Ciclo Clínico

Um caso clínico sobre Hipertireoidismo

Um caso clínico sobre Hipertireoidismo

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Imagem de perfil de Graduação Médica

História clínica paciente com hipertireoidismo

EEC, 54 anos, masculino, pardo, casado, marceneiro, natural e procedente de Salvador. Procurou Unidade de Pronto Atendimento referindo disfagia, odinofagia e dor em MMII associada a edema, há 15 dias.

Relata odinofagia com intensidade 5/10, ao deglutir alimentos sólidos, com duração de aproximadamente 01 hora após ingestão e nega dor à deglutição de líquidos. 

Refere disfagia com as mesmas características citadas, com uma sensação de bolo na garganta (sic). Paciente relata dor em MMII, latejante, intensidade 10/10, com formigamento em região, irradiando para os pés, associada a edema, apresentando como fator de melhora o movimento e fator de piora o repouso.

Associado a este quadro, paciente também refere emagrecimento, 10 Kg em uma semana, insônia, tremores, palpitações, sudorese intensa, irritabilidade, cefaleia em região occipital (5/10), em aperto, irradiando para região frontal, fator de melhora o descanso e piora durante o dia de trabalho.

Nega alterações em ritmo intestinal.  Refere intolerância ao calor e aumento do apetite.

Exame físico para hipertireoidismo

Paciente lúcido, orientado em tempo e espaço. Regular estado geral.

Sinais vitais

FC: 110 bpm; FR: 16 irpm; PA: 150 x 80 mmHg, Temperatura: 37 ºC.

Pele, fâneros e mucosas

Apresenta palidez, unhas e pelos quebradiços. Icterícia (+++/++++) ocular e de mucosa oral. Mucosa ocular hipocorada (+++/++++).

Cabeça e pescoço

Cefaleia de intensidade moderada (5/10), esclera ictéricas (+++/4).

Tireoide palpável, com consistência elástica, sem frêmitos ou sopros, com presença de nodulação em lobo direito (01 polpa digital, não aderido, fibroelástico). Olhos apresentando retração palpebral e sinal de lid-lag, sem exoftalmia.

Presença de linfadenopatia nas regiões supraclavicular e cervical.

Sistema Nervoso

Apresenta irritabilidade.

Sistema Respiratório

Tórax simétrico com expansibilidade preservada, frêmito toraco-vocal normal, som claro pulmonar à percussão, murmúrio vesicular preservado sem roncos ou sibilos.

Sistema Cardiovascular

Tórax simétrico sem abaulamentos, ictus cordis difuso. Ritmo cardíaco irregular e taquicárdico, sugestivo de FA. Pulsos simétricos de amplitude aumentada.

Aparelho Gastrointestinal

Abdome plano, sem lesões de pele, cicatrizes, circulação colateral ou herniações. Pulsações arteriais e peristalse não identificáveis à palpação. Peristalse normal, presente nos quatro quadrantes e ausência de sopros em focos arteriais abdominais à ausculta.

Hepatimetria medindo cerca de 10 cm (lobo direito) e 6 cm (lobo esquerdo). Traube livre. Abdome timpânico. Fígado e baços palpáveis. Sem visceromegalias e sinais de irritação peritoneal.

Membros

Extremidades quentes e úmidas, apresentando tremores finos. Edema em MMII, indolor.

Exames Complementares

Imagem de uma tabela com resultados de exames complementares para hipertireoidismo

Discussão sobre o caso de hipertireoidismo

1. Pela história da moléstia atual, exames físicos e exames complementares qual a suspeita de diagnóstico?

De acordo com os dados apresentados, a suspeita diagnóstica é de tireotoxicose de etiologia por hipertireoidismo de Doença de Graves.

A tireotoxicose é definida pelo excesso de hormônios tireoidianos e não é o mesmo que hipertireoidismo, o qual representa o resultado de uma função tireoidiana excessiva.

A Doença de Graves é responsável por 60-80% dos casos de tireotoxicose e sua patogênese é definida por uma combinação de fatores ambientais e genéticos.

O hipertireoidismo da Doença de Graves é causado pelas imunoglobulinas estimulantes da tireoide (TSI) sintetizadas na tireoide, assim como na medula óssea e nos linfonodos.

Outras respostas autoimunes da tireoide ocorrem concomitante nesses pacientes. Em particular, daremos destaque aos anticorpos anti-TPO, que funcionam como um marcador mensurável de autoimunidade e ocorrem em até 80% dos casos.

Levando em conta a tireoidite coexistente, a função tireoidiana pode sofrer alteração e, a longo prazo, provocar um hipotireoidismo autoimune espontâneo.

2. Quais os diagnósticos diferenciais?

Os diagnósticos diferenciais consistem em tireoidite subaguda, tumor hipofisário secretor de TSH ou outras causas de tireotoxicose.

A manifestação clínica depende da gravidade, duração da doença, susceptibilidade individual ao excesso de hormônio tireoidiano e idade. Como sinais e sintomas, o paciente apresenta:

  • Perda de peso;
  • Maior apetite;
  • Hiperatividade, nervosismo e irritabilidade;
  • Tremores finos;
  • Fibrilação atrial (mais comum em pacientes > 50 anos).

Obs: A manifestação cardiovascular mais comum é a taquicardia sinusal, associada muitas vezes a palpitações, causadas ocasionalmente pela taquicardia supraventricular.

  • Pele quente e úmida, sudorese e intolerância ao calor;
  • Textura dos pelos mais fina.

3. Quais os demais sinais e sintomas de hipertireoidismo?

Os portadores da Doença de Graves podem apresentar: eritema palmar, onicólise e, menos comumente, prurido, urticária e hiperpigmentação difusa.

Além disso, podem ter alopecia difusa, tempo de trânsito gastrointestinal reduzido (dando origem a maiores evacuações, na maioria com diarreia e, ocasionalmente, com esteatorreia).

As mulheres podem apresentar oligomenorreia ou amenorreia.

Os homens podem constatar função sexual prejudicada e, às vezes, ginecomastia. Além disso, mais de 50% dos pacientes apresentam oftalmopatia.

Na avaliação laboratorial, podemos observar a diminuição do nível de TSH (inferior a 0,05 mUI/L) e o aumento dos níveis dos hormônios tireoidianos totais e livres.

Juntamente a isso, a dosagem dos anticorpos contra TGO ou TRAb pode ser útil em caso de suspeita clínica.

Anormalidades associadas podem causar confusão diagnóstica, como a elevação das enzimas hepáticas (TGO: 126 U/L e TGP: 94 U/L), anemia microcítica (Hb: 9 g/dL e Ht: 23%) e trombocitopenia (plaquetas 115.000/mL).

Cerca de 5-15% das mulheres eutireoidianas e até 2% dos homens eutireoidianos possuem anticorpos antitireoidianos; esses indivíduos correm mais risco de vir a desenvolver disfunção na tireoide.

Quase todos os pacientes com hipotireoidismo autoimune e até 80% dos que possuem graves possuem anticorpos contra TPO geralmente em altos níveis.

As TSI são anticorpos que estimulam TSH-R na doença de graves. Costumam ser dosadas pelos TRAb, tendo como pressuposto que os níveis elevados no hipertireoidismo refletem efeitos estimuladores sobre o receptor de TSH.

Os níveis séricos de Tg estão elevados em todos os tipos de tireotoxicose, exceto na factícia. Os níveis maiores de Tg na tireoide refletem a destruição do tecido tireoidianos liberação de Tg.

A captação nuclear na doença de Graves apresenta uma glândula aumentada e com maior captação do marcador. A cintilografia de tireoide não é usada na avaliação de rotina de pacientes com nódulos na tireoide.

A cintilografia constitui o exame complementar preferido, porém pode-se utilizar a determinação do TRAb para avaliar atividade autoimune.

A ultrassonografia é valiosa para diagnóstico e avaliação de pacientes com doença nodular de tireoide.

De acordo com as diretrizes, deve ser solicitada para todos os pacientes com suspeita de nódulo da tireoide pelo exame físico ou outro de imagem, além de ser capaz de caracterizar nódulos e cistos.

4. Qual o tratamento indicado para o paciente com hipertireoidismo?

Em relação ao tratamento, ele é feito através da redução da síntese dos hormônios tireoidianos, utilizando drogas antitireoidianas ou reduzindo a quantidade de tecido tireoidianos pelo tratamento com iodo radioativo ou pela tireoidectomia.

Os pacientes podem necessitar de múltiplos tratamentos para conseguir a remissão.

As principais drogas antitireoidianas são as tionamidas, que inibem a função da TPO e dos hormônios antitireoidianos, e a propiltiouracila, que inibe a desiodinação da T4 em T3 (porém é hepatotoxica).

No tratamento com essas drogas a função tireoidianas e manifestações clínicas devem ser continuamente revistas.

O iodo radioativo causa progressiva destruição das células tireoidianas, podendo em alguns casos levar a um hipotireoidismo ou recidiva.

A tireoidectomia constitui uma opção para os pacientes que sofrem recidiva após uso de drogas antitireoidianas e que preferem este tratamento ao iodo radioativo.

A cirurgia é recomendada para pacientes mais jovens que apresentem bócio muito volumoso.

Confira o vídeo sobre hipertireoidismo:

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