Nos últimos anos, a saúde mental se tornou um assunto muito comentado, seja nas redes sociais, em grupos, em palestras. A sobrecarga humana, as decepções emocionais, os transtornos diagnosticados e, de forma muito importante, a medicação utilizada em idosos.
A relação com os idosos se deve ao fato dos mesmos serem tratados muitas das vezes com essa classe de fármacos, mas em uso correto, evitando efeitos colaterais de uso crônico e abusivo. A população está envelhecendo, e o uso abusivo dessa medicação está iniciando em idades cada vez menores.
A classe dos benzodiazepínicos está envolvida amplamente no manejo de situações como as citadas acima, porém, uma medicação de fase aguda, muitas vezes utilizada indiscriminadamente, por tempo indeterminado e sem acompanhamento clínico, pode trazer prejuízo para a saúde.
O que era para ser benéfico acabou apresentando riscos de intoxicação, tolerância e dependência que ocorre pela necessidade física que o medicamento provoca no organismo, sabendo-se que, a sua descontinuação provoca efeitos contrários aos desejados, como na ansiedade e insônia. O indivíduo chega a ficar mais ansioso e com problemas de sono, o que o faz tomar mais e mais doses, sendo assim um fármaco que causa vício e é dose dependente.
Benzodiazepínicos e Alzheimer
Como exemplo do prejuízo do uso indiscriminado de benzodiazepínicos estão as pessoas acometidas pelo Alzheimer, que é uma doença caracterizada pela morte neuronal levando à perda progressiva da memória. Com o avanço da patologia, ocorre dificuldade da fala e atenção, contratura muscular, perda da lucidez, diminuição da capacidade de pegar e usar objetos comuns e fazer atividades simples, como vestir a própria roupa, devido à incapacidade cognitiva e motora. Sintomas como agressividade, agitação, nervosismo, depressão e insônia são frequentemente comuns na síndrome demencial.
Estima-se que 79% a 90% da população de idosos vivendo em casas de repouso apresentam sintomas psicológicos e comportamentais da demência. Os sintomas podem surgir ao longo da evolução da demência de uma maneira não linear ou também podem evoluir linearmente por um período de tempo e subsequentemente diminuir sua frequência. Por exemplo, a perambulação na doença de Alzheimer pode persistir por dois anos nos estágios moderados da doença e depois regredir. Quando não controlados, contribuem para a institucionalização prematura,elevação dos custos de tratamento e piora na qualidade de vida do paciente e de seu cuidador.
Farmacologia
Os benzodiazepínicos são rapidamente absorvidos pelo organismo, possuem uma alta lipossolubilidade, conseguem atravessar a barreira hematoencefálica, também conseguem atravessar a barreira placentária aumentando os riscos de anomalias e malformações congênitas, passam para o leite materno sedando o recém-nascido. A retirada dos benzodiazepínicos deve ser lenta, pois pode promover síndromes de abstinência ou ansiedade de rebote. O uso deve ser intermitente e breve, retirando a medicação assim que os sintomas forem desaparecendo. Essas drogas podem ser classificadas de acordo com a meia vida, tempo que a droga fica na corrente sanguínea, até que sua metade seja eliminada. Tem efeito de curta, média e longa duração. Os benzodiazepínicos de curta duração são os que apresentam maior risco de abuso. Os mais utilizados atualmente são, Clonazepam, Diazepam, Lorazepam, Alprazolam.
Estudos e perspectivas
Onze estudos foram publicados entre os anos de 1998 e 2015, sobre o uso dos benzodiazepínicos e o risco de distúrbios demenciais. Os viesses principais que poderiam explicar esses resultados contribuíram para uma confusão residual. É possível supor que a insônia é em si um fator de risco para a demência, que as pessoas com baixa reserva cognitiva são mais propensas a usar benzodiazepínicos, ou que seu estilo de vida está associado a menos interações sociais do que os não usuários, o que poderia contribuir para a construção e a associação estatística encontrada na ausência de qualquer relação causal.
No entanto a maioria dos estudos tentou controlar esses viesses, considerando a existência de distúrbios de sono antes do tratamento. Como acontece frequentemente em farmacologia. Dos onze estudos publicados o tópico não era congruente: um concluiu que havia um efeito protetor, nove desses onze estudos encontraram um aumento nos transtornos de demência em usuários de benzodiazepínicos e apenas um deles não encontrou nenhuma associação. Apesar disso, o conjunto de evidências parece justificar a prescrição e a renovação dos benzodiazepínicos somente se necessário.
O número de pessoas que irão desenvolver a demência cresce a cada dia, por isso sabe-se com certeza que existe uma necessidade global de mais estudos e pesquisas em relação a essa doença e à utilização desses fármacos. Estudos apontam um risco de aumento para os indivíduos idosos em desenvolver demências com o uso prolongado de benzodiazepínicos. A população mundial está envelhecendo e, portanto, precisa-se do desenvolvimento de políticas públicas de saúde para as pessoas com mais de 60 anos para que estas sejam assistidas e que, inclusive, se possa ter maiores informações acerca do efeito prolongado de certos medicamentos com os benzodiazepínicos. São necessárias mais pesquisas relacionadas aos fármacos que possam ser utilizados por idosos e que não comprometam a saúde dos mesmos e sim aumentem a qualidade de vida.
Referências
Tseng LY, Huang ST, Peng LN, Chen LK, Hsiao FY. Benzodiazepines, z-Hypnotics, and Risk of Dementia: Special Considerations of Half-Lives and Concomitant Use. Neurotherapeutics. 2020 Jan;17(1):156-164. doi: 10.1007/s13311-019-00801-9. PMID: 31802436; PMCID: PMC7007460.
TAMAI, Sérgio. Tratamento dos transtornos do comportamento de pacientes com demência. Rev. Bras. Psiquiatr., São Paulo, v. 24, supl. 1, p. 15-21, Apr. 2002. Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-44462002000500005&lng=en&nrm=iso>. access on 29 Mar. 2021.
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