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A intoxicação por opioides ocorre quando há uso elevado de uma substância dessa classe, excedendo a dose pertencente à janela terapêutica medicamentosa, causando efeitos tóxicos no organismo. Essa intoxicação pode advir de sobredosagem acidental, agonismo farmacêutico, interação medicamentosa ou abuso de alguma substância da classe opioide.
Para uma boa avaliação e atendimento do paciente intoxicado, é necessário conhecer o que são opioides, seus receptores, o mecanismo de ação no organismo, os fatores de risco para intoxicações, sinais e sintomas da intoxicação aguda e crônica, sinais de abstinência, fluxograma de atendimento e tratamento, procedimentos para desintoxicação e tratamento para dependência.
Fisiopatologia
Os opióides se ligam a receptores no SNC, TGI e nervos periféricos de três tipos diferentes (mu, kappa ou delta). Nos receptores centrais, determinam depressão do SNC e respiratória. No TGI, acarretam lentificação do esvaziamento gástrico e do trânsito colônico.
Nos nervos periféricos, reduzem a sensação de dor. Por meio da atuação nos receptores kappa-2 podem causar disforia e alucinações, tendo um risco potencial de causar dependência química.
O início de ação depende da via de administração e do agente específico. Intuitivamente, a via endovenosa apresenta início de ação mais rápido que a oral. Alguns agentes, como a oxicodona e a morfina, apresentam tanto formulação de liberação imediata como estendida.
O desconhecimento desse detalhe implica erros na determinação do período de observação.
Quadro clínico
As manifestações clínicas são clássicas e devem ser reconhecidas, principalmente no contexto de pacientes que fazem uso crônico: sonolência, rebaixamento do nível de consciência, miose (pupilas puntiformes), depressão respiratória (com bradipneia e hipoventilação), redução do peristaltismo e constipação intestinal. Meperidina ainda pode levar a convulsões, por isso vem sendo muito pouco utilizada na prática. O achado de bradipneia (FR < 12 irpm) é o sinal que melhor prediz intoxicação por opioides. Vale ressaltar que a miose não é condição necessária para o diagnóstico, uma vez que midríase pode ocorrer decorrente de hipóxia ou coingestões.
Diagnóstico
O diagnóstico é clínico. Alguns opioides podem ser dosados na urina (p. ex., morfina e codeína); no entanto, sua concentração sérica não apresenta boa correlação com a gravidade dos sintomas. Testes urinários permanecem positivos por até 72 horas, período mais longo que a duração do efeito.
Logo, o screening positivo não afasta outras causas de alteração da consciência. Caso a história e apresentação clínica sejam consistentes com intoxicação isolada por opioide em paciente hemodinamicamente estável, outros testes diagnósticos não são necessários.
Caso contrário, consideram-se exames laboratoriais com a finalidade de excluir outras causas de rebaixamento do nível de consciência, assim como descartam-se outras intoxicações concomitantes. Exames indicados incluem:
- Glicemia capilar.
- Hemograma.
- CPK.
- Painel metabólico.
- Gasometria.
- Níveis séricos de acetaminofeno e salicilato.
Raio X de tórax pode ser útil para avaliação de aspiração pulmonar. TC de crânio sem contraste ajuda no diferencial de rebaixamento do nível de consciência.
Manejo e tratamento
As prioridades são a restauração da oxigenação e ventilação, seguidas de potencial reversão com naloxone. Medidas de suporte incluem monitorização, suporte de oxigênio, intubação orotraqueal se rebaixamento do nível de consciência importante, hidratação adequada, coleta de exames laboratoriais e correção de distúrbios hidroeletrolíticos.
Se convulsões (p. ex., meperidina), tratar com benzodiazepínicos. Medidas de descontaminação (lavagem gástrica e carvão ativado) são pouco utilizadas por conta do alto risco de broncoaspiração.
O naloxone é prescrito preferencialmente por via endovenosa, porém na ausência de acesso, vias alternativas são possíveis (intraóssea, subcutânea, intramuscular, intranasal, via cânula orotraqueal, inalatória). A duração do efeito é de 1 a 1,5 hora, mais curta que a maioria dos opioides.
Sua principal indicação é depressão respiratória grave (FR < 12 irpm) e outros diagnósticos diferenciais devem ser considerados se ausência de melhora clínica após medicação. O objetivo é a reversão dos sintomas com a menor dose para evitar precipitação de abstinência.
A dose inicial recomendada é 0,4 mg EV em bolus, podendo ser repetida, em doses crescentes, a cada 2 a 3 min até dose máxima de 15 mg. Porém, iniciar com doses tão menores como 0,04 mg IV com elevações seriadas é aceitável. Por via SC, inicia-se com 0,4 a 0,8 mg; via intranasal, 2 a 4 mg; via inalatória, 2 mg de naloxone em 3 mL de SF (o paciente deve estar respirando).
Em casos de intoxicação por opioides de longa duração de ação com recorrência ou persistência da depressão respiratória, pode-se iniciar infusão contínua (dose horária inicial de dois terços da necessária para estimular a respiração). Na parada cardiorrespiratória, recomenda-se administrar 2 mg em bolus.
São indicações formais de internação para observação:
- Risco de efeitos prolongados: overdose por opioide de longa duração (metadona, oxicodona, patch de fentanil – mínimo de 24 horas de observação); overdose por rotas atípicas de exposição, o que torna a farmacocinética imprevisível (p. ex., ingestão de patch de fentanil).
- Evidência de efeitos prolongados ou graves: necessidade de doses repetidas ou infusão contínua de naloxone; dessaturação persistente (suspeita de aspiração ou edema pulmonar); rebaixamento do nível de consciência persistente.
Caso não tenha se administrado naloxone, observa-se por pelo menos 2 horas a fim de se assegurar que os efeitos da intoxicação não piorem. Ao se administrar naloxone, o período de observação recomendado é de 3 a 4 horas.
Todos os casos suspeitos devem ser notificados (T11.1 – Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de opiáceos – uso nocivo para a saúde).
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Perguntas frequentes
- O que é?
A intoxicação por opioides ocorre quando há uso elevado de uma substância dessa classe. - Como é feito o diagnóstico?
O diagnóstico é clínico. - Qual o tratamento?
As prioridades são a restauração da oxigenação e ventilação, seguidas de potencial reversão com naloxone.