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Tratamento dos Transtornos de Humor | Colunistas

Tratamento dos Transtornos de Humor | Colunistas

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Introdução e definições

Este artigo tem como objetivo descrever o tratamento dos transtornos de humor, mostrando os princípios das terapias não farmacológicas e farmacológicas, de modo a apresentar ao leitor os dados necessários para a propedêutica desses transtornos. Para tanto, torna-se necessário uma apresentação geral do tema e algumas definições.

Os transtornos de humor caracterizam-se principalmente por alteração no humor, definido como o estado emocional basal do indivíduo. O humor oscila normalmente entre momentos de humor hipotímico, eutímico e hipertímico. Os transtornos são vistos quando essa oscilação ultrapassa os limiares de normalidade e causa sofrimento ao paciente.

Os transtornos podem ser classificados em transtorno depressivo maior, transtorno bipolar, ciclotimia, distimia, transtorno disfórico pré-menstrual, transtorno disruptivo da desregulação de humor e quadros provenientes do uso de drogas e medicações, além daqueles relacionados a outras condições clínicas. Ademais, outras doenças psiquiátricas podem cursar com alterações de humor, apesar de não serem tais alterações as características principais da doença, como é o caso da esquizofrenia.

Entretanto, os transtornos de humor mais comumente vistos são o transtorno depressivo maior e o transtorno bipolar, de modo que receberão maior atenção ao longo deste artigo.

Tratamento não farmacológico

O tratamento não farmacológico é de fundamental importância para a conduta em casos de transtornos de humor, assim como é visto em diversos outros quadros médicos. Aqui, destacam-se a psicoterapia e a mudança nos hábitos de vida, que serão especificados adiante em cada um dos principais transtornos de humor.

  • Transtorno depressivo maior: a psicoterapia com terapia cognitivo-comportamental é a mais indicada nesse caso. Ademais, a prática regular de atividade física e a adoção de hábitos de vida mais saudáveis, como a cessação do tabagismo, a higiene do sono e melhora do comportamento alimentar também são benéficas para os pacientes.
  • Transtorno bipolar: indica-se a psicoterapia, além da mudança de hábitos de vida (alimentares, cessação do tabagismo, higiene do sono, etc). Ademais, nesse quadro também se faz importante o reconhecimento dos estados de depressão, hipomania e mania pelo paciente e familiares, para que os quadros agudos possam ser melhor manejados.

Tratamento farmacológico

Nos transtornos de humor, o tratamento farmacológico deve ser individualizado, de modo a atender as necessidades de cada paciente de acordo com seus sintomas específicos. Sendo o transtorno depressivo e o transtorno bipolar os mais comuns, a seguir será realizada explicitação das terapias medicamentosas para essas patologias, além de ser feita uma revisão geral acerca do uso de cada classe de medicamentos.

No transtorno depressivo maior, o uso de medicamentos é indicado nos quadros moderados e graves, enquanto nos leves é priorizado o tratamento não farmacológico. Algumas orientações gerais acerca da medicação nos quadros depressivos são importantes. O tratamento deve ser iniciado com medicações de primeira escolha. Ademais, a medicação deve ser usada por tempo suficiente em dose suficiente para que faça efeito, de forma que só assim será possível avaliar com precisão os efeitos da terapia em cada caso. Esse tempo costuma ser de oito a doze semanas ou de quatro a oito semanas após atingir a dose máxima. Indica-se que o fármaco seja iniciado em dose mínima ou até mesmo em subdose para que a tolerância do paciente seja respeitada, fazendo-se aumentos graduais até dose suficiente, que pode ser tanto a dose máxima do medicamento quanto a dose máxima tolerada pelo paciente. Em cada dose, deve-se esperar de duas a quatro semanas para então avaliar a efetividade. Quanto aos efeitos colaterais, eles são bastante idiossincráticos. Por fim, não foi comprovada a superioridade de um fármaco antidepressivo em relação a outro, de forma que a prescrição deve levar em consideração o perfil e os sintomas de cada paciente. Quanto à escolha do fármaco, devido ao fator genético envolvido, também é interessante consultar o histórico familiar de uso desses medicamentos, de forma a seguir com a mesma droga.

Os antidepressivos de primeira escolha geralmente são os inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS). Esses medicamentos possuem efeitos colaterais leves (a saber: enjoo, diarreia, tremores, sintomas extrapiramidais, inquietação, insônia, perda/ganho de peso, disfunções sexuais, efeitos anticolinérgicos e raramente síndrome serotoninérgica – efeito grave), baixa toxicidade e menor interação com outros medicamentos, de forma que sua utilização costuma ser bem aceita. Devem ser receitados para utilização por via oral, com dose única diária, geralmente pela manhã (com exceção da paroxetina e da fluvoxamina, devido a terem como efeito colateral possível o sono). A tabela a seguir apresenta os principais ISRS e suas respectivas dosagens:

ISRSDOSE
Fluoxetina (Prozac)20 mg a 80 mg
Sertralina (Zoloft)50 mg a 200 mg
Paroxetina (Aropax)20 mg a 60 mg
Citalopram (Cipramil)20 mg a 60 mg
Escitalopram (Lexapro)10 mg a 30 mg
Fluvoxamina (Luvox)50 mg a 300 mg

Os duais são antidepressivos potentes, com pouca interação medicamentosa e menos efeitos colaterais quando comparados aos antidepressivos tricíclicos. Os sintomas costumam ser maiores no momento da introdução e da retirada desses fármacos. Seu uso se dá em dose única pela manhã em via oral. A tabela a seguir apresenta os principais duais e suas respectivas dosagens:

DUAISDOSE
Venlafaxina (Effexor)75 mg a 300 mg
Desvenlafaxina (Pristiq)50 mg a 200 mg
Duloxetina (Cymbalta)30 mg a 120 mg

Os antidepressivos tricíclicos (ADT) têm como efeitos colaterais o sono e o aumento de peso, de forma que sua indicação deve levar em consideração se estes efeitos são benéficos ou não para o paciente. Outros efeitos colaterais possíveis são os anticolinérgicos e os de alteração de condução cardíaca. Ademais, em dose baixa já apresentam efeito noradrenérgico e de modulação da dor. Esses medicamentos são pouco indicados para idosos, mas caso seja necessário, deve ser priorizada a nortriptilina. A seguir, encontra-se uma tabela com os principais antidepressivos tricíclicos e suas dosagens:

ANTIDEPRESSIVOS TRICÍCLICOS (ADT)DOSE
Amitriptilina (Amytril)75 mg a 300 mg
Clomipramina (Anafranil)75 mg a 300 mg
Nortriptilina (Pamelor)25 mg a 200 mg
Imipramina (Tofranil)100 mg a 300 mg
Doxepina75 mg a 300 mg

Por sua vez, os atípicos são fármacos menos utilizados. A seguir, é apresentada uma tabela com os principais antidepressivos atípicos, suas dosagens e algumas observações.

ATÍPICOSDOSEOBSERVAÇÃO
Agomelatina (Valdoxan)25 mg a 50 mgUtilizado em depressões sazonais
Mirtazapina (Remeron)15 mg  60 mgCausa aumento de apetite e sono
Trazodona (Donaren)150 mg a 400 mgEm dose baixa é hipnótico
Vortioxetina (Brintellix)5 mg a 20 mgNão possui ação sexual

Ademais, as seguintes classes de medicamentos antidepressivos são menos utilizadas, porém merecem ser citadas:

IMAODOSE
Tranilcipromina (Parnate)30 mg a 60 mg
Moclobemida (Aurorix)300 mg a 600 mg
IRNDDOSEOBSERVAÇÃO
Bupropiona (Zyban)150 mg a 450 mgTambém é utilizado para cessação de tabagismo
IRNDOSE
Reboxetina4 mg a 10 mg

O tratamento do transtorno bipolar é individualizado, devendo levar em conta os sintomas de cada paciente. O tratamento pode ser dividido de acordo com a fase da doença em que o paciente se encontra: aguda ou de manutenção. Nesse transtorno, as principais classes de fármacos utilizados são:

  • Estabilizadores de humor: Lítio, valproato, lamotrigina e carbamazepina. Como efeitos colaterais, podemos citar o hipotireoidismo, os tremores involuntários e a polidipsia.
  • Antipsicóticos atípicos: Quetiapina, aripiprazol e risperidona. Entre os efeitos colaterais estão o ganho de peso, as alterações gastrointestinais e a dislipidemia.
  • Inibidores seletivos da recaptação de serotonina: Usados em concomitância com um antipsicótico atípico e restritos ao transtorno bipolar do tipo 2. Como efeitos colaterais, podem ser citados a fadiga, a ansiedade e os sintomas gastrointestinais.

Ademais, ressalta-se que há alguma diferenciação entre o tratamento do transtorno bipolar tipo 1 e tipo 2, expostos a seguir após breve descrição das particularidades de cada tipo:

  • Transtorno bipolar tipo 1 – Nesse quadro, os episódios de mania estão presentes. A depressão e a hipomania, entretanto, podem estar presentes ou ausentes. Durante os períodos de manutenção, utiliza-se o mesmo tratamento da fase aguda, de forma a tentar sempre permanecer com o menor número de medicamentos na menor dose necessária. Nos períodos de mania, assim como nos de hipomania, podem ser utilizados os seguintes fármacos: lítio, quetiapina, valproato, aripiprazol e risperidona. Já nos períodos de depressão, podem ser utilizados quetiapina, lítio, lurasidona e lamotrigina. Durante os períodos de manutenção, por fim, utiliza-se o mesmo tratamento da fase aguda, de forma a tentar sempre permanecer com o menor número de medicamentos na menor dose necessária.
  • Transtorno bipolar tipo 1 – Aqui, a mania está ausente, de forma que os estados patológicos encontrados são os de depressão e hipomania. Nesse transtorno, a quetiapina é o único fármaco aprovado como tratamento de primeira linha. Como de segunda linha, podemos citar: lamotrigina, sertralina, lítio e venlafaxina.

Autor(a) : Aliscia Dal Pra Wendt – @alisciawendt


O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

Novidade: temos colunas sendo produzidas por Experts da Sanar, médicos conceituados em suas áreas de atuação e coordenadores da Sanar Pós.


Referências:

SADOCK, B. J. Compêndio de psiquiatria: ciência do comportamento e psiquiatria clínica – Kaplan, 11 ed., Artmed, 2017.

SADOCK, B. J.; SADOCK, V. A. Manual de farmacologia psiquiátrica de Kaplan e Sadock, 3 ed., Artmed, 2002