Carreira em Medicina

Lições de sabedoria: O que não dizer a um doente. | Colunistas

Lições de sabedoria: O que não dizer a um doente. | Colunistas

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1 – Não diga ao doente que, com certeza, ele ficará bem.

“O Tony vai ficar ótimo! Olha, não tem com o quê se preocupar, garanto!” (George O’Malley).

Quem não se lembra dessa cena do primeiro episódio de Grey’s Anatomy? (atenção, contém spoilers).

Tony será submetido a uma cirurgia de revascularização do miocárdio. O chefe da Cardiologia, Dr. Preston Burke, informa ao paciente e à esposa sobre os riscos associados a realização de uma cirurgia, apesar de ser um procedimento simples. Apreensiva, a esposa do paciente é confortada por George O’Malley com a frase acima em destaque. Até aí, tudo parece ir bem.

Após a cirurgia, Dr. Burke diz a O’Malley que o coração de Tony apresentava muitos danos e que ele perdera o paciente: “Acontece. Raramente, mas acontece.”. Desnorteado, O’Malley refere que garantiu e prometeu à esposa que Tony ficaria bem. Nesse momento, temos a primeira grande lição: “O único que mantém uma promessa dessas é Deus e eu não o vejo de bisturi há muito tempo. Nunca prometa à família de um paciente um bom resultado.” (Dr. Burke).

2 – Não fale tudo de uma só vez

Quando um paciente recebe um diagnóstico daqueles que ninguém quer aceitar, como um câncer em fase avançada ou uma infecção por HIV, ele costuma não prestar atenção em mais nada após poucos minutos de conversa; geralmente, ele chora. Esse é o exato momento de não se dizer mais nada e aguardar o momento oportuno de uma próxima visita para se concluir o diálogo.

Estender o assunto ou continuar informando o paciente sobre seu prognóstico e possíveis tratamentos pode ser muito prejudicial. É preciso cuidado ao se transmitir qualquer informação.

3 – Não minta

Num passado não muito distante, acreditava-se que quanto menos o doente soubesse de sua condição, maiores chances teria de recuperação. Hoje, estamos frente a uma forte tendência de abertura e honestidade com os pacientes a respeito de sua condição”. (Leo Pessini, doutor em Teologia Moral-Bioética).

O médico não é apenas um transmissor de informação, mas é também um orientador sobre as decisões de tratamento. Focar apenas no paciente torna o atendimento excessivamente paternalista; enquanto um foco na doença faz com o que o atendimento seja muito técnico. Se o médico foca em si, o cuidado passa a ser um tanto egoísta, mas, se foca excessivamente no sistema, tem-se uma relação muito impessoal.

O que fazer então?

Nesse caso, explicar as alternativas de tratamento e explicitar os benefícios e efeitos colaterais de cada uma motivam o paciente a fazer a melhor escolha em conjunto com seu médico e sua equipe assistente. Não assuste o paciente com um prognóstico desfavorável ou com a morte, mas também não diga mentiras e não dê falsas esperanças.

Também não invente explicações sobre o que você desconhece. Seja sincero com seu paciente se você não sabe de algo. Explique que você conversará com autoridades no assunto e que fará pesquisas para que aprenda sobre o tema questionado e tenha as respostas no próximo encontro. Você não é um super-herói e não sabe de tudo (nem precisa saber).

4 – Não faça uso exclusivo de termos técnicos (e seja empático)

Todas as orientações e informações transmitidas precisam ser compreendidas pelo paciente. Usar apenas termos técnicos pode exigir muito esforço do paciente para entender qualquer coisa sobre a sua própria condição de saúde e doença. Então, diga o que precisa ser dito, mas com um vocabulário acessível ao paciente.

O problema nem sempre é o ato de contar, mas o modo como se conta. Cautela, confiança e respeito são características fundamentais para o sucesso de um diálogo entre um médico e um paciente, para ambas as partes.

5 – Não tente animar seu paciente

Aos 21 anos de idade, o estudante de física Stephen Hawking recebeu o diagnóstico de esclerose lateral amiotrófica (ELA). Em depressão, isolou-se, recusando-se a sair de seu quarto. Jane, que seria sua esposa, o confortou e fez com que ele encontrasse forças para lidar com sua situação, provando que o carinho e a sensibilidade podem auxiliar muito o doente.

A doença passa a ser o tema central da mente de quem recebeu um diagnóstico ruim. Então, deixe que o paciente fale sobre isso; deixe que ele chore e desabafe. Não o obrigue a “ter mais vontade de se curar” ou a “não fazer corpo mole”. Isso não ajuda em nada. Mesmo!

Um processo de comunicação de qualidade inicia-se com a escuta e desenvolve-se com a escolha de palavras certas, com o respeito, a empatia e o cuidado humano.

É que, nem sempre, os livros e as faculdades ensinam isso: julgar menos e aceitar mais; falar menos e saber escutar. Mas a gente aprende.


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