Imagine acordar uma manhã e descobrir um novo mundo ao seu redor, um mundo cheio de odores que você nunca sonhou que existisse, odores que dizem mais sobre o ambiente que o rodeia do que você já imaginou olhando para ele.
Isso foi exatamente o que ocorreu a um jovem paciente do Dr. Oliver Sacks (história narrada no livro O Homem que confundiu sua mulher com um chapéu e outros casos clínicos).
A olfato permite a discriminação de bilhões de diferentes odores. O bulbo olfatório, a extensão do prosencéfalo que recebe estímulos de neurônios olfatórios primários, é muito mais desenvolvido nos vertebrados cuja sobrevivência está mais intimamente relacionada com o monitoramento químico de seu ambiente.
Anatomia e histologia no olfato
O mecanismo neural responsável pela olfação é realizado por uma cadeia de neurônios que começa no nariz. Este, por conseguinte, é considerado o órgão receptor da olfação (embora participe também de outras funções importantes, como a respiração e a fala).
A anatomia do nariz humano, bem como a dos mamíferos em geral, é bem adaptada para a canalização do ar inspirado e o seu direcionamento à traqueia e aos pulmões. As paredes internas do nariz são cobertas por uma mucosa, na qual estão incrustados os neurônios quimiorreceptores da olfação.
O epitélio olfatório é um neuroepitélio colunar pseudoestratificado, formado por três tipos celulares: as células de sustentação, as células basais e as células olfatórias. Em meio a esses elementos existem glândulas produtoras de muco.
O muco tem grande importância funcional para a olfação, pois é nele que se dissolvem as moléculas odorantes, antes de entrar em contato com a membrana dos neurônios receptores.
Fonte: SILVERTHORN, Dee Unglaub. Fisiologia humana: uma abordagem integrada. 7. Ed. Porto Alegre (2017)
As células de sustentação são prismáticas (também chamada de colunar ou cilíndrica), largas no seu ápice e mais estreitas na sua base. Apresentam, na sua superfície, microvilos que se projetam para dentro da camada de muco que cobre o epitélio.
As células basais são pequenas, arredondadas, e situam-se na região basal do epitélio, entre as células olfatórias e as de sustentação. São as células-tronco do epitélio olfatório.
As células olfatórias são neurônios bipolares que se distinguem das células de sustentação porque seus núcleos se localizam em uma posição mais inferior.
Suas extremidades apresentam dilatações elevadas, de onde partem 6 a 8 cílios, sem mobilidade, que são quimiorreceptores excitáveis pelas substâncias odoríferas. A existência dos cílios amplia enormemente a superfície receptora.
Os cílios ficam imersos no muco nasal, formando uma densa rede enovelada na superfície da mucosa. É justamente na membrana dos cílios que se encontram concentradas as moléculas receptoras responsáveis pela transdução quimioneural, que são chamados receptores olfatórios.
Do outro polo do neurônio receptor emerge um axônio direcionado para cima, que penetra na cavidade craniana através dos orifícios da placa crivosa do osso etmoide.
Por toda a mucosa nasal, o conjunto dos axônios dos quimiorreceptores vai formando filetes nervosos que se distribuem em forma de leque, convergindo dorsalmente para o etmoide.
Os axônios dos quimiorreceptores são na realidade as fibras de primeira ordem do sistema olfatório. Os filetes nervosos que eles formam constituem o primeiro nervo craniano, o nervo olfatório.
Esse é um nervo diferente, pois não constitui um cilindro compacto como os demais, mas sim um leque de filetes separados que vão terminar no bulbo olfatório no encéfalo.
Fisiologia do olfato
A estimulação da mucosa com um odorante constituído por um só tipo molecular provoca a ativação de um conjunto de quimiorreceptores que, em função da concentração do odorante, dispara em direção ao bulbo olfatório uma certa frequência de potenciais de ação.
A partir do bulbo olfatório, a informação segue direto para o córtex cerebral, inervando uma extensa área chamada córtex olfatório primário ou córtex piriforme.
Nesse aspecto, o sistema olfatório é diferente dos demais sistemas sensoriais, pois a informação chega ao córtex sem passar pelo tálamo. Os longos axônios das células m/t, reunidos no trato olfatório lateral, não projetam apenas para o córtex piriforme.
Muitos terminam em outras regiões prosencefálicas, como o núcleo olfatório anterior, o tubérculo olfatório, a área entorrinal e o complexo amigdaloide.
Esse conjunto de regiões aloja neurônios de terceira ordem que projetam para o hipotálamo e o hipocampo, conectando o sistema olfatório com o chamado sistema límbico.
Vias ascendentes do bulbo olfatório também levam à amígdala e ao hipocampo, partes do sistema límbico envolvidas na emoção e na memória. Um aspecto surpreendente da olfação é a sua ligação com a memória, a gustação e a emoção.
Duas hipóteses são consideradas para explicar a nossa capacidade de discriminar cheiros:
- “Linhas exclusivas”: Cada cheiro percorreria um caminho neural determinado, diferente dos demais cheiros. Essa hipótese é apoiada pela existência de uma certa topografia de ativação dos glomérulos do bulbo olfatório, mas é desautorizada pela baixa especificidade de muitos neurônios olfatórios em todos os níveis
- “Padrões de ativação”: Envolve diferentes populações de neurônios a cada cheiro. A particular combinação da atividade dos quimiorreceptores para cada cheiro seria detectada por neurônios de ordem superior situados em um dos estágios da via olfatória. Essa hipótese não requer especificidade dos neurônios olfatórios, porque a identificação dos cheiros dependeria da combinação dos neurônios ativos, e não de cada neurônio individualmente.
Semiologia do olfato
Para se examinar o nervo olfatório, primeiro precisa-se confirmar que a passagem nasal está aberta. O olfato é testado por líquidos ou óleos voláteis não irritativos.
De olhos fechados, uma narina do paciente é examinada e a outra é fechada, trazendo a substância próxima à narina aberta. Pede-se ao paciente para inalar uma substância e indicar se sentiu, não é preciso identificar.
Repetir o procedimento na outra narina e comparar. A percepção do cheiro é mais importante do que sua identificação. São usados para o teste qualitativo: alcatrão, óleo de rosas, eucalipto, lavanda, canela, terebentina, baunilha ou água de amêndoa.
A redução ou perda do olfato é chamada de hiposmia e anosmia, enquanto hiperosmia é o aumento da acuidade olfativa. Quanto a qualidade, a parosmia é a distorção de um odor que está presente, uma perversão da olfação e depende de alterações corticais.
Já o termo cacosmia representa a presença de súbito odor desagradável, comparado ao cheiro de borracha ou pano queimado, ou de excremento. Agnosia olfativa é a perda da discriminação entre odores e seu reconhecimento pela qualidade, mas a capacidade de perceber os aspectos do cheiro (detectar, adaptar e reconhecer diferentes intensidades) está normal. Afasia olfativa é a perda da denominação do odor.
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Referências:
- BRITO, Paulo. Os pares cranianos: Nervo olfatório. Acesso em 21 de abril 2021.
- CAMPBELL WW. DeJong – O Exame Neurológico. 7a. Edição, Editora Guanabara Koogan, 2014.
- JUNQUEIRA, LC; CARNEIRO, J. Histologia básica. 12. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.
- LENT,R. Cem bilhões de neurônios? Conceitos fundamentais de neurociências, 2° edição. Rio de Janeiro: Atheneu, 2010.
- SILVERTHORN, D. U. Fisiologia humana: uma abordagem integrada. 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017.




