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Doença inflamatória crônica de apresentação clínica variável, não contagiosa, relativamente comum e recidivante, que afeta em maior frequência a pele, mas que também pode acometer unhas e articulações.
Epidemiologia da psoríase
A psoríase é uma das dermatoses mais comuns na prática clínica, acometendo cerca de 2% da população mundial e cerca de três milhões de brasileiros. Atinge homens e mulheres de forma semelhante e pode ocorrer em qualquer idade, mas principalmente na segunda e na quinta década de vida.
Aspectos sociais, ambientais e geográficos podem influenciar na sua incidência, além de estar relacionada com maior risco do desenvolvimento de doenças cardiovasculares e prejuízo da saúde mental.
Etiologia
Fatores genéticos
Estima-se que 30 a 40% dos indivíduos acometidos tem histórico da doença na família. Assim, pacientes que a desenvolveram antes de 40 anos têm grande associação demonstrada em estudos com o antígeno leucocitário humano (HLA) – Cw6 e em menor intensidade com HLA B13, B17 e DR7, além da suscetibilidade de desenvolvimento entre gêmeos monozigóticos. Recentemente também foram revelados loci gênicos denominados psors encontrados nos cromossomos 1q, 4q, 6p e 17q.
Fatores ambientais
- Álcool e tabagismo ainda estão sendo investigados se levam a um gatilho para a doença ou se devido aos aspectos psicossociais gerados por ela, os pacientes acabam desenvolvendo tais hábitos como forma de escape.
- A temperatura mais fria leva ao ressecamento cutâneo que pode gerar exacerbação das lesões que tendem a melhorar com a exposição solar.
- Algumas medicações podem desencadear agudização da doença, como antimaláricos e betabloqueadores; já o anticoncepcional pode reduzir a severidade do quadro clínico da psoríase.
- Também se acredita em associação de infecção por HIV com piora do quadro.
- Fator de extrema importância é a relação da psoríase com o estresse fisiológico ou físico. É considerável a prevalência de transtorno depressivo nesses pacientes, assim como impacto na qualidade de vida, satisfação pessoal e morbidade psicológica. Em concordância com tal fator, pode-se abordar a influência do índice de massa corpórea acima de 30 na gravidade da doença. A obesidade aumenta o risco principalmente da psoríase invertida (que é mais comum em pacientes HIV positivos e negros);
- Além disso, pelo menos 30% dos portadores manifestaram infecções no trato superior (faringites e amigdalites) por Streptococcus do grupo A, C ou G, cerca de 2 semanas antes da exacerbação clínica.
Fisiopatologia
A doença ainda tem uma fisiopatologia questionada e com alguns pontos de vista teóricos. Até a década de 70, baseados na histopatologia das lesões, acreditava-se em uma proliferação e diferenciação descontroladas de queratinócitos, além de resposta imunológica exacerbada a um antígeno desconhecido. Na década de 80, foi descoberto, através de experimentos, que células T também estavam envolvidas no início e manutenção da psoríase.
As células T são inflamatórias, formadoras de vasos sanguíneos e influenciam na infiltração cutânea por neutrófilos. Assim, quando as células são atacadas, elas aumentam a produção, aceleram o ciclo evolutivo e por isso são produzidas as escamas e dificuldade das células mortas de serem eliminadas.
Componentes imunológicos podem ser citados como envolvidos na patogênese da doença, como: células T regulatórias, células T helper-17, células dendríticas, macrófagos, citocinas e interleucinas (IL 20, IL 22, IL 23). Ou seja, é muito provável que tenha como característica a resposta imunológica constituída por etapas:
- Sensibilização: as células dendríticas apresentam o antígeno para formação de células T1 e Th17, que poderiam ser causadores de infiltrados na pele;
- Silenciosa: apresenta duração variável;
- Efetora: pode ou não ser desenvolvida e é caracterizada por infiltração cutânea pelas células, ativação e resposta dos queratinócitos.
Sendo assim, durante a melhora, a etapa silenciosa retorna e no caso de recidiva a efetora é desenvolvida novamente.
Quadro clínico
A apresentação clínica é variável de acordo com o tipo da psoríase e com o organismo do paciente, incluindo, de forma geral:
- Manchas avermelhadas com escamas prateadas ou esbranquiçadas;
- Pele ressecada e com rachaduras, podendo evoluir com sangramentos;
- Manchas pequenas escuras ou esbranquiçadas, que são resíduos após as lesões originais;
- Dor em queimação;
- Prurido;
- Unhas grosseiras, descoladas, com sulcos ou depressões;
- Edema e rigidez articular.
Tipos de psoríase
Psoríase vulgar:
É a forma de manifestação mais comum da doença, afeta entre 58% a 97% dos pacientes, apresentando placas secas com escamas esbranquiçadas ou prateadas, demarcação nítida de tamanhos variados, além de hiperemiadas e inflamadas. Localizam-se principalmente em superfícies extensoras de antebraços e membros inferiores, couro cabeludo, face, ombros, tronco, joelhos, palmas, solas e unhas.
Pode apresentar prurido, dor em várias partes do corpo e em casos mais graves manifestar rachaduras cutâneas e sangramento no entorno das articulações.
Psoríase do couro cabeludo:
Apresenta-se como áreas hiperemiadas pruriginosas com escamas brancas ou prateadas. Podem ser percebidos flocos de células mortas em ombros e cabelos, que caem principalmente após coçar, semelhante a dermatite seborreica.
Psoríase ungueal:
Forma da doença que afeta as unhas dos pés e das mãos, fazendo com que a unha apresente crescimento fora do normal de forma grosseira, escamas, diferente coloração podendo levar a deformidade e descolamento ungueal.
Psoríase gutata:
Normalmente provocada por infecções estreptocócicas do trato respiratório superior em crianças e jovens abaixo de trinta anos. Apresenta lesões em placas com forma de gotas nos membros, tronco e couro cabeludo que são envolvidas por escama mais fina (diferentemente das típicas).
Psoríase pustulosa:
Nesse caso, podem ocorrer máculas, pápulas ou pústulas em pequenas áreas (palmas das mãos, solas dos pés ou pontas dos dedos) ou por todo o corpo com desenvolvimento rápido. As pápulas melhoram em cerca de um ou dois dias, mas podem recidivar em dias ou semanas. Também pode ser pronunciada a versão generalizada, ocasionando sintomas mais sistêmicos como febre, prurido intenso, astenia e calafrios.
Psoríase invertida:
Também chamada de psoríase intertriginosa, está mais relacionada com áreas úmidas (axilas, embaixo das mamas, fossas antecubitais e poplíteas, regiões genital, inguinal e umbilical, fenda glútea), com apresentação de manchas avermelhadas e inflamadas ou também esbranquiçadas e bem demarcadas. A gravidade depende de obesidade, sudorese excessiva e atrito nessas regiões de maior acometimento.
Psoríase eritodérmica:
É considerada o tipo menos comum, porém o mais sério da doença, podendo gerar risco de vida através da possibilidade de insuficiência cardíaca de alto débito, hipotermia e hipoalbuminemia. Engloba todo o corpo com máculas hiperemiadas que podem ser acompanhadas por queimação e prurido intenso, levando a acometimento sistêmico. Tem como fatores de risco: queimaduras graves, infecções, outros tipos de psoríase ou uso errado de medicações.
Psoríase artropática:
Também conhecida como artrite psoriásica podendo ser associada a qualquer forma da doença. Apresenta inflamação e lesões na pele, assim como também manifesta dores fortes nas articulações principalmente dedos das mãos e dos pés, coluna e articulação do quadril com possibilidade de gerar deformidades irreversíveis.
Diagnóstico
O diagnóstico da psoríase tem por base o quadro clínico e exame físico, com eventual histopatologia para confirmação em casos duvidosos ou atípicos. Também pode ser fácil conseguir o sinal do orvalho sangrento através da curetagem metódica de Brocq para auxílio no diagnóstico. Já a investigação da artrite psoriásica suporta a necessidade de estudo radiológico e avaliação conjunta com reumatologista.
Critérios de gravidade
Psoríase Leve:
- Engloba até 2% da área corporal;
- Não prejudica a qualidade de vida do paciente.
Psoríase Moderada:
- Engloba cerca de 2 a 10% da área corporal;
- Prejudica a qualidade de vida.
Psoríase Grave:
- Engloba mais de 10% da área corporal;
- Prejudica a qualidade de vida do paciente de forma significativa;
- Devido à doença o paciente pode aceitar tratamentos mesmo com a possibilidade de sérios efeitos colaterais.
Importante também na avaliação da gravidade a atenção pelo tipo de psoríase, regiões acometidas e comprometimento do estado geral.
Diagnóstico diferencial:
- Micoses;
- Pitiríase rósea;
- Pitiríase rubra pilar;
- Pênfigo foliáceo;
- Eczemas;
- Dermatites seborreicas e de contato;
- Infecções dérmicas;
- Erupções por drogas;
- Parapsoríase em placas;
- Sífilis secundária;
- Doença de Bowen.
Tratamento
A psoríase é considerada uma doença crônica e incurável e, portanto, o tratamento tem como objetivo a remissão da doença com melhora das lesões, sintomas e qualidade de vida. Para isso, ele é dividido de acordo com as características de gravidade da doença, além de levar em consideração a idade e sexo do paciente, antecedentes, tratamentos prévios, disponibilidade do tratamento.
É de grande importância a avaliação do dermatologista para que ele(a) estratifique e determine o melhor tratamento para tais lesões.
Tratamento tópico:
Tem como base principal a corticoterapia tópica, que é indispensável devido à minimização de efeitos colaterais em pele não lesada ou efeitos sistêmicos. Normalmente podem ser utilizados corticosteroides em forma de pomada, gel, creme, loção cremosa ou capilar, injeção intralesional. Além disso, pomadas de análogos da vitamina D, antralina ou imunomoduladores também são potencializadores para o tratamento.
Em qualquer tratamento, é essencial a inclusão de: emolientes, ceratolíticos ou umectantes, mesmo que alternados com outros produtos. No couro cabeludo, também pode-se lançar mão de lubrificação, xampus antifúngicos, corticosteroides, tópicos de alta potência, análogos de vitamina D, etc. E nas unhas podem ser utilizados corticosteroides tópicos, análogos de vitamina D, creme de ureia.
Nos casos mais leves, essa modalidade terapêutica costuma ser suficiente, sendo em monoterapia ou associações. Já nas formas moderadas ou graves, o tratamento tópico, se associado com fototerapia ou tratamento sistêmico, acelera a melhora das lesões.
Tratamento sistêmico:
Pode ser utilizado em casos de refratariedade ou quando são acometidas regiões que afetam a qualidade de vida dos pacientes como: face, mãos e pés. Também, na psoríase artropática, acrodermatite contínua e pustulose palmo-plantar, a terapêutica sistêmica é necessária visto que não respondem à tópica.
A fototerapia ocorre através da exposição à luz ultravioleta A (PUVA) em cabines associadas a medicações que aumentam a sensibilidade à luz, conhecidas como psoralenos. Já o tratamento com a luz ultravioleta B tem menos efeitos adversos podendo ser indicado até mesmo para gestantes.
O tratamento sistêmico pode ser através de monoterapia, combinação (redução da possibilidade de efeitos colaterais), rotacional (menor risco de toxicidade ou taquifilaxia por uso prolongado) ou intermitente.
A psoríase vulgar, por exemplo, pode ser tratada com sessões de fototerapia inicialmente e, em casos de intolerância ou não melhora, pode ser prescrito metotrexato ou acitretina, tendo como alternativas a ciclosporina ou biológicos (adalimumabe, infliximabe, etanercepte, ustequinumabe, secuquinumabe).
O uso de antibióticos é um pouco controverso e varia de acordo com a experiência médica. Corticosteroides sistêmicos são contraindicados para o tratamento dessa doença devido à possibilidade do desenvolvimento de formas graves ou pelo efeito rebote.
Portanto, o tratamento deve ser estudado minuciosamente pelo médico especialista devido aos efeitos colaterais potencialmente gerados por essas medicações, assim como contraindicações, caracterizando o tratamento individualizado.
Psicoterapia:
Devido ao fato de a psoríase afetar a qualidade de vida, autoestima e aparência dos pacientes, os aspectos psicossociais devem ser incorporados através do apoio multidisciplinar com psicólogo, assim como boa influência para atividade física e uma boa alimentação por meio de educadores físicos e nutricionistas.
Autoria: Isabella Schulthais