?

As leucemias são doenças malignas que se caracterizam pela quebra do equilíbrio da produção dos elementos do sangue, causada pela proliferação descontrolada de células. Tendo isso em vista, é fundamental conhecermos como este processo ocorre normalmente, a fim de entendermos as alterações encontradas na leucemia.

A hematopoiese é o processo pelo qual são formadas as células do sangue. Envolve todos os fenômenos relacionados a origem, multiplicação e maturação das células precursoras das células sanguíneas.

No período pós-natal, a medula óssea constitui o único local de produção da porção celular do sangue, isto é, de eritrócitos, leucócitos e plaquetas. Apesar de essas três linhagens celulares serem distintas umas das outras, elas são oriundas de uma célula-mãe única, chamada célula pluripotente.

Medula óssea

A medula óssea é um tecido líquido gelatinoso que preenche a cavidade interna de vários ossos e é responsável pela produção de células que compõem o sangue (hemácias, leucócitos e plaquetas).

Cleveland Clinic, 2019.

Na medula óssea, as células pluripotentes proliferam-se e podem ser estimuladas tanto a autorrenovar-se quanto a dar origem a células progenitoras diferenciadas. Essas células, que originam as distintas linhagens de células sanguíneas, são chamadas de células comprometidas. Elas possuem um maior grau de diferenciação, sendo assim unipotentes, isto é, capazes de originar apenas uma determinada linhagem sanguínea.

Como são constituídas as séries sanguíneas?

As séries sanguíneas são constituídas pelos:

  • Eritrócitos: também chamados de hemácias ou células vermelhas
  • Células granulocíticas
  • Monócitos
  • Linfócitos
  • Plasmócitos
  • Plaquetas (ou trombócitos).

Os glóbulos vermelhos são basicamente responsáveis pelo transporte de oxigênio. Os glóbulos brancos possuem função de defesa do organismo. Por fim, as plaquetas são responsáveis pela coagulação sanguínea, evitando hemorragias.

Processo de hematopoiese na medula óssea.
Imagem: Processo de hematopoiese na medula óssea. Fonte: Cleveland Clinic, 2019.

É importante estar atento ao fato de que os granulócitos, os monócitos, os linfócitos e os plasmócitos recebem a denominação geral de leucócitos, os glóbulos brancos do sangue. Além disso, vale lembrar que as células granulocíticas, ou granulócitos, incluem os mastócitos, neutrófilos, basófilos e eosinófilos.

Etiologia das leucemias

As leucemias, geralmente, são de origem desconhecida. Sua principal característica é o acúmulo de células doentes na medula óssea, que substituem as células sanguíneas normais.

Nessa condição, uma célula que ainda não atingiu a maturidade sofre uma mutação genética que a transforma em uma célula cancerosa ou leucêmica, como pode ser chamada. Essa célula anormal, além de não funcionar de maneira adequada, multiplica-se mais rápido e morre menos do que as células normais, fazendo com que as células saudáveis da medula sejam progressivamente substituídas.

Dessa forma, além de perderem a função de defesa do organismo, os leucócitos doentes produzidos descontroladamente reduzem o espaço na medula óssea para a fabricação das outras células que compõem o sangue. Adicionalmente, os glóbulos brancos não se desenvolvem por completo e caem na corrente sanguínea antes de estarem preparados, não exercendo assim as suas funções corretamente.

Esses leucócitos anormais que atingem a corrente sanguínea podem também invadir outros órgãos, tais como:

  • Fígado
  • Baço
  • Linfonodos
  • Rins
  • Cérebro.
Cleveland Clinic, 2019.

Resumidamente, nas leucemias há uma produção inadequada das células de defesa, o que predispõe o organismo a infecções. Em adição, o acúmulo de células anormais na medula óssea prejudica a produção de outros tipos celulares, predispondo o indivíduo a anemia e hemorragias, entre outros sintomas.

Imagem:O sangue normal contém células vermelhas, células brancas e plaquetas. Na leucemia, há produção exagerada de leucócitos danificados, diminuindo assim a produção de hemácias e plaquetas. Essa proporção pode ser observada no sangue dos pacientes. Fonte: Cleveland Clinic, 2019.

Diagnóstico da leucemia

O diagnóstico da leucemia envolve uma série de etapas para identificar a presença da doença, determinar o tipo específico de leucemia e avaliar o estágio da doença.

Anamnese e exame físico

O médico realizará uma entrevista detalhada com o paciente para coletar informações sobre os sintomas, histórico médico, histórico familiar e outros aspectos relevantes para o diagnóstico.

Em seguida, um exame físico será realizado para verificar a presença de sinais físicos da leucemia, como aumento dos gânglios linfáticos, baço ou fígado.

Exames de sangue

A análise de amostras de sangue é um passo importante no diagnóstico da leucemia. Os exames de sangue podem revelar a presença de células leucêmicas anormais, bem como fornecer informações sobre a contagem de:

  • Glóbulos brancos
  • Glóbulos vermelhos
  • Plaquetas no sangue

Exame de medula óssea (mielograma)

Para confirmar o diagnóstico de leucemia e determinar o tipo específico, é necessário realizar uma biópsia da medula óssea.

Nesse procedimento, uma pequena amostra de medula óssea é coletada, geralmente da parte posterior do quadril, e examinada sob um microscópio para detectar a presença de células leucêmicas.

Citogenética e biologia molecular

Análises adicionais podem ser realizadas para avaliar as características genéticas das células leucêmicas. A citogenética estuda os cromossomos para identificar anomalias genéticas específicas que podem estar relacionadas à leucemia.

A biologia molecular analisa os genes e moléculas presentes nas células leucêmicas para obter informações adicionais sobre a doença.

Imunofenotipagem

Esse teste utiliza marcadores específicos para determinar o tipo de células leucêmicas presentes na medula óssea e no sangue.

Essa informação é útil para classificar a leucemia em subtipos específicos, como leucemia linfocítica aguda (LLA) ou leucemia mieloide aguda (LMA).

Como fazer a classificação das leucemias?

As leucemias são classificadas de acordo com o tipo de leucócitos que afetam. Baseando-se neste critério, temos dois grandes grupos de leucemias, separados segundo a linhagem de células brancas acometida.

Uma leucemia é chamada linfocítica, linfoblástica ou linfoide quando atinge as células linfoides, isto é, aquelas derivadas do precursor linfoide (células NK, linfócitos T, linfócitos B e plasmócitos). Quando uma leucemia é classificada como mieloide ou mioloblástica, significa que as células alteradas são as mieloides, derivadas do precursor mieloide (mastócitos, basófilos, neutrófilos, eosinófilos e monócitos).

Em pacientes com leucemia, o crescimento celular ocorre descontroladamente e há um rápido aumento de leucócitos anormais.

Cleveland Clinic, 2019.

Leucemias agudas e crônicas

As leucemias podem também se apresentar de duas outras maneiras distintas, diferindo agora em relação não mais ao tipo celular acometido, mas sim quanto a velocidade de reprodução celular e da evolução da doença.

Nas leucemias agudas observamos o rápido crescimento de células imaturas, que não desempenham seu papel como deveriam e que se multiplicam aceleradamente. Nas leucemias crônicas há um aumento de células maduras, porém anormais. Elas se reproduzem de forma um pouco mais lenta e podem ter mantidas algumas de suas funções.

Existem mais de 12 tipos de leucemias, mas que podem ser agrupados em quatro grupos primários, conforme a classificação discutida:

  • Leucemia mieloide aguda (LMA)
  • Mieloide crônica (LMC)
  • Leucemia linfocítica aguda (LLA)
  • Leucemia linfocítica crônica (CLL).

LMA – Leucemia mieloide aguda

A LMA é um tipo de câncer que afeta as células mieloides imaturas na medula óssea, resultando em uma produção excessiva de glóbulos brancos imaturos e anormais.

Essas células cancerígenas, também conhecidas como blastos, substituem as células sanguíneas normais, incluindo glóbulos brancos, glóbulos vermelhos e plaquetas.

Fisiopatologia da LMA

A LMA ocorre devido a mutações genéticas nas células mieloides, que fazem com que elas se multipliquem descontroladamente. Com o acúmulo de células cancerígenas imaturas na medula óssea, a produção de células sanguíneas normais é prejudicada, resultando em uma quantidade insuficiente de glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas circulando no sangue.

Esse desequilíbrio afeta a capacidade do organismo de combater infecções, coagular o sangue e transportar oxigênio adequadamente.

Manifestações clínicas

Os sintomas da LMA podem variar, mas geralmente incluem:

  • Fadiga e fraqueza
  • Palidez e dificuldade para respirar
  • Infecções frequentes devido à supressão do sistema imunológico
  • Sangramentos inexplicados, como gengivas sangrando ou hematomas
  • Aumento de gânglios linfáticos ou do baço
  • Dores ósseas ou articulares
  • Perda de peso não intencional

Leucemia Mieloide Crônica (LMC)

A leucemia mieloide crônica é uma doença clonal da célula progenitora hematopoiética.

Nessa doença, há a multiplicação excessiva de células precursoras da linhagem mieloide sanguínea, sendo que a transformação maligna ocorre nas células mais maduras.

O cromossomo Ph

Diferentemente dos outros tipos de leucemias, em que a etiologia costuma ser desconhecida, nos pacientes com LMC é possível identificar a presença de uma mutação genética bem definida, conhecida como cromossomo Philadelphia (Ph). Trata-se de uma translocação entre os cromossomos 9 e 22, nas localizações q34 e p11, representada por t(9;22) (q34; p11).

Essa fusão de genes dá origem a um gene híbrido, chamado BCR-ABL, que irá definir a transcrição de uma proteína com alta atividade de tirosina quinase. Essa atividade enzimática está envolvida com a regulação da proliferação celular. Dessa forma, quando há essa mutação genética, observamos a alteração nessa regulação, fazendo com que as células se proliferem desgovernadamente.

Imagem: A translocação cromossômica e oncogenes associados na leucemia mieloide crônica. Fonte: Robbins e Cotran. Bases Patológicas das Doenças, 8. ed.

Epidemiologia

A ocorrência de LMC corresponde a 14% da ocorrência de todas as leucemias. No Brasil, observa-se a incidência de 1,6 casos a cada 100 mil habitantes por ano.

É uma doença que costuma acometer adultos mais velhos, por volta dos 50 ou 60 anos, sendo apenas 4% dos pacientes crianças. É observada uma discreta predominância de casos no sexo masculino.

O único fator de risco bem conhecido para o aparecimento da mutação –cromossomo Ph –, e portanto, da doença, é a exposição a radiação ionizante (raios X e gama). Normalmente, ela é proveniente de procedimentos médicos e o risco oferecido depende da dose, da exposição e da idade do paciente.

Quadro clínico

O quadro clínico da LMC é caracterizado por uma hiperplasia mieloide acompanhada de leucocitose, neutrofilia e basofilia. É muito comum também a presença de esplenomegalia, observada em mais de 80% dos casos.

A história natural da doença é dividida em três fases: fase crônica, fase acelerada e crise blástica. A fase crônica costuma ser pouco sintomática e geralmente tem duração de 3 a 5 anos. Na fase acelerada, há o aparecimento de mais sintomas e observa-se a duração de alguns meses.

Por fim, na crise blástica a doença passa a se comportar como uma leucemia aguda, porém com quadro clínico mais grave do que o observado quando a doença já tem início agudamente, como é o caso da LMA. Essa fase é considerada fatal e, algumas vezes, pode ser alcançada sem que o paciente passe pela fase acelerada.

Na fase crônica, o paciente pode estar assintomático ou apresentar poucos sintomas. Quando os sintomas se manifestam, eles costumam aparecer sob a forma de:

  • Fadiga
  • Perda de peso
  • Sudorese
  • Febre
  • Palidez, devido a anemia associada

Além disso, a maioria dos pacientes apresenta esplenomegalia importante. A intensidade dos sintomas está relacionada ao grau de leucocitose no sangue periférico, observado no hemograma, e com a presença de organomegalias.

Leucemia linfocítica aguda (LLA)

A Leucemia Linfocítica Aguda (LLA) é um tipo de câncer que afeta as células linfoides imaturas na medula óssea, resultando em uma produção excessiva de linfócitos imaturos e anormais. Essas células cancerígenas, também conhecidas como blastos linfoides, substituem as células sanguíneas normais na medula óssea, prejudicando a produção adequada de glóbulos brancos, glóbulos vermelhos e plaquetas.

A LLA é mais comum em crianças, mas também pode afetar adultos. Existem dois principais subtipos de LLA com base no tipo de linfócitos afetados:

  • LLA de linfócitos B (LLA-B)
  • LLA de linfócitos T (LLA-T)

A LLA-B é mais comum em crianças, enquanto a LLA-T é mais comum em adolescentes e adultos jovens.

Manifestações clínicas

Sintomas: Os sintomas da LLA podem variar dependendo do estágio da doença, mas geralmente incluem:

  • Fadiga e fraqueza
  • Palidez e dificuldade para respirar
  • Infecções frequentes devido à redução das células normais do sistema imunológico
  • Sangramento excessivo ou hematomas
  • Aumento dos gânglios linfáticos ou do baço
  • Dor óssea ou articular
  • Perda de peso não intencional
  • Inchaço abdominal (principalmente em crianças)

Leucemia linfocítica crônica (CLL)

A Leucemia Linfocítica Crônica (CLL) é um tipo de câncer do sangue e da medula óssea que afeta os linfócitos, um tipo de glóbulos brancos. Ao contrário da Leucemia Linfocítica Aguda (LLA), a CLL é uma doença crônica de progressão lenta, onde as células leucêmicas se acumulam gradualmente na medula óssea e no sangue ao longo do tempo.

A CLL é mais comum em adultos mais velhos, geralmente acima de 60 anos, e a causa exata ainda não é completamente compreendida. Algumas pesquisas indicam que mutações genéticas podem estar envolvidas no desenvolvimento da CLL, mas a influência de outros fatores ambientais e de estilo de vida ainda é objeto de estudo.

Como é feito o tratamento da leucemia?

O tratamento da leucemia pode variar significativamente com base no tipo específico da doença, estágio, idade do paciente, condição geral de saúde e outras características individuais. Geralmente, o tratamento da leucemia envolve uma abordagem multidisciplinar, combinando diferentes modalidades terapêuticas. As principais opções de tratamento incluem:

  • Quimioterapia
  • Radioterapia
  • Imunoterapia
  • Transplante de células-tronco: o transplante de células-tronco é uma opção de tratamento que pode ser considerada em alguns casos de leucemia em que a quimioterapia ou outros tratamentos não são suficientes. Nesse procedimento, células-tronco saudáveis são coletadas do paciente ou de um doador compatível e são então infundidas no paciente após a destruição das células cancerígenas por altas doses de quimioterapia ou radioterapia.

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Referência bibliográfica

  • INCA. Leucemias. Disponível em: . Acesso em 25 de Julho de 2023.

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