Carreira em Medicina

Preparos que antecedem a reanimação em recém-nascidos com mais de 34 semanas | Colunistas

Preparos que antecedem a reanimação em recém-nascidos com mais de 34 semanas | Colunistas

Compartilhar
Imagem de perfil de Comunidade Sanar

A reanimação neonatal diminui morbimortalidade dos neonatos. As principais etiologias de mortalidade neonatal no mundo são atribuídas em forma decrescente para complicações da
prematuridade, eventos relacionados ao parto e infecções, sendo que a prevenção e o tratamento da última é um dos principais responsáveis pela redução no número de mortes em crianças menores que 5 anos. Além disso, é estimado que cerca de 300.000 recém-nascidos brasileiros todo ano precisem de ajuda para iniciar e manter a respiração ao nascer. Dessa forma, ressalta-se a importância de conhecimento adequado do tema pelos pediatras e profissionais.

Antes do nascimento: material e condições que necessitem de reanimação

Antes de abordar as técnicas é imprescindível destacar a relevância da equipe, a qual realiza a anamnese materna e prepara o material para utilização imediata na sala de parto. Algumas situações da história devem chamar atenção para a possibilidade do recém-nato necessitar de reanimação, são elas:

  • Condições antenatais:
    • Idade < 16 anos ou > 35 anos
    • Idade gestacional < 39 ou > 41 semanas
    • Diabetes
    • Síndromes hipertensivas
    • Doenças maternas
    • Infecção materna
    • Aloimunização ou anemia fetal
    • Uso de medicações
    • Uso de drogas ilícitas
    • Óbito fetal ou neonatal anterior
    • Ausência de cuidado pré-natal
    • Gestação múltipla
    • Rotura prematura das membranas
    • Polidrâmnio ou oligoâmnio
    • Diminuição da atividade fetal
    • Sangramento no 2º ou 3º trimestre
    • Discrepância de idade gestacional e peso
    • Hidropsia fetal
    • Malformação fetal
  • Condições relacionados ao parto:
    • Parto cesáreo
    • Uso de fórcipe ou extração a vácuo
    • Apresentação não cefálica
    • Trabalho de parto prematuro
    • Parto taquitócico
    • Corioamnionite
    • Rotura de membranas > 18 horas
    • Trabalho de parto > 24 horas
    • Segundo estágio do parto > 2 horas
    • Padrão anormal de frequência cardíaca fetal
    • Anestesia geral
    • Hipertonia uterina
    • Líquido amniótico meconial
    • Prolapso ou rotura de cordão
    • Uso de opioides 4 horas antes ao parto
    • Descolamento prematuro da placenta
    • Placenta prévia
    • Sangramento intraparto significante

Antes do nascimento, é fundamental ter em mãos todo o material necessário já testado para a avaliação do recém-nascido, manutenção da temperatura, aspiração de vias aéreas, ventilação e administração dos medicamentos. Além disso, é necessário ao menos um profissional somente para o recém-nascido capacitado em realizar os primeiros passos e a ventilação com pressão positiva pela máscara facial presente durante todo o parto. Se identificado alguma das condições acima, é recomendado dois ou três profissionais na sala de parto exclusivamente para receber o recém-nato, sendo um deles pediatra. Na recepção do paciente, a equipe deve utilizar equipamentos de proteção individual e fazer a higienização correta das mãos.

Clampeamento do cordão umbilical

O clampeamento do cordão umbilical pode ser precoce ou tardio. O precoce é aquele que ocorre em até 60 segundos. Já o tardio é aquele que acontece 1 a 3 minutos após a extração por completo podendo ser posicionado no tórax ou abdome materno durante o período. O clampeamento tardio melhora os índices hematológicos aos 3 a 6 meses de vida, porém é associado a hiperbilirrubinemia indireta com necessidade de fototerapia na primeira semana de idade.

Depois da extração completa do recém-nascido da cavidade uterina, verifica-se dois tópicos: se começou a respirar ou chorar e se o tônus muscular está em flexão. Se sim para ambas perguntas, indica-se o clampeamento tardio do cordão, independente do aspecto do líquido amniótico.  Caso não presente essas situações no RN, ou a circulação placentária estiver comprometida (descolamento prematuro de placenta, placenta prévia ou rotura ou prolapso ou nó verdadeiro de cordão) ou a mãe é portadora de HIV, deve ser feito o clampeamento precoce.

Não há evidências em relação à segurança e eficácia da ordenha do cordão comparada ao clampeamento precoce ou tardio no neonato a termo.

Auxílio ao RN a termo com boa vitalidade ao nascer

Nos casos que há indicação de clampeamento tardio, o RN deve ficar em contato pele a pele com a mãe coberto com tecido de algodão aquecido e seco. A sala de parto deve estar com a temperatura ambiente entre 23-26ºC para manter uma boa temperatura corporal do neonato entre 36,5-37,5ºC. Deve-se também secar o corpo com compressas aquecidas. Enquanto o recém-nascido está em contato com a mãe ter o cuidado de manter as vias aéreas pérvias, o pescoço sem flexão ou hiperextensão e verificar se não tem excesso de secreções na boca e nariz. Primeiro, avaliar a frequência cardíaca com o estetoscópio no precórdio, o tônus muscular e a respiração/choro. Após, observar continuadamente a atividade, o tônus muscular e a respiração/choro.

A amamentação é recomendada ser feita na primeira hora após o parto, porque garante que o neonato ingira o colostro, que é rico em fatores protetores.

A estabilização antes da reanimação neonatal

Caso o RN tenha idade gestacional entre 34-36 semanas (pré-termo tardios) ou com ≥ 42 semanas (pós-termo), ou não iniciou movimentos respiratórios regulares, ou o tônus muscular está flácido, esses devem ser dirigidos envoltos em campos aquecidos à mesa de reanimação, posicionado em decúbito dorsal, para estabilização com os seguintes procedimentos realizados em no máximo até 30 segundos, na ordem:

  1. Prover calor;
    1. Temperatura axilar do RN deve estar entre 36,5 – 37,5ºC com sala aquecida entre 23-26ºC.
    1. Na mesa, o RN deve estar sob calor radiante.
    1. Deve-se secar o corpo e a região da fontanela. Após, descartar os campos úmidos.
  2. Posicionar a cabeça em uma leve extensão;
    1. Caso necessite ajuda para manter a cabeça nessa posição, pode-se colocar um coxim sob os ombros.
  3. Se necessário, aspirar boca e narinas, e secar.
    1. Introduzir delicadamente uma sonda traqueal nº 8-10 conectada ao
      aspirador a vácuo, sob pressão máxima de 100 mmHg.
    1. Se líquido meconial, é recomendado aspirar boca e narinas com sonda de aspiração traqueal nº 10. Não há evidências na literatura de fazer a aspiração traqueal sob visualização direta no RN não vigoroso nessa condição.
  4. Avaliar frequência cardíaca e respiratória.

Vale lembrar que o escore de Apgar é realizado no 1º e 5º minutos após a extração completa do RN, porém não é utilizado para indicar intervenções na reanimação neonatal. Entretanto, permite observar a resposta do neonato às manobras de reanimação executadas e a eficácia delas. Se o Apgar é <7 no 5º minuto, é indicado aplicar a cada 5 até os 20 minutos de vida, sendo essencial registrar o Apgar concomitante aos procedimentos de reanimação realizados.

A frequência cardíaca (FC) é um fator decisório no rumo para os próximos passos. É dito que uma respiração espontânea é considerada adequada quando os movimentos respiratórios são regulares e suficientes para manter uma FC >100 bpm. Nos primeiros minutos de vida, para avaliar a FC pode-se fazer a palpação do cordão umbilical, a ausculta do precórdio com estetoscópio e a detecção do sinal de pulso pela oximetria. Porém, todos eles subestimam a FC o que acarreta em intervenções desnecessárias. Estudos sugerem que verificar a atividade elétrica do coração pelo monitor cardíaco com três eletrodos é um método mais acurado, rápido e contínuo.

Contudo, é recomendado inicialmente auscultar o precórdio com o estetoscópio por 6 segundos e multiplicar por 10 para resultar no número de batimentos por minuto. Se > 100 bpm é adequada.

Nos recém-nascidos submetidos à estabilização inicial, se após as manobras, o RN apresentar FC > 100 bpm e respiração espontânea regular, pode-se deixar ele em contato pele-a-pele com a mãe. Mesmo assim observar a atividade, o tônus muscular e a respiração/choro de forma contínua.

Caso a FC seja < 100 bpm ou não tenha movimentos respiratórios regulares, um profissional de saúde deve realizar a ventilação com pressão positiva (VPP) iniciada nos primeiros 60
segundos após o nascimento  e outro fixar três eletrodos do monitor cardíaco (um em cada braço próximo ao ombro e o último na face anterior da coxa) e o sensor do oxímetro (no pulso radial direito). Se for um RN nessas condições com líquido amniótico meconial e depois de 30 segundos com VPP efetiva não há melhora, suspeita-se de obstrução de vias aéreas e é indicado a retirada do mecônio residual da hipofaringe e da traqueia sob visualização direta, com cânula traqueal conectada a dispositivo de aspiração e ao aspirador a vácuo com pressão máxima de 100 mmHg.

Conclusão

A reanimação neonatal é um tema muito relevante no dia a dia do pediatra e neonatologistas e o conhecimento dos passos que antecedem as manobras são de extrema importância ao profissional a fim de realizar o preparo mais adequado possível com o objetivo de ter resultado melhor na reanimação do recém-nascido.

Autora: Amanda Wilceki

Instagram: @amandawilceki


O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

Novidade: temos colunas sendo produzidas por Experts da Sanar, médicos conceituados em suas áreas de atuação e coordenadores da Sanar Pós.


Referências

Programa de Reanimação Neonatal da Sociedade Brasileira de Pediatria. Reanimação do recém-nascido ≥34 semanas em sala de parto: Diretrizes 2016. Sociedade Brasileira de Pediatria. www.sbp.com.br/reanimacao